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PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. POSSE E EXERCÍCIO EM CARGO PUBLICO. RECEBIMENTO DOS VALORES. MÁ-...

Data da publicação: 07/07/2020, 06:42:12

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. POSSE E EXERCÍCIO EM CARGO PUBLICO. RECEBIMENTO DOS VALORES. MÁ-FÉ. CARACTERIZAÇÃO. PRESCRIÇÃO. DECRETO 20.910/1932. INOCORRÊNCIA 1. Segundo entendimento do STF, consignado no Tema nº 666, É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil, aplicando-se, conforme decidido pelo STJ no Tema nº 553, o prazo quinquenal previsto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32. Afastada a incidência do § 5º do art. 37 da Constituição Federal. 2. O retorno ao trabalho implica o cancelamento do benefício de aposentadoria por invalidez a contar da data em que caracterizado o exercício de atividade laboral. 3. Assim, o exercício de atividade remunerada, devidamente comprovada nos autos, e a não comunicação dessa situação ao INSS, para cancelamento do benefício, implica a ocorrência e má-fé da beneficiária a autorizar a cobrança dos valores pagos indevidamente pela Autarquia Previdenciária. (TRF4 5011480-69.2014.4.04.7009, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 22/05/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5011480-69.2014.4.04.7009/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

APELANTE: VALTER ZEAGINSKI (RÉU)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de ação de cobrança, por meio da qual o INSS busca a restituição dos valores recebidos pelo réu a título de aposentadoria por invalidez (NB 123.528.660-3) durante o período de 26/08/2008 a 30/04/2014, no montante de R$ 49.536,53 (quarenta e nove mil, quinhentos e trinta e seis reais e cinquenta e três centavos) em razão da assunção de cargo público na função de agente de execução da Secretaria de Estado da Educação.

Sentenciando, em 09/12/2015, o juízo a quo julgou o feito nos seguintes termos:

Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos do autor contidos na exordial, extinguindo o feito, com resolução de mérito, nos termos do art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de condenar o réu a restituir os valores de aposentadoria por invalidez recebidos no período de 26/08/2008 a 30/04/2014, devidamente atualizados desde cada competência pelo IPCA-e e com juros de mora a partir da citação, no mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, capitalizados de forma simples, correspondentes a: 0,5% ao mês, caso a taxa SELIC ao ano seja superior a 8,5%; ou a 70% da taxa SELIC ao ano, mensalizada, nos demais casos.Concedo o benefício da Assistência Judiciária Gratuita.Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, § 3º do CPC, ficando suspensa sua exigibilidade com fulcro no artigo 11, § 2º e 12 da Lei 1.060, de 05.02.1950, tendo em vista sua condição legal de necessitada.Sentença sujeita a reexame necessário (artigo 475, I, do Código de Processo Civil).(...)

Inconformada, apela a parte autora, defendendo, em síntese, que ainda que se possa cogitar a ocorrência de uma irregularidade, é certo que, no caso em tela, não houve má-fé e intuito em lesar o erário. Alega ser irrepetível a verba por ter caráter alimentar, sendo o mínimo necessário para preservar sua dignidade humana. Aduz que “o elemento que evidencia a boa-fé objetiva no caso é a legítima confiança ou justificada expectativa que o beneficiário adquire, de que os valores recebidos são legais e de que integram em definitivo o seu patrimônio”. Sucessivamente, requer seja reconhecida a prescrição das parcelas anteriores ao quinquênio que antecede a interposição da ação.

Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

REMESSA NECESSÁRIA

Tratando-se de sentença de procedência em favor da fazenda pública, incabível a remessa necessária.

APELAÇÃO DA PARTE RÉ

A irregularidade apurada pelo INSS, mediante devido processo legal administrativo, é relativa ao recebimento de benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez (NB 123.528.660-3) durante o período de 26/08/2008 a 30/04/2014 em razão segurado ter assumido cargo público, passando a exercer labor.

Da Decadência

Não se trata da hipótese de decadência, vez que não se está discutindo a legalidade do ato concessivo do benefício de aposentadoria por invalidez titularizado pela parte ré, mas sim da perda sucessiva do direito ao mesmo por alteração da situação fática (retorno da capacidade laboral).

