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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RESTABELECIMENTO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. TRF4. 5068038-...

Data da publicação: 17/04/2021, 07:01:22

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RESTABELECIMENTO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. 1. A possibilidade de o INSS revisar ou anular seus atos, quando eivados de nulidade, tem expressa previsão legal e é decorrência do dever de autotutela da Administração Pública. 2. Contudo, existem limites para a atuação da autarquia previdenciária ao revisar atos que impliquem reconhecimento de direito em favor do segurado. 3. A Administração não pode desfazer ato de concessão de benefício ou reconhecimento de direito com base em simples reavaliação de provas e nova interpretação em processo administrativo perfeito e acabado. 4. Hipótese em que o INSS, ao examinar originalmente a documentação apresentada, entendeu que o segurado tinha direito ao benefício que postulou, por ter preenchido os requisitos necessários, revestindo de presunção de legitimidade o ato concessório. A possibilidade de modificar este ato pressupõe a prova cabal de que houve ilegalidade, o que não ocorreu. 5. Preenchidos os requisitos legais, e não comprovada a prática de ilícito por parte do segurado, este tem direito ao restabelecimento de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar de sua indevida cessação. 6. O indeferimento, o cancelamento ou a revisão de benefício previdenciário pelo INSS, como regra, não caracteriza, por si só, dano moral indenizável. O INSS tem o dever de avaliar a legalidade do ato de concessão. Contudo, restando configurado o cancelamento injustificável e arbitrário do benefício pela autarquia, após vários anos da concessão, fica comprometida a segurança jurídica, tendo o INSS sujeitado o segurado a muito mais do que à mera frustração pelo cancelamento do benefício. 7. O cancelamento da aposentadoria após longos anos de inatividade por segurado idoso, que restou sem sua fonte de renda, causou evidente e relevante sofrimento, a justificar indenização. 8. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, sem modulação de efeitos. 9. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E. 10. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança. (TRF4, AC 5068038-74.2017.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 09/04/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5068038-74.2017.4.04.7100/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: MILTON GAGLIARDI LACAU (AUTOR)

ADVOGADO: GLAUCIA BUCCO DE ALMEIDA (OAB RS064790)

ADVOGADO: ÂNGELO AUGUSTO BUSSOLLETTI CHIATTONE (OAB RS048462)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de ação previdenciária ajuizada em 21/12/2017 contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, postulando o restabelecimento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar de sua cessação na via administrativa (15/10/2017), bem como a condenação da autarquia ao pagamento de indenização por danos morais.

Indeferido o pedido liminar (evento 11), foi interposto agravo de instrumento (5004392-16.2018.4.04.0000) a esta 6ª Turma, ao qual foi dado provimento para determinar o restabelecimento do benefício, o que foi cumprido pela autarquia previdenciária (evento 48).

O juízo a quo, em sentença publicada em 23/05/2019, julgou parcialmente procedentes os pedidos, com dispositivo de seguinte teor:

Ante o exposto, resolvo o mérito do processo, indeferindo a prescrição e julgando parcialmente procedentes os pedidos (CPC, art. 487, I), para condenar o INSS a:

a) pagar ao autor a aposentadoria por idade desde 10/10/2009;

b) limitar a consignação da dívida da restituição das parcelas da aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/144141702-5 (integrais até a DIB da aposentadoria por idade e das diferenças das rendas de ambas desde então) a 10% das prestações mensais do benefício em manutenção.

Nas parcelas vencidas, incidem os seguintes encargos: i) correção monetária: desde o vencimento de cada prestação, pelo mesmo índice utilizado para os reajustamentos dos benefícios do RGPS, sendo o INPC a partir de 04/2006, substituído pelo IPCA-E em 07/2009; ii) juros de mora: desde a citação, pelos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicáveis à caderneta de poupança; ou desde que devidas as prestações, se posterior à citação.Honorários nos termos da fundamentação.

Por economia processual, fica mantida a antecipação da tutela deferida pelo TRF da 4a Região, reservando-se os ajustes necessários para a fase de cumprimento de sentença.

Honorários nos termos da fundamentação.

Sem custas, porque a parte autora é beneficiária da AJG e o INSS é isento.

Apelou a parte autora, repisando as teses arroladas na inicial. Narra que teve aposentadoria por tempo de contribuição concedida administrativamente em 05/09/2007, ocasião em que levou ao INSS documentação quanto ao vínculo laboral junto à empresa COPAG Comércio de Produtos Agrícolas Ltda., de 1982 a 1999; que a anotação em sua CTPS se deu de forma extemporânea, por meio de uma pessoa que se apresentou como contador da empresa, após o autor por diversas oportunidades ter requerido sua assinatura por parte da empregadora; que, apesar de extemporânea, a anotação é válida, à medida que o autor efetivamente laborou para a empresa, viajando e prospectando clientes mediante remuneração; que, mais de 10 anos após a concessão do benefício, quando já havia se desfeito da documentação que possuía quanto ao vínculo, foi surpreendido com o cancelamento do benefício, sob alegação de fraude. Sustenta não ter sido demonstrada qualquer conduta ilícita de sua parte, pois efetivamente laborou para a empresa no período controvertido, como anotado em sua CTPS e corroborado pelas testemunhas ouvidas em juízo. Sustenta que, não comprovada a má-fe, é inviável a revisão do ato concessório de seu benefício. Postula o restabelecimento de sua aposentadoria, bem como o pagamento de indenização por danos morais.

