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PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. MISERABILIDADE. O CRITÉRIO ECONÔMICO PRESENTE NA LOAS NÃO É ABSOLUTO. TRF4. 5009683-25...

Data da publicação: 06/07/2024, 07:01:33

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. MISERABILIDADE. O CRITÉRIO ECONÔMICO PRESENTE NA LOAS NÃO É ABSOLUTO. 1. São dois os requisitos para a concessão do benefício assistencial: condição de pessoa com deficiência/impedimento de longo prazo ou idosa (65 anos ou mais); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, de hipossuficiência econômica ou de desamparo). 2. O critério econômico presente na LOAS (§3º do art. 20 da Lei n.º 8.742/1993 - renda familiar mensal per capita igual ou inferior a 1/4 do salário mínimo) importa presunção de miserabilidade, não impedindo o Julgador, contudo, de concluir nesse mesmo sentido a partir das demais provas do processo. (TRF4, AC 5009683-25.2023.4.04.7112, QUINTA TURMA, Relator ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, juntado aos autos em 28/06/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5009683-25.2023.4.04.7112/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

APELANTE: MARTA VILMA ARAUJO PINTO (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de ação de procedimento comum na qual a parte autora postula o restabelecimento do benefício assistencial NB 543.155.420-0 e a declaração de inexistência de débito.

Foi juntado laudo socioeconômico (evento 30, LAUDO_SOC_ECON1 ).

O réu contestou (evento 21, CONTES1).

Sobreveio sentença (evento 43, SENT1) que julgou o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos:

Ante o exposto, indefiro a tutela de urgência e julgo improcedentes os pedidos veiculados pela parte autora, contra o INSS, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Declaro a inexistência de débito, referente ao NB 543.155.420-0, não sendo devida a respectiva restituição.

Condeno a parte autora ao pagamento de despesas processuais, inclusive eventuais honorários periciais, que, na hipótese de já terem sido requisitados, via sistema AJG, deverão ser ressarcidos à Seção Judiciária do Rio Grande do Sul.

Condeno ainda a parte demandante ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa.

Contudo, resta suspensa a exigibilidade das condenações, por força da gratuidade da justiça, incumbindo ao credor, no prazo assinalado no § 3º do artigo 98 do CPC, comprovar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão do beneplácito.

Não há condenação ao pagamento de custas nos termos do artigo 4º, inciso II, da Lei n.º 9.289/1996.

Apelou a parte autora alega requerendo a reforma da sentença para o fim de julgar totalmente procedente o pedido exordial, restabelecendo o benefício assistencial NB 543.155.420-0 em 31/01/2022, com o pagamento das parcelas vencidas (evento 55, APELAÇÃO1).

Com contrarrazões (evento 63, CONTRAZ1), vieram os autos a esta Corte.

Oportunizada a manifestação do Ministério Público Federal.

É o breve relatório.

VOTO

Admissibilidade

Recurso adequado e tempestivo. Apelante isenta de custas, nos termos do art. 4º, II, da Lei 9.289/1996.

Benefício Assistencial

Assim dispõe o art. 203 da Constituição Federal:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

(...)

V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

Referida garantia foi regulamentada pelo art. 20 da Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), que com as alterações legislativas posteriores tem a seguinte redação:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)

§ 3o Observados os demais critérios de elegibilidade definidos nesta Lei, terão direito ao benefício financeiro de que trata o caput deste artigo a pessoa com deficiência ou a pessoa idosa com renda familiar mensal per capita igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 14.176, de 2021)

De acordo com as disposições transcritas, o direito ao benefício assistencial deve ser analisado sob dois aspectos: (a) pessoal (pessoa com deficiência/impedimento de longo prazo ou idosa com 65 anos ou mais) e (b) socioeconômico (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou desamparo).

Assim dispõe o art. 34 e parágrafo único da Lei 10.741/03:

Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas.

Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas.

Já nos termos do art. 20, §2º, transcrito, a deficiência, embora definida inicialmente como a incapacidade para a vida independente e para o trabalho, com as alterações legislativas o critério incapacidade para o trabalho foi superado, passando a pessoa com deficiência a ser definida como a que possui impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Impedimento de longo prazo, ao seu turno, considera-se aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos (art. 20, §10).

