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PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA. NÃO CONHECIMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LABOR RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. TUTELA ESPECÍFICA. TRF4...

Data da publicação: 29/04/2022, 07:01:31

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA. NÃO CONHECIMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LABOR RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Não conhecida a remessa necessária, considerando que, por simples cálculos aritméticos, é possível concluir que o montante da condenação ou o proveito econômico obtido na causa é inferior a 1.000 salários mínimos (artigo 496 do CPC). 2. Ressalta-se a previsão da Súmula 577 do STJ, a qual preconiza que "é possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório". 3. A jurisprudência do STJ caminha no sentido de que é possível presumir o labor rural da esposa quando os documentos, inclusive a certidão de casamento, comprovam o labor rural do marido (STJ. AgRg no REsp 1309123/SP. Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS. SEGUNDA TURMA. Julgado em 08/05/2012). 4. Não possui razão o INSS ao alegar que ficha ou declaração escolar proveniente de instituição pública, ou particular de ensino, é prova inválida do labor rural. Isto porque, o art. 54, VIII, da Instrução Normativa 77/2045, deixa claro que se considera início de prova material, para fins de comprovação da atividade rural, comprovantes de matrícula ou ficha de inscrição em escola, ata ou boletim escolar do trabalhador, ou dos filhos. 5. No que diz respeito aos denominados boias-frias (trabalhadores informais), diante da dificuldade de obtenção de documentos, o STJ firmou entendimento no sentido de que a apresentação de prova material somente sobre parte do período pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por robusta prova testemunhal. 6. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado. (TRF4, AC 5028313-43.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 21/04/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5028313-43.2019.4.04.9999/PR

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0001052-05.2017.8.16.0102/PR

RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: LUCELIA MARIA BARBOSA

ADVOGADO: MARCIA CRISTINA AVELINO BENEDETTI IDALGO (OAB PR017323)

RELATÓRIO

Trata-se de ação de procedimento comum em que é postulada a averbação de tempo de trabalho rural de dezembro de 1970 a junho de 1991, bem como a concessão de benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição.

Processado o feito, sobreveio sentença, cujo dispositivo tem o seguinte teor:

DISPOSITIVO.

Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, CPC, julgo procedente a demanda, para declarar comprovado o trabalho rural da autora no período de 06/12/1972 a 01/06/1991, determinando-se sua devida averbação perante o RGPS, na condição de segurada especial.

Via de consequência, condeno o réu a implantar o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição com proventos integrais à autora, desde o requerimento administrativo (24/08/2016), observando-se, quanto ao salário-de-benefício, as balizas da legislação previdenciária, sendo que os valores atrasados deverão ser corrigidos monetariamente e sofrer incidência de juros por uma única vez, no índice aplicável à remuneração das cadernetas de poupança, conforme o art. 1°-F, Lei n° 9.494/97.

Condeno o réu ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios, os quais, diante da razoável complexidade do processo e do zelo demonstrado pelo causídico, arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, incidente sobre as prestações vencidas até a presente data, observado o teor da Súmula nº 111, STJ e art. 85, §§ 2° e 3° do NCPC.

Decorrido o prazo para a interposição de recurso ou para apresentação de contrarrazões, remetam-se os autos ao E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região, para o julgamento do reexame necessário, uma vez que se trata de sentença ilíquida (Súmula nº 490, STJ).

O INSS apela, alegando que os documentos apresentados não são suficientes para comprovar o efetivo desempenho de labor rural durante todo o período reconhecido (06/12/1972 a 01/06/1991). Que o primeiro documento a ser considerado é a certidão de casamento da autora (1977) e o último a certidão de nascimento da filha (1980), e os demais períodos foram reconhecidos sem início de prova material.

Afirma que os documentos emitidos em nome do marido da autora antes do casamento, não a aproveitam. E que os documentos escolares não comprovam o efetivo desempenho de labor rural pela autora. Assim, diz que há início de prova material apenas para o período entre 1977 a 1980.

