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PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE LABORAL. GRAVIDEZ ...

Data da publicação: 10/07/2021, 07:01:25

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE LABORAL. GRAVIDEZ DE RISCO. PROVA. CONVENÇÃO Nº 103/OIT. DECRETO Nº 10.088/2019. CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER, DE 1979. DECRETO 4377/2002. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO. 1. São requisitos para a concessão dos benefícios previdenciários por incapacidade: a qualidade de segurado; o cumprimento do período de carência, salvo nos casos excepcionados por lei; e a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença). O segurado portador de enfermidade que o incapacita temporariamente para o exercício de sua atividade laboral tem direito à concessão do benefício de auxílio-doença. 2. A gravidez, prenúncio da maternidade, é um dos momentos mais significativos da existência humana. Pressuposto da continuidade da humanidade, o próprio Estado tem interesse na maternidade e mantença de taxas mínimas permanentes, como medida de sobrevivência, também, do Estado. 3. A Convenção nº 103 da Organização Internacional do Trabalho, voltada ao Amparo à Maternidade, internalizada por meio do Dec. nº. 58.820/66, de 14.7.66, consolidada pelo Dec. nº 10.088/2019, consagra ampla proteção à mulher gestante e lhe confere garantias específicas do pré-natal ao parto e objetiva evitar a discriminação das mulheres por razões de casamento ou maternidade, e no caso de doença confirmada por atestado médico como resultante da gravidez, o art. III - 5, da Convenção estipula a ampliação da licença, preconizando à gestante prestações em espécie e a assistência médica no caso de licença em virtude da gravidez (art. IV -1), dentre outras garantias elencadas na bojo do dispositivo. No mesmo sentido, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979, promulgada pelo Dec. 4377/2002, preconiza amplo resguardo dos direitos à maternidade, como também daquelas estabelecidas na Convenção 102 da OIT vigente no Brasil a partir de 15.06.2009; 4. A internalização desses compromissos internacionais convencionados importa no dever da integração dessas perspectivas protetivas ao direito nacional. A Constituição Brasileira e a legislação infraconstitucional já observam a recepção desses valores, prevendo, no art. 7º, XVIII e art. 227, do texto constitucional, e no art. 2º do Código Civil Brasileiro, tanto a proteção da gestante, quando do nascituro, binômio protetivo que somente pode concluir pela necessidade do sistema jurídico ofertar completa proteção à gestante e ao nascituro, conforme preconizam os compromissos internacionais antes aludidos. Como corolário, deve ser afastada a exigência da comprovação do cumprimento da carência para a concessão de benefício previdenciário no caso de gravidez de risco, devidamente comprovado. (TRF4, AC 5007588-62.2021.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 02/07/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5007588-62.2021.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: DARA XAVIER PRESTES

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

A parte autora ajuizou ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pleiteando a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez desde a Data de Entrada do Requerimento na via administrativa (DER em 05.11.2018), conforme documento juntado ao ev. 1 - out10.

Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 14.10.2020, por meio da qual o Juízo a quo julgou improcedente o pedido nos seguintes termos (ev. 109 ):

Os embargos de declaração foram acolhidos para sanar a omissão e no mérito, mantida a improcedência do pedido ev.120, verbis:

(...)

Em suas razões recursais (ev. 124), a parte autora requer a reforma da sentença, sustentando, em síntese, que o benefício requerido na via administrativa foi indeferido porque contava com apenas uma contribuição, no entanto, por se tratar de pedido relacionado à gravidez de risco, entende que se rata de hipótese de isenção de carência.

Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

Peço dia para julgamento.

VOTO

Aposentadoria por Invalidez/Auxílio-Doença

A concessão de benefícios por incapacidade laboral está prevista nos artigos 42 e 59 da Lei nº 8.213/91, verbis:

Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.

Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.

Extraem-se, da leitura dos dispositivos acima transcritos, que são requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a qualidade de segurado; o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais, e a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).