Da prescritibilidade das ações de ressarcimento de danos ao erário

O débito questionado nesta demanda consiste em ressarcimento de benefício previdenciário pago indevidamente.

Nesse passo, a discussão envolve, necessariamente, o alcance da imprescritibilidade das ações de ressarcimento de danos ao erário, conforme previsto no art. 37, § 5º, da Constituição Federal:

Art. 37.
(...)
§ 5º - A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.

Ao interpretar o texto constitucional, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou no sentido de que a imprescritibilidade da ação de ressarcimento por dano ao erário seria ampla, abrangendo inclusive ilícitos administrativos e alcançando tanto agentes públicos quanto particulares (MS 26210, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 04/09/2008, DJe-192 DIVULG 09-10-2008 PUBLIC 10-10-2008).

A decisão da Suprema Corte, porém, não encerrou o debate. Nesse sentido, em 26/08/2013, o STF reconheceu que a matéria tem repercussão geral, nos seguintes termos:

ADMINISTRATIVO. PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. PRESCRIÇÃO. INTERPRETAÇÃO DA RESSALVA FINAL PREVISTA NO ARTIGO 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.
Apresenta repercussão geral o recurso extraordinário no qual se discute o alcance da imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário prevista no artigo 37, § 5º, da Constituição Federal.
(RE 669069 RG, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, julgado em 02/08/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-166 DIVULG 23-08-2013 PUBLIC 26-08-2013)

O Ministro Teori Zavascki, por sua vez, relator do recurso extraordinário em questão, sintetizou as posições quanto ao tema do seguinte modo:

A questão transcende os limites subjetivos da causa, havendo, no plano doutrinário e jurisprudencial, acirrada divergência de entendimentos, fundamentados, basicamente, em três linhas interpretativas: (a) a imprescritibilidade aludida no dispositivo constitucional alcança qualquer tipo de ação de ressarcimento ao erário; (b) a imprescritibilidade alcança apenas as ações por danos ao erário decorrentes de ilícito penal ou de improbidade administrativa; (c) o dispositivo não contém norma apta a consagrar imprescritibilidade alguma.

Cabe assinalar que o mencionado recurso extraordinário (RE 669.069) já teve seu julgamento finalizado, quando então restou afirmada a tese de ser "prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil":

CONSTITUCIONAL E CIVIL. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. SENTIDO E ALCANCE DO ART. 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO.
1. É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil.
2. Recurso extraordinário a que se nega provimento.(RE 669069, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 03/02/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-082 DIVULG 27-04-2016 PUBLIC 28-04-2016)

Nesse quadro, não há dúvidas de que, de fato, a posição que melhor se harmoniza com o sistema constitucional é a de que a imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário, prevista no art. 37, § 5º, da Lei Fundamental, deve ser compreendida restritivamente.

Com efeito, a prescrição, instituto que tem íntima relação com a noção de segurança jurídica, é a regra no ordenamento, de forma que as exceções a ela devem ser expressas e interpretadas de modo restritivo. Atentaria contra a segurança jurídica exegese do art. 37, § 5º, que consagrasse a imprescritibilidade de ação de ressarcimento ao erário decorrente de qualquer ato ilícito. Aludido dispositivo constitucional deve ser lido em conjunto com o parágrafo que o antecede (art. 37, § 4º), o qual dispõe sobre os atos de improbidade administrativa. É dizer, somente diante de ilícitos especialmente graves é possível concluir pela condição imprescritível da respectiva ação de ressarcimento.

