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PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. RECEBIMENTO INDEVIDO, DE BOA-F'E. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE RESTITUIÇÃO. TRF4. 5013653-12.2018.4.04.7208...

Data da publicação: 20/04/2022, 07:01:44

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. RECEBIMENTO INDEVIDO, DE BOA-F'E. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE RESTITUIÇÃO. A ex-esposa que, embora separada de fato de seu cônjuge, mas não de direito, requer a concessão da pensão decorrente do óbito deste último, acreditando ter direito ao benefício, não tem o dever de devolver as prestações que recebeu indevidamente, de boa-fé. (TRF4, AC 5013653-12.2018.4.04.7208, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 12/04/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5013653-12.2018.4.04.7208/SC

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5013653-12.2018.4.04.7208/SC

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MARIA MERCEDES SCHNEIDER DE ANDRADE (AUTOR)

ADVOGADO: DJALMA PORCIUNCULA (OAB SC014189)

RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença. A seguir, complemento-o.

Seu teor é o seguinte:

Julgamento conjunto dos processos nº 5009365-21.2018.4.04.7208 e nº 5013653-12.2018.4.04.7208, em razão de conexão processual.

RELATÓRIO

Processo nº 5009365-21.2018.4.04.7208/SC

Trata-se de demanda proposta por Marly Salvador em face do INSS, sob o rito do procedimento comum.

A autora busca a concessão de pensão por morte em decorrência do óbito de Ademir de Andrade, em 27/04/2017, de quem alega ter sido companheira.

Relata que requereu o benefício administrativamente (NB 21/182.225.020-7 - DER 10/07/2017), mas seu pedido foi indeferido por falta da qualidade de dependente. Alega que vivia em união estável com o instituidor há mais de 20 anos; residiram na Avenida Campos Novos, número 341, no Bairro São Vicente, em Itajaí/SC até a data do óbito.

Deferida a assistência judiciária gratuita (evento 8).

Processo administrativo do pedido de pensão no evento 12.

Processo administrativo da aposentadoria do instituidor no evento 14.

Citado, o INSS defende, em prejudicial de mérito, a ocorrência de prescrição; e, no mérito, a não comprovação da efetiva relação de companheirismo com o de cujus na época do óbito (evento 15).

Réplica à contestação no evento 19.

Após o saneamento do feito (evento 21), foi determinada a reunião com o processo 5013653-12.2018.4.04.7208/SC, no qual Maria Mercedes Schneider de Andrade busca o restabelecimento de pensão por morte do mesmo instituidor, sendo designada audiência conjunta com a finalidade de elucidar os fatos (evento 29).

Em audiência (evento 49), foi tomado o depoimento pessoal das autoras, ouvidas duas testemunhas do juízo e duas testemunhas de cada parte. Alegações finais remissivas.

Vieram os autos conclusos para sentença.

É o relato do essencial. Decido.

Processo nº 5013653-12.2018.4.04.7208/SC

Trata-se de demanda proposta por Maria Mercedes Schneider de Andrade em face do INSS, sob o rito do procedimento comum.

A autora busca afastar a devolução de valores recebidos a título de pensão por morte, bem como o restabelecimento do benefício (NB 21/182.038.764-7).

Narra que o INSS lhe concedeu pensão por morte (NB 21/182.038.764-7), na condição de viúva de Ademir de Andrade, falecido em 27/04/2017. Mas posteriormente suspendeu o benefício, por suposta irregularidade consistente na falta de comprovação da dependência econômica. Ocorre que uma nova dependente se habilitou e a autora declarou que estava separada de fato e não dependia economicamente do instituidor.

Defende que "mantinha o seu casamento com seu falecido marido, e apesar de não residirem sob o mesmo teto, permaneceram os cuidados entre os mesmos e a administração conjunta das necessidades do casal"; o texto da declaração lhe foi ditado, e não tinha "a mínima capacidade de interpretação das circunstâncias legais que o fato exigia". Sustenta que se houve irregularidade na concessão do benefício foi por culpa exclusiva dos agentes da autarquia; logo, os valores recebidos são irrepetíveis em razão da sua boa-fé e da natureza alimentar.

Deferida a assistência judiciária gratuita e postegado o exame do pedido liminar (evento 3).

No evento 12, o INSS apresenta cópia do processo administrativo da pensão por morte requerida por Marly Salvador, em 10/07/2017, na condição de companheira de Ademir de Andrade (ofic1); e do processo administrativo da autora (ofic6); além dos procedimentos relacionados à apuração de irregularidade na concessão do benefício (ofic2-5).

Na contestação (evento 13), o INSS sustenta a impossibilidade de restabelecimento do benefício diante da declaração da própria autora de que estava separada de fato e não dependia do instituidor. Aduz que Marly Salvador requereu o benefício na condição de companheira e apresentou documentos suficientes para a realização de justificação administrativa, na qual testemunhas confirmam a união estável por muitos anos, mas que terminou antes do óbito, o que motivou o indeferimento do benefício. Defende, ainda, a repetibilidade dos valores recebidos pela autora.

