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PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS HIDROCARBONETOS. NÍVEIS DE CONCENTRAÇÃO DOS AGENTES QUÍMICOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. EPIS. APOSEN...

Data da publicação: 08/03/2024, 07:17:09

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS HIDROCARBONETOS. NÍVEIS DE CONCENTRAÇÃO DOS AGENTES QUÍMICOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. EPIS. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. 1. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos e a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância vigentes à época da prestação do labor enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial. 2. Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários. 3. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Precedentes desta Corte. 4. Não havendo provas consistentes de que o uso de EPIs neutralizava os efeitos dos agentes nocivos a que foi exposto o segurado durante o período laboral, deve-se enquadrar a respectiva atividade como especial. A eficácia dos equipamentos de proteção individual não pode ser avaliada a partir de uma única via de acesso do agente nocivo ao organismo, como luvas, máscaras e protetores auriculares, mas a partir de todo e qualquer meio pelo qual o agente agressor externo possa causar danos à saúde física e mental do segurado trabalhador ou risco à sua vida. 5. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria especial. (TRF4, AC 5061245-46.2022.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relatora ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA, juntado aos autos em 29/02/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5061245-46.2022.4.04.7100/RS

RELATORA: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: JANETE TERESINHA RENCK (AUTOR)

ADVOGADO(A): YOSHIAKI YAMAMOTO KIYAMA (OAB RS120348)

ADVOGADO(A): ATILA MOURA ABELLA

RELATÓRIO

Trata-se de apelações contra sentença publicada na vigência do Código de Processo Civil de 2015, em que foram julgados parcialmente procedentes os pedidos, com dispositivo de seguinte teor:

a) DECLARAR a especialidade do tempo de serviço laborado entre 18/07/1991 a 06/02/1998 e de 17/11/1998 a 24/06/2008 e DETERMINAR a sua averbação como tal pelo INSS;

b) DETERMINAR a implantação da APOSENTADORIA MAIS VANTAJOSA a partir de 18/11/2019, com RMI a ser calculada pelo INSS;

c) CONDENAR o INSS ao pagamento das parcelas vencidas, corrigidas na forma da fundamentação.

Ainda, DEFIRO a tutela provisória de evidência, com base no artigo 311, IV do Código de Processo Civil, para determinar ao INSS a imediata implantação do benefício.

Oficie-se diretamente ao INSS (CEAB-DJ-SR3 Cumprimento) para que comprove o cumprimento da tutela de evidência concedida nos autos, no prazo de 20 (vinte) dias, nos termos da súmula que segue ao final, apresentando o INFBEN e o CONBAS do benefício implantado/restabelecido.

Despesas com perícia técnica a serem integralmente ressarcidas pelo INSS, porquanto, deu causa ao ajuizamento da ação.

As partes são isentas de custas (art. 4, I, da Lei 9.289/96).

Condeno à parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10%, tendo por base de cálculo a parcela não acolhida no pedido, a ser apurada, suspensa a exigibilidade enquanto beneficiária da AJG.

Deixo de condenar o INSS ao pagamento de honorários de sucumbência, considerando a inexistência de contestação ao pedido de reafirmação da DER, nos termos da fundamentação.

A parte autora recorreu alegando ter sido comprovada a atividade especial no interregno de 05/01/2010 a 24/07/2019, com a consequente outorga da aposentadoria especial, desde a DER.

O INSS, por seu turno, apelou sustentando a impossibilidade de reconhecimento da natureza especial do labor prestado nos intervalos de 18/07/1991 a 06/02/1998 e 17/11/1998 a 24/06/2008, ante a ausência de informação quanto ao nível de concentração dos agentes químicos, bem como em decorrência da utilização de EPIs eficazes.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.

Mérito

Não estando o feito submetido ao reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se:

- ao reconhecimento da especialidade das atividades desenvolvidas nos períodos de 18/07/1991 a 06/02/1998, de 17/11/1998 a 24/06/2008 e de 05/01/2010 a 24/07/2019;

- à consequente concessão de aposentadoria especial, a contar da DER (24/07/2019).

Da atividade especial

A r. sentença proferida pelo MM. Juiz Federal Lademiro Dors Filho, bem analisou as questões controvertidas nos intervalos de 18/07/1991 a 06/02/1998 e de 17/11/1998 a 24/06/2008, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis:

"(...)

