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PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. IMPROCEDÊNCIA. CONCESSÃO NEGADA. VERBA HONORÁRIA. MAJORAÇÃO. TRF4. 5000741-...

Data da publicação: 21/04/2021, 11:00:58

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. IMPROCEDÊNCIA. CONCESSÃO NEGADA. VERBA HONORÁRIA. MAJORAÇÃO. 1. Não comprovada a exposição do segurado a agente nocivo ou o exercício de atividade enquadrável até o início da vigência da Lei nº 9.032/95, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, não é possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. 2. Não tem direito à aposentadoria especial o segurado que não possui tempo de serviço especial suficiente para a concessão do benefício. 3. Majorada a verba honorária devida, nos termos do art. 85, § 11, NCPC, ante a negativa de provimento ao recurso. (TRF4, AC 5000741-30.2016.4.04.7118, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 13/04/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000741-30.2016.4.04.7118/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

APELANTE: JUCARA MARIA BARELLA ZANDONA (AUTOR)

ADVOGADO: JULIANO BRITO (OAB RS055628)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de ação ajuizada em face do INSS em 09/03/2016, na qual JUÇARA MARIA BARELLA ZANDONÁ (59 anos) objetiva a conversão de sua aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, desde a DER (02/09/2013), mediante o reconhecimento da especialidade do labor exercido de 09/06/1997 a 30/06/2009 (J. Zandoná & Cia Ltda.) e de 01/09/2009 a 07/06/2013 (Ângelo Lisot).

Sobreveio sentença (Evento 78), prolatada em 25/08/2017, que julgou o feito nos seguintes termos finais:

Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos formulados na presente ação, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, levando em conta o art. 85, § 4º, III do CPC e § 6º e atentando-se aos parâmetros do § 2º e do inciso I do §3º do referido dispositivo legal, os quais devem ser arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da causa, suspensa a exigibilidade nos moldes do artigo 98, §3º, do CPC, em face da gratuidade da justiça deferida no curso da instrução.

Sem custas (art. 4º, II, Lei nº 9.289/96).

Sentença não sujeita a remessa necessária (art. 496 do CPC).

Em apelação (Evento 84) a autora, preliminarmente, sustenta haver cerceamento de defesa, uma vez que havia solicitado a produção de prova testemunhal e pericial para a averiguação das condições laborais nos períodos de 09/06/1997 a 30/06/2009 (J. Zandoná & Cia Ltda.) e de 01/09/2009 a 07/06/2013 (Ângelo Lisot). No mérito, pretende o reconhecimento da especialidade dos períodos mencionados, bem como a concessão da aposentadoria que lhe for mais vantajosa.

Oportunizadas as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

Preliminar do Autor - Cerceamento de Defesa

A parte autora sustenta haver cerceamento de defesa, uma vez que havia solicitado a produção de prova pericial para a averiguação das suas reais condições laborais nos períodos laborados junto às empresas J. Zandoná & Cia Ltda. e Ângelo Lisot - ME.

Sendo a prova dirigida ao Juízo, não se configurará cerceamento de defesa se este entender que o conjunto probatório trazido aos autos é suficiente à formação de seu convencimento, permitindo o julgamento da causa, nos termos do art. 355, I, do CPC.

Importa destacar, outrossim, que o afastamento da alegação de cerceamento de defesa não pressupõe o automático reconhecimento da especialidade do período requerido. O retorno dos autos à origem somente se justifica na medida em que inexista nos autos documentação suficiente para esclarecer as condições de trabalho vivenciadas pela parte autora. Na verdade, existindo esta documentação, não há falar em cerceamento de defesa. Entretanto, se a documentação trazido a exame não corrobora o alegado pela parte autora, o que existe, na verdade, é contrariedade e inconformismo com o resultado alcançado e não cerceamento do direito de defesa.