Em relação à criança e ao adolescente menor de dezesseis anos com deficiência, deve ser avaliado também o impacto da deficiência na limitação do desempenho de atividade e restrição da participação social, compatível com a idade (art. 4º, §1º, do Decreto 6.214/07, com a redação do Decreto 7.617/2011).

Conceito de família e aspecto socieconômico

Em relação ao aspecto socioeconômico, embora a redação original do art. 20, §3º, estabelecesse como hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário-mínimo, tal critério foi flexibilizado no julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça do REsp 1.112.557/MG (tema 185 dos recursos repetitivos), no qual firmada tese de que a aferição da miserabilidade poderia se dar por outros meios de prova.

Quanto ao ponto, as Leis 13.146/15 e 14.176/21 introduziram os §11 e §11-A ao art. 20 citado, dispondo que § 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento. § 11-A. O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal familiar per capita previsto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o disposto no art. 20 -B desta Lei.

Em síntese, a renda per capita inferior a 1/4 de salário-mínimo, como critério balizador da aferição do quadro de risco social, importa presunção de miserabilidade, não impedindo o Julgador, contudo, de concluir nesse mesmo sentido a partir das demais provas do processo.

A partir da alteração promovida pela Lei 12.435/11 na Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS, o conceito de família compreende: o requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

Quanto aos filhos maiores de idade e capazes, importante refletir sobre a responsabilidade que têm com os membros idosos da família. Uma vez que o benefício em questão, tratado no art. 203, V, da CF, garante um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência ou idosa que comprove não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua família, não seria razoável excluir a renda do filho maior e capaz que aufere rendimentos, uma vez que este tem responsabilidade com seus genitores idosos.

Por outro lado, considerar aqueles filhos maiores e capazes que não auferem renda para fins de grupo familiar seria beneficiá-los com uma proteção destinada ao idoso, ou seja, estariam contribuindo para a implementação dos requisitos do benefício (cálculo da renda per capita) sem contribuir para o amparo de seus ascendentes. Logo, tem-se que devem ser computados no cálculo da renda per capita tão somente os filhos que possuem renda.

A jurisprudência das Cortes Superiores orienta, ainda, que devem ser excluídos do cômputo da renda familiar per capita para concessão de benefício assistencial, a partir de interpretação do art. 34 da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso), (i) o valor recebido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou de benefício previdenciário de renda mínima; (ii) o valor de um salário-mínimo de benefício previdenciário de montante superior recebido por pessoa idosa e (iii) o benefício assistencial recebido por pessoa com deficiência de qualquer idade integrante do grupo familiar.

Nesse sentido, a decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 580.963/PR (tema 312 da repercussão geral):

Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. (...) 4. A inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34, parágrafo único, que o benefício assistencial já concedido a qualquer membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. Não exclusão dos benefícios assistenciais recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de até um salário mínimo, percebido por idosos. Inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo. Omissão parcial inconstitucional. 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. 6. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (RE 580963, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-225 DIVULG 13-11-2013 PUBLIC 14-11-2013)

Também a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça julgou a questão pela sistemática dos recursos repetitivos no REsp 1.355.052/SP (tema 640), nesses termos:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO. 1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente. 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93. 3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008. (REsp 1355052/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/11/2015)

Anote-se que suprimida renda de integrante do grupo, também este não será considerado na composição familiar para efeito do cálculo da renda per capita.

Por fim, destaca-se que o art. 21 da Lei 8.742/1993 prevê a revisão periódica do benefício assistencial a cada dois anos, a fim de avaliar a continuidade das condições que deram origem ao benefício, possibilitando assim, a suspensão do benefício quando constatada, após processo administrativo adequado que observe as garantias do contraditório e ampla defesa, significativa alteração da situação fática relativamente ao aumento da renda per capita do núcleo familiar.

Caso concreto

O atendimento do quesito pessoal é incontroverso.

A insurgência recursal assenta-se apenas na improcedência do pedido de restabelecimento do benefício, já que a inexigibilidade do débito foi reconhecida na sentença.

No que tange à análise da situação socioeconômica do grupo familiar, as informações colhidas em Estudo Social (evento 30, LAUDO_SOC_ECON1) indicam as seguintes condições:

6 – Contextualização familiar e socioeconômica

Segundo o Sr. Luis Carlos, mantém união estável com a autora há 33 anos; a mesma sofre com a epilepsia e convulsões; a moradia localiza-se mais próxima da saída do bairro e dos equipamentos: UPA 24 hs e UBS CAIC

Contou que está tentando manter o cuidado com a companheira, como também, as suas atividades laborativas como autônomo (construção civil), a fim de perceber alguma renda mensal; tem buscado várias estratégias para que a Sra. Marta Vilma esteja sob proteção e vigilância; contratou uma pessoa para preparar alimentação, fazer companhia (R$300,00 por semana) quando está no trabalho. Preocupa-se em priorizar as questões financeira, de saúde, alimentação e habitabilidade.

