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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL ANTERIOR AOS 12 ANOS. AUSÊNCIA DE LASTRO PROBATÓRIO. LABOR RURAL POSTERIOR A 31/10/199...

Data da publicação: 21/12/2023, 11:00:59

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL ANTERIOR AOS 12 ANOS. AUSÊNCIA DE LASTRO PROBATÓRIO. LABOR RURAL POSTERIOR A 31/10/1991. SUPORTE CONTRIBUTIVO. NECESSIDADE. EXPEDIÇÃO DE GUIAS. 1. O tempo de serviço rural pode ser demonstrado mediante início de prova material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e Súmula nº 149 do STJ. 2. Para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. O início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática. 3. Ademais, nos termos da súmula nº 577 do STJ: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentando, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório". 4. De outra banda, quanto à parcela dos períodos de labor rural em regime de economia familiar anterior aos 12 anos, a total ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 320 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção, sem o julgamento do mérito (art. 485, IV, do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 486, § 1º, do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. Precedente do STJ em sede de recurso representativo de controvérsia (REsp 1.352.721/SP, Corte Especial, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 16/12/2015 - Tema 629). 5. Quanto ao período de labor rural posterior à vigência da Lei nº 8.213/91 (mais especificamente a partir de 01/11/1991), precedentes deste Tribunal, do STJ e do STF esclarecem que, ainda que comprovado o labor agrícola, esse tempo de serviço não pode ser utilizado para a obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição sem o necessário suporte contributivo. 6. Não obstante, o período pode ser reconhecido em juízo (pronunciamento de natureza declaratória), restando vinculado seu cômputo para fins de aposentadoria à indenização das contribuições correspondentes. Diante do pedido expresso da parte autora e do reconhecimento do labor rural, caberá ao INSS, quando do cumprimento do julgado, a expedição das guias de recolhimento respectivas para fins de oportuna indenização. (TRF4, AC 5000172-92.2021.4.04.7202, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 13/12/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000172-92.2021.4.04.7202/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: ANTONIO WIDMAR (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pela parte autora (evento 87, APELAÇÃO1) contra sentença, publicada em 20/06/22, que julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos (evento 83, SENT1):

DISPOSITIVO

Ante o exposto, JULGO EXTINTO o processo sem resolução do mérito com relação ao período especial de 02/11/2017 a 30/04/2020 (art. 485, VI, CPC), e quanto aos pedidos remanescentes, JULGO-OS PARCIALMENTE PROCEDENTES, extinguindo o feito com resolução de mérito, com fundamento do art. 487, I, do CPC, para reconhecer o exercício de atividade rural em regime de economia familiar nos períodos de 30/04/1980 a 22/04/1996, 01/07/2003 a 02/05/2004, 10/12/2005 a 10/03/2007 e de 01/01/2010 a 31/12/2011 e condenar o INSS a proceder à apuração dos valores devidos pela parte autora a título de indenização do período posterior a 31/10/1991.

Considerando a sucumbência recíproca e com base no art. 86, caput, do CPC, fixo os honorários sucumbenciais em 10% sobre o valor da causa, na proporção de 50% em favor do procurador de cada parte.

Na mesma proporção, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais. O INSS está isento do pagamento de custas (art. 4°, I, Lei nº. 9.289/96).

A exigibilidade do pagamento dos honorários sucumbenciais e das custas processuais a cargo do autor fica suspensa diante da concessão do benefício da justiça gratuita (evento 31).

Caso interposta apelação, intime-se o apelado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias. No caso de apelação adesiva, intime-se o apelante para apresentar contrarrazões. Após, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, independentemente de juízo de admissibilidade (CPC, art. 1.010, §§ 1º a 3º).

Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.

A parte autora busca, em síntese: a) Seja reformada a sentença de primeiro grau, para que seja reconhecido o efetivo exercício da atividade rural em regime de economia familiar no período de 30.04.1974 a 29.04.1980 (a partir dos 06 anos de idade), exercido juntamente com seus pais e irmãos; b) Que seja emitida guia de pagamento de indenização dos períodos rurais reconhecidos posteriores a 11/1991, em tempo suficiente para concessão do benefício na esfera judicial; c) Outrossim, diante das novas regras previdenciárias, caso não seja possível à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição de acordo com as regras antigas, seja proporcionado a Recorrente, a reafirmação da DER.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 90, CONTRAZ1).

É o relatório.

VOTO

A parte autora busca, em síntese, reconhecimento do período de labor rural em regime de economia familiar de 30.04.1974 a 29.04.1980, expedição de guia de pagamento dos períodos rurais a partir de 01/11/91 e a concessão do benefício na DER ou mediante sua reafirmação.

Os períodos rurais de 30/04/1980 a 22/04/1996, 01/07/2003 a 02/05/2004, 10/12/2005 a 10/03/2007 e de 01/01/2010 a 31/12/2011 restam incontroversos.

Atividade rural

O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.

Acresce-se que o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).

O tempo de serviço rural pode ser demonstrado mediante início de prova material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor do art. 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91, e Súmula n.º 149 do STJ.

Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural, consoante inclusive consagrado na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Cumpre salientar que, para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. O início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática.

No ponto, o Tribunal da Cidadania editou a Súmula n.º 577, a qual estampa entendimento jurisprudencial no sentido de que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório".

De outra parte, destaco que, conforme decidido na Ação Civil Pública nº 5017267-34.2013.4.04.7100/RS, proposta pelo Ministério Público Federal em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), é possível o cômputo de período de trabalho rural realizado mesmo antes dos 12 anos de idade, para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei nº 8.213/91, em maior amplitude, sem a fixação de requisito etário (TRF4, AC 5017267-34.2013.4.04.7100, Sexta Turma, Relatora para Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, julgado em 09-04-2018). Na mesma linha recentes julgados do STJ (por todos: AgInt no AREsp 956.558/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2020, DJe 17/06/2020).

Destaco, também, que a jurisprudência deste Regional é no sentido de que "a utilização de maquinário e eventual de diaristas não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial porquanto ausente qualquer exigência legal no sentido de que o trabalhador rural exerça a atividade agrícola manualmente" (TRF4, EINF 5023877-32.2010.4.04.7000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 18/08/2015; no mesmo sentido: TRF4 5031053-08.2018.4.04.9999, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 03/04/2019).