Tal orientação já vinha sendo sustentada por Teori Zavascki em sede doutrinária. Nesse sentido:

O instituto da prescrição, importante para a segurança e estabilidade das relações jurídicas e da convivência social, está consagrado como regra em nosso sistema de direito. São raríssimas as hipóteses de imprescritibilidade. Nas palavras de Pontes de Miranda, 'a prescrição, em princípio, atinge a todas as pretensões e ações, quer se trate de direitos pessoais, quer de direitos reais, privados ou públicos. A imprescritibilidade é excepcional'. (...) Se a prescritibilidade das ações é a regra - pode-se até dizer, o princípio -, a imprescritibilidade é a exceção e, por isso mesmo, a norma que a contempla deve ser interpretada restritivamente.
Nessa linha de entendimento, merece interpretação restritiva a excepcional hipótese de imprescritibilidade prevista no citado § 5º do art. 37 da Constituição Federal. O alcance desse dispositivo deve ser buscado mediante sua associação com o do parágrafo anterior, que trata das sanções por ato de improbidade administrativa. Ambos estão se referindo a um mesmo conjunto de bens e valores jurídicos, que são os da preservação da idoneidade da gestão pública e da penalização dos agentes administrativos ímprobos. Assim, ao ressalvar da prescritibilidade "as respectivas ações de ressarcimento", o dispositivo constitucional certamente está se referindo não a qualquer ação, mas apenas às que busquem ressarcir danos decorrentes de atos de improbidade administrativa de que trata o § 4º do mesmo art. 37 (ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, 6ª ed. p. 71).

Essa posição também foi sufragada, recentemente, pela 4ª Turma desta Corte, nos termos da seguinte ementa:

DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE DANOS AO ERÁRIO. PRESCRIÇÃO. CF/88, ART. 37, § 5º. DANO QUE NÃO DECORRE DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRAZO QUINQUENAL.
1. A redação do art. 37, § 5º, da Constituição da República ("A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento") sugere a imprescritibilidade da ação de ressarcimento de danos ao erário causados por ato ilícito praticado por qualquer agente, servidor ou não.
2. Contudo, a regra não deve ser interpretada no sentido de ser aplicável a todo e qualquer ato ilícito danoso cometido por qualquer agente em desfavor dos cofres públicos. Tamanha é a gama de atos ilícitos (civis, criminais, administrativos, tributários, aduaneiros, de trânsito, etc.) que, quando praticados por um agente qualquer, podem resultar em prejuízo ao erário, que tal interpretação extensiva daquele preceito constitucional erigiria a imprescritibilidade, que sabemos constituir-se em exceção no sistema jurídico, a regra geral quando se trata de responsabilidade civil do particular frente ao Estado.
3. A imprescritibilidade da ação de ressarcimento prevista no texto da Constituição dirige-se exatamente àqueles atos ilícitos prejudiciais ao erário para os quais o constituinte, no mencionado art. 37, § 5º, determinou ao legislador ordinário que definisse os prazos prescricionais. Isso ocorreu com a edição da Lei 8.429/92, na qual o legislador ordinário tipificou os atos de improbidade administrativa e estabeleceu os respectivos prazos prescricionais. Nessa perspectiva, é para as ações que visem o ressarcimento dos prejuízos ao erário provocados por esses atos ilícitos, qualificados pelo legislador como atos de improbidade administrativa, que a Constituição estabeleceu a imprescritibilidade.
4. No caso dos autos, não estando configurado ato de improbidade administrativa, e inexistindo prazo específico definido em lei, o prazo prescricional aplicável é o de cinco anos, de largo emprego no Direito Administrativo, e em respeito aos princípios da isonomia e simetria.
5. Execução fiscal extinta em face da ocorrência da prescrição intercorrente.(TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5008970-61.2014.404.0000, 4ª TURMA, Des. Federal CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR , POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR, JUNTADO AOS AUTOS EM 01/12/2014)

Nesse caso, em voto-vista lapidar, assentou o Des. Federal Candido Alfredo Silva Leal Junior:

Com efeito, atos ilícitos capazes de produzir danos ao erário existem nos mais diversos ramos da atividade humana e social, podendo ser ilícitos civis, criminais, administrativos, ambientais, eleitorais, aduaneiros, de trânsito, etc. Atribuir aquele alcance extensivo à norma constitucional significaria admitir como imprescritíveis praticamente todas as ações de ressarcimento movidas pelo Poder Público. Excetuados os casos fundados na responsabilidade objetiva, a imprescritibilidade abarcaria desde os casos mais singelos, como, v.g., danos produzidos à sinalização de trânsito provocados por uma colisão de automóveis, ou a danificação culposa da pintura de um prédio público, até os mais graves, como os "rombos" nos cofres públicos produzidos pela macrocriminalidade econômica. Ou seja, a imprescritibilidade passaria a ser a regra, provocando a formação de um imenso estoque de litígios em potencial, que poderiam eclodir a qualquer momento. Sem dúvida, isso comprometeria a função da pacificação social proporcionada pelo instituto da prescrição e obrigaria o cidadão (e, talvez, as gerações que o sucederem) a manter em seu poder verdadeiro arsenal de provas relativas aos eventos em que se viu envolvido e que possam vir a ser futuramente entendidos como danosos ao erário, de forma a poder exercer oportunamente sua defesa, caso o litígio renasça das cinzas.
É preciso que se balize que, como nos demais ramos do Direito, a prescritibilidade das ações é a regra nas relações entre administração e seus agentes e a administração e os administrados. Como bem salienta o doutrinador José Afonso da Silva,
"A prescritibilidade como forma de perda da exigibilidade de direito, pela inércia de seu titular, é um princípio geral de direito. Não será, pois, de se estranhar que ocorram prescrições administrativas sob vários aspectos, quer quanto às pretensões de interessados em face da Administração, quer quanto às desta em face da Administração." (Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 673)
Nessa perspectiva, julgo que a regra do art. 37, § 5º, da Constituição de 1988, ao prever hipótese de imprescritibilidade, tem em vista não quaisquer atos danosos ao erário, mas atos ilícitos especialmente qualificados - tanto que mereceram tratamento em sede constitucional - e que correspondem àqueles que vieram a ser tipificados como "atos de improbidade administrativa" pelo legislador ordinário na Lei 8.429/92, em atendimento ao comando constitucional.
Assim, é imprescritível a ação tendente a ressarcir o dano ao erário produzido pelo ato de improbidade administrativa, configurado a partir do balizamento contido na Lei 8.429/92, e não por outro ato danoso qualquer. Consequência disso é que, na interpretação da regra do art. 23 da Lei da Improbidade, que dispõe sobre prazo prescricional para a aplicação das sanções previstas na lei, deve ser excluído o
ressarcimento do dano ao erário.
Portanto, a imprescritibilidade da ação de ressarcimento do dano depende do reconhecimento do ato de improbidade que o originou, em ação própria. Inexistindo tal declaração do caráter de improbidade administrativa do ilícito causador do dano, a prescrição incidirá conforme as regras ordinárias relativas à matéria.

Em suma, é de se confirmar que a imprescritibilidade inscrita no art. 37, § 5º, da Constituição Federal deve abranger apenas as ações por danos decorrentes de ilícito penal ou de improbidade administrativa.

Do prazo prescricional aplicável

Registro que as Turmas que julgam a matéria previdenciária nesta Corte já firmaram o entendimento de que, para as ações de ressarcimento deve ser considerado o prazo prescricional de cinco anos. Aplica-se o art. 1º do Decreto nº 20.910/32. Ademais, o entendimento atual é de que o prazo fica suspenso na pendência do processo administrativo de apuração. A propósito, nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. RESTITUIÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. PRESCRIÇÃO.
Tratando-se de pedido de ressarcimento de valores pagos pelo INSS em razão de benefício previdenciário, quanto à prescrição, é aplicável ao caso, pelo princípio da simetria, o disposto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32 (prescrição quinquenal). Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
(TRF4, AC 5007572-41.2013.404.7202, SEXTA TURMA, Relator (AUXÍLIO VÂNIA) PAULO PAIM DA SILVA, juntado aos autos em 21/08/2014)

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO. PAGAMENTO INDEVIDO DE BENEFÍCIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. CONCESSÃO ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA DE MÁ-FÉ. REPETIÇÃO DE VALORES DE NATUREZA ALIMENTAR. IMPOSSIBILIDADE.
1. Sobre o tema da incidência do prazo prescricional nas ações contra particulares em que se busca o ressarcimento ao erário, o entendimento desta Turma é o de que se aplica o prazo quinquenal de que trata o Decreto 20.910/32. (v.g., TRF4, AC 5003286-44.2014.404.7118, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, juntado aos autos em 07/07/2015)
2. omissis.......
(TRF4, AC 5000098-79.2014.404.7009, QUINTA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 10/08/2016)

Da prescrição no caso dos autos

Da análise do processo administrativo anexado no evento 1, observa-se os seguintes marcos temporais:

05/10/1999 - DIB do benefício de auxílio-doença;

02/04/2002 - DIB do benefício de aposentadoria por invalidez (conversão);

26/08/2008 - ingresso do réu em cargo público 26/08/2008, marco inicial do lapso prescricional.