Pede o provimento do apelo com a consequente reforma da sentença de primeiro grau.

Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

REMESSA NECESSÁRIA

Nos termos do artigo 496, caput e § 3º, I, do CPC, está sujeita à remessa necessária a sentença prolatada contra as pessoas jurídicas de direito público nele nominadas, à exceção dos casos em que, por simples cálculos aritméticos, seja possível concluir que o montante da condenação ou o proveito econômico obtido na causa é inferior a 1.000 salários mínimos.

No que diz respeito às demandas previdenciárias, o artigo 29, § 2º, da Lei nº 8.213/91 dispõe que o valor do salário de benefício não será superior ao limite máximo do salário de contribuição na data de início do benefício. Logo, por meio de simples cálculos aritméticos, é possível concluir que, mesmo na hipótese de concessão de benefício no limite máximo e acrescido das parcelas em atraso (últimos 05 anos) com correção monetária e juros de mora (artigo 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91), o valor da condenação não excederá o montante de 1.000 salários mínimos. Por igual, nas demandas previdenciárias envolvendo menores de 16 anos, hipótese em que a prescrição não corre (artigos 3º e 198, I, do CC), também a condenação não ultrapassa o limite legal.

Como não se trata de hipótese de sujeição da sentença à remessa necessária, impõe-se o seu não conhecimento.

MÉRITO

ATIVIDADE RURAL – SEGURADO ESPECIAL

O trabalho rural, na condição de segurado especial, encontra previsão no art. 11, VII, e § 1º da Lei 8.213/91, in verbis:

Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:

(...)

VII- como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em algomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de :

produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividades:

agropecurária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;

de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985 de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida;

pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e

conjugue ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.

§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes.

Para fins de comprovação do exercício da atividade rural, não se exige prova robusta, sendo necessário que o segurado especial apresente início de prova material (art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborada por prova testemunhal idônea, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, sendo que se admite inclusive documentos em nome de terceiros do mesmo grupo familiar, a teor da Súmula nº 73 do TRF da 4ª Região.

Ainda sobre a prova, acrescenta-se que nos termos da Súmula 149 do STJ não se admite prova exclusivamente testemunhal para comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência do E. STJ e do TRF4:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.

1. A questão jurídica posta no recurso especial gira em torno da caracterização da condição de segurado especial, para fins de concessão de aposentadoria rural por idade.

2. O Tribunal a quo concluiu pela inexistência de efetiva atividade campesina durante o período pretendido, porquanto ausente o início de prova material exigido por lei. Rever tal entendimento demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, vedado pela Súmula 7/STJ.

Precedentes.

3. Ademais, o reconhecimento de tempo de serviço rurícola, para efeito de aposentadoria por idade, é tema pacificado pela Súmula 149 desta Egrégia Corte, no sentido de que a prova testemunhal deve estar apoiada em um início razoável de prova material.

4. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp 1042311/AM, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/05/2017, DJe 23/05/2017)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR E COMO "BÓIA-FRIA". RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ANTECIPADA. CONVERSÃO EM TUTELA ESPECÍFICA. 1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. Restando comprovado nos autos o requisito etário e o exercício de atividade rural no período de carência, é de ser concedida a aposentadoria por idade rural à parte autora a contar do requerimento administrativo, a teor do disposto no art. 49, II, da Lei nº 8.213/91. 3. O fato de a parte autora ter recolhido contribuições previdenciárias não constitui óbice à caracterização da sua condição de segurada especial, porquanto, não raras vezes, o segurado especial, com o intuito de garantir o direito à inativação - o qual até a edição da Lei nº 8.213/91 somente era garantido aos trabalhadores rurais com 65 anos de idade e que fossem chefes ou arrimos de família - inscrevia-se na Previdência Social com o fito de assegurar assistência médica, sem, contudo, deixar de exercer, exclusivamente, a atividade rural. Isso sem falar que tais contribuições não acarretam qualquer prejuízo ao INSS, uma vez que foram vertidas aos cofres públicos. 4. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). Contudo, já tendo havido a implantação por força de antecipação de tutela, mantenho a implantação agora sob esse fundamento. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5018877-65.2016.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR MAIORIA, JUNTADO AOS AUTOS EM 16/06/2017)