De mais a mais, "o tamanho da propriedade rural, por si só, não tem o condão de descaracterizar o regime de economia familiar quando preenchidos os demais requisitos legalmente exigidos" (STJ, REsp 1403506/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/12/2013, DJe 16/12/2013; no mesmo sentido: TRF4, AC 5002005-62.2022.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 24/03/2022).

Isso porque a análise de vários elementos - localização do imóvel, tipo de cultura explorada, quantidade de produção comercializada, número de membros familiares a laborar na atividade rural, utilização ou não de maquinário agrícola e de mão de obra de terceiros de forma não eventual - juntamente com a extensão do imóvel, é que permitirão um juízo de valor seguro acerca da condição de rurícola do segurado. As circunstâncias de cada caso concreto é que vão determinar se o segurado se enquadra ou não na definição do inc. VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91 (EIAC n. 2000.04.01.043853-1/RS, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, unânime, DJU de 11/02/2004).

Pois bem.

Os períodos rurais em regime de economia familiar de 30/04/1980 a 22/04/1996, 01/07/2003 a 02/05/2004, 10/12/2005 a 10/03/2007 e de 01/01/2010 a 31/12/2011 já foram reconhecidos na sentença e são incontroversos.

A parte autora busca o reconhecimento dos períodos rurais de 30.04.1974 a 29.04.1980, inferiores aos 12 anos de idade, destacando suficiência das provas materiais e testemunhal.

Em relação aos interergnos discutidos nos autos foram apresentados os seguites documentos pela parte autora:

a) certificado de cadastro do INCRA, em nome do genitor, em 1966 (Mondaí) e 1991 (Campo Erê); evento 1, PROCADM10, fl. 24/25

b) ficha de identificação sindical do genitor, em 08/1971 (Mondaí); evento 1, PROCADM10, fl. 53

c) registro de imóveis em nome do genitor, constando aquisição em 1981 e venda em 1984; evento 1, PROCADM10, fl. 62.

d) registro de imóveis em nome do genitor, constando aquisição de imóvel em 1984 e 1988; evento 1, PROCADM10, fl. 21

e) carteira de identificação sindical (Campo Erê) do genitor, constando admissão em 1986; evento 1, PROCADM10, fl. 22.

f) recibos sindicais em nome do genitor, emitidos em 1986; evento 1, PROCADM10, fl. 23.

g) certidão de nascimento do filho, constando o autor como agricultor, em 06/2005; evento 1, CERTNASC9

h) contratos particulares de arrendamento, firmado com Romeu Finger, em 07/2003, 04/2006; evento 1, PROCADM10, fl. 38

i) certidão de casamento - constando o requerente como divorciado-, em 2013;

j) notas fiscais em nome próprio, emitidas em 1994/95, 2004, 2006, 2010/12; evento 1, PROCADM10, 26/36

k) recibos de pagamento da cooperativa, em 2009/10 .

Como já mencionado neste voto, os documentos em nome de familiares da parte autora consubstanciam início de prova material do labor rural (súmula nº 73 deste TRF4); além disso, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural. Reforço, ainda, que este Regional vem admitindo a possibilidade de cômputo do lapso como labor rural em regime de economia familiar, ainda que anterior aos 12 (doze) anos de idade, desde que a prova testemunha seja idônea à demonstração, tendo em vista o que fora decidido na Ação Civil Pública nº 5017267-34.2013.4.04.7100/RS (TRF4, AC 5017267-34.2013.4.04.7100, Sexta Turma, Relatora para Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, julgado em 09/04/2018).

Feitas tais ponderações, tenho que há nos autos início de prova material para o período em questão, indiciária do exercício de labor rural pelo grupo familiar da parte autora.

A prova testemunhal tem o seguinte conteúdo, como bem resumiu a sentença:

Em juízo a parte autora esclareceu ter nascido em Mondaí, que ficou na comunidade Taipa Alta até os 17 anos de idade, que seu pai possuía uma colônia de terras; que são em treze filhos e os pais, sendo o requerente dos cinco filhos mais jovens; produziam milho, feijão, trigo, fumo; criavam suínos; sobreviviam apenas da agricultura; que estudou até a 4ª Série, em Mondaí, na comunidade de São Lourenço. Que aos 17 anos mudaram-se para o atual município de Saltinho, na época Campo Erê; que o pai vendeu as terras de Taipa Alta e adquiriu outras, na comunidade de São Donato, Saltinho. Que foi toda a família; que não serviu ao Exército; continuaram trabalhando com os mesmos produtos; não recorda ao certo até quanto ficou em São Donato, pois seu irmão arrumou uma casa em Serra Alta; [...] que o pai vendeu as terras. Que Milton Wildmar é seu primo-irmão, que foi trabalhar com ele em Porto Alegre, não ficou nem 60 dias, não se adaptou e voltou porque seus pais estavam doentes; que voltou para Serra Alta. Que posteriormente trabalhou em outras empresas; que trabalhou como vigia na CBEMI, era empresa de asfalto, que trabalhava na agricultura durante o dia e fazia ronda em dias alternados. Que depois de sair da Portal Madeira voltou a trabalhar na roça, em terras de outros proprietários; [...] Que quando seu filho nasceu, trabalhava na agricultura em terras próximas da cidade e também em atividades urbanas em dias alternados; que ainda hoje trabalha na agricultura.

Foram, ainda, inquiridas as testemunhas Jacir Ernesto Cella, Laurindo Chichelero Borsoi, Jaime Cerisoli, Pedro Antonio Battistella, Sadi Cerisoli e Arcangelo Mario Foscarini. As duas primeiras e a última testemunha relataram conhecer o autor desde criança, que residia em São Donato, Campo Erê; que o requerente e a família trabalhavam na agricultura em terras próprias; que trabalharam na agricultura até o momento em que venderam as terras, não tinham auxílio de empregados ou diaristas e sobreviviam apenas da agricultura. A terceira testemunha relatou ter conhecido o autor em Serra Alta, que ele trabalhava na Portal Madeiras e depois passou a trabalhar na agricultura em parceria com o depoente, na comunidade de Flor da Serra, antigamente Campo Erê; que trabalhou por aproximadamente cinco anos. A quarta testemunha relatou ter conhecido o autor em Serra Alta; que ele trabalhava na roça, em terras do depoente, antes de começar a trabalhar na Portal Madeiras. A quinta testemunha relatou ter trabalhado com o autor na Portal Madeiras e que depois o requerente passou a trabalhar na agricultura em Lageado Grande, em terras dos pais da testemunha.