No caso em questão, foram apresentados documentos que podem ser aproveitados para comprovação ou não da especialidade requerida, tais como os Perfis Profissiográficos Previdenciários (Evento 1 - PROCADM3, fls. 16 e 18/19), além de contrato social e alterações da empresa J. Zandoná & Cia Ltda. (Evento 76 - PROCADM1, fl. 55 e ss) e LTCAT de Gustavo de Mello Farmácia - ME/Ângelo Lisot - ME, de Abril/2017 (Evento 65 - OFIC1), não havendo falar em necessidade de nova perícia.

Dessa forma, creio que o feito encontra-se suficientemente instruído para análise neste momento.

Assim, afasto a preliminar de cerceamento de defesa.

MÉRITO

Os pontos controvertidos no plano recursal restringem-se:

- ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 09/06/1997 a 30/06/2009 (J. Zandoná & Cia Ltda.) e de 01/09/2009 a 07/06/2013 (Ângelo Lisot);

- à possibilidade de conversão da aposentadoria por tempo de contribuição vigente em aposentadoria especial.

TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL

Segundo orientação adotada pela Terceira Seção do STJ, o tempo de serviço especial disciplina-se pela lei vigente à época em que exercido o labor, passando a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador como direito adquirido (AGRESP 493.458/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, DJU 23/06/2003, e REsp 491.338/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU 23/06/2003).

Portanto, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova e, ante a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, torna-se necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto. Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:

a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações, e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou mesmo quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para ruído, em que necessária sempre a aferição do nível de decibéis por meio de parecer técnico trazido aos autos, ou simplesmente por referência no formulário padrão emitido pela empresa;

b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95, no art. 57 da Lei de Benefícios, passou a ser necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico;

c) após 06/03/1997, a partir da vigência do Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento do tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

Tal interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).

Agentes Químicos

No tocante à necessidade de análise quantitativa dos agentes químicos, a Norma Regulamentadora n.º 15 (NR-15), do Ministério do Trabalho , somente é aplicável a partir de 03/12/1998, data da publicação da MP n.º 1.729, convertida na Lei 9.732/1998, quando a redação do artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/1991 passou a incluir a expressão "nos termos da legislação trabalhista". Também o Decreto nº 3.265/99, de 29/11/1999, modificou o item 1.0.0 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, passando a prever que o agente químico é nocivo quando apresenta "nível de concentração superior aos limites de tolerância estabelecidos."

Contudo, mesmo após essas alterações, é dispensável o exame da concentração do agente químico (análise quantitativa) em relação aos agentes arrolados no Anexo 13 da NR 15, em relação ao quais é suficiente a avaliação qualitativa de risco. Isso porque a própria norma regulamentadora dispensa, em relação a esses agentes químicos, a análise quantitativa, a qual fica reservada aos agentes arrolados no Anexo 11. Essa distinção é inclusive reconhecida administrativamente pelo INSS, que a incorporou à Instrução Normativa nº 45/2010 (art. 236, § 1º, I) e à Instrução Normativa nº 77/2015 (art. 278, § 1º).

Noto, por fim, que essa orientação também tem sido adotada pela jurisprudência deste Tribunal (TRF4, EINF 5009536-30.2012.4.04.7000, Terceira Seção, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, juntado aos autos em 01/07/2016; TRF4, APELREEX 0019923-48.2014.4.04.9999, Quinta Turma, Relator Roger Raupp Rios, D.E. 16/03/2017; TRF4, APELREEX 5024791-82.2013.4.04.7100, Quinta Turma, Relator Osni Cardoso Filho, julgado em 12/02/2019).

Intermitência na exposição aos agentes nocivos

A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. A jurisprudência desta Corte volta-se à interpretação no sentido de que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, vejam-se os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, Relator Rogerio Favreto, D.E. 24/10/2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07/11/2011.

Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).

Equipamento de Proteção Individual - EPI

Primeiramente, é importante pontuar que a utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998, data da entrada em vigor da MP n.º 1.729/98, convertida na Lei 9.732/1998, através da qual passou a existir a exigência de o laudo técnico conter informações sobre a existência de tecnologia de proteção individual eficaz para diminuir a intensidade do agente nocivo a limites de tolerância e recomendação do empregador para o uso.