Indeferido o pedido de tutela antecipada e determinada determinada a reunião deste feito com o processo 5009365-21.2018.4.04.7208/SC, sendo designada audiência conjunta com a finalidade de elucidar os fatos (evento 15).

Em audiência (evento 31), foi tomado o depoimento pessoal das autoras, ouvidas duas testemunhas do juízo e duas testemunhas de cada parte. Alegações finais remissivas.

Vieram os autos conclusos para sentença.

É o relato do essencial. Decido.

O dispositivo da sentença tem o seguinte teor:

DISPOSITIVO

Ante o exposto:

1) nos autos do processo 5009365-21.2018.4.04.7208/SC, acolho os pedidos da parte autora, extinguindo o feito com apreciação do mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para condenar o INSS a:

a) conceder à parte autora o benefício de pensão por morte (NB 21/182.225.020-7), desde 27/04/2017 (data do óbito), de forma vitalícia, nos termos da fundamentação;

b) pagar os valores atrasados, acrescidos de correção monetária e juros, nos termos da fundamentação, respeitada a prescrição quinquenal, nos termos da Súmula 85 do STJ.

Condeno o INSS em honorários de sucumbência que fixo no percentual de 10% do proveito econômico obtido pela parte autora, a ser definido em liquidação de sentença, observando-se o disposto na Súmula 111 do STJ.

2) nos autos do processo 5013653-12.2018.4.04.7208/SC, acolho parcialmente os pedidos da parte autora, extinguindo o feito com apreciação do mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para declarar a inexigibilidade dos valores apurados pelo INSS em desfavor da parte autora; devendo cessar imediatamente a cobrança, com a restituição de eventuais valores já devolvidos pela autora.

Considerando a sucumbência recíproca, que considero em partes iguais, cada parte arcará com os honorários advocatícios de seus patronos, os quais fixo em 10% do valor atualizado da causa (art. 85, § 3º e § 4º, inciso III, do CPC), a serem calculados em liquidação de sentença.

Sentença não sujeita à remessa necessária (artigo 496, § 3º, I do CPC), haja vista que, utilizando como parâmetro o valor atribuído à causa, o proveito econômico obtido pelo autor certamente não será superior a 1.000 (mil) salários mínimos.

Intimem-se as partes da sentença proferida nos presentes autos para, querendo, recorrerem.

Apresentada apelação, intime-se a parte adversa para contrarrazões e remetam-se os autos ao TRF da 4ª Região independentemente do juízo de admissibilidade (artigo 1.010 do CPC).

Registrada e publicada eletronicamente.

Destacam-se, nas razões de apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, os seguintes trechos:

Conforme se verifica da documentação apresentada no feito a parte autora, a partir de convocação do INSS motivada por denúncia de terceira pessoa que se dizia companheira do falecido, compareceu à Autarquia e de próprio punho, declarou que estava separada de fato do falecido e que dele não dependia economicamente.

(...)

Conforme processo de habilitação de pensão por morte, a Sra. Marly Salvador veio à Autarquia alegando ser companheira do falecido à época do óbito, trazendo inclusive documento, os quais motivaram a realização de Justificação Administrativa por parte da Autarquia, sendo que o benefício só não foi concedido naquela oportunidade à Sra. Marly, pelo fato de as testemunhas terem afirmado que embora a Justificante e o falecido tenham convivido por muitos anos, na época do óbito, os dois já não conviviam mais.

Quanto à cobrança dos valores recebidos pela parte autora, não há como alegar a boa fé. O que consta do processo administrativo, igualmente anexado), é que a parte autora já não residia com o falecido há muitos anos e ela mesmo declarou não residir nem depender do falecido e nem se diga que foi induzida a erro pela Autarquia já que não nega o fato de estar separada, apenas procura dizer que ainda cuidavam um do outro, isso após ter declarado espontaneamente que não conviviam e nem dependia do falecido, repita-se.

Fosse uma separação de alguns dias ou mesmo meses, talvez se pudesse cogitar de boa-fé, mas o caso é de separação de muitos anos. Não há boa fé nesse caso.

Mas ainda que houvesse boa fé, mesmo assim há previsão legal expressa de restituir o que foi recebido indevidamente.

Extrai-se da sentença prolatada o seguinte trecho: ”...Por outro lado, a própria autora Maria Mercedes reconhece estar separada de fato do instituidor pelo menos desde o início dos anos 2000; e inexiste prova material do alegado auxílio financeiro, não se extraindo tal convicção da prova oral produzida. Assim, acertada a decisão administrativa que suspendeu o benefício de pensão por morte, sendo este devido integralmente à companheira Marly Salvador”.(...)

Ora, a própria sentença alude que a parte estava separada de fatodesde o ano 2000, não havendo qualquer auxílio por parte do instituidor. Revela-se assim que a qualidade de dependente para comoinstituidor nunca esteve presente, sendo de boa ordem e índole a atitude tomada pela autarquia quanto àcobrança administrativa encetada, revelando que a parte não agiu de boa-fé, pois que ela mesma declarou que não mais convivia com o de cujus.