Do caso dos autos

A parte autora postula o reconhecimento da especialidade dos seguintes períodos:

1) Período: 18/07/1991 a 06/02/1998 Empresa: Musa Calçados Ltda. Cargo: Serviços Gerais/Trabalhador Polivalente (indústria calçadista) Provas: CTPS, CNIS, comprovante de situação cadastral no CNPJ, PPP e laudo técnico

O PPP foi apresentado no evento 01, PROCADM4, página 28 e comprova o exercício da atividade de serviços gerais no setor de costura em empresa de fabricação de calçados.

Realizada perícia em estabelecimento similar, o perito constatou (evento 36):

Musa Calçados Ltda 18/07/1991 a 06/02/1998 Trabalhava, de forma habitual e permanente, como serviços gerais/trabalhador polivalente. Consistia em: -Aplicar cola à base de hidrocarbonetos (hexano e tolueno)*1, com auxílio de pincel, em partes de calçados em couro para posterior montagem. O contato com a cola era diário, tanto por via dermal quanto respiratório, por toda a jornada de trabalho.

Portanto, o período deve ser considerado como tempo de serviço especial com base no código 1.2.11 do Decreto 53.831/64 e 1.0.3 do Decreto 2.172/97.

2) Períodos: 17/11/1998 a 24/06/2008 | 05/01/2010 a 24/07/2019 Empresa: A. Grings. S.A. Cargo: Auxiliar de Seção de Oficina Provas: CTPS, CNIS, PPP, comprovante de situação cadastral no CNPJ e laudo técnico

O PPP foi apresentado no evento 01, PROCADM4, página 67.

Realizada perícia técnica no estabelecimento empregador por profissional de confiança deste juízo e equidistante das partes, restou constatado (evento 36):

A. Grings. S.A 17/11/1998 a 24/06/2008 05/01/2010 a 24/07/2019 Trabalhava, de forma habitual e permanente, como auxiliar de seção de oficina. Consistia em: -Costurar tiras de chinelo, com auxílio de máquina de costura industrial. Atividade realizada por cerca de 50% da jornada de trabalho, -Recolher peças cortadas na máquina de corte de palmilhas, embalar e destinar a caixa de transporte. Atividade realizada por cerca de 30% da jornada, -Aplicar colas*2, com auxílio de pincel, em partes de calçados em couro para posterior montagem. Atividade realizada por cerca de 20% da jornada. As atividades eram realizadas em rodízio, dependendo da demanda de cada setor.

*2 – Segundo informações da representante da empresa, as colas à base de tolueno e hexano foram utilizadas na empresa até final de 2008, após, passaram a utilizar somente colas sem tolueno. Não foram fornecidos laudos de avaliação de químicos relativos aos períodos de trabalho da autora.

A. Grings. S.A

17/11/1998 a 24/06/2008

Avaliação da exposição ocupacional ao ruído

-medições atuais na empresa: 78,56 dB(A)* Sem fornecimento de EPI. * Recolhendo peças, 30%: 80,3 dB(A) – Colando, 20%: 75,4 dB(A) – Costurando, 50%: 78,4 dB(A)

Anexo XIII - Agentes Químicos – HIDROCARBONETOS E OUTROS COMPOSTOS DE CARBONO

- Emprego de produtos contendo hidrocarbonetos aromáticos como solventes ou em limpeza de peças. Na operação em que passava cola para montagem dos calçados. Sem fornecimento de EPI.

05/01/2010 a 24/07/2019 Avaliação da exposição ocupacional ao ruído -medições atuais na empresa: 78,56 dB(A)*

Sem fornecimento de EPI.

* Recolhendo peças, 30%: 80,3 dB(A) – Colando, 20%: 75,4 dB(A) – Costurando, 50%: 78,4 dB(A)

(...)

-05/01/2010 a 24/07/2019, trabalhado na A. Grings. S.A, não há exposição a agentes insalubres acima dos graus de tolerância caracterizados na Norma Regulamentadora 15, seja por não terem atingidos os limites, seja pela utilização de EPI’s capazes de elidir os riscos detectados ou pela eventualidade de exposição.

Acolho o parecer pericial em detrimento dos documentos apresentados.

O perito de confiança do juízo é pessoa equidistânte das partes e avaliou todas as eventuais possibilidade de exposição a agentes nocivos.

Nos termos do laudo pericial, a parte autora laborou exposta a agentes químicos no período de 17/11/1998 a 24/06/2008, o que autoriza o reconhecimento da especialidade com base no código 1.0.3 do Decreto 2.172/97.

Já no período de 05/01/2010 as 24/07/2019, não laborou exposto a agentes nocivos.

(...)"

Níveis de concentração dos agentes químicos

Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos - tóxicos orgânicos e inorgânicos - , diferentemente do que ocorre com alguns agentes agressivos, como ruído, calor, frio ou eletricidade, não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários, especificamente quando o contato é MANUAL e não apenas AÉREO.