06/06/2012 - interrupção do lapso prescricional - recebimento, pelo réu, da correspondência informando que a autarquia previdenciária estava estabelecendo procedimentos internos de apuração de irregularidade;

19/05/2014 - retorno do curso do prazo prescricional - recebimento, pelo réu, da correspondência informando que havia sido apurada a irregularidade e que o réu encontrava-se em débito com a fazenda pública.

Apura-se, portanto, que, entre o início do lapso prescricional e a sua interrupção, não decorreram cinco anos. Como a interrupção do prazo ocorreu após decorrido mais da metade do mesmo, a fazenda pública agora teria dois anos e meio para utilizar-se dos meios legais para cobrar a dívida. Assim, não tendo decorrido o prazo de 2 anos e meio até a interposição da presente ação de cobrança (10/10/2014) não existem parcelas prescritas.

Mantida a sentença no ponto.

Do mérito

Discute-se sobre a possibilidade de cobrança de valores pagos indevidamente pelo INSS a título de benefício previdenciário.

Está consolidado o entendimento jurisprudencial no sentido de que em se tratando de valores percebidos de boa-fé pelo segurado, seja por erro da Administração, seja em razão de antecipação de tutela, não é cabível a repetição das parcelas pagas.

Os princípios da razoabilidade, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana conduzem à impossibilidade de repetição das verbas previdenciárias quando se tratar de benefício de caráter alimentar recebido pelo beneficiário de boa-fé.

Entretanto, deve-se ter por inaplicável o art. 115 da Lei 8.213/91 na hipótese de inexistência de má-fé do segurado.

No caso concreto, entretanto, vê-se que o benefício foi cancelado face a constatação de que a parte ré, aposentada por invalidez, estaria exercendo atividade laboral. Muito embora a má-fé seja negada pela segurada, os fundamentos da sentença, abaixo transcritos, solucionam com acerto a demanda [grifei]:

Não há nos autos controvérsias acerca da regularidade da cessação da aposentadoria por invalidez. Discute-se apenas a legalidade da cobrança dos valores pagos ao réu a este título, após sua admissão em cargo público.Pede o réu, portanto, que seja declarada a inexigibilidade da devolução dos valores referentes ao benefício objeto do presente feito. Defende a irrepetibilidade dos valores pagos, dado o caráter alimentar dos benefícios previdenciários e a sua boa-fé no recebimento.O mérito da cobrança, portanto, está diretamente atrelado à questão da boa-fé do segurado.Nesse trajeto, importante destacar que a jurisprudência é pacífica no sentido de que o caráter alimentar do benefício e a ausência de má-fé do beneficiário afastam a exigência do ressarcimento dos valores auferidos indevidamente.Com efeito, essa vem sendo a orientação do STJ na matéria:PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. SÚMULA 83/STJ.
1. Cumpre asseverar que não há nos autos informação da existência de tutela antecipada para recebimento do benefício previdenciário, conforme alegado pelo agravante.
2. A jurisprudência desta Corte é no sentido da impossibilidade dos descontos, em razão do caráter alimentar dos proventos percebidos a título de benefício previdenciário, aplicando ao caso o princípio da irrepetibilidade dos alimentos. Precedentes. Súmula 83/STJ.