Destaca-se, a propósito, que esta Turma já firmou entendimento de que os documentos civis tais como certificado de alistamento militar, certidões de casamento/nascimento, em que consta a qualificação como agricultor constituem início de prova material (STJ, AR 1166/SP, 3ª Seção, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 26/2/2007; TRF4, AC Nº 0002853-52.2013.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, , D.E. 10/11/2016; TRF4: AC 2003.71.08.009120-3/RS, 5ª Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. de 20/5/2008).

Relativamente à idade mínima, a limitação constitucional ao labor do menor de dezesseis anos de idade deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas/previdenciários quando tenha prova de que efetivamente desenvolveu tal atividade (TRF4, AC Nº 5018877-65.2016.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, JUNTADO AOS AUTOS EM 16/06/2017; TRF4, AC Nº 5002835-30.2011.404.7213, 5a. Turma, LORACI FLORES DE LIMA, JUNTADO AOS AUTOS EM 23/03/2017).

Outrossim, há recente precedente deste Tribunal retratado nos autos da ação civil pública sob nº 5017267-34.2013.4.04.7100/RS, 6ª Turma, Rel. p/ acórdão Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene, com o fito de que o INSS:

c.1) se abstenha de fixar idade mínima para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei 8.213/91, admitindo, para comprovação de seu exercício, os mesmos meios probatórios postos à disposição dos demais segurados;

c.2) altere seus regulamentos internos para adequá-los ao comando sentencial;

c.3) comunique às suas Gerências Executivas e Agências da Previdência Social a necessidade de fazer observar a obrigação estabelecida na sentença.

Esta Corte, por ocasião do julgamento da sessão do dia 09/04/2018, julgou integralmente procedente a ação, a fim de reconhecer a possibilidade de ser computado período de trabalho realizado antes dos 12 anos de idade, qual seja, sem a fixação de requisito etário para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei nº 8.213/91.

A decisão foi mantida pelo Supremo Tribunal Federal (RE nº 1.225.475).

Finalmente, no que diz respeito aos denominados boias-frias (trabalhadores informais), diante da dificuldade de obtenção de documentos, o STJ firmou entendimento no sentido de que a apresentação de prova material somente sobre parte do período pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por robusta prova testemunhal.

A partir do exposto, conclui-se, em síntese, que para o reconhecimento do labor rural permite-se:

a) o reconhecimento do tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que corroborado por prova testemunhal idônea e robusta (AgInt no REsp 1570030/PR, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/05/2017, DJe 29/05/2017);

b) o reconhecimento de documentos em nome de terceiros (parentes que compõem o grupo familiar) como início de prova material;

c) a averbação do tempo de serviço rural em regime de economia familiar sem a fixação de requisito etário;

d) que os documentos tais como certificado de alistamento militar, certidões de casamento/nascimento, em que consta a qualificação como agricultor, valham como início de prova material.

Registro ainda que o aproveitamento do tempo de atividade rural desenvolvida até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, V, do Decreto n.º 3.048/99.

CASO CONCRETO – LABOR RURAL

A parte autora pretende seja reconhecido o exercício de labor rural, em regime de economia familiar, bem como boia-fria, no período de dezembro de 1970 a junho de 1991. Para tanto, acostou aos autos os seguintes documentos:

a) Certidão de casamento da autora, na qual seu esposo está qualificado como "lavrador", de 1977;

b) Certidão de nascimento da filha da autora, na qual seu marido está qualificado como "lavrador", de 1980;

c) Declarações escolares, em nome da autora, do ano de 1971, e de sua filha Elisângela, dos anos de 1987 e 1988. Além de histórico escolar de sua filha (escola rural);

d) Certificado de dispensa de incorporação em nome do marido da autora, na qual consta sua profissão como lavrador, de 1976;

e) Certidão eleitoral na qual o marido da autora se autodeclarou lavrador, em 23/12/1975;

f) Certidão de Registro de Imóveis;