O INSS, por sua vez, alega a nulidade da sentença, por ultra petita, à medida que em nenhum momento o autor postulou a concessão de aposentadoria por idade, apenas o restabelecimento de sua aposentadoria por tempo de contribuição. Quanto à restituição das parcelas recebidas indevidamente, defende ser afastada a limitação de 10% por cento sobre o valor do benefício em manutenção, sendo aplicável o artigo 115, II, da Lei 8.213/91. Por fim, sustenta a aplicação da Lei 11.960/09 para fins de atualização monetária e juros de mora a incidir sobre as parcelas devidas.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.

MÉRITO

Em decisão liminar desta Relatora nos autos do agravo de instrumento nº 5004392-16.2018.4.04.0000, posteriormente confirmada por esta 6ª Turma naqueles autos, assim foram apreciadas as questões controvertidas, em sede de cognição sumária:

Primeiramente, insta registrar que o INSS pode, em princípio, revisar o ato que concedeu benefício previdenciário, desde que configurada sua ilicitude. Essa possibilidade há muito é reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência, e restou consagrada nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, passando posteriormente a contar com previsão legal expressa (art. 43 da Lei 9.784/99 e art. 103-A, da Lei 8.213/91, introduzido pela MP 138/03).

Cumpre destacar, contudo, que existem limites para a atuação da autarquia previdenciária ao revisar atos que impliquem reconhecimento de direito em favor do segurado.

Na hipótese, o benefício foi concedido em 13/04/2007 e em 15/10/2017 foi encaminhado ofício ao segurado, informando que foram encontradas irregularidades na concessão, facultando-se então a apresentação de defesa no prazo de 10 dias (evento1-OFÍCIO/C7-p.1).

O segurado apresentou defesa administrativa em 30/10/2017 (PROCADM21). Em 12/12/2017 foi julgada improcedente a defesa (evento 1-OFÍCIO/C7-p.2).

Houve o cancelamento em 15/10/2017.

Segundo o ofício do INSS (evento 1-OFÍCIO/C7-p.2), ao acostar defesa, não houve apresentação de provas ou mesmo adição de novos elementos que pudessem caracterizar o direito ao recebimento do benefício, de forma que foi caracterizada a irregularidade do ato concessório. Tal irregularidade se refere, especificamente, à inexistência de vínculo empregatício com a empresa COPAG-COMÉRCIO DE PRODUTOS AGRÍCOLAS LTDA -, que decorre do fato de a inserção do vínculo ter sido extemporânea nos Sistemas da Previdência Social por meio de Guia de Recolhimento do FGTS e informações à Previdência Social - GFIP. Nesse contexto, o INSS entendeu que, descontando o indigitado período, o segurado não perfazia, na data do requerimento, o tempo mínimo para obtenção do benefício então deferido.

Em sua defesa administrativa a agravante alegou a decadência do direito de a administração anular o ato de concessão, ausência de má-fé e informou que devido ao tempo decorrido (quase 20 anos) não possui mais qualquer documento referente ao vínculo trabalhista com a empresa COPAG-COMÉRCIO DE PRODUTOS AGRÍCOLAS LTDA e demais empresas em que trabalhou, a não ser a CTPS.

É assente no direito pretoriano, que a Administração não pode desfazer ato de concessão de benefício ou reconhecimento de direito com base em simples reavaliação de provas e nova interpretação em processo administrativo perfeito e acabado. Tal ocorre, por exemplo, quando o INSS reavalia o potencial probatório dos documentos juntados, para, em novo momento, entender que as provas que considerou antes como suficientes, hoje não consideraria da mesma forma. Não sendo comprovada a ilegalidade, não é dado à Administração simplesmente reavaliar a situação, voltando atrás quanto à sua manifestação, em prejuízo do administrado em clara supressão da segurança jurídica. Nessa linha, quando não há prova de ilegalidade que possa justificar a anulação do ato pela Administração, mas tão-somente mudança de critério interpretativo, ou mesmo reavaliação da prova, não se mostra possível o desfazimento do ato administrativo.

Em outras palavras, o INSS, após examinar a documentação apresentada, entendeu que o segurado tinha direito ao que postulou, por ter preenchido os requisitos necessários. Assim, o ato concessório se reveste de presunção de legitimidade. Cabe, pois, à autarquia comprovar, cabalmente, a existência de ilegalidade no ato. Para isso, repiso, não basta dar nova interpretação às provas já existentes.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. FRAUDE E MÁ-FÉ. INEXISTÊNCIA. NOVA VALORAÇÃO DA PROVA. RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL.

1. Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário, compete ao INSS o ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório de aposentadoria, pois tal ato se reveste de presunção de legitimidade.