Possuo o entendimento de que "no meio rural, a contribuição de cada um dos membros familiares detém significativa importância para a subsistência do grupo familiar como um todo, não devendo se exigir, rigidamente, que a parte demonstre a indispensabilidade das atividades realizadas especificamente pelo infante" (TRF4, AC 5009811-33.2018.4.04.7205, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 21/03/2022). Ademais, é de se reconhecer que, dependendo da época do ano, as atividades campesinas sejam diferentes e que as crianças ajudem na medida de suas capacidades físicas e peculiaridades, de forma que lhes sejam atribuídas mais funções de acordo com o seu desenvolvimento.

O fato de ter o menor eventualmente frequentado a escola no período de atividade rural não é óbice ao reconhecimento do trabalho rural infantil. Com efeito, demandar que o segurado provasse a indispensabilidade de seu trabalho para a família de origem, mediante a inviabilização de sua frequência escolar, seria impor exigência desproporcional, que obstaria, na prática, o reconhecimento da qualidade de segurado especial em tais hipóteses. A tese, inclusive, já foi rechaçada pela TNU:

APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. TRABALHADOR RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. Ementa: PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. A CONSTATAÇÃO DA CONCOMITÂNCIA DAS ATIVIDADES RURAIS COM ATIVIDADES ESCOLARES, POR SI SÓ, NÃO IMPEDE O RECONHECIMENTO DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. PEDILEF CONHECIDO E PROVIDO. QUESTÃO DE ORDEM 38 DA TNU. Tese firmada: "A concomitância das atividades rurais com atividades escolares, por si só, não impede o reconhecimento da qualidade de segurado especial em regime de economia familiar". (TNU, PUIL n. 0000693-47.2020.4.03.6342/SP Relatora Juíza Federal CARMEN ELIZANGELA DIAS MOREIRA DE RESENDE, julg. em 15/02/2023 - grifei).

Não desconheço que essa Corte vem exigindo mais detalhamento probatório para fins de reconhecimento do labor rural antes dos 12 anos de idade. Porém, havendo amparo em prova testemunhal idônea, com explicitação das culturas plantadas e/ou dos animais criados, alinhada com o relato firme de que o(a) segurado(a) antes dos 12 anos já contribuía efetivamente para o regime de economia familiar pelo desempenho de atividades na lida rural, parece-me suficiente para o reconhecimento do labor.

Sobre a discussão, tive a oportunidade de apresentar prefácio à brilhante e contemporânea obra literária do professor Adriano Mauss, Trabalho infantil: desafio para comprovar a filiação previdenciária, no qual realizei ponderações sobre a matéria. Peço vênia para transcrever alguns trechos que considero essenciais tanto para a solução da presente controvérsia, quanto para fins de verticalização do debate no âmbito deste colegiado (grifei):

(...) Não é possível uma compreensão sobre o fato social histórico trabalho infantil se não se conhece suas origens na formação e no habitus da sociedade brasileira, que, até há pouco tempo, era predominantemente rural. Esta realidade está aqui ilustrada com elementos históricos e dados que revelam uma tradicional e contumaz tendência de as famílias rurais se utilizarem da força de trabalho de crianças de tenra idade, sem considerar a diminuta força, a imaturidade física e as limitações inerentes aos indivíduos ainda em fase de crescimento.

(...)

Fruto de (pré)juízos e do desconhecimento da realidade histórica do trabalho campesino no Brasil, tudo se tem dito e afirmado para que o tempo de trabalho infantil não seja reconhecido para fins previdenciários.

Pode-se começar lembrando o preconceito da vedação legal do trabalho infantil, que encerra em si um paradoxo. Mesmo depois de uma sentença de procedência proferida em ACP proposta pelo MPF, devidamente confirmada pelo TRF4 e transitada em julgado, analisada no livro, ainda se invoca o princípio protetivo da infância em desfavor os próprios infantes protegidos, ao que tenho respondido em inúmeros julgados "que a infelicidade de terem perdido a infância tendo que trabalhar, quando deveriam estar brincando e estudando, não pode ser agravada com a desconsideração deste trabalho, mesmo que ilegal, imoral, inconstitucional ou coisa que o valha".

Depois, superada esta questão do óbice legal, objeta-se com fundamentos que verdadeiramente não se sustentam na realidade social sensível do ambiente de trabalho rural ao longo do tempo e principalmente em tempos pretéritos mais longínquos, tais como a exigência de comprovação de força física e efetiva contribuição no âmbito do regime de economia familiar. Com efeito, trata-se de fato irrelevante e dele não se pode exigir prova. Se a criança produzia mais ou menos, se a criança tinha maior ou menor dificuldade para pegar no cabo da enxada, além de constituírem circunstâncias de prova odiosa, a sua ausência não pode conspirar para o não reconhecimento do trabalho. São aspectos que não descaracterizam o trabalho e apenas podem representar que este se desenvolveu com mais ou menos sacrifício ou esforço.

(...)

Desconhecimento também é afirmar-se que se o infante estava estudando, não poderia, portanto, estar trabalhando em atividade rural. Olvida-se, à miúde, que era prática assente na sociedade rural brasileira o estudo em um turno e o trabalho em outro.

(...)