Destarte, há de ser reformada a sentençaquanto à parte autora MARIA MERCEDES SCHNEIDER DE ANDRADENO SENTIDO DE QUE SEJAM MANTIDOS OS DESCONTOS, COMDECLARAÇÃO DE EXIGIBILIDADE DA COBRANÇA NO PRESENTE FEITO, COM FULCRO NO DISPOSITIVO LEGAL ABAIXO INDICADO E COM FUNDAMENTO NAS RAZÕES QUE SÃO IGUALMENTE ALINHADAS PARA FINS DE MOTIVAÇÃO DO ATO LEGAL POR PARTE DA AUTARQUIA, ORA RECORRENTE.

Restituição de valores com fundamento no artigo 115, II, da Lei 8.213/91

A Lei n. 8.213/1991 autoriza, expressamente, o desconto no valor dos benefícios previdenciários.

Dispõe o art. 115 da Lei nº 8.213/91:

“Art. 115: “Podem ser descontados dos benefícios: ...

II - pagamento de benefício além do devido; ...

§ 1º Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé.”

Conforme ressai do aludido dispositivo, podem ser objeto de desconto nos benefícios previdenciários os valores recebidos além do devido pelo segurado.

E a norma não criou qualquer exceção à obrigatoriedade da restituição ao INSS dos pagamentos realizados indevidamente em favor do segurado. Há ressalva apenas quanto à forma da restituição, que pode ser parcelada na hipótese de inexistência de má-fé.

Assim, a lei nunca considerou obstativa à restituição ao erário a constatação da boa-fé do beneficiário ou o caráter alimentar das verbas recebidas.

A decisão recorrida, ao vedar a restituição dos valores percebidos por força de decisão liminar, procedeu com verdadeira interpretação contra legem, violentando não só a literalidade do artigo 115 da Lei 8.213/91, mas também o sentido que levou o legislador a editá-lo, qual seja, afastar o enriquecimento sem causa do segurado em detrimento da Previdência Social.

O ordenamento jurídico pátrio adota os princípios da legalidade e da legitimidade das leis, segundo os quais a norma é considerada válida e aplicável, enquanto não sobrevier decisão declaratória de sua inconstitucionalidade. O referido dispositivo encontra-se em vigor, motivo pelo qual é mister sua aplicação ou a declaração de sua inconstitucionalidade.

A propósito, cumpre ressaltar que o STF declarou inconstitucionala antiga redação do art. 130 da Lei n. 8.213/91, que dispensava os segurados da Previdência de restituir os valores que fossem recebidos por força de decisão judicialque viesse a ser revertida.

Dizia o art. 130, § único (texto de 25-7-1991 a 13-10-1996):

“Parágrafo único. Ocorrendo a reforma da decisão, será suspenso o benefício e exonerado o beneficiário de restituiros valores recebidos por força da liquidação condicionada.”

Exatamente essa redação foi JULGADA INCONSTITUCIONAL pelo STF, na Medida Cautelar na ADI 675-4/DF. Eis a ementa do julgado:

“E M E N T A : Previdência Social: L. 8.213/91 (Plano de Benefícios): suspensão cautelar, em ação direta, por despacho do Presidente do STF, no curso das férias forenses, da parte final do caput do art. 130 (que determina o cumprimento imediato de decisões relativas a prestações previdenciárias, ainda que na pendência de recursos) e do seu parágrafo único que, na hipótese da reforma da decisão, exonera o beneficiário de "restituir os valores recebidos por força da liquidação condicional": referendum, por voto de desempate, do despacho presidencial.”

Vale citar as palavras dos Ministros Paulo Brossard e Moreira Alves, em seus votos, respectivamente, in verbis:

“A alegação de que alimentos não se restituem, deve ser entendida em termos. Não tenho os vencimentos como alimentos, mas os mesmos vem tendo tratamento semelhante, senão idêntico, ao de alimentos. Pois bem. Quem recebe vencimentos indevidos não fica exonerado de restituí-los. Ao contrário. De modo que, especialmente, a norma do parágrafo único me parece pouco aceitável.”

"Nem se alegue que alimentos não podem ser repetidos, tendo em vista sua própria natureza, porquanto, se a decisão final –que é a que traduz a apreciação pelo Poder Judiciário de ameaça ou lesão a direito –considera não devidos os alimentos, o que implica dizer que alimentos não devidos a alguém não são, com referência a essa pessoa, alimentos".

Esse julgado possui eficácia contra todos e efeito vinculante, não podendo os demais tribunais, por entendimento diverso, repristinar o conteúdo de dispositivo que o STF já julgou inconstitucional.

Doutro lado, há no âmbito do STJ decisão da 1ª Seção que trata da devolução de valores a título de boa-fé.