Tendo em vista que a aposentadoria por invalidez pressupõe incapacidade total e permanente, cabe ao juízo se cercar de todos os meios de prova acessíveis e necessários para análise das condições de saúde do requerente, mormente com a realização de perícia médica.

Aos casos em que a incapacidade for temporária, ainda que total ou parcial, caberá a concessão de auxílio-doença, que posteriormente será convertido em aposentadoria por invalidez (se sobrevier incapacidade total e permanente), auxílio-acidente (se a incapacidade temporária for extinta e o segurado restar com sequela permanente que reduza sua capacidade laborativa) ou extinto (com a cura do segurado).

Após a regulamentação da Reforma da Previdência, instituída pela Emenda Constitucional n.º 103/2019, o auxílio-doença passa a ser chamado de auxílio por incapacidade temporária, denominação inserida no Regulamento da Previdência Social (Decreto n.º 3.048/99, art. 71) pelo Decreto n.º 10.410, de 30.06.2020, enquanto a aposentadoria por invalidez passa a ser designada como aposentadoria por incapacidade permanente (Decreto n.º 3.048/99, art. 43, com a redação dada pelo Decreto n.º 10.410, de 30.06.2020).

Quanto ao período de carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício), estabelece o artigo 25 da Lei de Benefícios da Previdência Social:

Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência:

I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 contribuições mensais;

Na hipótese de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições, prevê o artigo 15 da Lei nº 8.213/91 o denominado "período de graça", que permite a prorrogação da qualidade de segurado durante um determinado lapso temporal:

Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:

I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;

II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;

III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;

IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;

V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;

VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.

1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.

2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.

4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.

Decorrido o período de graça, as contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado somente serão computadas para efeitos de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, conforme o caso, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido (ao tempo da vigência do art. 24, § único, da Lei 8.213/91) ou metade daquele número de contribuições (nos termos do art. 27-A da Lei n.º 8.213/91, incluído pela Lei nº 13.457, de 27.06.2017, e com a redação atual dada pela Lei nº 13.846, de 18.06.2019).

A concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação, por meio de exame médico-pericial, da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado, e terá vigência enquanto essa condição persistir. Ainda, não obstante a importância da prova técnica, o caráter da limitação deve ser avaliado conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso porque não se pode olvidar de que fatores relevantes - como a faixa etária do requerente, seu grau de escolaridade e sua qualificação profissional, assim como outros - são essenciais para a constatação do impedimento laboral e efetivação da proteção previdenciária.

Dispõe, outrossim, a Lei nº 8.213/91 que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito ao benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão.

Caso Concreto

A parte autora, segurada, conforme se declara, passadeira, nascida em 18.10.1996, grau de instrução 8ª série primária, residente e domiciliada na Rua Imbirucu, n° 1020, em Quedas do Iguaçu/PR, pede o benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez desde a Data de Entrada do Requerimento na via administrativa (DER em 05.11.2018), alegando encontrar-se incapacitada para as atividades laborativas.

A sentença julgou improcedente o pedido entendendo que a parte autora não demonstrou o cumprimento do período de carência, tendo vertido apenas uma contribuição ao RGPS.

A parte autora sustenta que por se tratar de pedido de benefício relacionado à gravidez de risco é isenta da carência.

Considerando a perícia judicial (ev. 83 - out2), realizada em 07.12.2019, a parte autora apresentou gravidez de risco, CID 026.9, encontrando-se sem incapacidade laborativa. Informa que a autora "REFERE QUE INICIOU COM GRAVIDEZ DE RISCO EM OUTUBRO DE 2018. NO MOMENTO NÃO HÁ INCAPACIDADE ". No item "histórico o perito anotou que a periciada referiu que trabalhou por um mes e parou de trabalhar em outubro de 2018 devido à gravidez de risco, realizada cesárea em 16 de abril de 2019:

Cumpre salientar que a prova se direciona ao magistrado, ao qual incumbe aferir da suficiência do material probatório produzido para a entrega da prestação jurisdicional. Com efeito, o julgador, via de regra, firma sua convicção com base no laudo do expert, embora não esteja jungido à sua literalidade, sendo-lhe facultada ampla e livre avaliação da prova.