2. O cancelamento de benefício previdenciário fundado tão-somente em nova valoração da prova e/ou mudança de critério interpretativo da norma, salvo comprovada fraude e má-fé, atenta contra o princípio da segurança das relações jurídicas e contra a coisa julgada administrativa .

3. Apelação do INSS e remessa oficial improvidas.

(AC: 200072070021618. 6ª Turma TRF 4. Rel. Des. Fed. Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle)

No caso, ademais, trata-se de beneficiário com 73 anos que depende do benefício para sua subsistência, justificando-se a antecipação da tutela recursal pretendida. Seu benefício foi cancelado em ato contínuo à sua intimação para defesa administrativa, após mais de 10 anos sem qualquer indício de que o INSS havia identificado problemas na concessão.

Nessa situação, a presunção pesa em favor do segurado, devendo-se restabelecer o benefício oa agravante até decisão final.

Ressalvo não ser viável, em sede de agravo de instrumento, determinar o pagamento das parcelas retroativas. A presente decisão se refere objetivamente ao restabelecimento do benefício.

A esta altura processual, encerrada a fase instrutória, permanece não provada fraude que tenha sido perpetrada pelo segurado.

O presente feito, a exemplo de diversas ações criminais e previdenciárias que tramitam na Justiça Federal, é desdobramento do Inquérito Policial 104/2012, que versa sobre irregularidades em vínculos trabalhistas com a empresa COPAG Comércio de Produtos Agrícolas Ltda., inseridos no sistemas do INSS por meio de Guias de Recolhimento de FGTS e de Informações à Previdência Social(GFIP), alegadamente realizados por escritório de contabilidade.

Em que pesem os graves fatos denunciados pelo Ministério Público Federal, dando conta da utilização da empresa COPAG para a realização de fraudes previdenciárias após o encerramento formal de suas atividades, tal não implica necessariamente a inexistência ou invalidade de toda e qualquer relação de trabalho que tenha sido firmada com a empresa - que, ao que consta, efetivamente exerceu atividade econômica por determinado período.

Quanto à permanência das atividades econômicas da empresa COPAG mesmo após formalmente encerradas suas atividades em 1991, argumento que vai ao encontro da tese autoral de que nela laborou, são dignos de nota os apontamentos do voto condutor do julgamento da Apelação Criminal nº 5008260-46.2017.4.04.7110 (Oitava Turma, Relator Exmo. Desembargador Federal Leandro Paulsen, juntado aos autos em 12/06/2020), em que mantida a sentença absolutória em ação movida contra outro segurado:

"(...)

Ouvi atentamente aos depoimentos prestados pelas testemunhas em Juízo (evento 43). Concluo que, em seu conjunto, tal prova realmente aponta no sentido de que atividades empresariais envolvendo arroz tiveram regular seguimento no parque fabril da COPAG mesmo após o ano de 1991, momento em que uma série de fraudes cometidas por seus administradores acabaram por inviabilizar a pessoa jurídica. Ainda que possivelmente sob diferente nome empresarial, as pessoas ouvidas atestaram a manutenção das atividades. Neste sentido caminham as versões de Antônio Carlos Guillamelau Campelo (vídeo 03), Edna Afonso Velho (vídeo 04) e até mesmo da testemunha de acusação Waldo de Souza Brasil (vídeo 02). (grifou-se)

A prática, infelizmente, não é incomum. Empresas que respondem a diversas autuações trabalhistas e fiscais acabam por tentar ludibriar as autoridades estatais simulando a venda de seu patrimônio para terceiros que, em verdade, constituem mera continuidade do mesmo grupo econômico. Por vezes, a depender do porte do empreendimento, os próprios trabalhadores sequer tomam conhecimento de tais alterações.

Também é preciso destacar que a prova testemunhal corrobora o argumento de que CARLOS ALBERTO efetivamente prestava serviço de frete à COPAG conduzindo caminhões, vide depoimento de Carlos Guillamelau Campelo, proprietário do local em que o beneficiamento do arroz era realizado. Pontuou: O réu trabalhava com caminhão em Arroio Grande e pegava canjicão lá no Pedro Paulo e levava para limpar lá, no engenho do depoente, mais ou menos em 1998/1999. Ele puxava para a COPAG. Conhece o réu daí. O réu chegava com as notas da COPAG para limpar canjicão e levava de volta, isso pode afirmar. Pela sua percepção acha que o réu trabalhava para a COPAG, já que levava e trazia os produtos. Para o depoente ele era empregado da firma. Parou mais ou menos em 1999, quando o depoente parou. Mas até esse momento o réu puxava canjicão para a COPAG. Nunca ouviu falar nada de negativo do réu. MPF: trabalhou em Arroio Grande de 1991 até 1999. Começou de novo em 2001 até 2004. De 1996 a 1999 lembra do réu trabalhando. Nessa segunda temporada que trabalhou não lembra de ter visto o réu, porque não trabalhava (o depoente) com o mesmo ramo. Perceba-se que em relação ao período de 1999 em diante o depoente nada pôde afirmar, porquanto mudou de ramo de atuação. Assim, diferentemente do que pretende fazer crer o MPF, não se trata de prova no sentido da falsidade da versão defensiva, mas de que, ao menos em parte, o que sustenta CARLOS ALBERTO seria verdadeiro.