A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, de fato, pacificou o tema em sentido diverso, in verbis1-2:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.RECEBIMENTO VIA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO. REALINHAMENTO JURISPRUDENCIAL. HIPÓTESE ANÁLOGA. SERVIDOR PÚBLICO. CRITÉRIOS. CARÁTER ALIMENTAR E BOA-FÉ OBJETIVA. NATUREZA PRECÁRIA DA DECISÃO. RESSARCIMENTO DEVIDO. DESCONTO EM FOLHA. PARÂMETROS.

1. Trata-se, na hipótese, de constatar se há o dever de o segurado da Previdência Social devolver valores de benefício previdenciário recebidos por força de antecipação de tutela (art. 273 do CPC) posteriormente revogada.

2. Historicamente, a jurisprudência do STJ fundamenta-se no princípio da irrepetibilidade dos alimentos para isentar os segurados do RGPS de restituir valores obtidos por antecipação de tutela que posteriormente é revogada.

3. Essa construção derivou da aplicação do citadoprincípio em Ações Rescisórias julgadas procedentes para cassar decisão rescindenda que concedeu benefício previdenciário, que, por conseguinte, adveio da construção pretoriana acerca da prestação alimentícia do direito de família. A propósito: REsp 728.728/RS, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, Quinta Turma, DJ 9.5.2005.

4. Já a jurisprudência que cuida da devolução de valores percebidos indevidamente por servidores públicos evoluiu para considerar não apenas o caráter alimentar da verba, mas também aboa-fé objetiva envolvida in casu.

5. O elemento que evidencia a boa-fé objetiva no caso é a "legítima confiança ou justificada expectativa, que o beneficiário adquire, de que valores recebidos são legais e de que integraram em definitivo o seu patrimônio" (AgRg no REsp 1.263.480/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 9.9.2011, grifei). Na mesma linha quanto à imposição de devolução de valores relativos a servidor público: AgRg no AREsp 40.007/SC, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 16.4.2012; EDcl nos EDcl no REsp 1.241.909/SC, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 15.9.2011; AgRg no REsp 1.332.763/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 28.8.2012; AgRg no REsp 639.544/PR, Rel. Ministra Alderita Ramos de Oliveira (Desembargador Convocada do TJ/PE), Sexta Turma, DJe 29.4.2013; AgRg no REsp 1.177.349/ES, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJe 1º.8.2012; AgRg no RMS 23.746/SC, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 14.3.2011.

6. Tal compreensão foi validada pela Primeira Seção em julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, em situação na qual se debateu a devolução de valores pagos por erro administrativo: "quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando empagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público." (REsp 1.244.182/PB, Rel. Ministro Benedito Gonçalves,Primeira Seção, DJe 19.10.2012, grifei).

7. Não há dúvida de que os provimentos oriundos de antecipação de tutela (art. 273 do CPC) preenchem o requisito da boa-fé subjetiva, isto é, enquanto o segurado os obteve existia legitimidade jurídica, apesar de precária.

8. Do ponto de vista objetivo, por sua vez, inviável falar na percepção, pelo segurado, da definitividade do pagamento recebido via tutela antecipatória, não havendo o titular do direito precário como pressupor a incorporação irreversível da verbaao seu patrimônio.

9. Segundo o art. 3º da LINDB, "ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece", o que induz à premissa de que o caráter precário das decisões judiciais liminares é de conhecimento inescusável (art. 273 do CPC).

10. Dentro de uma escala axiológica, mostra-se desproporcional o Poder Judiciário desautorizar a reposição do principal ao Erário em situações como a dos autos, enquanto se permite que o próprio segurado tome empréstimos e consigne descontos em folha pagando, além do principal, juros remuneratórios a instituições financeiras.

11. À luz do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e considerando o dever do segurado de devolver os valores obtidos por força de antecipação de tutela posteriormente revogada, devem ser observados os seguintes parâmetros para o ressarcimento: a) a execução de sentença declaratória do direito deverá ser promovida; b) liquidado e incontroverso o crédito executado, o INSS poderá fazer o desconto em folha de até 10% da remuneração dos benefícios previdenciários em manutenção até a satisfação do crédito, adotado por simetria com o percentual aplicado aos servidores públicos (art. 46, § 1º, da Lei 8.213/1991.

12. Recurso Especial provido.(REsp 1384418/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/06/2013, DJe 30/08/2013)

A questão em tela, como se vê, é similar –direito à restituição de valores pagos em decorrência de decisão judicial precária –mas a interpretação jurídica das decisões é dissonante, o que impõe uma uniformização.

Note-se que trata-se de acórdão proferido pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça –STJ, não sendo acórdão de apenas uma das Turmas do STJ, o que demonstra que a jurisprudência é dominante no âmbito do Tribunal da Cidadania.

(...)

No Estado Democrático de Direito, somente a lei cria direitos e deveres, consoante dispõe o artigo 5º, inciso II, da Constituição da República. O Poder Judiciário, não obstante a sua nobre função, não pode criar normas jurídicas.

Conforme já demonstrado, inexiste previsão legal do suposto impedimento ao INSS de se cobrar os valores recebidos a maior, seja de boa-fé, seja de má-fé.