3. A decisão agravada, ao julgar a questão que decidiu de acordo com a interpretação sistemática da legislação, especialmente nos termos do art. 115 da Lei n. 8.112/91, apenas interpretou as normas, ou seja, de forma sistemática, não se subsumindo o caso à hipótese de declaração de inconstitucionalidade sem que a questão tenha sido decidida pelo Plenário. Agravo regimental improvido.
(AgRg no AREsp 432.511/RN, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/12/2013, DJe 03/02/2014).CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ERRO ADMINISTRATIVO CONSTATADO. LEGALIDADE DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DE REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. PODER-DEVER DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA MORALIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 37, CAPUT DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. PAGAMENTOS INDEVIDOS RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO BENEFICIÁRIO. VERBAS DE NATUREZA ALIMENTAR. EXIGÊNCIA DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO AFASTADA. PREQUESTIONAMENTO.
1. Desde que constatada a existência de erro material na concessão do benefício previdenciário, cabe, à Administração Pública, pautada pelos princípios constitucionais da legalidade e da moralidade, a teor do art. 37, caput da Constituição Federal de 1988, proceder à respectiva retificação ou cancelamento daquele.
2. Contudo, a natureza alimentar das cifras pagas e a ausência de má-fé no agir da parte beneficiária, aliadas à sua evidente hipossuficiência econômica, fragilizam e inibem a pretensão de ressarcimento do INSS. Inteligência do artigo 115 da Lei nº 8.213/91, interpretado consoante uníssono entendimento desta 4ª Corte Regional Federal e do colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ), bem como, em conformidade com a Constituição Federal de 1988. Situação, ademais, a prevenir possíveis ataques ao princípio da necessidade de preservação da dignidade da pessoa, aqui, consubstanciado na impossibilidade de se lhe entregar, mensalmente, a título de ressarcimento ao Estado, quantia destinada à mínima subsistência.
3. Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir.
(TRF4, APELREEX 5010324-96.2012.404.7112, Quinta Turma, Relatora MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, D.E. 06/09/2013).
Como se observa, a nova orientação conjuga o caráter alimentar dos benefícios previdenciários à boa-fé objetiva no seu recebimento.O caso vertido nos autos diz respeito a pagamento oriundo de ato administrativo regular, editado em caráter definitivo, mas posteriormente cessado ante a constatação de ilegalidade. O benefício de aposentadoria por invalidez foi concedido corretamente, porquanto fundado na invalidez do réu, confirmada em perícia administrativa realizada em 23/08/2012 - após deflagrado o procedimento administrativo para apuração de irregularidades (PROCADM9, evento 1, p. 2) -, porém foi cessado por ter o réu voltado a exercer atividades laborativas.Argumenta o réu que não tinha o objetivo de lesar o erário público, mas apenas de complementar suas rendas, diante das despesas extras decorrentes de seus problemas de saúde.Não há dúvidas de que a atitude do réu em trabalhar, apesar das várias patologias que apresenta, é de evidente superação, sendo admirável sua conquista ao ser aprovado em concurso público em vagas destinadas a portadores de deficiência. Por outro lado, não há como negar que ele possuía ciência de que sua aposentadoria, por ser decorrente de invalidez, é incompatível com o trabalho, tanto é que a alegação apresentada ao requerer sua aposentadoria era de inaptidão para o trabalho. O réu estava ciente, portanto, que ao ingressar em cargo público os pagamentos de sua aposentadoria deixariam de ser legítimos.Os termos da defesa apresentada no procedimento administrativo, por seu turno, demonstram que o réu possui grau de instrução e pensamento crítico suficientes a entender a lógica do sistema previdenciário quando ao segurado é concedido um benefício por invalidez, qual seja, o de substituir a renda que seria auferida por quem está impossibilitado de trabalhar.Assim, pelo que consta nos autos, o segurado agiu de má-fé quando deixou de comunicar a autarquia seu retorno ao trabalho, vez que para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez é tida como conditio sine qua non o requerente ser considerado inapto para a realização de toda e qualquer atividade laborativa.Cabe ressaltar que esta condição não é ignorada pela maioria da população, sendo de conhecimento geral que os benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez são devidos em razão da existência de incapacidade para o trabalho, quanto mais este último benefício, marcado pela perpetuidade.Ademais, no caso, o que está em análise é a boa-fé objetiva e a subjetiva, vale dizer, não se está somente perquirindo se o réu possuía consciência de estar agindo em desconformidade com determinada norma do ordenamento jurídico, mas sim se portava uma conduta social ética e leal. Assim como a boa-fé é indispensável ao comportamento do administrador público, também se exige do cidadão ao se relacionar com a administração pública.Não se está aqui a tratar de caso decorrente de indevido pagamento de verba alimentar, recebida de boa-fé, por ser oriunda de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da administração, mas sim de benefício concedido de forma regular, e que veio a se tornar ilegal pela atitude do próprio administrado.Nesse sentido, confira-se entendimento jurisprudencial:É importante destacar que, neste caso, nem mesmo erro da Administração ocorreu. A própria conduta do beneficiário ocasionou a ilegalidade do recebimento da aposentadoria por invalidez, pois ele voltou a trabalhar e não comunicou o INSS. Dessa forma, tanto existe má-fé, que essa atitude tem sido considerada crime de estelionato contra a Previdência Social, motivando condenações na Justiça Federal da 4ª Região (TRF4, ACR 5014310-74.2010.404.7000, Sétima Turma, Relator Des. Federal Néfi Cordeiro, D.E. 10/11/2011).Destarte, apesar de se tratar de verba alimentar, ela foi recebida de ma-fé pelo administrado, legitimando os atos de cobrança da autarquia.(...)