O laudo pericial administrativo reconheceu a incapacidade laborativa da parte autora no período de 11.10.2018 a 20.04.2019:

Impede verificar a condição de segurada na data de início da incapacidade laborativa fixada em 11.10.2018, quando efetivamente constatada.

O Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) registra que a autora se filiou ao RGPS na condição de empregada em 01.12.2017, mantendo o vínculo até 22.01.2018. Voltou a verter contribuições na condição de empregada 25.06.2018:

Extrai-se do CNIS que a autora, em princípio, não detinha a carência aplicável à generalidade dos trabalhadores/segurados, na data de início da incapacidade laboral.

Importante averbar que a dispensa de carência está prevista para determinadas situações. Com efeito, à luz do artigo 26, inciso II, da Lei nº. 8.213/91, independe de carência a concessão das seguintes prestações de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez dentre outras hipóteses:

Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:

(...)

II - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como nos casos de segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, atualizada a cada 3 (três) anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado; (Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015)

A Instrução Normativa nº 77/PRES/INSS/2015, vigente à época, relaciona as moléstias que dispensam o cumprimento de carência para efeitos de benefício previdenciário:

Percebe-se desse rol que a legislação previdenciária procura prestar especial proteção para hipóteses de súbito agravamento das condições de saúde, onde se percebe presente, mas não se limitando a isso, o risco de vida.

Assim, a questão jurídica a se definir é a possibilidade, ou não, da dispensa da carência na hipótese de gravidez de risco, na medida em que o diagnóstico não está relacionado na mencionada Instrução Normativa.

O princípio da solução da questão exige que se tenha em mente que a gravidez, prenuncio da maternidade, é sem dúvida nenhuma um dos momento mais significativos da existência humana. Pressuposto da continuidade da humanidade, carrega no curto período as expectativas do processo reprodutivo para o qual se uniram homem e mulher, ou, atualmente, se uniram gametas masculinos e femininos direcionados à continuidade da espécie, com a realização de inúmeros interesses morais, familiares, econômicos, etc, tanto pessoais como sociais ou coletivos. Desnecessário afirmar que o próprio Estado tem interesse na maternidade e mantença de taxas mínimas permanentes, como medida de sobrevivência, também, do Estado.

Outro ponto a ter em mente, é que a gravidez, paralelamente, submete a mulher à uma condição fática especial, sob aspectos emocionais, familiares, sociais, trabalhista e biológicos. A aceitação universal dessa realidade pode ser extraída da Convenção nº 103 da Organização Internacional do Trabalho, voltada ao Amparo à Maternidade, internalizada por meio do Dec. nº. 58.820/66, de 14.7.66, consolidada pelo Dec. nº 10.088/2019.

Dita convenção consagra ampla proteção à mulher gestante e lhe confere garantias específicas do pré-natal ao parto e objetiva sobretudo evitar a discriminação das mulheres por razões de casamento ou maternidade, assegurando-lhe a efetividade do direito ao trabalho (art. II). No caso de doença confirmada por atestado médico como resultante da gravidez, o art. III - 5, da Convenção estipula a ampliação da licença, preconizando à gestante prestações em espécie e a assistência médica no caso de licença em virtude da gravidez (art. IV -1), dentre outras garantias elencadas na bojo do dispositivo.

Por sua vez, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979, promulgada pelo Dec. 4377/2002, preconiza amplo resguardo dos direitos à maternidade, como também daquelas estabelecidas na Convenção 102 da OIT vigente no Brasil a partir de 15.06.2009, descritas, pela ordem:

1. Os Estados-Partes adotarão todas as medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra a mulher na esfera do emprego a fim de assegurar, em condições de igualdade entre homens e mulheres, os mesmos direitos, em particular:

a) (...)