O art. 115 da Lei n. 8.213/91 fala de restituição de “pagamento de benefício além do devido”. Pagamentos debenefícios são verbas tipicamente alimentares e o artigo manda restituir exatamente essas verbas. Não há, portanto, como afastar sua aplicação sob o fundamento de que as verbas, no caso, são alimentares.

Da mesma forma, o art. 115 da Lei n. 8.213/91 fala de desconto “em parcelas, ..., salvo má-fé”. Ou seja, determina que, em caso de boa-fé, o desconto seja em parcelas. Não há, portanto, como afastar sua aplicação sob o fundamento de que as verbas, no caso, foram recebidas de boa-fé.

O art. 115 da Lei n. 8.213/91 trata especificamente de hipóteses em que se permite desconto do valor do benefício que, como se sabe, é verba de natureza alimentar. Em síntese: se não foi demonstrada a inconstitucionalidade da Lei Federal, e estando o caso perfeitamente enquadrado na hipótese de incidência (o que é incontroverso e seria mesmo indiscutível), ela deveria ter sido aplicada, mas não foi.

A Constituição estabelece a lei como instrumento necessário e suficiente para a criação de direitos e obrigações (art. 5º, II). Uma lei aplicável ao caso concreto só pode ser afastada se for inconstitucional, pois nesse caso a prevalência é da Constituição. Sem a demonstração da inconstitucionalidade da lei, cabe ao Judiciário garantir a sua aplicação (CF/1988, art. 105, III).

A Lei 8.213/91 art. 115 é aplicável ao caso dos autos e a alegação de “verba alimentar” ou “boa-fé” não o retiram de seu campo de incidência, pois a norma se refere expressamente a verbas de natureza alimentar recebidas de boa-fé. Os motivos invocados para não aplicar a normal legal, portanto, afrontam a razão e constituem caso de violação dos princípios da legalidade (art. 5º, II) e da presunção de constitucionalidade das leis (art. 97 e 105, III).

Quem recebeu aquilo que, ao final, descobriu-se não ser seu direito, deve devolvê-lo à Previdência, não sendo relevante, para a existência dessa obrigação, a boa ou má-fé no recebimento (Lei n. 8.213/91, art. 115).

Decisão em sentido contrário vem desvirtuando as mais elementares regras de justiça: pretendem fazer justiça distributiva em casos em que a questão é puramente de justiça comutativa. Quem recebeu o que não é seu direito deve devolvê-lo. Pode até fazê-lo sem pagar juros, se não houve má-fé, mas jamais está autorizado a ficar com o quenão lhe pertence e, mesmo quando a recomposição completa for impossível (em razão da morte, por exemplo), deve-se fazer o máximo para aproximá-la do que é o justo (utilização da herança até os seus limites).

Aqui cabe lembrar as palavras de São Tomás de Aquino, em ensinamento até hoje não superado. O filósofo responde a uma questão sobre o que se deve fazer quando o bem tirado é de impossível restituição, como por exemplo um membro amputado. Conclui que, mesmo quando a restituição completa é impossível, deve-se buscar ao máximo compensá-la:

... deve-se dizer que se é impossível dar uma compensação equivalente, basta compensar o que é possível. ... Por isso, quando o que foi tirado não é restituível por algo de igual, deve-se dar a compensação que for possível. (Suma Teológica, v. 6, q. 62, art. 2)

Quem recebeu aquilo que, ao final, descobriu-se não ser seu direito, deve devolvê-lo à Previdência Social, sendo irrelevante, para a existência dessa obrigação, a boa ou má-fé no recebimento (Lei 8.213/91, art. 115).

(...)

DO PEDIDO DE REFORMA DO DECISUMDiante do exposto, calcado na motivação supra, requer o INSS que o presente recurso seja conhecido por esse colendo órgão fracionário e que lhe seja deferido provimento, com o devido prequestionamento dos dispositivos suscitados, julgando improcedente o pleito inicial DA AUTORA MARIA MERCEDES SCHNEIDER DE ANDRADE (FEITO Nº 50136531220184047208), MANTENDO HÍGIDA A EXIGIBILIDADEDA COBRANÇADOS VALORESPELO INSS.

Termos em que,

Pede Deferimento

Os autores apresentaram suas contrarrazões, nas quais se destacam os seguintes trechos:

A r. sentença de fls. deve ser mantida na sua integralidade, haja vista que foi aplicado o melhor entendimento jurídico à matéria, objeto da lide.

O entendimento que lastreou a decisão ”a quo” fez julgamento procedente ao pedido da apelada para declarar a inexigibilidade dos valores apurados pelo apelante em contra aquela, cessando imediatamente a cobrança e a restituição de eventuais valores já cobrados da mesma.

O lastro que suportou a tese do r. magistrado é suficientemente sólido para manter-se incólume. No caso dos autos não restou comprovado que houve má-fé da apelada no processo administrativo que concedeu o benefício previdenciário à mesma e, admissível a sua interpretaçãodo direito, decorrente da sua formação e em virtude de não ter se divorciado do instituidor.