Passo, ao exame do recurso da parte autora com relação ao período de 05/01/2010 a 24/07/2019, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida em sujeição ao agente nocivo ruído.

Período: 05/01/2010 a 24/07/2019

Empresa: A. Grings. S.A

Atividade/função: auxiliar de seção de oficina

Agente nocivo: hidrocarbonetos aromáticos

Prova: PPP - Perfil profissiográfico previdenciário (evento 01, PROCADM4, página 67); perícia judicial (evento 36)

Enquadramento legal: item 1.0.3 (benzeno e seus compostos tóxicos) do Anexo IV do Dec. n. 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99.

Conclusão: no caso, a perícia judicial constatou que a parte autora não esteve exposta a agentes nocivos no período "seja por não terem sido atingidos os limites, seja pela utilização de EPI's capazes de elidir os riscos detectados ou pela eventualidade de exposição". Tal conclusão decorre da constatação de que a parte autora passava 20% de sua jornada diária passando cola nos sapatos.

Houve, portanto, a constatação de contato com agentes químicos pelo expert de confiança do juízo, tarefa que a ele cabia, ultrapassando suas atribuições a realização do enquadramento legal.

Ainda, a informação de que a empresa utilizou colas com tolueno em sua composição apenas até 2008 não afasta o contato da parte autora com hidrocarbonetos aromáticos. Neste sentido, há nos autos laudo realizado na própria empresa que indica que as colas empregadas após 2008 continham hidrocarbonetos - ainda que não tolueno - em suas composições (evento 44, LAUDO2 - pp. 05/06).

A exigência de comprovação da exposição habitual e permanente do segurado a agentes nocivos para fins de caracterização da especialidade de suas atividades foi introduzida pela Lei n.º 9.032/95, razão pela qual, para períodos anteriores a 28-04-1995, a questão perde relevância.

Em relação aos intervalos posteriores a 28/04/1995, registro que a habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei n.º 9.032/95, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição é ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n. 0003929-54.2008.404.7003, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24/10/2011; EINF n. 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011.

Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF n. 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF n. 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).

Deve-se lembrar, ainda, que o Decreto nº 4.882/03 alterou o Decreto nº 3.048/99, o qual, para a aposentadoria especial, em seu art. 65, passou a considerar trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, aquele cuja exposição ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, o que ocorre no caso vertente.

No caso, constatou-se que a parte autora mantinha contato com colas de sapateiros por 20% de sua jornada diária de trabalho. Assim, impossível se dissociar o contato com os agentes químicos do desempenho de suas atividades laborais diárias. Dessa forma, deve ser reconhecida a especialidade do labor prestado no período.

Equipamento de Proteção Individual - EPI

A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é considerada irrelevante para o reconhecimento da especialidade das atividades exercidas sob exposição a agentes nocivos até 03/12/1998, data da publicação da MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/98, que alterou o § 2.º do artigo 58 da Lei 8.213/91.

Para os períodos posteriores, merece observância o decidido pela 3ª Seção desta Corte, ao julgar o IRDR n.º 5054341-77.2016.4.04.0000, em 22/11/2017, quando fixada a seguinte tese jurídica:

“A mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário.”

Conforme estabelecido no precedente citado, tem-se que a mera anotação acerca da eficácia dos equipamentos protetivos no PPP apenas pode ser considerada suficiente para o afastamento da especialidade do labor caso não contestada pelo segurado.

Há, também, hipóteses em que é reconhecida a ineficácia dos EPIs ante a determinados agentes nocivos, como em caso de exposição a ruído, a agentes biológicos, a agentes cancerígenos e à periculosidade. Nessas circunstâncias, torna-se despiciendo o exame acerca do fornecimento e da utilização de EPIs.

Nos demais casos, a eficácia dos equipamentos de proteção individual não pode ser avaliada a partir de uma única via de acesso do agente nocivo ao organismo, mas a partir de toda e qualquer forma pela qual o agente agressor externo possa causar danos à saúde física e mental do segurado trabalhador ou risco à sua vida.

Quanto aos agentes químicos, a utilização de luvas e cremes de proteção não possui o condão de neutralizar a ação dos agentes nocivos a que estava exposto o segurado.

Os cremes de proteção são conhecidos como "luvas invisíveis" e são utilizados por não ocasionarem perda de tato ou movimentação dos trabalhadores. Considerando-se o desgaste natural da camada protetora proporcionada por esses cremes em virtude do manuseio de equipamentos, ferramentas, da fricção das mãos com objetos e roupas e mesmo do suor, aspectos ínsitos à prestação laboral em análise, torna-se impossível a avaliação do nível de proteção a que está sujeito o trabalhador.