O preconceito é agravado quando se trata da “mulher” segurada especial, que precisou trabalhar desde a infância e agora vê seu direito à filiação previdenciária periclitar diante de afirmativas do tipo, “o seu trabalho não era indispensável para a sobrevivência do grupo familiar”, “apenas ajudava nas lides domésticas da casa”, “executava tarefas de limpeza e conservação”, “ajudava na cozinha”, “cuidava dos irmãos” etc. Vejo nestas suposições discriminação de gênero (contra a mulher) e penso que o julgamento na hipótese deve ser encaminhado na “Perspectiva de Gênero”, consoante tem orientado o Conselho Nacional de Justiça. Trago à colação, à guisa exemplificativa, passagem de voto-vencedor de minha relatoria na egrégia 9ª Turma do TRF4:

“Ademais, o adjutório da autora à economia familiar não pode ser considerado apenas em função dos valores auferidos com a produção agrícola, mas sim a partir da perspectiva de gênero e de uma análise mais ampla, que leva em consideração a fundamentalidade do papel da trabalhadora rural para viabilizar o próprio trabalho dos demais membros do conjunto familiar. Não se pode olvidar, ademais, da carga laboral extra que é social e automaticamente atribuída às mulheres, referente ao trabalho de "cuidado", e que envolve as mais diversas responsabilidades domésticas. Sobre o tema da "economia do cuidado", destaco a famosa frase atribuída à autora italiana Silvia Federici: "Isso que chamam de amor nós chamamos de trabalho não pago", a qual deve conduzir todos nós à reflexão. Trata-se, com efeito, de atividades (verdadeiro labor) essenciais para o gerenciamento da unidade familiar e que ganham relevo ímpar no meio rural diante da precariedade das condições sociais que o caracterizam, de forma que não podem ser ignoradas pelo julgador, o qual deve levar a perspectiva de gênero em consideração. Julgamento conforme diretrizes do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ; art. 7º, inciso XX, da Constituição Federal; e Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (Decreto nº 4.377, de 13 de setembro de 2002) (TRF4, AC 5006466-77.2022.4.04.9999, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 06/07/2023).

(...)

E diante desses aspectos paticularizadores da realidade social de inúmeras crianças, as quais se viram obrigadas ao desempenho do sofrido labor rural para possibilitar a subsistência de sua família, invoco a Doutrina da Proteção Integral (art. 1º do ECA) e o Princípio da Prioridade Absoluta (art. 227 da CF), em verdade, metaprincípios decorrentes do Postulado Normativo do Interesse Superior da Criança e do Adolescente.

Com efeito, o mencionado dispositivo constitucional estampa que "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão". Já o § 3º, II, do referido artigo esclarece que a proteção especial de crianças e adolescentes abrangerá a "garantia de direitos previdenciários e trabalhistas".

Assim, pode-se concluir que as crianças e adolescentes possuem os mesmos direitos fundamentais que os adultos, acrescidos de tantos outros em atenção às especificidades que circundam a sua realidade de vida, sempre com respeito à sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, notadamente no que se refere ao trabalho (art. 69, I, do ECA), o que deve pautar não somente a implementação de políticas públicas, mas também a própria atuação do Poder Judiciário.

Logo, até mesmo às crianças e aos adolescentes abaixo da idade mínima para o exercício de trabalho devem ser plenamente assegurados os direitos previdenciários (sem a fixação de um limite etário rígido, conforme decidido na ACP 5017267-34.2013.4.04.7100), uma vez que a norma protetiva não pode vir em sentido contrário ao melhor/superior interesse dos infantes.

Dessa forma, a meu ver, essa rigidez jurisprudencial acaba criando amarras ao pleno exercício dos direitos fundamentais das crianças, notadamente o direito à previdência social, extrapolando a moldura constitucional referente à atuação judicial, de forma que, ao fim e ao cabo, o Poder Judiciário está negando à criança um direito fundamental, o que não se pode admitir. Não se está a dizer que não há necessidade de prova do labor rural pela criança! Mas que não há espaço para esse rigor extremo que tenho visualizado na jurisprudência e, em especial, no âmbito deste Regional, comparativamente com outros trabalhadores rurais com idêntica ou menor proteção constitucional e legal.

Penso que o entendimento pela necessidade de demonstração cabal da indispensabilidade do labor do infante para o regime de economia familiar frustra, ainda que indiretamente, todo o avanço alcançado pelo julgamento da ACP 5017267-34.2013.4.04.7100, o que também não se pode permitir.

É inconcebível o rigorismo que se observa também na exigência do chamado “início material de prova” do trabalho infantil para fins de enquadramento previdenciário do segurado especial. Parece que o segurado que foi obrigado a trabalhar é discriminado diante do conceito legal e jurisprudencial de “início de prova material”. Para ele, por castigo pela petulância de pretender resgatar uma mora da sociedade que não lhe permitiu escolha, o início de prova material se transmuda em prova cabal, robusta, incontestável, deixando mesmo de ser um “mero início”, “um indício”, “um elemento documental relacionado”, assim como se exige de todos os demais segurados especiais. Trata-se de uma discriminação incompreensível que viola o princípio constitucional da igualdade entre os iguais. O elemento de discrímen (fato de ser criança) não se sustenta e desvela a flagrante inconstitucionalidade desta exigência despropositada e, no mais das vezes, praticamente insuperável pelo trabalhador infantil.

Embora a parte autora postule o reconhecimento do labor rural desde os 06 anos de idade, nenhuma das provas materiais é precisa nesse sentido.

Em juízo o autor se limitou a fazer afirmações genéricas, não detalhando o momento em que iniciou as lides campesinas, sequer especificando se o labor começou em Mondaí ou apenas em Campo Erê.

Nenhuma das testemunhas arroladas conheceu o autor na primeira infância, em Mondaí, Taipa Alta. Todas conheceram-no numa segunda localidade onde o autor morou, Campo Erê, Saltinho/São Donato, para onde o autor se mudou com 17 anos, segundo suas próprias declarações.

Relativamente ao período de 30.04.1974 a 29.04.1980, portanto, não foi produzida qualquer prova material e sequer testemunhal.

Por mais que se deseje relativizar a necessidade de prova material contemporânea aos períodos em que se deseja comprovar o labor rural, na hipótese não se verifica um só documento que venha em auxílio da tese da autora no que toca ao período.

Assim, reputo insuficientes os elementos de prova acostados aos autos.

Diante da hipossuficiência da parte autora, seria desarrazoado reconhecer a improcedência do pleito formando a coisa julgada material, haja vista que recente precedente da Corte Especial do STJ, em sede de recurso representativo de controvérsia, mudou o encaminhamento das demandas previdenciárias com ausência ou insuficiência de provas:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.

1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.

2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.

3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas.

4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social.

5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. 6. Recurso Especial do INSS desprovido. (REsp 1.352.721/SP, Corte Especial, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, pub. no DJ em 28/04/2016, p. 118).