2. A fim de impedir a discriminação contra a mulher por razões de casamento ou maternidade e assegurar a efetividade de seu direito a trabalhar, os Estados-Partes tomarão as medidas adequadas para:

a) Proibir, sob sanções, a demissão por motivo de gravidez ou licença de maternidade e a discriminação nas demissões motivadas pelo estado civil;

b) Implantar a licença de maternidade, com salário pago ou benefícios sociais comparáveis, sem perda do emprego anterior, antiguidade ou benefícios sociais;

c) Estimular o fornecimento de serviços sociais de apoio necessários para permitir que os pais combinem as obrigações para com a família com as responsabilidades do trabalho e a participação na vida pública, especialmente mediante fomento da criação e desenvolvimento de uma rede de serviços destinados ao cuidado das crianças;

d) Dar proteção especial às mulheres durante a gravidez nos tipos de trabalho comprovadamente prejudiciais para elas.

(...)

Artigo 12

(...)

2. Sem prejuízo do disposto no parágrafo 1o, os Estados-Partes garantirão à mulher assistência apropriadas em relação à gravidez, ao parto e ao período posterior ao parto, proporcionando assistência gratuita quando assim for necessário, e lhe assegurarão uma nutrição adequada durante a gravidez e a lactância.

Convenção nº 102:

Art. 46 — O Membro para o qual a presente Parte da convenção estiver em vigor, deve assegurar prestações de maternidade às pessoas amparadas, de acordo com os seguintes artigos desta Parte.

Art. 47 — O evento coberto será a gravidez, o parto e suas consequências, bem como a suspensão de ganhos daí decorrente tal como se achar definida na legislação nacional.

Nessa perspectiva, a internalização desses compromissos internacionais convencionais, importa no dever da integração dessas perspectivas protetivas ao direito nacional.

Não há como se reconhecer cumprimento aos compromissos advindos da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, que em seu art. 2, alínea "a" e "d", senão proibindo alterações prejudiciais às condições de trabalho, de benefícios sociais e previdência que tenham a gravidez como fator desencadeante ou contributivo, sem que se forneça de modo amplo a proteção previdenciária. E mais, não há como se reconhecer o cumprimento da obrigação de direito internacional, ja internalizada no direito pátrio, de se " d) Dar proteção especial às mulheres durante a gravidez nos tipos de trabalho comprovadamente prejudiciais para elas", quando exames indicam que a gravidez é de risco, ou seja, onde qualquer trabalho pode ser prejudicial à gestante e feto.

Desnecessário, outrossim, pontuar, ainda no que pertine a impossibilidade de exigência do cumprimento de todo um período de carência, como pressuposto da proteção previdenciária, porque uma cautela assim estabelecida colimaria com primazia à proteção atuarial do sistema de previdência, em desprestigio do compromisso de proteção especial da maternidade, em evidente inversão de prioridades.

E finalmente, para que muito não se estenda, ainda no que pertine a desnecessidade de carência para o amparo à gravidez de risco, por ser fenômeno natural e ocasional não pode ser restringido e muito menos imposto a período específico, como que sujeitado-o as leis da natureza às ficções dos processos legislativos.

Observo, sobre outro aspecto, não menos importante, que a Constituição Brasileira, e legislação infraconstitucional, já observam a recepção desses valores, quando se prevê no Art. 7º, XVIII e Art. 227, do texto Constitucional, e no art. 2º do Código Civil Brasileiro, tanto a proteção da gestante, quando do nascituro, binômio protetivo que somente pode concluir pela necessidade do sistema jurídico ofertar completa proteção à gestante e ao nascituro, conforme preconizam os compromissos internacionais antes aludidos:

Art. 7º da Constituição Federal:

7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I - (...)

XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias;

(...)

