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ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. TÉCNICO DO SEGURO SOCIAL. DESEMPENHO DE ATIVIDADES PRÓPRIAS DE AUDITOR/ANALISTA DA RECEITA FEDERAL. DESVIO DE FUNÇÃO NÃO ...

Data da publicação: 13/05/2022, 07:33:55

EMENTA: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. TÉCNICO DO SEGURO SOCIAL. DESEMPENHO DE ATIVIDADES PRÓPRIAS DE AUDITOR/ANALISTA DA RECEITA FEDERAL. DESVIO DE FUNÇÃO NÃO CONFIGURADO. 1. A produção de provas visa à formação do convencimento do juiz, que, por decisão fundamentada, pode indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias (artigos 355 e 370 do CPC). Existindo elementos probatórios suficientes para apreciação do litígio, não se afigura ilegal ou abusivo o julgamento antecipado da lide. 2. O desvio de função caracteriza-se nas hipóteses em que o servidor, ocupante de determinado cargo, exerce funções atinentes a outro cargo público, seja dentro da própria repartição ou em outro órgão. 3. O cargo público é conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na organização legal de uma entidade e do servidor. O exercício de um cargo pressupõe não apenas funções executivas, mas as responsabilidades pelos atos por ele praticados. Para configurar-se o desvio, mister prova de que o servidor desempenhada(ou) as funções e responsabilidades da carreiras paradigma. 4. A jurisprudência deste Tribunal exige a comprovação do exercício de funções inerentes a outro cargo de forma permanente e habitual. (TRF4, AC 5007698-95.2016.4.04.7102, QUARTA TURMA, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 05/05/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5007698-95.2016.4.04.7102/RS

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

APELANTE: PATRÍCIA AVENA DE BORBA (AUTOR)

ADVOGADO: LUCIANA INES RAMBO (OAB RS052887)

ADVOGADO: Heverton Renato Monteiro Padilha (OAB RS074807)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente a ação, nos seguintes termos:

Ante o exposto, afasto a preliminar de prescrição suscitada e julgo improcedente o pedido, resolvendo o feito com julgamento de mérito, nos termos do art. 487, I , do CPC.

Honorários advocatícios. Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios para o procurador da parte contrária, verba que fixo em 10% do valor da causa, nos termos do art. 85, §3º, do NCPC. Resta suspensa a exigibilidade da verba em razão da assistência judiciária gratuita deferida nos autos (art. 98, §3º, do CPC).

Custas isentas (art. 4º, II, da Lei nº 9.289/96).

Sem reexame necessário, nos termos do art. 496, §3º, I, do CPC.

Havendo recurso de apelação desta sentença, intime-se a parte recorrida para oferecimento de contrarrazões, observado o disposto nos arts. 1.009, § 2º e 1.010, § 2º, do CPC-2015. Em seguida, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, independentemente de juízo de admissibilidade, inclusive no que se refere à regularidade do preparo, nos termos do artigo 1.010, § 3º, do mesmo diploma legal.

Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.

Transitada em julgado, intimem-se as partes e dê-se baixa, com arquivamento do feito.

Em suas razões, a parte autora sustentou, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, uma vez que foi indeferido o pedido de realização de prova pericial (o julgador entendeu que é desnecessária para a comprovação das atividades realizadas pela apelante, sendo a prova documental e testemunhal suficientes para o desfecho da demanda) e, ainda que se faculte ao julgador avaliar a conveniência da produção das provas, cabia sopesar se o encerramento da instrução não romperia com a necessária igualdade de forças que torna a solução do conflito imparcial. No mérito, defendeu que: (1) desde a sua redistribuição para desempenhar suas funções junto da Receita Federal, por força do art. 12 da Lei nº 11.457/07, exerceu atribuições que não eram pertinentes ao cargo ocupado (técnico do seguro social), e, pela natureza do serviço, eram típicas do cargo de auditor-fiscal da Receita Federal; (2) de acordo com a legislação de regência, a análise técnica e desenvolvimento das tarefas que demandassem maior esforço intelectual e maiores responsabilidades deveriam ficar a cargo do auditor-fiscal da Receita Federal e que as demais funções de auxílio administrativo seriam exercidas pelos técnicos e analistas da Receita; (3) conforme os documentos juntados em anexo, e pelos depoimentos colhidos durante a instrução processual, a apelante efetuava o lançamento dos débitos tributários e de contribuições das pessoas físicas e jurídicas, bem como o exame da contabilidade das obras de pessoas jurídicas com a finalidade de fiscalizar a regularidade dos pagamentos dos débitos e verificar a existência de pendências, analisando livros, registros e escrituras de papéis, utilizando a prerrogativa concedida às autoridades fazendárias, de acordo com a autorização expressa no art. 1.193 do Código Civil; (4) ainda, cabia à servidora a tarefa de orientar o sujeito passivo no tocante à interpretação da legislação tributária e supervisionar as demais atividades de esclarecimento ao contribuinte. Todas essas atividades, conforme exposto anteriormente, constam no rol de atribuições do art. 2º do Decreto nº 6.641/2008 e são competências, frise-se, privativas de auditor-fiscal da Receita; (5) nenhuma dessas atividades era praticada pela servidora com supervisão do auditor-fiscal responsável ou de analista-tributário, uma vez que detinha poder decisório sobre as referidas atribuições; (6) desempenhava várias atividades que vão além daquelas constantes no rol de atribuições do cargo de técnico do seguro social. Exemplificativamente, pode-se citar: análise de documentos; análise de contabilidade das empresas; geração de guias de arrecadação; parcelamento de débitos; capeamento e movimentação de processos internos (tanto físicos quanto virtuais); levantamento e lançamento de débitos; análise de obras de pessoa Jurídica e pessoa Física; cálculo de pró-labore, entre outros; (7) a maioria das atividades exercidas eram atribuídas aos auditores fiscais, mas realizadas pela apelante, fato esse que, diga-se, foi reconhecido pelo julgador quando refere em sua decisão, ao referir que “a servidora executava algumas das tarefas descritas na inicial, mas em regime de apoio; e (8) caso não reste reconhecido que a apelante laborou em desvio de função para o cargo de auditor-fiscal, é imperativo que se reconheça o desvio para analista-tributário. Nesses termos, pugnou pelo: a) o acolhimento da preliminar de apelação (art. 1.009, § 1º, do CPC), cassando-se a r. sentença, para que seja determinada a produção da prova pericial, sob pena de configuração de cerceamento de defesa; b) se superada a preliminar, no juízo de mérito, o total provimento do apelo, para fins de que seja reformada a r. sentença, julgando-se procedentes na íntegra os pedidos formulados na inicial. c) quanto aos honorários advocatícios, requer a inversão do ônus da sucumbência, com a condenação da apelada a suportá-los, na forma do art. 85, § 3º, do CPC, com a devida observância ao § 5º do mesmo diploma. Ainda, que arque com as despesas processuais, inclusive custas judiciais, na forma dos arts. 82, § 2º, e 84, do CPC, bem como com eventuais despesas referentes à contratação de peritos, inclusive contador à apresentação de cálculos de liquidação de sentença.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