Os documentos apresentados (itens a/f) servem como início de prova material da atividade rural do requerente após 1972, não sendo demais frisar que a jurisprudência não exige "a comprovação da atividade rural ano a ano, de forma contínua" pois início de prova material não significa prova cabal, mas algum "registro por escrito que possa estabelecer liame entre o universo fático e aquilo que expresso pela testemunhal." (TRF 4ª Região - AC n° 2000.04.01.128896-6/RS, Relator Juiz João Surreaux Chagas, DJU de 25-7-2001, p. 215).

Com efeito, a certidão de casamento da autora, na qual seu esposo está qualificado como "lavrador", de 1977, bem como a certidão de nascimento da filha da autora, na qual seu marido está qualificado como "lavrador", de 1980, e as declarações escolares, em nome da autora, do ano de 1971, e de sua filha Elisângela, dos anos de 1987 e 1988 (escola rural), servem como início razoável de prova material de que a família exerceu o labor rural no período controverso.

Na Audiência Judicial (evento 74), foram ouvidas duas testemunhas e uma informante.

A informante, Sra. Alice Maria da Silva, disse que conhece a autora desde quando ela tinha uns 10 anos, do Sítio São Lucas, onde a autora e a família trabalhavam na condição de arrendatários. Que a testemunha também exerceu labor rural, e já trocou dias de serviço com a autora. Conta que quando a autora casou, se mudou e foi para outro sítio como meeira. Que lá plantavam milho, feijão, etc. Que o marido da autora também trabalhava na lavoura. Explica que a autora tem uma filha, a qual nasceu nesse mesmo sítio. Que a autora ficou uns 12 anos nesse sítio, e que a parte que era tocada por sua família correspondia a uns três alqueires. Que não tinham empregados, nem máquinas. Diz que o labor da autora e de seu marido era para a subsistência, com a venda do excedente. Depois, conta que a autora trabalhou como boia-fria em fazendas, inclusive junto com a testemunha. Que elas eram levadas por gatos. Que o pagamento era semanal. Que depois de seis anos trabalhando como boia-fria, a autora começou a trabalhar na cidade. Que hoje trabalha como empregada doméstica.

A primeira testemunha, Sr. Jorge Paiva, disse que conhece a autora há uns 50 anos. Que também é lavrador. Conta que conheceu os pais da autora e cita os nomes. Que via a autora desde pequena laborando na lavoura com a família em um sítio arrendado. Que conhece o esposo da autora e ele também é trabalhador rural. Afirma que eles têm uma filha que nasceu no sítio. Que depois laboraram no sítio Sr. João Gabriel, em terra arrendada de três alqueires. Que ficaram lá uns 12 anos e plantavam feijão, milho e arroz. Diz que não tinham máquina nem empregados. Que a produção era para subsistência e o excedente era vendido. Explica que, depois, a autora trabalhou como boia-fria por uns seis anos. Que não possuía outra fonte de renda, apenas o que ganhava na roça. Que hoje a autora trabalha na cidade.

A segunda, Sr. Jorge Lopes, disse que conhece a autora há uns 50 anos. Que conheceu ela no sítio São Lucas, onde trabalhava com seus pais. Que também é trabalhador rural e já trabalhou com a autora. Que lá plantavam feijão, arroz e milho. Conta que conhece o marido da autora e que ele também é trabalhador rural. Afirma que eles têm uma filha que nasceu no sítio. Que, depois que ela casou, mudou-se para o Sítio do João Gabriel, onde trabalhava como arrendatária. Que eles plantavam em parte do terreno, em dois, três alqueires, sendo que o sítio tinha um total de nove alqueires. Que eles ficaram lá uns 12 anos, não tinham empregados, nem máquinas. Conta que só trabalhavam ela e o marido para a subsistência, com a venda do excedente. Que a testemunha fazia troca de dias com eles. Que depois a autora trabalhou como boia-fria durante uns três anos e citou a propriedades. Que o gato que a levava e o pagamento era semanal. Que em 1992 veio trabalhar na cidade.