Assim, não convincente a afirmação de que a utilização apenas de cremes de proteção, ainda que de forma adequada, possui o condão de neutralizar a ação de agentes nocivos químicos, ainda mais considerando que a exposição do segurado ocorria de forma "contínua e permanente".

Frise-se que tal entendimento vem sendo reiteradamente adotado no âmbito trabalhista, restando caracterizada a insalubridade do labor, em grau máximo, desempenhado por trabalhadores da área de mecânica de manutenção, ainda que demonstrada, por meio de prova técnica, a adequada utilização de cremes protetores. Nesse sentido:

RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. CREME DE PROTEÇÃO. Em que pese a conclusão do perito engenheiro, no sentido de não serem insalubres as atividades laborais da reclamante, pelo uso adequado do creme de proteção para as mãos, esta Turma Julgadora, na sua atual composição, adota o entendimento de que os cremes de proteção, mesmo com Certificado de Aprovação, e utilização regular pelo trabalhador, não são eficazes para neutralizar de forma eficiente a ação dos agentes insalubres, porquanto não formam uma barreira de proteção uniforme sobre as mãos e antebraços, a qual não permanece íntegra após o atrito das mãos com as peças manuseadas. Adicional de insalubridade devido. (TRT4, RO 0002111-72.2012.5.04.0333; 9ª Turma; Relatora Desa. Maria da Graça Ribeiro Centeno. 22/05/2014).

ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. CONTATO COM PRODUTOS QUÍMICOS DE ORIGEM MINERAL. "LUVA INVISÍVEL". GRAU MÁXIMO. O fornecimento e o uso do creme protetor, ainda que o obreiro o reaplique de forma periódica, consiste em uma "luva invisível" que vai sendo retirada com o manuseio, expondo o empregado ao contato direto com o agente insalubre. A proteção insuficiente é fator de aumento do risco, pois o trabalhador, acreditando estar imune, age com menor cautela do que quando não está usando nenhum equipamento de proteção individual. (TRT4, RO 0000145-35.2013.5.04.0561; 6ª Turma; Relator Des. Raul Zoratto Sanvicente. 26/02/2014).

Por conseguinte, considerando que a caracterização da especialidade do labor em decorrência da exposição do segurado a agentes químicos prescinde de análise quantitativa, bem como demonstrada a impossibilidade de total neutralização dos efeitos de tais agentes pelo uso dos EPIs fornecidos à parte autora, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor.

Requisitos para concessão de aposentadoria especial

A aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, é devida ao segurado que, além da carência, tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física durante 15, 20 ou 25 anos.

Em se tratando de aposentadoria especial, portanto, não há conversão de tempo de serviço especial em comum, pois o que enseja a outorga do benefício é o labor, durante todo o período mínimo exigido na norma em comento (15, 20, ou 25 anos), sob condições nocivas.

Direito à aposentadoria

No caso em exame, considerado o presente provimento judicial, a parte autora alcança, na DER (24/07/2019):

Até a DER (24/07/2019)25 anos, 8 meses e 17 dias31142 anos, 11 meses e 27 dias68.7056

A carência necessária à obtenção do benefício de aposentadoria no ano de 2019 (art. 142 da Lei n.º 8.213/91) restou cumprida, tendo em vista que a parte autora possuía mais de 180 contribuições na DER.

Dessa forma, cumprindo com os requisitos tempo de serviço e carência, a parte autora tem direito:

- à implementação do benefício de aposentadoria especial desde a data do requerimento;

- ao pagamento das parcelas vencidas.

Transcorridos menos de cinco anos entre a DER (24/07/2019) e o ajuizamento da demanda (23/11/2022), não incide, no caso, a prescrição quinquenal.

Da necessidade de afastamento da atividade especial

No julgamento do Tema 709, em sede de embargos de declaração julgados em 23/02/2021, o STF fixou a seguinte tese:

"I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.

II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão"

Definida, em decisão com efeitos vinculantes, a questão da constitucionalidade da norma que veda a percepção de aposentadoria especial pelo segurado que permanece em atividade classificada como especial ou que a ela retorna, e estabelecida a eficácia da decisão, impõe-se assegurar à Autarquia previdenciária a possibilidade de proceder à verificação quanto à permanência do segurado no exercício de atividade classificada como especial ou quanto ao seu retorno. Uma vez verificada a continuidade ou o retorno do labor especial, poderá cessar (suspender) o pagamento do benefício previdenciário em questão, sem prejuízo do pagamento dos valores vencidos desde o termo inicial do benefício até a data da cessação.