A autora trabalhou por 4 anos, formalmente, no setor de comércio e serviços, como ajudante de cozinha em Canoas; devido às crises epilépticas constantes, perdeu o emprego e não conseguiu recolocar-se no mercado de trabalho.

O Sr. Luis Carlos, atualmente, está trabalhando informalmente na construção civil (receberá pagamento de mais 2 parcelas de R$600,00); contou que desde 2016 não conseguiu emprego formal; iniciou a trabalhar como autônomo, sendo que um cliente sugeriu formalizar como MEI-Microempreendedor individual; tem uma dívida de R$2.000,00 na Receita Federal, pois o contador não realizou o pagamento da contribuição em 2022. Até o final de 2022 recebia o Auxílio Brasil de R$600,00. Pagam aluguel de R$650,00.

Expôs que fez um empréstimo em jan/2023 de R$1.000,00 e paga através da conta de luz (parcelas de R$180,00). Também recorreu a outro empréstimo pelo cartão de crédito do Banco Senff (dívida de R$630,00) em 3 parcelas de R$224,87. Fez renegociação pelo Programa Desenrola Brasil. Conforme justificativa do Sr. Luis Carlos, precisou do dinheiro para comprar alimentos e remédio.

Observou-se que o casal não dispõe de rede interna e externa de apoio; o Sr. Luis Carlos procura otimizar o tempo para conseguir prestar o cuidado e assistência à companheira (utiliza bicicleta para locomover-se rapidamente do trabalho até a residência; ajuda na alimentação; administra alguma medicação).

O companheiro expôs que o casal tive 7 filhos: Catiane Pinto Pinheiro, CPF022613940-98; Cristiano Pinto Pinheiro, CPF024313140-22; Carine Pinto Pinheiro, CPF854925230-91; Keli Pinto Pinheiro, CPF85925230-15. Os filhos não auxiliam financeiramente aos pais; sem convivência; houve o rompimento dos vínculos afetivos. Conforme informou Catiane, os outros 3 irmãos foram adotados, tem outros núcleos familiares.

Tem cadastro no CRAS Guajuviras-Nordeste (Rua 5, 20 Quadra R, setor 5 - Guajuviras, Canoas - RS, 91040-070). Conforme informou o Sr. Luis Carlos, não atualizou dados no Cadastro Único; apresentando como razões, a necessidade de trabalhar e priorizar o cuidado da companheira; o casal não recebe nenhum benefício eventual.

No contexto de vida da autora, a condição de endividamento, vulnerabilidade material e financeira e de saúde, impactaram no processo relacional familiar de afeto, na ruptura de vínculo com os filhos, na aceleração da deficiência mental da autora, refletindo na dificuldade nas relações interpessoais, na sobrecarga de cuidados impostas ao companheiro, constituindo-se adversidades e barreiras para os tratamentos, sociabilidade e autonomia.

7 – Condição de saúde da Sra. Marta Vilma Araujo Pinto

A autora tem diagnóstico de Alzheimer e Epilepsia condição que causa convulsões (Evento 12 - LAUDO4); é dependente nos vários âmbitos de vida: não pode fazer nenhuma atividade doméstica, não pode ficar sozinha, por causa de risco de queda ( já quebrou a perna esquerda; atendimento pelo SAMU - Evento 1-LAUDO2); não pratica ou cuida de atos de sua vida civil; não toma decisões, não consegue realizar nenhuma atividade para geração de renda. Demonstrou-se incomodada, humor bastante depressivo e irritável; ao perguntarmos sobre a origem da tristeza, demonstrou-se tensa e desconfortável, parou de falar; manteve a estereotipia de movimento pendular; está sob efeito de medicamento anticonvulsivante e sedativo.