A prova oral produzida acaba por dar amparo à versão defensiva. O réu CARLOS ALBERTO declinou em Juízo sempre ter trabalhado para a COPAG realizando fretes que, em média, ocorriam de 15 em 15 dias. Nesta toada, pontuou que a empresa sempre funcionou, mesmo depois de 1991, razão pela qual para ele era indiferente qual a razão social utilizada à época dos fatos. Peço vênia para transcrever, uma vez mais, a síntese do interrogatório: (grifou-se)

Afirma que prestava serviços para a COPAG, como COPAG. Agora se ela não existia mais, se operava com outro nome, isso não sabia. Afirma que pegava o arroz, levava parte para o engenho do Antonio (testemunha), trazia arroz beneficiado para Pelotas. Isso não era constante, não era assim todos os dias, mas nunca passou mais de 15 dias sem ir. É que tem coisas que não sabe precisar. Trabalhava assim: ganhava comissão e essas comissões normalmente vinham para o Dr. Ricardo (Carlos Ricardo Domingues de Souza) aqui e ele que fazia o pagamento. Quando adoeceu, começou a procurar por um recurso porque precisava formalizar sua situação, para poder pedir aposentadoria. Foi aí que a coisa começou a tomar um rumo meio inesperado por mim, que eles me pediram meus documentos todos, tinha todos os documentos numa caixa. Os documentos foram para Dr. Ricardo porque queria de certa forma até acionar eles (COPAG) na Justiça, como todos os outros funcionários. Aí o Ricardo lhe prometeu que regularizaria toda a situação, acertando a aposentadoria do réu. Dito isso, passou duas ou três semanas e Ricardo mandou o réu para um escritório de contabilidade e nesse escritório eles encaminharam o pedido de aposentadoria. Nesse escritório de contabilidade lhe pediram a carteira, quando o réu disse que já tinha entregado a carteira para Ricardo. Nessa ocasião verificaram que Ricardo não sabia mais dos documentos, constatando-se que os documentos foram estraviados. Aí no escritório de contabilidade lhe disseram que não tinha problema porque o INSS tinha o registro dos recolhimentos. Fizeram um boletim de ocorrência da perda desses documentos. Foi o escritório do despachante José Cláudio Vahl que fez o encaminhamento. Foi ele que fez o registro da perda (boletim de ocorrência). Ele que levou o réu no INSS, protocolou a entrada do réu lá, marcaram uma perícia. (...)

O réu descobriu que o advogado Carlos Ricardo era representante da COPAG apenas quando da morte deste. Soube que Carlos Ricardo, quando da morte de Pedro Paulo, passou a tocar o negócio junto com a família dele. O Dr. Ricardo chegou a lhe dizer que representava a COPAG em várias ações. O Ricardo que indicou o réu para trabalhar na COPAG. Começou a trabalhar um pouco antes de 1996. Acredita que uns cinco anos antes de 1996, tipo 1992 ou 1993 foi que começou a trabalhar na COPAG. Sobre sua situação junto à COPAG, trabalhou um bom tempo carregando lá, pegando na função de empregado na maioria das vezes, mas eles queriam o réu continuasse como prestador de serviços só. E trabalhar dez anos, no meu caso foi 10 anos, e precisar de aposentadoria e não ter a guarida da empresa que trabalhou, não dá. O que o réu queria era o reconhecimento da condição de empregado para poder se aposentar. O réu trabalhava por comissão, ganhava um percentual sobre o valor da carga que transportava. Normalmente era 3%. Fazia uma carga por semana, geralmente. Muitas vezes ia para carregar e não tinha carga. Aí pegava o caminhão deles, levava canjicão. Isso aí reclamou, para Flávio, que era quem ficou no lugar de Pedro Paulo quando morreu, e ele lhe encaminhou para o Dr. Ricardo, para resolver a situação (para registrar como empregado). O início do vínculo com a COPAG estava anotado na CTPS do réu, onde constava comissionado. Não tinha data de saída da COPAG. Não entrou direto no INSS pq tinha atraso de recolhimentos. Por isso teve que procurar o advogado. Não teria porque desconfiar de nada, porque tudo que Ricardo lhe falou realmente aconteceu. Sobre a COPAG ter fechado, o que se sabia é que mudava ou teria mudado o nome ou razão social, mas outra empresa respondendo pela COPAG teria assumido. Não sabe que empresa seria essa. Existe um nome que falavam muito lá era Capororoca, que seria uma das empresas da família. Não pode precisar isso com certeza porque não sabe. Quando houve o escândalo já trabalhava na empresa, mas ia lá só de vez em quando. O contato do réu na COPAG era geralmente com Sr. José, chefe da expedição na época. Aparecia sempre o carimbo COPAG nos documentos. Depois da morte de Pedro Paulo, não tem certeza de quem assumiu a empresa. Pelo que sabe quem assumiu a empresa depois da morte de Pedro Paulo seria Flávio. Entretanto, depois de muitos anos ficou sabendo que quem gerenciou ou assumiu as coisas foi o Dr. Ricardo mesmo. Depois da morte de Pedro Paulo não mudou muita coisa no trabalho do réu. (...)