Art. 2º do Código Civil Brasileiro:

Art. 2 o A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

O conjunto de normas objetiva assegurar o direto ao trabalho de mulheres grávidas, particularmente das jovens, por vezes discriminadas quando da contratação, em atenção à condição de gestante para o desenvolvimento saudável da gravidez e do nascimento do filho; não se pode exigir que as mulheres grávidas, presente o risco para si ou para o feto, sejam obrigadas ao trabalho pela ausência de proteção previdenciária no período de gestação, colocando em risco a si e ao nascituro, devendo as hipóteses de dispensa de carência, para fins previdenciário, serem integradas, a partir do direito internacional e do direito interno, para que se inclua a proteção previdenciária na hipótese de gravidez de risco.

Atento a esses ditames de ordem normativa, a jurisprudência deste Tribunal, com precisão, já reconhece direito ao benefício previdenciário quando demonstrada a gravidez de risco, independentemente do tempo de contribuição previdenciária, em homenagem aos preceitos constitucionais de proteção previdenciária especial à maternidade e à gestante.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA. AUXÍLIO-DOENÇA. SEGURADA GESTANTE. CARÊNCIA DISPENSADA. TERMO INICIAL. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. (...) 3. Considerando-se que a gestante tem proteção previdenciária especial garantida pela Constituição Federal, é dispensável a carência para a concessão de auxílio-doença, em se tratando de complicações decorrentes da gravidez. 4. O benefício concedido judicialmente é devido desde a data do requerimento administrativo ou da cessação do benefício, quando nessa data já estiverem preenchidos os requisitos necessários para a concessão. 5. (...) (TRF4 5052422-29.2016.4.04.9999, TRS/PR, Rel. LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, em 19/07/2018)

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. CARÊNCIA. GRAVIDEZ DE RISCO. DISPENSA. marco inicial. juros. 1. Manutenção da sentença que concedeu o auxílio-doença, pois a dispensa da carência prevista no artigo 26 da LBPS deve se estender a casos como o presente em que havia gravidez de risco e também porque não se trata de incapacidade preexistente ao reingresso no RGPS. 2. (...). 3. (...). (TRF4, AC 5026474-80.2019.4.04.9999, SEXTA TURMA, Rel. JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, em 04/06/2020)

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. CARÊNCIA. GESTAÇÃO DE ALTO RISCO. A jurisprudência deste Regional é pacífica no sentido de que a gestação de alto risco afasta a exigência de carência para fins de concessão de benefício de auxílio-doença. (TRF4, AC 5029182-06.2019.4.04.9999, TRS/SC, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, em 21/07/2020)

Dito isso, e demonstrada a incapacidade laborativa em face da gravidez de risco, entendo que a carência deve ser dispensada, consoante fundamentação supra.

Portanto, presente a incapacidade laborativa, é devido a parte autora o benefício de auxílio-doença no período de 11.10.2018 a 16.04.2019. Sentença reformada.

Devidas, também, as parcelas em atraso, descontados pagamentos já realizados a tais títulos e/ou com outros benefícios inacumuláveis.

Consectários da Condenação

Correção Monetária

A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de abril de 2006 (Lei 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei 8.213/91), conforme decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 810, RE 870.947, Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, DJE de 20.11.2017, item "2" (embargos de declaração rejeitados sem modulação dos efeitos em 03.10.2019, trânsito em julgado em 03.03.2020), e do Superior Tribunal de Justiça no Tema 905, REsp. 1.492.221/PR, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 20.03.2018 , item "3.2" da decisão e da tese firmada.

Juros Moratórios

a) os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29.06.2009;

b) a partir de 30.06.2009, os juros moratórios serão computados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/97, consoante decisão do STF no RE 870.947, DJE de 20.11.2017.

Honorários Advocatícios

Os honorários advocatícios são devidos, em regra, no patamar de 10%, observados os percentuais mínimos previstos em cada faixa do § 3º do art. 85 do Código de Processo Civil para as condenações proferidas a partir de 18.03.2016, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, respectivamente:

Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.

Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.