Quanto à matéria relativa ao uso de EPI, o Colendo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (ARE 664335, Relator Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, Acórdão Eletrônico DJE-029 Divulgação 11/02/2015 Publicação 12/02/2015), firmou as seguintes teses:

1 - o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial;

2 - na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.

Como se vê, considerado o período a partir de 03 de dezembro de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade, em decorrência do uso de EPIs, é admissível desde que haja prova hábil afirmando inequivocamente que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis, ou os neutralizou.

O questionamento sobre a suficiência do mero preenchimento dos campos específicos, no PPP, onde simplesmente são respondidas as perguntas "EPI eficaz?" e "EPC eficaz?" para a caracterização da especialidade ou não da atividade, provocou a discussão estabelecida no IRDR 15, na 3ª Seção desta Corte, o qual teve o mérito julgado em sessão de 22/11/2017. No entanto, as teses nele firmadas não são aplicáveis de imediato, tendo em conta a interposição de recursos excepcionais contra o acórdão nele proferido, de acordo com o disposto nos artigos 982, § 5º e 987, § 1º, do NCPC.

Portanto, todos os aspectos supramencionados devem ser observados para avaliação da eficácia da utilização dos EPIs na elisão dos efeitos danosos dos agentes nocivos para a caracterização ou não do tempo especial.

Do Perfil Profissiográfico Previdenciário

Para validade da utilização do formulário Perfil Profissiográfico Previdenciário, este deve ter sido produzido com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, o qual deve figurar como responsável técnico. Esta Corte firmou entendimento no sentido de que presume-se, ainda que de forma relativa, que o referido documento guarda fidelidade em relação às informações extraídas do laudo técnico (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0010952-16.2010.404.9999, 6ª Turma, Rel. Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, D.E. 27/05/2011; TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017107-59.2015.4.04.9999, 5ª Turma, Rel. Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, POR UNANIMIDADE, D.E. 22/06/2017).

Da contemporaneidade do laudo técnico

Cumpre referir que a extemporaneidade do laudo técnico em relação ao período cuja especialidade o segurado pretende ver reconhecida não impede o enquadramento da atividade como especial, conforme se depreende do seguinte aresto:

"PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. EC 20/98. ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO. LEI N. 9.711/98. DECRETO N. 3.048/99. LAUDO CONTEMPORÂNEO. DESNECESSIDADE. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. HONORÁRIOS PERICIAIS. OMISSÃO SUPRIDA. MARCO INICIAL DO BENEFÍCIO.

1 a 4. Omissis. 5. O fato de o laudo pericial não ser contemporâneo ao exercício das atividades laborativas não é óbice ao reconhecimento do tempo de serviço especial, visto que, se em data posterior ao labor despendido, foi constatada a presença de agentes nocivos, mesmo com as inovações tecnológicas e de medicina e segurança do trabalho que advieram com o passar do tempo, reputa-se que, à época do labor, a agressão dos agentes era igual, ou até maior, dada a escassez de recursos materiais existentes para atenuar sua nocividade e a evolução dos equipamentos utilizados no desempenho das tarefas. 6 a 12. Omissis. (TRF4, AC n.º 2003.04.01057335-6, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E de 02.05.2007)."

Assim, ainda que o LTCAT tenha sido elaborado após a efetiva prestação dos serviços, não havendo prova de alteração do layout da empresa desde o início da prestação dos serviços, não há óbice na sua utilização como prova da especialidade das atividades, uma vez que não há razão para se deduzir que as agressões ao trabalhador fossem menores ou inexistissem em época anterior, até porque a evolução tecnológica e da segurança do trabalho tendem a causar a redução e não o aumento da nocividade com o passar dos anos.

Da fonte de custeio

É absolutamente inadequado aferir-se a existência de um direito previdenciário a partir da forma como resta formalizada determinada obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Pouco importa, em verdade, se a empresa entendeu ou não caracterizada determinada atividade como especial. A realidade precede à forma. Se os elementos técnicos contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade, não guardam relevância a informação da atividade na GFIP ou a ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.