Conforme hodierno entendimento, a má fé não se presume, e necessita ser comprovada, nãosendo o caso dos autos:

“GRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. CONTRATO DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO. INVALIDEZ PERMANENTE. DOENÇA PREEXISTENTE. AUSÊNCIA DE EXAMES PRÉVIOS. NECESSIDADE DE SE PROVAR A MÁ-FÉ DO SEGURADO. SÚMULA 609/STJ. RECURSO DESPROVIDO. 1. Verificada a ausência deelementos concretos para a caracterização de má-fé, deve-se presumir a boa-fé dosegurado. "A presunção de boa-fé é princípio geral de direito universalmente aceito, sendo milenar a parêmia: a boa-fé se presume; a má-fé se prova (REsp 956.943/PR -Repetitivo, Rel. p/ acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORTE ESPECIAL, DJede 1º/12/2014). 2. Agravo interno desprovido, com o retorno dos autos à origem.”(STJ - AGINT NOS EDCL NO RESP 1745782 / PR 2018/0134778-6)

Parafraseando a r. sentença, “conforme jurisprudência iterativa das Cortes Superiores, o caráter eminentemente alimentar dos benefícios previdenciários faz com que, quando recebidos em boa-fé, não sejam passíveis de devolução (STJ, REsp 1674457, SEGUNDA TURMA , DJe 09/08/2017, Ministro OG FERNANDES).”

(...)

Ante o exposto e pelo que consta nos autos, requer e espera a apelada que seja recebido opresente RECURSO DE APELAÇÃO, conhecido e provido para ser mantida integralmente o teor dar. sentença condenatória.

Nestes termos,

Pede deferimento.

Vieram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

Inicialmente destaco, na fundamentação da sentença, o seguinte trecho:

(...)

Feitas essas ponderações, passo ao exame dos requisitos exigidos no caso concreto.

Da qualidade de segurado do instituidor

Não há controvérsia no ponto.

O instituidor estava recebendo aposentadoria por tempo de contribuição na época do óbito (processo 5009365-21.2018.4.04.7208: evento 12, procadm1, p. 7), restando devidamente comprovada, portanto, a qualidade de segurado.

Da qualidade de dependente das autoras

A autora Maria Mercedes Schneider de Andrade recebeu pensão por morte em razão do óbito de Ademir de Andrade, na condição de viúva, no período de 27/04/2017 a 31/12/2017; sendo suspensa após a autora Marly Salvador também requerer o benefício na condição de companheira.

Conforme Ofício 20.021.050/067/2017, o INSS identificou indício de irregularidade na concessão do benefício, consistente na falta de comprovação da dependência econômica à época do óbito (processo 5013653-12.2018.4.04.7208: evento 1, ofic10), em que pese a apresentação da certidão do casamento ocorrido em 30/01/1986 (idem, certcas5).

Houve regular processo administrativo para a cessação do benefício, possibilitando o contraditório e ampla defesa (processo 5013653-12.2018.4.04.7208, evento 12). Na ocasião Maria Mercedes, em declaração de próprio punho, afirmou estar separada de fato do instituidor, desde 2007, e não depender dele economicamente (idem, ofic6, p. 23).

Por outro lado, Marly Salvador requereu administrativamente o benefício de pensão por morte do mesmo instituidor na condição de companheira (processo 5013653-12.2018.4.04.7208, evento 12, procadm1) e apresentou prova material da união estável, consistente em ficha de abertura de conta conjunta em 11/04/2016 (idem, p. 11); endereço em comum na época do óbito: Avenida Campos Novos, 341 (idem, p. 13/17 e 25/27), mesmo endereço do instituidor constante da certidão de óbito (evento 1, certobt5); bem como documentos pertinentes aos serviços de funeral, nota fiscal e pedido, no qual figura como responsável (evento 1, out8, p. 5/6). E as testemunhas ouvidas na justificação administrativa confirmaram a união estável por longos anos, sendo o benefício indeferido por suposta separação antes do falecimento.

Na audiência conjunta designada para elucidar os fatos (evento 49), foi tomado o depoimento pessoal das autoras, ouvidas duas testemunhas do juízo e duas testemunhas de cada parte. Extrai-se das declarações:

Depoimento pessoal de Marly Salvador (vídeo 6): Ademir faleceu há dois anos, na época moravam juntos na Avenida Campos Novos, nº 341; residiram nesse endereço por 20 e poucos anos, mas a união iniciou antes; a casa pertencia ao casal; não tiveram filhos juntos. Ele foi casado com Maria Mercedes; depois da separação conviveu com ele o tempo todo, até o falecimento, sem separações; cuidou dos procedimentos do enterro. Quando ficou internado, as filhas cuidavam dele durante o dia e a autora à noite. Sempre viveram como marido e mulher, inclusive nos anos anteriores ao falecimento; ele não reatou o casamento anterior. Ele era aposentado, com renda de aproximadamente R$ 4.000,00; não prestava auxílio para Maria Mercedes; não que ela saiba.