Saliente-se que, não obstante o caso que foi objeto de análise naquele julgado ser relativo à aposentadoria por idade, a ratio decidendi mostra-se aplicável a todas as hipóteses em que se rejeita a pretensão a benefício previdenciário em decorrência de ausência ou insuficiência de lastro probatório, consoante leciona o eminente Juiz Federal José Antonio Savaris:

"Orientando-se ao encerramento sem o julgamento do mérito, contudo, o juiz se abre ao apelo do bem da vida que se encontra em discussão, distanciando-se da forma processual civil em nome de um valor maior. Resguardando a possibilidade de o indivíduo reunir os elementos de prova necessários e obter finalmente o benefício previdenciário, a homenagem é feita à lógica da preservação da existência humana, à ideia da não preclusão do direito previdenciário. (...) Na extinção do processo sem o julgamento do mérito por falta de provas, há também um importante reconhecimento da insuficiência do poder de cognição do juiz. A decisão final deixa de ser vista como um veredicto imutável para ser melhor compreendida como uma decisão 'nesses termos' ou 'por agora'. É isso o que expressa a decisão que extingue o feito sem julgamento do mérito: primeiro, a possibilidade de que existam provas favoráveis ao autor que não constam dos autos e que poderiam mudar a sua sorte; segundo, a injustiça ou a gravidade de se tornar essa decisão imutável e, assim, negar definitivamente o benefício previdenciário em que pese aquela possibilidade. (...) Com base nesse entendimento [REsp 1352721, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 16.12.2015], deve ser extinto sem jultamento de mérito o processo previdenciário em que a decisão judicial não reconhece o direito ao benefício em razão da ausência ou insuficiência de prova material, pressuposto para a comprovação do tempo de serviço(Direito Processual Previdenciário. Curitiba. 2016: Alteridade, p. 93-94).

Em síntese, a solução que melhor se amolda ao caso é a extinção do feito sem exame do mérito, em relação ao período rural de 30.04.1974 a 29.04.1980, com fulcro no art. 485, inc. IV, NCPC, o que não obsta o ajuizamento de nova ação para renovação do pleito, pelo segurado, mediante apresentação de novas provas, conforme recentemente decidido por este Colegiado, por unanimidade, nos autos da Apelação Cível nº 0011414-31.2014.4.04.9999 (TRF4, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Roger Raupp Rios, julg. em 07/06/2016).

Período de labor rural posterior à vigência da Lei nº 8.213/91

A parte autora busca a expedição de guia em relação aos períodos rurais de 01/11/91 a 22/04/1996, 01/07/2003 a 02/05/2004, 10/12/2005 a 10/03/2007 e de 01/01/2010 a 31/12/2011 e a respectiva concessão do benefício com base neles.

Em relação ao período posterior a 31/10/1991, mais especificamente a partir de 01/11/1991, a jurisprudência se consolidou no sentido de que, a partir da vigência da Lei nº 8.213/91, o tempo de labor rural somente será computado para fins de obter-se aposentadoria por tempo de contribuição se a parte requerente comprovar o efetivo recolhimento de contribuições. Tal entendimento decorre de interpretação do art. 39, inciso II, da Lei de Benefícios, segundo o qual "Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão: (...) II - dos benefícios especificados nesta Lei, observados os critérios e a forma de cálculo estabelecidos, desde que contribuam facultativamente para a Previdência Social, na forma estipulada no Plano de Custeio da Seguridade Social".

Esclarece-se que, para que o segurado especial perceba aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição, deve recolher a contribuição facultativa de que trata o art. 21 da Lei nº 8.212 (Lei de Custeio da Previdência Social), no percentual de 20% sobre o salário de contribuição. A Lei de Benefícios não considera a contribuição incidente sobre a comercialização da produção rural para efeito de concessão de outros benefícios, salvo os enumerados no inciso I do art. 39 (aposentadoria por idade ou por invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão, pensão e auxílio-acidente).

No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 272, nos seguintes termos: "O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher contribuições facultativas".

Igualmente são as lições de José Antonio Savaris (Direito processual previdenciário. 6. ed. rev. atual. ampl. Curitiba: Alteridade Editora, 2016, p. 585), segundo o qual "Aposentadoria por tempo de contribuição (integral). Beneficiários: todos os segurados. Deve-se observar, porém, que o segurado especial, sujeito ao recolhimento de contribuições obrigatórias incidentes sobre o produto da comercialização, somente fará jus à aposentadoria por tempo de contribuição se recolher as contribuições facultativas, pela sistemática prevista para o contribuinte individual (Lei 8.213/91, art. 39, II, c/c Lei 8.213/91, art. 25, § 1º)". Outrossim, somente se optar por fazer contribuições mensais, de forma voluntária, é que o segurado especial passa a ter reconhecido o direito à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (LAZZARI, João Batista; CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. Direito Previdenciário. 2. ed. Rio de Janeiro: Método, 2021, p. 299).

Esse tem sido o entendimento adotado por este Regional, conforme se depreende dos seguintes julgados: TRF4, AC 5030446-92.2018.4.04.9999, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 15/02/2022; TRF4, AC 5001295-27.2019.4.04.7031, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 22/02/2022; TRF4 5005536-30.2020.4.04.9999, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 15/02/2022.

Na hipótese dos autos, quanto ao tempo de labor rural de 01/11/91 a 22/04/1996, 01/07/2003 a 02/05/2004, 10/12/2005 a 10/03/2007 e de 01/01/2010 a 31/12/2011, o cômputo para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição depende do respectivo suporte contribuitivo, nos termos da fundamentação supra.

Feitas tais considerações, e após análise da documentação acostada aos autos eletrônicos, tenho que não há nenhuma prova de que a parte autora efetuou o recolhimento de contribuições no mencionado período.

Outrossim, mostra-se inviável a averbação de atividade rural sem as devidas contribuições após 31/10/1991 para fins de cômputo como tempo de serviço/contribuição. Não obstante, resta possível pronunciamento de natureza declaratória pelo Poder Judiciário, reconhecendo o período como labor rural, pois devidamente comprovado nos autos.

Ademais, considerando o pedido específico da parte autora na exordial, e reconhecido o período como labor rural, caberá ao INSS, em sede de cumprimento de sentença, a expedição das respectivas guias de recolhimento, possibilitando-se a indenização pela parte autora em prazo razoável, merecendo, quanto ao ponto, acolhida o apelo.