O que importa é que a atividade é, na realidade, especial. Abre-se ao Fisco, diante de tal identificação, a adoção das providências relativas à arrecadação das contribuições que entende devidas. O raciocínio é análogo às situações de trabalho informal pelo segurado empregado (sem anotação em carteira ou sem recolhimento das contribuições previdenciárias). A discrepância entre a realidade e o fiel cumprimento das obrigações fiscais não implicará, jamais, a negação da realidade, mas um ponto de partida para os procedimentos de arrecadação fiscal e imposição de penalidades correspondentes.

De outro lado, consubstancia grave equívoco hermenêutico condicionar-se o reconhecimento de um direito previdenciário à existência de uma específica contribuição previdenciária. Mais precisamente, inadequada é a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). E a ausência de contribuição específica não guarda relação alguma com o princípio da precedência do custeio(CF/88, art. 195, §5º).

Note-se, quanto ao particular, que a contribuição adicional apenas foi instituída pela Lei 9.732/98, quase quatro décadas após a instituição da aposentadoria especial pela Lei 3.807/60. Além disso, as empresas submetidas ao regime simplificado de tributação (SIMPLES), como se sabe, não estão sujeitas ao recolhimento da contribuição adicional e essa condição não propicia sequer cogitação de que seus empregados não façam jus à proteção previdenciária diferenciada ou de que a concessão de aposentadoria especial a eles violaria o princípio constitucional da precedência do custeio. E isso pelo simples motivo de que ela decorre, dita proteção à saúde do trabalhador, da realidade das coisas vis a vis a legislação protetiva - compreendida desde uma perspectiva constitucional atenta à eficácia vinculante dos direitos fundamentais sociais. O que faz disparar a proteção previdenciária é a realidade de ofensa à saúde do trabalhador, verificada no caso concreto, e não a existência de uma determinada regra de custeio. Deve-se, aqui também, prestigiar a realidade e a necessidade da proteção social correlata, de modo que a suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social, plenamente justificável, estaria a violar o princípio da precedência do custeio.

EXAME DO TEMPO ESPECIAL NO CASO CONCRETO

Compulsando os presentes autos, verifico que a sentença do MM. Juízo assim solucionou a lide quanto aos períodos de especialidade do labor discutida, in verbis:

Do caso concreto

Analisando-se as especificidades do trabalho desenvolvido, tem-se o que segue:

Período: 09/06/1997 a 30/06/2009.

Forma de filiação: contribuinte individual.

Função: farmacêutica/gerente.

Agente(s) nocivo(s) alegados: produtos alcalinos (químico) e microrganismos (biológico).

Prova: PPP (E1, PROCADM3, p.18/19) e Contrato social e alterações (E1, PROCADM8, p.55 e seguintes)

Fundamentação:

Antes de adentrar na averiguação da alegada atividade especial atinente ao período como contribuinte individual, ressalto que apenas podem ser objeto de análise as contribuições que se encontram efetivamente recolhidas.

Pois bem. Inicialmente, destaco que é perfeitamente possível reconhecer como especial o tempo de serviço sujeito a agentes nocivos prestado pelo contribuinte individual, desde que comprovados o exercício da atividade e a exposição a fatores de risco. Afinal, não há óbice na legislação previdenciária, não podendo o segurado ser prejudicado pela ausência de previsão do custeio específico do benefício pelo legislador. Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. REVISÃO/MAJORAÇÃO DE RMI DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. 1. Uma vez exercida atividade enquadrável como especial, sob a égide da legislação que a ampara, o segurado adquire o direito ao reconhecimento como tal e ao acréscimo decorrente da sua conversão em comum. 2. O segurado empresário ou autônomo, que recolheu contribuições como contribuinte individual, tem direito à conversão de tempo de serviço de atividade especial em comum, quando comprovadamente exposto aos agentes insalubres, de forma habitual e permanente, ou decorrente de categoria considerada especial, de acordo com a legislação. 3. Constando dos autos a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço e majorada a aposentadoria por tempo de serviço do segurado. (TRF4, AC n.º 0020474-96.2012.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 29/08/2013).