O retorno do segurado ao trabalho é causa, portanto, de imediata cessação do benefício. O segurado que desejar retornar ao trabalho, deverá solicitar a realização de nova avaliação pericial para, constatada a recuperação da capacidade laborativa, ter a prestação previdenciária suspensa, cujas regras estão elencadas no artigo 47 da Lei 8.213/91.

Tratando-se, como no caso dos autos, de ingresso em regime próprio, igualmente cabe ao segurado em gozo de benefício por incapacidade renunciar ao mesmo. O fato de constatar-se a incapacidade do segurado pela perícia técnica do regime geral não retira a ilegalidade do concomitante gozo do benefício com o exercício de atividade laboral no regime próprio.

No caso dos autos, não houve por parte da ré tal iniciativa. Ao contrário, ela omitiu o retorno ao trabalho, alegando que precisava complementar a sua renda oriunda da aposentadoria que, no seu entendimento, era insuficiente para os gastos com medicamentos.

Assim, havendo conhecimento de que não poderia retornar ao trabalho e continuar recebendo o benefício, caracterizada a má-fé, motivo pelo qual os valores devem ser devolvidos ao erário.

Mantida a sentença.

PREQUESTIONAMENTO

Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária e negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001680818v18 e do código CRC 80888f27.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 22/5/2020, às 15:49:4


5011480-69.2014.4.04.7009
40001680818.V18


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 03:42:12.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5011480-69.2014.4.04.7009/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

APELANTE: VALTER ZEAGINSKI (RÉU)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. POSSE E EXERCÍCIO EM CARGO PUBLICO. RECEBIMENTO DOS VALORES. MÁ-FÉ. CARACTERIZAÇÃO. PRESCRIÇÃO. DECRETO 20.910/1932. INOCORRÊNCIA

1. Segundo entendimento do STF, consignado no Tema nº 666, É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil, aplicando-se, conforme decidido pelo STJ no Tema nº 553, o prazo quinquenal previsto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32. Afastada a incidência do § 5º do art. 37 da Constituição Federal.

2. O retorno ao trabalho implica o cancelamento do benefício de aposentadoria por invalidez a contar da data em que caracterizado o exercício de atividade laboral.

3. Assim, o exercício de atividade remunerada, devidamente comprovada nos autos, e a não comunicação dessa situação ao INSS, para cancelamento do benefício, implica a ocorrência e má-fé da beneficiária a autorizar a cobrança dos valores pagos indevidamente pela Autarquia Previdenciária.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 19 de maio de 2020.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001680819v3 e do código CRC 057042df.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 22/5/2020, às 15:49:4


5011480-69.2014.4.04.7009
40001680819 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 03:42:12.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 12/05/2020 A 19/05/2020

Apelação/Remessa Necessária Nº 5011480-69.2014.4.04.7009/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

APELANTE: VALTER ZEAGINSKI (RÉU)

ADVOGADO: INGRID HESSEL (OAB PR043209)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/05/2020, às 00:00, a 19/05/2020, às 16:00, na sequência 407, disponibilizada no DE de 30/04/2020.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 03:42:12.

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