O INSS alega, no recurso de apelação, que os documentos apresentados não são suficientes para comprovar o efetivo desempenho de labor rural durante todo o período reconhecido (06/12/1972 a 01/06/1991). Que o primeiro documento a ser considerado é a certidão de casamento da autora (1977) e o último a certidão de nascimento da filha (1980), e os demais períodos foram reconhecidos sem início de prova material.

Sobre a alegação do INSS de que não foram apresentadas provas anteriores a 1977, o que impediria o reconhecimento do labor rural a partir de 1972 exclusivamente com base em provas testemunhais, ressalta-se a previsão da Súmula 577 do STJ, a qual preconiza que “é possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório”.

Portanto, em função da grande dificuldade encontrada pelos trabalhadores rurais em provar ano a ano seu labor para fins previdenciários, e como as testemunhas e a informante foram uníssonas em explicar que presenciaram o labor rural da autora desde a infância, sendo que com ela laborou a informante e uma testemunha, entendo que tal argumento da autarquia não merece prosperar.

A autarquia afirma, ainda, que os documentos emitidos em nome do marido da autora antes do casamento, não a aproveitam. E que os documentos escolares não comprovam o efetivo desempenho de labor rural pela autora. Assim, diz que há início de prova material apenas para o período entre 1977 a 1980.

Como bem apontou o juiz sentenciante, a jurisprudência do STJ caminha no sentido de que é possível presumir o labor rural da esposa quando os documentos, inclusive a certidão de casamento, comprovam o labor rural do marido.

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO. EXTENSÃO À ESPOSA. 1. A jurisprudência do STJ há muito firmou entendimento de que, diante da dificuldade de comprovação da atividade rural, em especial da mulher, há de se presumir que, se o marido desempenha este tipo de labor, a esposa também o fazia, em razão das características da atividade. 2. A execução em maior parte de tarefas domésticas pela autora não é óbice para a concessão da aposentadoria rural, visto a situação de campesinos comum ao casal. 3. Precedente: ‘Verificando-se, na certidão de casamento, a profissão de rurícola do marido, e de se considerar extensível a profissão da mulher, apesar de suas tarefas domésticas, pela situação de campesinos comum ao casal.’ (EREsp 137697/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, Terceira Seção, julgado em 13.5.1998, DJ 15.6.1998, p. 12.) Agravo regimental improvido. (STJ. AgRg no REsp 1309123/SP. Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS. SEGUNDA TURMA. Julgado em 08/05/2012).

Ora, se na data do casamento da autora seu marido trabalhava na lavoura, tal desempenho não ocorreu a partir do casamento, mas, sim, já era um fato que permaneceu após o matrimônio, revelando situação de continuidade. Ainda que labor rural do esposo antes do casamento não signifique, necessariamente, que ela também o exercia, é mais um indicativo de que a autora morava em região rural e, somada essa informação com as provas testemunhais e materiais, reforça a compreensão de que a autora trabalhava na lavoura.

Uma dessas provas indicativas do labor rural da autora antes do casamento, é a declaração escolar em seu próprio nome, datada de 1971, a qual revela que a vida da requerente foi construída na região rurícula, constituindo mais um indício da sua atividade rural.

Além disso, não possui razão o INSS ao alegar que ficha ou declaração escolar proveniente de instituição pública, ou particular de ensino, é prova inválida do labor rural. Isto porque, o art. 54, VIII, da Instrução Normativa 77/2045, deixa claro que se considera início de prova material, para fins de comprovação da atividade rural, comprovantes de matrícula ou ficha de inscrição em escola, ata ou boletim escolar do trabalhador, ou dos filhos.