Também a Súmula nº 62 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais dispõe nesse exato sentido: "O segurado contribuinte individual pode obter reconhecimento de atividade especial para fins previdenciários, desde que consiga comprovar exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física".

Na mesma linha, especificamente tratando da questão da fonte de custeio: APELREEX nº 5001497-32.2012.404.7101, Relator Ézio Teixeira, Sexta Turma, D.E. 09/05/2013.

Necessária, portanto, a demonstração do efetivo exercício da atividade, ou seja, é preciso haver comprovação da própria função alegadamente exercida, a fim de que seja possível, especificadas as atividades desempenhadas, analisar a especialidade do trabalho. Além disso, também é imprescindível a comprovação da sujeição a agentes nocivos na forma exigida pela legislação previdenciária conforme a época em que o labor foi desenvolvido, como dito alhures.

No presente caso, a parte autora apresenta formulário (PPP - E1, PROCADM3, p.18/19), confeccionado e assinado por seu marido, documento que não conta com a imparcialidade necessária para ser considerado apto a comprovar a alegada especialidade do período.

Além disso, no contrato social e nas alterações que se sucederam, a parte autora foi relacionada como gerente da empresa. Assim, considerando as diversas atividades exercidas pela demandante nas suas funções de chefia, revela-se que a exposição a agentes nocivos, se de fato existiu, ocorria de maneira eventual.

Improcedente, dessa forma, o feito neste tópico.

Período: 01/09/2009 a 07/06/2013.

Empregador: Angelo Tissot.

Função/setor: farmacêutica (farmácia)

Descrição das atividades: Realizar atendimento a clientes, avaliação farmacêutica do receituário de clientes, realizar a guarda de medicamentos, drogas e matérias-primas e sua conservação. Organizar e atualizar controles de produtos farmacêuticos, químicos e biológicos, mantendo registro permanente do estoque de substâncias e medicamentos. Controlar estoque de medicamentos. Emitir parecer técnico a respeito de produtos e equipamentos utilizados na farmácia. Fazer requisições de substâncias, medicamentos e materiais necessários à farmácia (E65, OFIC1, p.21).

Agente(s) nocivo(s) alegados: produtos alcalinos (químicos) e micorganismos (biológico).

Provas: CTPS (E1, PROCADM3, p.65), PPP (E1,PROCADM3, p.16) e laudo (E65, OFIC1, p.21).

Fundamentação:

Pela descrição das funções desempenhadas, é pouco provável que haja o contato com os fatores biológicos e químicos arrolados a ponto de caracterizar a especialidade do labor.

Apesar do fato de que habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho, tal não é o caso dos autos.

Impera registrar que, no caso concreto, a exposição aos agentes descritos se dava de forma eventual, consoante análise do formulário e laudos apresentados. Naturalmente, se a exposição se dava de forma eventual, proscreve-se a habitualidade, requisito sine qua non para o reconhecimento do direito à especialidade.

Apesar de ter constado no PPP exposição a agentes nocivos (o laudo indicou que a atividade não era insalubre), há descrição de atividades por parte da demandante em diversos locais e setores, havendo demonstração de que a parte autora, no exercício de suas funções, estava eventualmente exposto aos agentes nocivos descritos nos formulários.

Assim, não evidenciada a sujeição habitual e permanente ao agentes nocivos, entendo que não está configurada a especialidade alegada no período.

Nesse contexto, não restou comprovada o exercício de atividade especial nos períodos controvertidos, não tendo direito, a parte autora, à concessão do benefício de aposentadoria especial.

Em primeiro lugar, ressalto que em ambos os períodos citados restou claro que a demandante não entrava em contato direto com agentes biológicos nocivos, tanto por atuar em atividades administrativas e gerenciais, conforme dito na sentença, quanto pelo fato de que as provas conduzem em sentido contrário.