Não chegou a entrar com ação judicial contra a COPAG, porque Ricardo aconselhou a não fazer isso porque conseguiria resolver para o réu a função da aposentadoria. Sobre o fato de ter constado na GFIP que o réu era gerente, ou seja, os recolhimentos seriam na função de gerente, não sabe explicar porque ocorreu isso. (...)

Os comprovantes de recebimento do réu ficaram junto com os documentos extraviados por Ricardo. Chegou a entrar com uma ação cível para restabelecer o benefício. Tem uma audiência marcada. Não foi julgado ainda. A situação do réu ficou muito crítica, imagine o seguinte: uma criatura que tá acostumado a receber seguramente mais de quatro mil reais por mês. De repente vai no banco sacar para pagar as contas e não tinha nada. Dois dias depois recebe uma carta do INSS simplesmente eliminando, dizendo que teria roubado o INSS e teria que pagar trezentos mil reais. Se houve alguma coisa Dr., eu fui usado, porque a minha situação ficou muito difícil. (...) Diz que trabalha desde os oito anos de idade. Nunca tirou férias e depois ter que estar aqui, por (...). A situação do réu está muito difícil, tendo que depender de filho, esposa, amigo.

Como bem destacou o Ministério Público Federal, há inconsistências na versão defensiva, porém não as vejo como suficientes para fins de condenação criminal. CARLOS ALBERTO realmente tinha ciência de que, à época dos fatos, não estava formalmente registrado na condição de empregado e que, portanto, não faria jus ao benefício previdenciário caso o postulasse. Não fosse assim, jamais teria afirmado que trabalhou um bom tempo carregando lá, pegando na função de empregado na maioria das vezes, mas eles queriam o réu continuasse como prestador de serviços só. E trabalhar dez anos, no meu caso foi 10 anos, e precisar de aposentadoria e não ter a guarida da empresa que trabalhou, não dá. O que o réu queria era o reconhecimento da condição de empregado para poder se aposentar.

De acordo com a versão defensiva, a partir do pleito do acusado, foram os próprios responsáveis pela empresa que conduziram o processo de aposentadoria, inclusive promovendo o recolhimento tributário retroativo perante o INSS. O Ministério Público Federal sustenta que a defesa não comprova tal alegação, porém o ônus da prova quanto ao fato constitutivo da acusação recai sobre o parquet. Para os fins destes autos temos prova no sentido de que a pessoa jurídica continuou atuando depois de 1991, ainda que sob outra razão social, assim como de que o réu efetivamente prestou serviços de motorista à empresa.(grifou-se)

Sendo assim, é possível que o réu efetivamente acreditasse que possuía vínculo empregatício com a pessoa jurídica e que tenha postulado o benefício junto a seus patrões em virtude da confiança que neles depositava. Em outras palavras, há verossimilhança na tese de que CARLOS ALBERTO não tinha dolo de fraudar a autarquia previdenciária.

Saliento que a suposta contradição entre o depoimento prestado às autoridades policiais e o interrogatório judicial, tema suscitado pelo MPF em seu apelo, é meramente circunstancial e não prejudica a verossimilhança do que sustenta a defesa. O fato de o réu ter entregado os documentos primeiramente ao advogado da empresa que, posteriormente, os repassou para um escritório de contabilidade, ou, alternativamente, de ter o réu procurado o escritório de contabilidade diretamente por orientação do advogado da empresa não conforma contradição relevante. Tratando-se de fatos que ocorreram há mais de 12 anos é até mesmo esperada a existência de alguns lapsos. (...)"

Em semelhante sentido, pertinente trecho do voto condutor do julgamento da Apelação Criminal nº 5004617-46.2018.4.04.7110 (Sétima Turma, Relatora Exma. Desembargadora Federal Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 27/11/2019), em que, igualmente, foi mantida a sentença absolutória em ação movida contra outro segurado:

'(...)

No caso, o conjunto probatório dos autos não permite a segura conclusão acerca da presença de fraude quanto ao vínculo com a empresa COPAG do crime de estelionato.

Percebe-se que a materialidade do crime de estelionato pressupõe a demonstração de que o agente, mediante o implemento de algum artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento, tenha obtido vantagem indevida em prejuízo alheio, de forma que, na ausência desse duplo resultado (vantagem ilícita e prejuízo alheio), não há que se falar na configuração desse delito.

De acordo com as informações dos autos, a fraude imputada ao réu consistiria na informação de vínculos de emprego, quando, de acordo com o que restou apurado, as empresas COPAG Comércio de Produtos Agrícolas Ltda. e Cerealista Borges, já estariam inativas.

Entretanto, como bem pontuado pelo juízo a quo, em senteça:

Quando interrogado, o réu sustentou que efetivamente trabalhou na empresa COPAG no período indicado na inicial, iniciando suas atividades a pedido do então sócio-administrador Pedro Paulo Costa Silveira, no período que sucedeu ao episódio do denominado "arroz de papel". Referiu que a empresa passava por dificuldades e que, por já ter sido bancário, foi contratado e desenvolveu atividades na empresa até o ano de 2005. Mencionou que, após o óbito de Pedro Paulo, ocorrido aproximadamente no ano de 2001, a administração passou a ser desenvolvida pela esposa e filho do referido sócio, sendo que o réu paulatinamente se afastou das atividades, vindo a se desligar definitivamente no ano de 2005.