Pois bem.

Realizado o pagamento, surjem os seguintes indagamentos: o período indenizado pode ser computado para fins de enquadramento nas regras de aposentadoria anteriores à EC nº 103/2019 ou, ainda, nas regras de transição da referida Emenda Constitucional? Concedido o benefício previdenciário, o termo inicial dos seus efeitos financeiros deve retroagir à data do requerimento administrativo ou deve ser fixado na data do pagamento das guias?

Pois bem. Em relação ao primeiro ponto, o INSS vem sustentando a impossibilidade do cômputo com fulcro na Portaria PRES/INSS nº 1.382/2021, a qual, em seu art. 9º, dispõe que "O recolhimento efetuado em atraso após o fato gerador não será computado para nenhum fim, ainda que dentro do prazo de manutenção da qualidade de segurado" (§ 2º) e que "Para fins de análise a direito adquirido, somente poderão ser considerados os recolhimentos em atraso efetuados até a data da verificação do direito. Os recolhimentos com data de pagamento posterior à data da análise do direito não integrarão o cálculo de tempo de contribuição nessa regra, mesmo que se refiram a competências anteriores" (§ 5º).

Não obstante, prevalece nesta Corte o entendimento de que "A data de indenização do período rural não impede que o período seja computado, antes da data indenização, para fins de verificação do direito à aposentadoria. Uma vez indenizado, o período se incorpora ao patrimônio jurídico do segurado" (TRF4 5023640-76.2021.4.04.7108, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 12/07/2022). Dessa forma, "(...) é possível a utilização do tempo rural indenizado para verificação do direito adquirido ou enquadramento nas regras transitórias da EC 103/2019, ainda que a indenização tenha ocorrido após a publicação da aludida emenda constitucional ou mesmo após 30.06.2020" (TRF4, AG 5017465-16.2022.4.04.0000, NONA TURMA, Relator JAIRO GILBERTO SCHAFER, juntado aos autos em 26/07/2022).

Ora, antes mesmo da edição da Portaria PRES/INSS nº 1.382/2021, a autarquia previdenciária já adotava tal entendimento/interpretação, conforme Comunicado DIVBEN3 nº 02/2021, o qual era afastado pelo Poder Judiciário ante a carência de base legal para tanto. Tal interpretação depende de previsão legal em sentido formal, não bastando para tanto a edição de Comunicados e/ou Portarias.

Não por outro motivo, esta 9ª Turma possui firme entendimento pelo afastamento da intepretação dada pelo INSS, veja-se:

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REGRA DE TRANSIÇÃO. ARTIGO 17 DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019. ATIVIDADE RURAL ANTERIOR. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES EM ATRASO. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. 1. Segundo o entendimento que vinha sendo adotado pelo INSS, considera-se devida a aposentadoria a partir da data de entrada do requerimento (artigo 49, inciso II, da Lei nº 8.213/91), desde que preenchidos os requisitos, não configurando óbice, por si só, a existência de débitos de contribuições em atraso, conforme explicitado pelo artigo 167 da Instrução Normativa nº 77/2015. 2. Com a revogação do artigo 59 do Decreto nº 3.048/99, promovida pelo Decreto nº 10.410/2020, o INSS expediu o Comunicado DIVBEN3 nº 02/2021, passando a entender que as contribuições recolhidas em atraso a partir de 01/07/2020 não poderiam ser consideradas para fins de cálculo do tempo de contribuição em 13/11/2019, data da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103/2019, ou seja, não poderia ser computado para fins de aplicação do pedágio. 3. A interpretação conferida pelo INSS, ao recolhimento em atraso de contribuições relativas ao labor rural cujo exercício foi regularmente reconhecido, carece de fundamento de validade em lei. 4. Manutenção da sentença que concedeu, em parte, a segurança, a fim de anular a decisão administrativa pertinente ao NB 199.946.008-9, fixando prazo para reabertura do processo administrativo e prolação de nova decisão acerca do preenchimento dos requisitos para aposentadoria, considerando, na contagem do tempo de contribuição, o período de labor cujas contribuições foram regularmente indenizadas. (TRF4 5006782-76.2021.4.04.7202, NONA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 08/10/2021, grifei)

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REGRA DE TRANSIÇÃO. ARTIGO 17 DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019. ATIVIDADE RURAL ANTERIOR. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES EM ATRASO. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. 1. Com a revogação do artigo 59 do Decreto nº 3.048/99, promovida pelo Decreto nº 10.410/2020, o INSS expediu o Comunicado DIVBEN3 nº 02/2021, passando a entender que as contribuições recolhidas em atraso a partir de 01-07-2020 não poderiam ser consideradas para fins de cálculo do tempo de contribuição em 13-11-2019, data da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103/2019, ou seja, não poderia ser computado para fins de aplicação do pedágio. 2. Carece de fundamento de validade em lei a interpretação conferida pelo INSS ao recolhimento em atraso de contribuições relativas ao labor rural cujo exercício foi regularmente reconhecido,. 3. É devida a aposentadoria a partir da data de entrada do requerimento (artigo 49, inciso II, da Lei nº 8.213/91), desde que preenchidos os requisitos, não configurando óbice, por si só, a existência de débitos de contribuições em atraso, conforme explicitado pelo artigo 167 da Instrução Normativa nº 77/2015. 4. Tem a parte impetrante direito à aposentadoria conforme art. 17 das regras transitórias da EC 103/19, tendo em vista que cumpre o tempo mínimo de contribuição até a data da entrada em vigor da EC 103/19 (mais de 28 anos), o tempo mínimo de contribuição (30 anos), a carência de 180 contribuições (Lei 8.213/91, art. 25, II) e o pedágio de 50% (no caso, 2 meses e 23 dias). 5. Mantida a sentença que concedeu a segurança. (TRF4 5001579-12.2021.4.04.7210, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 15/12/2021)

Pelo exposto, tem-se que o período de labor rural indenizado deve integrar o panorama contributivo do segurado para que seja utilizado tanto no enquadramento nas regras anteriores à Emenda Constitucional nº 103/2019 (direito adquirido), quanto para incidência das regras de transição.