Precisa usar transporte por aplicativo quando desloca-se para atendimento, exames e consultas (limitação da mobilidade: de subir no ônibus por causa da perna, tonturas e desorientação); utiliza fraldas quando acontecem os eventos convulsivos e nas internações. Utiliza a UBS CAIC (Av. Dezessete de Abril, 241 - Guajuviras, Canoas - RS, 92415-000) na clínica geral e odontologia (risco asfixia/não pode usar dentadura durante a crise); UPA 24 hs Nordeste (Av. Boqueirão, 2900 - 4 Estância Velha, Canoas - RS, 92032-130) e Hospital de Pronto Socorro de Canoas (R. Caçapava, 100 - Mathias Velho, Canoas - RS, 92330-290) para atendimento nas crises epilépticas; SAMU (R. Florianópolis, 1716 - Mathias Velho, Canoas - RS, 92330-500).

Tem atendimentos no Hospital da ULBRA (Av. Farroupilha, 8001 - São José, Canoas - RS, 92425-020) para tratamento de fisioterapia; fez cirurgia por causa de fratura na perna esquerda há 3 anos. No CAPS Recanto do Girassol (R. Guilherme Morsch, 278 - Centro, Canoas - RS, 92310-080) recebeu alguns atendimentos, mas a autora está resistente em vincular com o serviço; em momentos de lucidez, disse que não quer ser institucionalizada. Faz uso continuado de Fenobarbital 100 mg. O Sr. Luis Carlos justificou que há falta do medicamento na Farmácia Municipal e, também há filas e demora no atendimento; precisa levar a companheira Marta Vilma junto; não a deixar sozinha. Adquire as medicações em farmácia particular (R$75,00).

8 – Infraestrutura e condições gerais de habitabilidade e moradia

O núcleo familiar mudou-se há 2 semanas para a casa alugada (R$650,00). O casal mudou-se para o novo endereço, a fim de que a moradia pudesse estar mais próxima da saída do bairro e dos equipamentos: UPA 24 hs e UBS CAIC. A moradia é de alvenaria; tem 4 cômodos (sala, cozinha, banheiro, quarto e um pequeno pátio). A moradia é pequena, geminada com a casa do proprietário. Atende minimamente às necessidades da família; necessita de manutenção e reparos. Tem o mínimo de mobiliário básico e de características simples; o Sr. Luis Carlos ainda está organizando e instalando os móveis; não há pia na cozinha. O lugar tem infraestrutura (rede de esgoto, água, luz, transporte público, iluminação). Dispõe de equipamentos de saúde e assistência social.

A apelante recebe benefício assistencial desde 2010, o qual foi suspenso em razão de indício de irregularidade, consistente em renda per capita familiar superior ao teto legal.

A autora possui diagnóstico de Alzheimer e Epilepsia e tem suas necessidades providas pelo companheiro, que trabalha na construção civil.

Analisando o Extrato Previdenciário deste, verifica-se que ele auferiu durante o período em discussão, renda de cerca de um salário mínimo, como empregado e mais recentemente com contribuinte individual (evento 21, OUT4, págs. 10/15).

Estando a renda familiar per capita acima de 1/4 de salário mínimo, não se presume a miserabilidade do núcleo familiar e deve-se averiguar a situação de fato em que a família vive. Dentre os elementos trazidos no Estudo Social, destaco que a autora necessita de acompanhamento permanente de terceiros em razão de sua doença.

Sendo o grupo familiar formado apenas por ela e seu companheiro, que precisa contratar uma pessoa para os cuidados com a apelante enquanto ele trabalha, despendendo trezentos reais por semana, já se verifica um significativo comprometimento da renda familiar que justifica a necessidade do benefício assistencial para suprir as necessidades básicas da recorrente.

Além disso, há despesas com alimentação, medicamentos e fraldas, bem como notícia de superendividamento que levou à impossibilidade de adimplir despesas com aluguel.

Entendo, portanto, estar bem caracterizado o risco social a que está submetido o autor, frente à demonstrada hipossuficiência econômica, miserabilidade ou situação de abandono.

Atendidos os requisitos pessoal e socioeconômico, deve ser restabelecido o benefício assistencial, com pagamento das parcelas devidas desde o cancelamento.

Correção monetária e juros de mora

A partir do julgamento definitivo pelo Supremo Tribunal Federal do tema 810 da repercussão geral (RE 870947) e pelo Superior Tribunal de Justiça do tema 905 dos recursos repetitivos (REsp 1495146), bem como das alterações veiculadas pela EC 113/2021, as condenações judiciais de natureza assistencial sujeitam-se à atualização monetária pelo IPCA-E até o advento da EC 113/2021 e aos juros de mora, incidentes desde a citação (súmula 204 do STJ), de forma simples (não capitalizada), com a observância dos seguintes índices e períodos:

- 1% ao mês até 29/06/2009;

- a partir de 30/06/2009, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009) até o advento da EC 113/2021.