No período de 09/06/1997 a 30/06/2009, trabalhando em sua própria Farmácia (J. Zandoná & Cia Ltda.), da qual era acionista massivamente majoritária e atuava no gerenciamento, o próprio contrato social explana que a atividade da empresa era exclusivamente de Drogaria ou Farmácia e Drogaria (contrato social e alterações no Evento 76 - PROCADM1, fl. 55 e ss), absolutamente nada constando sobre atividades de laboratório de análises clínicas.

Observe-se que, após 06/03/1997, a partir da vigência do Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento do tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Os formulários apresentados para ambas as empresas não possuem base em laudo técnico (Evento 1 - PROCADM3, fls. 16 e 18/19), o que os desqualifica para a indicação da nocividade dos agentes, embora possam passar uma ideia a respeito das atividades praticadas, no que não contrariarem a documentação complementar nos autos.

No entanto, entendo desnecessária a cogitação da produção de perícia técnica (conforme mencionado na preliminar), uma vez que o LTCAT produzido para a sucessora da empresa Ângelo Lisot - ME (Evento 65 - OFIC1) deixa uma ideia clara do trabalho de farmacêutica exercido em empresas como as ora investigadas, razão pela qual valho-me de tal laudo para avaliar as atividades desenvolvidas em ambos os períodos, de idêntica natureza.

Na fl. 21 do referido LTCAT, adotado para ambos os períodos como prova técnica adequada, é mencionado que na atividade de Farmacêutica a profissional realizaria atendimento a clientes, faria avaliação do receituário, realizaria guarda dos medicamentos, drogas e matérias-primas e sua conservação, organizando e controlando os produtos e mantendo registro do estoque, além de emitir pareceres técnicos e fazer requisições. O perito apurou que tais atividades não são insalubres.

Portanto, não é cabível o reconhecimento da natureza especial dos períodos postulados, devendo ser, no mérito, confirmada a sentença de improcedência.

Majoração dos honorários de sucumbência

Considerando o disposto no art. 85, § 11, NCPC, e que está sendo negado provimento ao recurso, majoro os honorários fixados na sentença em 20%, respeitados os limites máximos das faixas de incidência previstas no § 3º do art. 85. Mantida a suspensão da exigibilidade das verbas sucumbenciais, em face da gratuidade da justiça deferida no curso da instrução.

Prequestionamento

No que concerne ao prequestionamento, observe-se que, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.

CONCLUSÃO

Afastada a preliminar de cerceamento de defesa e negado provimento à apelação da parte autora, mantendo-se a sentença de improcedência, com a majoração da verba honorária devida, nos termos da fundamentação.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por afastar a preliminar levantada e negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002381786v20 e do código CRC ba1db22c.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000741-30.2016.4.04.7118/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

APELANTE: JUCARA MARIA BARELLA ZANDONA (AUTOR)

ADVOGADO: JULIANO BRITO (OAB RS055628)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. IMPROCEDÊNCIA. CONCESSÃO NEGADA. VERBA HONORÁRIA. MAJORAÇÃO.

1. Não comprovada a exposição do segurado a agente nocivo ou o exercício de atividade enquadrável até o início da vigência da Lei nº 9.032/95, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, não é possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida.

2. Não tem direito à aposentadoria especial o segurado que não possui tempo de serviço especial suficiente para a concessão do benefício.

3. Majorada a verba honorária devida, nos termos do art. 85, § 11, NCPC, ante a negativa de provimento ao recurso.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, afastar a preliminar levantada e negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 13 de abril de 2021.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002381787v3 e do código CRC 61eba07e.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 13/4/2021, às 18:27:8


5000741-30.2016.4.04.7118
40002381787 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 21/04/2021 08:00:58.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 06/04/2021 A 13/04/2021

Apelação Cível Nº 5000741-30.2016.4.04.7118/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): ALEXANDRE AMARAL GAVRONSKI

APELANTE: JUCARA MARIA BARELLA ZANDONA (AUTOR)

ADVOGADO: JULIANO BRITO (OAB RS055628)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 06/04/2021, às 00:00, a 13/04/2021, às 14:00, na sequência 371, disponibilizada no DE de 23/03/2021.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, AFASTAR A PRELIMINAR LEVANTADA E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 21/04/2021 08:00:58.

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