Embora as testemunhas referidas pela acusação (evento 21) mencionem o encerramento das atividades da empresa COPAG no ano de 1991, à exceção da testemunha Ricardo Costa Silveira, que chega a mencionar a existência de outras empresas utilizadas por seu irmão (Pedro Paulo) para o desenvolvimento da atividade, a prova testemunhal produzida nos autos da ação penal n.º 5008260-46.2017.4.04.7110, também de competência deste Juízo, corrobora a versão apresentada pelo réu.

Conforme se extrai da sentença proferida naqueles autos, onde igualmente estava sendo imputado o delito de estelionato diante da inserção de vínculo com a empresa COPAG, no período posterior ao registro de inatividade, o conteúdo dos depoimentos colhidos indicam que o sócio-administrador da COPAG (Pedro Paulo Costa Silveira) se envolveu em diversas irregularidades que prejudicaram o exercício das atividades da empresa. Todavia, aparentemente o encerramento das atividades desenvolvidas naquele local não ocorreu na data especificada na denúncia (ano de 1991).

Diante dessa quadro, não é possível concluir, com certeza, que a empresa mencionada, na qual o réu afirma ter trabalhado no período indicado, tenha de fato encerrado as atividades no ano de 1991. Desse modo, não há provas de que o vínculo do réu junto à empresa COPAG não tenha ocorrido.

Ademais, mesmo que se admitisse a fraude nas informações prestadas ao INSS, as provas constantes nos autos indicam que as alterações realizadas no sistema, em especial a inserção de vínculo inexistente, não foram realizadas pelo réu ou com o seu consentimento. Inclusive o acusado mencionou em seu interrogatório que nunca havia trabalhado na empresa Cerelista e que não tinha ideia de como houve a inclusão deste vínculo no seu cadastro junto ao INSS.

Além disso, como bem pontuado novamente pelo juízo a quo em sentença:

A partir das informações prestadas pelo próprio INSS, verifica-se que as irregularidades apontadas, consistentes na inclusão de vínculo inexistente (Cerealista Borges) e emissão de GFIP'S relativas a período anterior, foram realizadas após a concessão do benefício previdenciário ao réu e por pessoa com acesso aos sistemas informatizados da autarquia. Assim, na medida em que o réu encaminhou diretamente o benefício e não teria qualquer interesse em gerar guias para recolhimento de contribuições após a concessão do benefício, para o que sequer teria acesso ao sistema, inviável concluir tenha praticado diretamente a fraude, ou mesmo concorrido para o seu implemento.

As referências citadas, especialmente aquela relativa ao fato de que houve a supressão do vínculo do réu com a empresa COPAG junto ao CNIS, posteriormente à concessão do benefício, apontam para a responsabilidade das pessoas vinculadas aos escritórios de contabilidade investigados no âmbito do Inquérito Policial n.º 104/2012 pelo implemento da fraude. Ademais, não há nos autos cópia da CTPS do réu que permita concluir tenha o mesmo inserido, naquele documento, os vínculos mencionados na inicial.

Diante de tais circunstâncias, tenho que não há nos autos provas suficientes a embasar a conclusão de que o réu teria inserido dados falsos no sistema informatizado, simulando vínculo empregatício com as empresas COPAG COMÉRCIO DE PRODUTOS AGRÍCOLAS LTDA., e CEREALISTA BORGES, a fim de receber indevidamente o benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição.

Dessa forma, daí não se pode extrair, com segurança, que o acusado tenha mantido em erro o INSS, eis que se está na seara da mera possibilidade que impede a formação da convicção segura exigível para a condenação. E o campo da probabilidade, por si só, como é sabido, não conduz à necessidade de se proceder à responsabilização penal.

(...)"

No caso ora analisado, as testemunhas ouvidas em juízo (evento 80) corroboram a alegação do autor quanto à efetiva prestação do labor, indo no mesmo sentido da anotação em CTPS que, apesar de extemporânea, foi considerada válida e suficiente pela autarquia quando do ato concessório para a averbação do intervalo e consequente concessão de benefício previdenciário.

Registre-se que o vínculo controvertido se refere ao intervalo de 1982 a 1999 e a DIB do benefício é de 2007. Assim, à época do cancelamento da aposentadoria, em 2017, o vínculo já estava extinto há quase 20 anos e o processo administrativo concessório findado há mais de uma década, sendo irrazoável recair sobre o segurado o ônus de manter consigo documentação comprobatória do labor além daquela já considerada, como dito, suficiente pelo INSS em uma primeira análise administrativa.

Embora o INSS tenha o poder-dever de rever seus atos, quando eivados de nulidade, existem limites para essa atuação, quando se trata de atos que impliquem reconhecimento de direito em favor do segurado.