Em relação ao segundo ponto, reconheço a existência de alguma divergência no âmbito deste Regional, ora sendo deferida a retroação dos efeitos financeiros à data do requerimento administrativo, ora com fixação na data do recolhimento das guias. A discussão gira em torno da própria natureza jurídica desse recolhimento, se seria constitutivo do direito ao benefício ou condição suspensiva para a implantação do benefício.

Inicialmente apresentei divergência em relação ao entendimento dos pares integrantes deste órgão fracionário, no sentido de que a data de recolhimento das guias não deveria ser utilizada como parâmetro para fixação do termo inicial dos efeitos financeiros do benefício eventualmente concedido. Defendia que o recolhimento deveria sim retroagir à data do requerimento administrativo.

Não obstante, após debates em sessões de julgamento passadas, optei por rever meu posicionamento anterior, ainda que com ressalvas ante o conhecimento prático da mora do INSS quanto à expedição das guias, em prol do princípio da colegialidade e para fins de pacificação da jurisprudência desta Corte Regional, notadamente no âmbito desta 9ª Turma.

Corroborando tal entendimento, trago à baila precedentes deste TRF4:

PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. VÍNCULO URBANO DO CÔNJUGE. EXTENSIBILIDADE DA PROVA MATERIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO DEMONSTRADO. RECOLHIMENTOS COMPLEMENTARES. EFEITOS FINANCEIROS. TEMPO INSUFICIENTE. (...) 5. Contribuições previdenciárias pagas em atraso somente podem gerar efeitos previdenciários a partir da data do efetivo pagamento, não havendo como retroagir tais efeitos à DER, quanto recolhidas depois disso. Isso porque, até a data do pagamento, os requisitos autorizadores do cômputo dessas competências como tempo de contribuição, ou para outros efeitos previdenciários, não se encontravam perfectibilizados. 6. Apenas tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição o segurado que, mediante a soma do tempo judicialmente reconhecido com o tempo computado na via administrativa, possuir tempo suficiente e implementar os demais requisitos para a concessão do benefício. (TRF4 5004082-44.2022.4.04.9999, Décima Turma, Relator Desembargador Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, juntado aos autos em 07/07/2022)

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. REEXAME NECESSÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EMENDA CONSTITUCIONAL 103/2019. ATIVIDADE RURAL ANTERIOR. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES EM ATRASO. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ART. 49 DA LEI 8.213/91. EFEITOS FINANCEIROS. (...) 4. O pagamento das contribuições previdenciárias relativas ao período rural exercido após 31-10-1991 não enseja a retroação da DIB para a DER. Nessa linha, deve o marco inicial dos efeitos financeiros do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ser fixado na data em que houve o efetivo recolhimento das contribuições previdenciárias relativas aos respectivos períodos, visto que somente a partir daí houve o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício. (...) (TRF4 5014755-88.2021.4.04.7200, Nova Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, juntado aos autos em 18/04/2022)

PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LABOR RURAL. SEGURADO ESPECIAL. CÔMPUTO DE PERÍODO POSTERIOR A OUTUBRO DE 1991. INDENIZAÇÃO PRÉVIA. NECESSIDADE. (...) 3. Caso em que foi comprovado o recolhimento da indenização, ficando mantida a determinação de concessão do benefício. Os efeitos financeiros, contudo, são devidos a partir da data do recolhimento da indenização. (TRF4, AC 5007348-73.2021.4.04.9999, Décima Turma, Relatora Desembargadora Federal Cláudia Cristina Cristofani, juntado aos autos em 12/05/2022)

PREVIDENCIÁRIO.TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INDENIZAÇÃO DE PERÍODO PÓS 31/10/1991.TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. (...) 2. Caso o segurado tenha recolhido as contribuições devidas em momento posterior ao requerimento administrativo de benefício, o termo inicial dos efeitos financeiros deve ser fixado na data do recolhimento. (TRF4, AC 5015417-94.2021.4.04.9999, Sexta Turma, Relator Juiz Federal Convocado José Luis Luvizetto Terra, juntado aos autos em 17/02/2022)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. TEMPO RURAL. INDENIZAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES. EFEITOS FINANCEIROS. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. (...) O reconhecimento de tempo de serviço rural após 31.10.1991, para efeito de concessão de benefício no Regime Geral da Previdência Social, está condicionado ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes. Ausente tal recolhimento, resta declarado o desempenho de atividade rural em regime de economia familiar, sendo que os efeitos financeiros para fins de concessão do benefício somente podem ser considerados a partir da data da indenização. (...)(TRF4, AC 5003840-32.2020.4.04.7000, Décima Turma, Relator Desembargador Federal Marcio Antônio Rocha, juntado aos autos em 11/11/2021)

Dessa forma, com relação ao termo inicial dos efeitos financeiros de benefício concedido mediante cômputo de período indenizado, não é possível sua retroação à data do requerimento administrativo, tendo em vista que os requisitos para o aproveitamento do tempo de contribuição somente se perfectibilizam com o efetivo recolhimento das contribuições.

Do direito do autor no caso concreto

Conforme explanado na sentença, o autor não atinge os requisitos para obtenção do benefício, seja na DER, seja mediante sua reafirmação:

Do Tempo de Serviço

Ao computar o período resultante da atividade rural ora reconhecido, e que independe de indenização, aos interregnos já averbados pelo INSS, verifica-se que:

Data de Nascimento30/04/1968
SexoMasculino
DER01/11/2017

- Tempo já reconhecido pelo INSS:

Marco TemporalTempoCarência
Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998)1 anos, 4 meses e 8 dias13 carências
Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999)2 anos, 8 meses e 6 dias24 carências
Até a DER (01/11/2017)16 anos, 3 meses e 16 dias157 carências

- Períodos acrescidos:

Nome / AnotaçõesInícioFimFatorTempoCarência
1rural30/04/198031/10/19911.0011 anos, 6 meses e 1 dias0

Marco TemporalTempo de contribuiçãoCarênciaIdadePontos (Lei 13.183/2015)
Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998)12 anos, 10 meses e 9 dias1330 anos, 7 meses e 16 diasinaplicável
Pedágio (EC 20/98)6 anos, 10 meses e 8 dias
Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999)14 anos, 2 meses e 7 dias2431 anos, 6 meses e 28 diasinaplicável
Até a DER (01/11/2017)27 anos, 9 meses e 17 dias15749 anos, 6 meses e 1 dias77.3000

Nessas condições, em 16/12/1998 e 28/11/1999, a parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional (regras anteriores à EC 20/98), porque não cumpre o tempo mínimo de serviço de 30 anos, nem a carência mínima de 102 e 108 contribuições.