Finalmente, no que diz respeito aos denominados boias-frias (trabalhadores informais), diante da dificuldade de obtenção de documentos, o STJ firmou entendimento no sentido de que a apresentação de prova material somente sobre parte do período pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por robusta prova testemunhal.

Assim, mantenho a sentença e julgo comprovado o exercício da atividade rural pelo autor no período de 06/12/1972 a 01/06/1991.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Na espécie, diante do não acolhimento do apelo, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios de 10% sobre a base de cálculo fixada na sentença para 15% sobre a mesma base de cálculo, com base no artigo 85, §11, do CPC.​​​.

TUTELA ESPECÍFICA

Com base no artigo 497 do CPC e na jurisprudência consolidada da Terceira Seção desta Corte (QO-AC 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado, a ser efetivada em 45 dias, a contar da publicação do presente julgado, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.

Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário, o INSS deverá implantar o benefício concedido ou revisado judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

PREQUESTIONAMENTO

Objetivando possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.

CONCLUSÃO

Remessa necessária: não conhecida.

Apelo do INSS: improvido.

Determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado, a ser efetivada em 45 dias.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária e negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação. Determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado, a ser efetivada em 45 dias.



Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003098335v24 e do código CRC 3a3714a9.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 21/4/2022, às 12:13:29


5028313-43.2019.4.04.9999
40003098335.V24


Conferência de autenticidade emitida em 29/04/2022 04:01:30.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5028313-43.2019.4.04.9999/PR

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0001052-05.2017.8.16.0102/PR

RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: LUCELIA MARIA BARBOSA

ADVOGADO: MARCIA CRISTINA AVELINO BENEDETTI IDALGO (OAB PR017323)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA. NÃO CONHECIMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LABOR RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. TUTELA ESPECÍFICA.

1. Não conhecida a remessa necessária, considerando que, por simples cálculos aritméticos, é possível concluir que o montante da condenação ou o proveito econômico obtido na causa é inferior a 1.000 salários mínimos (artigo 496 do CPC).

2. Ressalta-se a previsão da Súmula 577 do STJ, a qual preconiza que “é possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório”.

3. A jurisprudência do STJ caminha no sentido de que é possível presumir o labor rural da esposa quando os documentos, inclusive a certidão de casamento, comprovam o labor rural do marido (STJ. AgRg no REsp 1309123/SP. Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS. SEGUNDA TURMA. Julgado em 08/05/2012).

4. Não possui razão o INSS ao alegar que ficha ou declaração escolar proveniente de instituição pública, ou particular de ensino, é prova inválida do labor rural. Isto porque, o art. 54, VIII, da Instrução Normativa 77/2045, deixa claro que se considera início de prova material, para fins de comprovação da atividade rural, comprovantes de matrícula ou ficha de inscrição em escola, ata ou boletim escolar do trabalhador, ou dos filhos.

5. No que diz respeito aos denominados boias-frias (trabalhadores informais), diante da dificuldade de obtenção de documentos, o STJ firmou entendimento no sentido de que a apresentação de prova material somente sobre parte do período pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por robusta prova testemunhal.

6. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação. Determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 19 de abril de 2022.



Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003098336v6 e do código CRC 8beca865.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 21/4/2022, às 12:13:29


5028313-43.2019.4.04.9999
40003098336 .V6


Conferência de autenticidade emitida em 29/04/2022 04:01:30.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 07/04/2022 A 19/04/2022

Apelação Cível Nº 5028313-43.2019.4.04.9999/PR

RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: LUCELIA MARIA BARBOSA

ADVOGADO: MARCIA CRISTINA AVELINO BENEDETTI IDALGO (OAB PR017323)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 07/04/2022, às 00:00, a 19/04/2022, às 16:00, na sequência 439, disponibilizada no DE de 29/03/2022.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO. DETERMINO O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO CONCEDIDO OU REVISADO, A SER EFETIVADA EM 45 DIAS.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 29/04/2022 04:01:30.

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