Ressalte-se que, nos casos específicos de profissionais de saúde constantes do rol do art. 3º-J, da Lei nº 13.979/2020, e que estejam trabalhando diretamente no combate à epidemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, encontram-se suspensos os efeitos do decidido pelo STF no caso, nos termos da decisão liminar proferida pelo Exmo. Min. Relator Dias Toffoli. Em tais casos, deverá ser observado pelo juízo de origem, oportunamente, o que vier a ser decidido pelo tribunal superior quanto ao ponto.

Consectários e provimentos finais

- Correção monetária e juros de mora

A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da Lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

- INPC ou IPCA em substituição à TR, conforme se tratar, respectivamente, de débito previdenciário ou não, a partir de 30/06/2009, diante da inconstitucionalidade do uso da TR, consoante decidido pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no tema 905.

Os juros de mora, por sua vez, devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.

Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).

Por fim, a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve incidir o artigo 3º da Emenda n. 113, segundo o qual, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.

Honorários advocatícios

Provido o apelo da parte autora, impõe-se o afastamento de sua condenação ao pagamaneto de honorários advocatícios.

Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.

Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência devem ser fixados originariamente em 10% sobre as parcelas vencidas.

Conforme a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, a verba honorária deve incidir sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (acórdão).

Tutela específica - implantação do benefício

Possível desde logo a determinação de implantação do benefício, sem prejuízo da respectiva cessação, caso o INSS verifique que o segurado permaneceu ou retornou ao exercício de atividade especial, nos termos da decisão do STF no tema 709.

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Resulta, todavia, facultada à parte autora a possibilidade de renúncia à implantação do benefício ora determinada.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTOImplantar Benefício
NB1921964216
ESPÉCIEAposentadoria Especial
DIB24/07/2019
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

Conclusão

Dado provimento à apelação da parte autora para reconhecer a especialidade no intervalo de 05/01/2010 a 24/07/2019, com a consequente concessão da aposentadoria especial, bem como o redimensionado dos ônus sucumbenciais. Nos demais pontos, mantida a sentença.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS, dar provimento à apelação da parte autora e determinar a implantação do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004292020v9 e do código CRC 17dffec4.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA
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5061245-46.2022.4.04.7100
40004292020.V9


Conferência de autenticidade emitida em 08/03/2024 04:17:08.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5061245-46.2022.4.04.7100/RS

RELATORA: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: JANETE TERESINHA RENCK (AUTOR)

ADVOGADO(A): YOSHIAKI YAMAMOTO KIYAMA (OAB RS120348)

ADVOGADO(A): ATILA MOURA ABELLA

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS HIDROCARBONETOS. NÍVEIS DE CONCENTRAÇÃO DOS AGENTES QUÍMICOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. EPIS. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO.

1. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos e a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância vigentes à época da prestação do labor enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial.

2. Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários.

3. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Precedentes desta Corte.

4. Não havendo provas consistentes de que o uso de EPIs neutralizava os efeitos dos agentes nocivos a que foi exposto o segurado durante o período laboral, deve-se enquadrar a respectiva atividade como especial. A eficácia dos equipamentos de proteção individual não pode ser avaliada a partir de uma única via de acesso do agente nocivo ao organismo, como luvas, máscaras e protetores auriculares, mas a partir de todo e qualquer meio pelo qual o agente agressor externo possa causar danos à saúde física e mental do segurado trabalhador ou risco à sua vida.

5. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria especial.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, dar provimento à apelação da parte autora e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 28 de fevereiro de 2024.



Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004292021v6 e do código CRC 75538acf.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 29/2/2024, às 18:30:36


5061245-46.2022.4.04.7100
40004292021 .V6


Conferência de autenticidade emitida em 08/03/2024 04:17:08.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 28/02/2024

Apelação Cível Nº 5061245-46.2022.4.04.7100/RS

RELATORA: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

PROCURADOR(A): MAURICIO PESSUTTO

SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: YOSHIAKI YAMAMOTO KIYAMA por JANETE TERESINHA RENCK

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: JANETE TERESINHA RENCK (AUTOR)

ADVOGADO(A): YOSHIAKI YAMAMOTO KIYAMA (OAB RS120348)

ADVOGADO(A): ATILA MOURA ABELLA

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 28/02/2024, na sequência 195, disponibilizada no DE de 19/02/2024.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

Votante: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 08/03/2024 04:17:08.

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