Em 01/11/2017 (DER), a parte autora não tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98), porque não preenche o tempo mínimo de contribuição de 35 anos e nem a carência de 180 contribuições. Ainda, não tem interesse na aposentadoria proporcional por tempo de contribuição (regras de transição da EC 20/98) porque o pedágio da EC 20/98, art. 9°, § 1°, inc. I, é superior a 5 anos.

Tampouco atinge o tempo mínimo necessário com a reafirmação da DER pleiteada.

Tutela específica - averbação dos períodos reconhecidos judicialmente

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à averbação dos períodos reconhecidos judicialmente - rurais (30/04/1980 a 31/10/91) -, para fins de futura obtenção de benefício previdenciário, especialmente diante da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais. Da mesma forma, deve o INSS expedir as guias de recolhimento para indenização do período de labor rural posterior a 31/10/1991 (01/11/91 a 22/04/1996, 01/07/2003 a 02/05/2004, 10/12/2005 a 10/03/2007 e de 01/01/2010 a 31/12/2011).

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTOEmitir Averbação
NB1830843831
ESPÉCIE
DIB01/11/2017
DIP
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕESrural: 30/04/1980 a 22/04/1996, 01/07/2003 a 02/05/2004, 10/12/2005 a 10/03/2007 e de 01/01/2010 a 31/12/2011; a fim de que seja computado para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, o período rural a partir de 01/11/91 depende do respectivo suporte contributivo, devendo o INSS expedir as respectivas guias para recolhimento.

Requisite a Secretaria da 9ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 30 (trinta) dias.

Dos consectários

Não havendo condenação em obrigação de pagar, não há falar em juros de mora e correção monetária.

Diante do parcial acolhimento do recurso da parte autora, mas mantida a sucumbência recíproca, remanescem os consectários nos termos fixados na sentença:

Considerando a sucumbência recíproca e com base no art. 86, caput, do CPC, fixo os honorários sucumbenciais em 10% sobre o valor da causa, na proporção de 50% em favor do procurador de cada parte.

Na mesma proporção, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais. O INSS está isento do pagamento de custas (art. 4°, I, Lei nº. 9.289/96).

A exigibilidade do pagamento dos honorários sucumbenciais e das custas processuais a cargo do autor fica suspensa diante da concessão do benefício da justiça gratuita (evento 31).

Conclusão

- Recurso da parte autora parcialmente acolhido para:

a) determinar a extinção do feito sem exame do mérito, em relação ao período rural de 30.04.1974 a 29.04.1980, com fulcro no art. 485, inc. IV, NCPC, o

b) condenar o INSS à expedição das guias de recolhimento para indenização do período de labor rural posterior a 31/10/1991 (01/11/91 a 22/04/1996, 01/07/2003 a 02/05/2004, 10/12/2005 a 10/03/2007 e de 01/01/2010 a 31/12/2011).

- Sucumbência recíproca mantida.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo da parte autora e determinar a imediata averbação dos períodos reconhecidos judicialmente, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004206894v26 e do código CRC aa3a5456.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 13/12/2023, às 20:42:32


5000172-92.2021.4.04.7202
40004206894.V26


Conferência de autenticidade emitida em 21/12/2023 08:00:58.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000172-92.2021.4.04.7202/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: ANTONIO WIDMAR (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL anterior aos 12 anos. ausência de lastro probatório. LABOR RURAL POSTERIOR A 31/10/1991. SUPORTE CONTRIBUTIVO. NECESSIDADE. EXPEDIÇÃO DE GUIAS.

1. O tempo de serviço rural pode ser demonstrado mediante início de prova material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e Súmula nº 149 do STJ.

2. Para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. O início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática.

3. Ademais, nos termos da súmula nº 577 do STJ: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentando, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório".

4. De outra banda, quanto à parcela dos períodos de labor rural em regime de economia familiar anterior aos 12 anos, a total ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 320 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção, sem o julgamento do mérito (art. 485, IV, do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 486, § 1º, do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. Precedente do STJ em sede de recurso representativo de controvérsia (REsp 1.352.721/SP, Corte Especial, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 16/12/2015 - Tema 629).

5. Quanto ao período de labor rural posterior à vigência da Lei nº 8.213/91 (mais especificamente a partir de 01/11/1991), precedentes deste Tribunal, do STJ e do STF esclarecem que, ainda que comprovado o labor agrícola, esse tempo de serviço não pode ser utilizado para a obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição sem o necessário suporte contributivo.

6. Não obstante, o período pode ser reconhecido em juízo (pronunciamento de natureza declaratória), restando vinculado seu cômputo para fins de aposentadoria à indenização das contribuições correspondentes. Diante do pedido expresso da parte autora e do reconhecimento do labor rural, caberá ao INSS, quando do cumprimento do julgado, a expedição das guias de recolhimento respectivas para fins de oportuna indenização.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo da parte autora e determinar a imediata averbação dos períodos reconhecidos judicialmente, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 12 de dezembro de 2023.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004206895v6 e do código CRC 895c14dd.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 13/12/2023, às 20:42:32


5000172-92.2021.4.04.7202
40004206895 .V6


Conferência de autenticidade emitida em 21/12/2023 08:00:58.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 04/12/2023 A 12/12/2023

Apelação Cível Nº 5000172-92.2021.4.04.7202/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PROCURADOR(A): MAURICIO PESSUTTO

APELANTE: ANTONIO WIDMAR (AUTOR)

ADVOGADO(A): ALEXANDER JOSUE VIEIRA DO PRADO (OAB SC035183)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 04/12/2023, às 00:00, a 12/12/2023, às 16:00, na sequência 220, disponibilizada no DE de 23/11/2023.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA AVERBAÇÃO DOS PERÍODOS RECONHECIDOS JUDICIALMENTE, VIA CEAB.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 21/12/2023 08:00:58.

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