Depoimento pessoal de Maria Mercedes Schneider de Andrade (vídeo 5): casou com Ademir em 1986, viveram juntos por 13-15 anos; não tiveram filhos. Patrícia e Susana são enteadas. Depois que se separaram, não reataram o casamento, mas ele continuou a frequentar a casa dela, levava medicamentos e alimentos, pois continuaram amigos; não foi nada combinado, ele ajudava porque sabia que ela precisava. Visitou Ademir depois que ele adoeceu, a filha estava cuidando dele.

Testemunhas do Juízo:

Patricia Conceição de Andrade (vídeo 7): é filha de Ademir; ele faleceu há dois anos, ficou internado dois meses no hospital; Marly cuidava dele durante à noite. O instituidor morava na mesma casa da depoente; ele vivia com Marly como marido e mulher há 33 anos, nunca se separaram. Antes disso ele foi casado com Maria Mercedes, nunca reataram o casamento e nunca soube de algum tipo de auxílio prestado para ela.

Susana Conceição de Andrade (vídeo 8): é filha de Ademir; quando ele ficou internado, Marly, as filhas e o sobrinho cuidavam dele; a depoente cuidou por mais tempo por se dar muito bem com o pai. Quem internou ele pela primeira vez foi Marly; eles viviam em união estável; em terreno com três casas, o casal morava na parte da frente, a depoente e a irmã nos fundos; agora a autora mora na frente, a irmã no meio e a depoente nos fundos. Antes o pai era casado como Maria Mercedes, ele nunca comentou se prestava algum tipo de auxílio para ela.

Testemunhas de Marly Salvador:

Enedir da Silva (vídeo 2): conhece Marly e o marido dela, Ademir, que era amigo do marido da depoente; eles eram vistos como um casal; frequentava a casa deles; não soube de separações. Quando Ademir estava internado no hospital, a depoente estava na mesma ala acompanhando o seu marido, que faleceu uma semana antes dele; quem acompanhava Ademir era a autora e duas filhas; nem sabia que ele teve outra mulher antes de Marly.

Marcio de Castro Gandra (vídeo 3): era amigo de Ademir, prestava assessoria administrativa para ele; conhece Marly, desde 2009, como esposa de Ademir; não teve conhecimento de separações. Não conhece Maria Mercedes, Ademir nunca comentou sobre a existência de casamento anterior ou prestação de auxílio à ex-esposa.

Testemunhas de Maria Mercedes:

Terezinha Peres (vídeo 9): conhece Maria Mercedes e Marly Salvador há quarenta anos, como vizinha, mas nunca foi na casa delas. Conhecia de vista o instituidor; ele foi casado com Maria Mercedes, via ele levando compras para ela. Não sabe se ele foi companheiro de Marly.

Maria das Neves Hansen Mattos (vídeo 4): foi vizinha de Maria Mercedes há trinta anos; depois que ela e Ademir se separaram, não voltaram a viver juntos, mas ele levava ajuda para ela; não lembra quando foi a última vez que viu isso acontecer, pois mudou de endereço, acredita ter sido há vinte anos.

Como se vê, a prova testemunhal é firme no sentido de que Ademir de Andrade viveu em união estável por longos anos com como Marly Salvador, assim permanecendo até a data do óbito.

Portanto, há início de prova material, corroborada por prova testemunhal harmônica e convincente, a amparar o reconhecimento da união estável entre Marly Salvador e o "de cujus" na época do óbito, exclusivamente para fins previdenciários.

Constatada a união estável, não há que se falar em prova de dependência econômica, por ser esta presumida entre os companheiros.

Por outro lado, a própria autora Maria Mercedes reconhece estar separada de fato do instituidor pelo menos desde o início dos anos 2000; e inexiste prova material do alegado auxílio financeiro, não se extraindo tal convicção da prova oral produzida. Assim, acertada a decisão administrativa que suspendeu o benefício de pensão por morte, sendo este devido integralmente à companheira Marly Salvador.

Como visto, na data do óbito de seu esposo, Ademir de Andrade, a senhora Maria Mercedes Schneider de Andrade dele estava separada de fato, há bastante tempo.

Ao tomar conhecimento do óbito dele, ela requereu a concessão de pensão por morte, que foi deferida, mediante a apresentação da certidão de casamento do casal e da certidão de óbito do falecido.

O benefício foi concedido e posteriormente cessado, mediante o devido processo administrativo, depois que a companheira de Ademir de Andrade, Marly Salvador, também requereu a concessão da pensão por morte, que foi deferida.

Assim, Maria Mercedes Schneider de Andrade auferiu, indevidamente, a pensão por morte em assunto, entre 27/04/2017 e 31/12/2017.

Está em questão, aqui, sua obrigação (ou não) de devolver as prestações que indevidamente recebeu.

A sentença exonerou-a desse ônus, nos seguintes termos:

Restituição dos valores recebidos indevidamente

Quanto aos valores recebidos indevidamente pela autora Maria Mercedes, penso não estar demonstrada a efetiva má-fé, sendo razoável admitir que ela acreditava ter direito ao benefício por nunca ter se divorciado ou separado oficialmente do instituidor.