A Administração não pode desfazer ato de concessão de benefício ou reconhecimento de direito com base em simples reavaliação de provas e nova interpretação de normativos, após processo administrativo perfeito e acabado (Lei 9.769, art. 2º, XIII).

Ao examinar originalmente a documentação apresentada, entendeu o INSS que o segurado tinha direito ao que postulou, por ter preenchido os requisitos necessários, revestindo de presunção de legitimidade o ato concessório. A modificação desse ato dependeria da demonstração de que o segurado se houve com dolo, fraude ou má-fé, o que não ocorreu.

Dessa forma, tem o segurado direito:

- ao restabelecimento de sua aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da data de sua cessação administrativa (15/10/2017).

- ao pagamento das parcelas vencidas.

Transcorridos menos de cinco anos entre a cessação administrativa e o ajuizamento da ação, não há de se falar em prescrição quinquenal.

Reformada a sentença para reconhecer o direito ao restabelecimento do benefício, fica prejudicada a apelação do INSS quanto à forma de restituição de parcelas recebidas indevidamente, bem como quanto à possibilidade de reconhecimento do direito a benefício previdenciário diverso do expressamente postulado na inicial.

Da indenização por danos morais

Para caracterizar a ocorrência do dano moral não é necessário que haja o propósito deliberado de cancelar o benefício, mas há que se exigir do INSS cuidado redobrado na revisão administrativa, pois a pessoa que recebeu a aposentadoria, recebeu também a segurança do estado de que ela teria condições de se manter com a renda concedida. O motivo do cancelamento deve ser suficiente, com lastro em profunda averiguação e investigação dos fatos ocorridos, não bastando mera revaloração de provas.

Note-se que no presente caso, ainda que por suspeita de fraude, a Autarquia Previdenciária cancelou a aposentadoria do autor com base unicamente em reexame de provas e exclusão de períodos que haviam sido computados inicialmente na via administrativa.

Em que pese o cancelamento, de fato, tenha ocorrido no âmbito de uma investigação maior sobre irregularidades em vínculos trabalhistas em nome da empresa COPAG Comércio de Produtos Agrícolas Ltda., inseridos no sistemas do INSS por meio de Guias de Recolhimento de FGTS e de Informações à Previdência Social(GFIP), não havia elementos que apontassem diretamente a uma conduta ilícita pelo titular do benefício.

Assim, precipitada e injustificada a conduta da Autarquia na análise realizada no benefício de aposentadoria do autor, que resultou no cancelamento de prestação de natureza alimentar, direito fundamental do demandante, que necessitava da renda para fazer frente às suas despesas diárias, ainda mais considerando que teve o benefício cessado quando já possuía mais de 70 anos, momento da vida em que o retorno ao trabalho é praticamente inviável.

Como se sabe, o dano moral é in re ipsa, sendo suficiente à sua demonstração que se comprove a violação ao direito e a sua aptidão, em tese, para gerar uma situação de extremo sofrimento, angústia e degradação, e não mero dissabor ou incômodo comuns à vida cotidiana.

É o que ocorre no caso, a dar margem à indenização pelos danos morais sofridos.

Sabe-se que o arbitramento do dano moral deve buscar reparar o sofrimento causado, sem, contudo, significar enriquecimento excessivo, e, ao mesmo tempo, representar um alerta pedagógico ao violador do direito.

É preciso ter presente que o sofrimento é sempre pessoal e insuscetível de mensuração em pecúnia, de forma que a condenação tem por propósito apenas alcançar algum efeito compensatório, que não deve desprezar a circunstância de que o dano patrimonial será objeto de recomposição.

A jurisprudência do TRF da 4ª Região vem reconhecendo a existência de dano moral em casos de desconto indevido de proventos (EINF 2007.71.11.001727-3, j. 11/03/2010; AC 2006.72.05.000835-0, j. 23/02/2010), supressão de benefício antes de ocorrido o recadastramento (APELREEX 2007.72.10.001430-7, j. 23/02/2010), cancelamento de benefício por óbito não ocorrido (AC 2007.72.04.001208-7, j. 09/02/2010, entre outras hipóteses, sendo que o valor da indenização, considerando-se o caráter alimentar do benefício, tem variado conforme as circunstâncias do caso.

No caso dos autos, consideradas todas as circunstâncias que cercaram a suspensão do benefício, o tempo decorrido desde a suspensão, a idade do autor, arbitro o valor da indenização em R$ 20.000,00, dando, assim, parcial provimento à apelação respectiva, no ponto.

Consectários e provimentos finais

- Correção monetária

A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei n.º 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, foi afastada pelo STF no julgamento do tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, com trânsito em julgado em 03/03/2020.

No julgamento do tema 905, através do REsp 1.495146, e interpretando o julgamento do STF, transitado em julgado em 11/02/2020, o STJ definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, no recurso representativo da controvérsia e que, aos previdenciários, voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.

A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.

Juros de mora

Os juros de mora devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.

Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).

Honorários Advocatícios

Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.

Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência, devidos exclusivamente pelo INSS, devem ser fixados originariamente em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC. Conforme a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, a verba honorária deve incidir sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (acórdão).