Reformada a sentença e invertida a sucumbência, fixo a verba honorária nos percentuais mínimos previstos em cada faixa do art. 85, § 3º, do Código de Processo Civil, considerando as parcelas vencidas até a data deste julgamento (Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF/4ª Região), e as variáveis do art. 85, § 2º, incisos I a IV, e § 11, do Código de Processo Civil.

Custas

O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96), mas não quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF/4ª Região).

Prequestionamento

Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.

Conclusão

- apelação: provida.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002522153v75 e do código CRC 21131d74.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 2/7/2021, às 15:17:29


5007588-62.2021.4.04.9999
40002522153.V75


Conferência de autenticidade emitida em 10/07/2021 04:01:22.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5007588-62.2021.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: DARA XAVIER PRESTES

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. benefício por incapacidade. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. qualidade de segurado. INCAPACIDADE laboral. GRAVIDEZ DE RISCO. PROVA. Convenção nº 103/oit. DecRETO nº 10.088/2019. Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979. DecRETO 4377/2002. Constituição FEDERAL. Código Civil Brasileiro.

1. São requisitos para a concessão dos benefícios previdenciários por incapacidade: a qualidade de segurado; o cumprimento do período de carência, salvo nos casos excepcionados por lei; e a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença). O segurado portador de enfermidade que o incapacita temporariamente para o exercício de sua atividade laboral tem direito à concessão do benefício de auxílio-doença.

2. A gravidez, prenúncio da maternidade, é um dos momentos mais significativos da existência humana. Pressuposto da continuidade da humanidade, o próprio Estado tem interesse na maternidade e mantença de taxas mínimas permanentes, como medida de sobrevivência, também, do Estado.

3. A Convenção nº 103 da Organização Internacional do Trabalho, voltada ao Amparo à Maternidade, internalizada por meio do Dec. nº. 58.820/66, de 14.7.66, consolidada pelo Dec. nº 10.088/2019, consagra ampla proteção à mulher gestante e lhe confere garantias específicas do pré-natal ao parto e objetiva evitar a discriminação das mulheres por razões de casamento ou maternidade, e no caso de doença confirmada por atestado médico como resultante da gravidez, o art. III - 5, da Convenção estipula a ampliação da licença, preconizando à gestante prestações em espécie e a assistência médica no caso de licença em virtude da gravidez (art. IV -1), dentre outras garantias elencadas na bojo do dispositivo. No mesmo sentido, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979, promulgada pelo Dec. 4377/2002, preconiza amplo resguardo dos direitos à maternidade, como também daquelas estabelecidas na Convenção 102 da OIT vigente no Brasil a partir de 15.06.2009;

4. A internalização desses compromissos internacionais convencionados importa no dever da integração dessas perspectivas protetivas ao direito nacional. A Constituição Brasileira e a legislação infraconstitucional já observam a recepção desses valores, prevendo, no art. 7º, XVIII e art. 227, do texto constitucional, e no art. 2º do Código Civil Brasileiro, tanto a proteção da gestante, quando do nascituro, binômio protetivo que somente pode concluir pela necessidade do sistema jurídico ofertar completa proteção à gestante e ao nascituro, conforme preconizam os compromissos internacionais antes aludidos. Como corolário, deve ser afastada a exigência da comprovação do cumprimento da carência para a concessão de benefício previdenciário no caso de gravidez de risco, devidamente comprovado.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 29 de junho de 2021.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002522154v9 e do código CRC 9b0042a6.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 2/7/2021, às 15:17:29


5007588-62.2021.4.04.9999
40002522154 .V9


Conferência de autenticidade emitida em 10/07/2021 04:01:22.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 22/06/2021 A 29/06/2021

Apelação Cível Nº 5007588-62.2021.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART

APELANTE: DARA XAVIER PRESTES

ADVOGADO: JOÃO MORAIS DO BONFIM (OAB PR021436)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 22/06/2021, às 00:00, a 29/06/2021, às 16:00, na sequência 1248, disponibilizada no DE de 11/06/2021.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 10/07/2021 04:01:22.

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