Conforme jurisprudência iterativa das Cortes Superiores, o caráter eminentemente alimentar dos benefícios previdenciários faz com que, quando recebidos em boa-fé, não sejam passíveis de devolução (STJ, REsp 1674457, SEGUNDA TURMA , DJe 09/08/2017, Ministro OG FERNANDES).

Assim se posicionou o TRF em caso similar:

PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE PENSÃO POR MORTE DE EX-CÔNJUGE. DESCABIMENTO. COMPROVAÇÃO DA SEPARAÇÃO DE FATO DO CASAL E INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DA EX-CÔNJUGE EM RELAÇÃO AO DE CUJUS. ANULAÇÃO DO DÉBITO PELOS VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE A TÍTULO DE PENSÃO. CABIMENTO. BOA-FÉ DA AUTORA COMPROVADA. 1. Tendo restado comprovado que a autora estava, há muitos anos, separada de fato do falecido cônjuge, o qual vivia com outra companheira, e que também não dependia economicamente do de cujus, descabe o restabelecimento do benefício de pensão por morte de cônjuge, indevidamente concedido em seu favor. 2. Não tendo restado comprovada a má-fé da autora no recebimento da pensão por morte do cônjuge, descabe a cobrança, pelo INSS, dos valores indevidamente recebidos, devendo, ainda, o Instituto devolver os eventuais valores descontados a tal título do benefício de aposentadoria da demandante. (TRF4, processo 5000105-58.2016.4.04.7217, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, julgado em 08/08/2018, Relator José Antonio Savaris)

Logo, não há necessidade de devolução.

Com efeito, no presente caso não se pode, acima de qualquer dúvida razoável, excluir a possibilidade de que a senhora Maria Mercedes Schneider de Andrade acreditasse que, conquanto estivesse separada de fato de seu marido, tinha direito à referida pensão por morte, porque formalmente seu matrimônio não fora dissolvido.

Ademais, assim que foi convocada pela administração previdenciária para esclarecer os fatos, ela preencheu, de próprio punho, a declaração de que trata o evento 12, arquivo OFIC6, página 23, cujo teor é o seguinte:

Declaração

Eu, Maria Mercedes Schneider de Andrade, inscrita no CPF sob nº 312.245.809-82, declaro para os devidos fins, que estava separada de fato de Ademir de Andrade, inscrito no CPF sob o nº 352.035.959-68, desde 2007, morando em casas separadas, e que não dependia economicamente dele, não recebia pensão alimentícia.

Portanto, a senhora Maria Mercedes Schneider de Andrade foi sincera e prestativa, já na primeira vez em que foi convocada para prestar esclarecimentos acerca do caso.

Anote-se que não se aplica ao presente caso a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do tema repetitivo nº 979.

A tese então firmada tem o seguinte teor:

Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.

Com efeito, ao deferir o benefício a autarquia previdenciária não incorreu propriamente em erro administrativo.

Na realidade, o deferimento administrativo do benefício estaria correto, não fosse a circunstância de que a certidão de casamento que comprovava a condição de dependente da autora não estava atualizada.

Conclusivamente, tenho que a apelada Maria Mercedez Schneider de Andrade não tem a obrigação de restituir as prestações da pensão por morte que indevidamente recebeu, entre 27/04/2017 e 31/12/2017.

Por conseguinte, impõe-se a confirmação da sentença.

Apesar da sucumbência recursal da apelante, não se há falar, no presente caso, na majoração dos honorários advocatícios arbitrados em seu desfavor, na sentença.

É que esta última, na realidade, estabeleceu que cada uma das partes arcará com os honorários advocatícios dos respectivos patronos, e, quanto a isso, nenhuma delas apela.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5013653-12.2018.4.04.7208/SC

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5013653-12.2018.4.04.7208/SC

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MARIA MERCEDES SCHNEIDER DE ANDRADE (AUTOR)

ADVOGADO: DJALMA PORCIUNCULA (OAB SC014189)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. RECEBIMENTO INDEVIDO, DE BOA-F'E. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE RESTITUIÇÃO.

A ex-esposa que, embora separada de fato de seu cônjuge, mas não de direito, requer a concessão da pensão decorrente do óbito deste último, acreditando ter direito ao benefício, não tem o dever de devolver as prestações que recebeu indevidamente, de boa-fé.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 08 de abril de 2022.



Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001716748v5 e do código CRC 4fa748f8.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 01/04/2022 A 08/04/2022

Apelação Cível Nº 5013653-12.2018.4.04.7208/SC

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MARIA MERCEDES SCHNEIDER DE ANDRADE (AUTOR)

ADVOGADO: DJALMA PORCIUNCULA (OAB SC014189)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 01/04/2022, às 00:00, a 08/04/2022, às 16:00, na sequência 1188, disponibilizada no DE de 23/03/2022.

Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES

Secretária



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