A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao art. 3º da EC 113/2021, a qual estabelece que, nas discussões e condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente. As eventuais alterações legislativas supervenientes devem ser igualmente observadas.

Ressalte-se, a fim de evitar recorrentes embargos declaratórios, que não há que se cogitar de violação aos Temas 810/STF e 905/STJ em razão da aplicação da SELIC, uma vez que o julgamento da questão pelo tribunais superiores não impede a alteração pelo poder constituinte derivado, cujo poder de reforma está limitado materialmente apenas às hipóteses previstas no art. 60, §4º, da Constituição Federal.

Honorários Advocatícios

Reformada a sentença e invertida a sucumbência, fixo os honorários advocatícios nos percentuais mínimos previstos em cada faixa do art. 85, § 3º, do Código de Processo Civil, considerando as parcelas vencidas até a data deste julgamento, nos termos da súmula 76 do TRF/4ª Região, e as variáveis do art. 85, § 2º, incisos I a IV, do Código de Processo Civil.

Honorários Recursais

Incabível a majoração de honorários, na forma do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, à vista da inversão dos ônus sucumbenciais.

Tutela Específica

Nos termos do art. 497, caput, do CPC e considerando que os recursos excepcionais, em princípio, não possuem efeito suspensivo (TRF4, Terceira Seção, Questão de Ordem na AC 200271000503497, Rel. p/ acórdão Celso Kipper, j. 09/08/2007), assim como eventuais embargos de declaração (art. 1.026 do CPC), o julgado deve ser cumprido imediatamente no tocante à implantação do benefício da parte autora, no prazo de 20 dias úteis, a partir da intimação deste.

Verificando-se que a parte autora está em gozo de benefício previdenciário, o INSS não deverá implementar a tutela específica ora deferida.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTORestabelecer Benefício
NB5431554200
ESPÉCIE
DIB01/02/2022
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Conclusão

Em conclusão, o recurso comporta provimento.

Prequestionamento

O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal e a análise da legislação aplicável são suficientes para prequestionar, às instâncias superiores, os dispositivos que as fundamentam. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração para esse exclusivo fim, o que evidenciaria finalidade de procrastinação do recurso, passível, inclusive, de cominação de multa, nos termos do art. 1.026, §2º, do CPC.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004481631v19 e do código CRC 0594d282.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Data e Hora: 28/6/2024, às 19:40:27


5009683-25.2023.4.04.7112
40004481631.V19


Conferência de autenticidade emitida em 06/07/2024 04:01:32.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5009683-25.2023.4.04.7112/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

APELANTE: MARTA VILMA ARAUJO PINTO (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. MISERABILIDADE. O CRITÉRIO ECONÔMICO PRESENTE NA LOAS NÃO É ABSOLUTO.

1. São dois os requisitos para a concessão do benefício assistencial: condição de pessoa com deficiência/impedimento de longo prazo ou idosa (65 anos ou mais); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, de hipossuficiência econômica ou de desamparo).

2. O critério econômico presente na LOAS (§3º do art. 20 da Lei n.º 8.742/1993 - renda familiar mensal per capita igual ou inferior a 1/4 do salário mínimo) importa presunção de miserabilidade, não impedindo o Julgador, contudo, de concluir nesse mesmo sentido a partir das demais provas do processo.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 27 de junho de 2024.



Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004481632v3 e do código CRC 97c42870.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Data e Hora: 28/6/2024, às 19:40:27


5009683-25.2023.4.04.7112
40004481632 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 06/07/2024 04:01:32.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/06/2024 A 27/06/2024

Apelação Cível Nº 5009683-25.2023.4.04.7112/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PROCURADOR(A): JANUÁRIO PALUDO

APELANTE: MARTA VILMA ARAUJO PINTO (AUTOR)

ADVOGADO(A): JULIANA LEGUNES NENES (OAB RS109964)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/06/2024, às 00:00, a 27/06/2024, às 16:00, na sequência 726, disponibilizada no DE de 11/06/2024.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

LIDICE PENA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 06/07/2024 04:01:32.

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