Em 26/08/2020, foi afetado pelo STJ o Tema 1059, com a seguinte questão submetida a julgamento: "(Im) Possibilidade de majoração, em grau recursal, da verba honorária fixada em primeira instância contra o INSS quando o recurso da entidade previdenciária for provido em parte ou quando o Tribunal nega o recurso do INSS, mas altera de ofício a sentença apenas em relação aos consectários da condenação."

Ciente da existência de determinação de suspensão nacional dos feitos em que se discute essa matéria, e considerando a necessidade de evitar prejuízo à razoável duração do processo, a melhor alternativa, no caso, é diferir, para momento posterior ao julgamento do tema, a decisão sobre a questão infraconstitucional afetada, sem prejuízo do prosseguimento do feito quanto aos demais temas, evitando-se que a controvérsia sobre consectários possa produzir impactos à prestação jurisdicional principal.

Assim, deverá ser observado pelo juízo de origem, oportunamente, o que vier a ser decidido pelo tribunal superior quanto ao ponto.

Tutela específica - restabelecimento do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante ao restabelecimento do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Dados para cumprimento: ( ) Concessão (X) Restabelecimento ( ) Revisão

NB

144.141.702-5

Espécie

42 - aposentadoria por tempo de contribuição

DIB

05/09/2007

DIP

No primeiro dia do mês da implantação do benefício

DCB

Não se aplica

RMI

a apurar

Observações

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

Conclusão

Parcialmente provida a apelação da parte autora para determinar ao INSS o restabelecimento de sua aposentadoria por tempo de contribuição, a contar de sua cessação (15/10/2017), bem como para condenar a autarquia ao pagamento de indenização por danos morais, fixados em R$20.000,00. Adequados de ofício os critérios de correção monetária. Honorários advocatícios redistribuídos pela modificação da sucumbência. Nos demais pontos, mantida a sentença.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora, negar provimento à apelação do INSS e determinar o restabelecimento do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002431392v28 e do código CRC bf81b235.Informações adicionais da assinatura:
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5068038-74.2017.4.04.7100
40002431392.V28


Conferência de autenticidade emitida em 17/04/2021 04:01:21.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5068038-74.2017.4.04.7100/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: MILTON GAGLIARDI LACAU (AUTOR)

ADVOGADO: GLAUCIA BUCCO DE ALMEIDA (OAB RS064790)

ADVOGADO: ÂNGELO AUGUSTO BUSSOLLETTI CHIATTONE (OAB RS048462)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RESTABELECIMENTO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.

1. A possibilidade de o INSS revisar ou anular seus atos, quando eivados de nulidade, tem expressa previsão legal e é decorrência do dever de autotutela da Administração Pública.

2. Contudo, existem limites para a atuação da autarquia previdenciária ao revisar atos que impliquem reconhecimento de direito em favor do segurado.

3. A Administração não pode desfazer ato de concessão de benefício ou reconhecimento de direito com base em simples reavaliação de provas e nova interpretação em processo administrativo perfeito e acabado.

4. Hipótese em que o INSS, ao examinar originalmente a documentação apresentada, entendeu que o segurado tinha direito ao benefício que postulou, por ter preenchido os requisitos necessários, revestindo de presunção de legitimidade o ato concessório. A possibilidade de modificar este ato pressupõe a prova cabal de que houve ilegalidade, o que não ocorreu.

5. Preenchidos os requisitos legais, e não comprovada a prática de ilícito por parte do segurado, este tem direito ao restabelecimento de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar de sua indevida cessação.

6. O indeferimento, o cancelamento ou a revisão de benefício previdenciário pelo INSS, como regra, não caracteriza, por si só, dano moral indenizável. O INSS tem o dever de avaliar a legalidade do ato de concessão. Contudo, restando configurado o cancelamento injustificável e arbitrário do benefício pela autarquia, após vários anos da concessão, fica comprometida a segurança jurídica, tendo o INSS sujeitado o segurado a muito mais do que à mera frustração pelo cancelamento do benefício.

7. O cancelamento da aposentadoria após longos anos de inatividade por segurado idoso, que restou sem sua fonte de renda, causou evidente e relevante sofrimento, a justificar indenização.

8. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, sem modulação de efeitos.

9. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.

10. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, negar provimento à apelação do INSS e determinar o restabelecimento do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 07 de abril de 2021.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002431393v7 e do código CRC 7a5d1caf.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 9/4/2021, às 19:54:44


5068038-74.2017.4.04.7100
40002431393 .V7


Conferência de autenticidade emitida em 17/04/2021 04:01:21.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 07/04/2021

Apelação Cível Nº 5068038-74.2017.4.04.7100/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON

APELANTE: MILTON GAGLIARDI LACAU (AUTOR)

ADVOGADO: GLAUCIA BUCCO DE ALMEIDA (OAB RS064790)

ADVOGADO: ÂNGELO AUGUSTO BUSSOLLETTI CHIATTONE (OAB RS048462)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 07/04/2021, na sequência 455, disponibilizada no DE de 24/03/2021.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR O RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 17/04/2021 04:01:21.

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