I - A produção de provas visa à formação do convencimento do juiz, que, por decisão fundamentada, pode indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias (artigos 355 e 370 do CPC). Existindo elementos probatórios suficientes para apreciação do litígio, não se afigura ilegal ou abusivo o julgamento antecipado da lide.

In casu, o magistrado a quo entendeu que a prova pericial é desnecessária para a comprovação das atividades realizadas pela autora, sendo a prova documental e testemunhal suficientes para o desfecho da demanda.

Com efeito, comungo de tal entendimento, porquanto, como bem salientado pela União em contrarrazões: (i) referida prova, no caso em apreço, é absolutamente desnecessária, já que os fatos arguidos pela parte autora puderem ser facilmente cotejados pelos depoimentos testemunhais e provas documentais juntadas aos autos, as quais suprem de forma proporcional a razoável a instrução do feito; (ii) foram colhidos depoimentos de diversos servidores lotados na unidade em que a servidora desempenhou suas funções, com testemunhos claros, evidentes e absolutamente esclarecedores a respeito dos fatos arguidos. Ademais, foi produzida extensa prova documental, sobre a qual a parte autora teve a oportunidade de se manifestar e exercer seu contraditório; e (iii) eventual reconhecimento de nulidade requer a demonstração de efetivo prejuízo, o qual a parte autora não logrou êxito em demonstrar. Arguiu na apelação que o indeferimento de perícia macula toda a instrução processual, devendo ser reconhecida a nulidade da sentença. Entretanto, tal argumento é feito de forma genérica, sem demonstrar em que medida o indeferimento da perícia violou seu direito e não pode ser suprido pelas demais provas dos autos.

Nesse contexto, não se vislumbra cerceamento de defesa, a inquinar a sentença.

II - Ao analisar o pleito deduzido na inicial, o magistrado a quo assim decidiu:

Cuida-se de ação ordinária proposta por PATRÍCIA AVENA DE BORBA em face da UNIÃO - (AGU), objetivando reconhecimento do desvio de função.

Narra a autora, em suma, ser servidora pública aposentada, tendo ocupado o cargo de técnico do seguro-social. Contudo, afirmou que desempenhou funções atinentes ao cargo de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, afirmando estar caracterizado o desvio funcional e pugnando, por consequência, pelo seu reconhecimento judicial, bem como os consectários legais daí decorrentes. Subsidiariamente, pleiteou o reconhecimento de desvio de função para o cargo de Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil. Requereu a AJG. Juntou documentos.

Deferido o benefício da assistência judiciária gratuita (AJG) (Evento 4).

Citada, a União apresentou contestação (Evento 7), sustentando, preliminarmente, que o pedido resta fulminado pela prescrição. Outrossim, impugnou o pedido de AJG, argumentando que a renda da autora ultrapassa o parâmetro utilizado para isenção do imposto de renda. Da mesma forma, defendeu-se aduzindo que a pretensão deduzida traduzir-se-ia como "burla" ao ordenamento jurídico vigente. Nesses termos, pugnou pela total improcedência do pedido da parte autora.

Houve réplica (Evento 11), onde a demandante reiterou os argumentos tecidos na exordial.

Mantido o beneficio da AJG deferido à autora (Evento 13).

Expedido ofício ao Delegado da Receita Federal solicitando envio de relatório contendo todas as atividades desempenhadas pela autora desde sua redistribuição à DRF/STM, até sua aposentadoria, especificando, ainda, o cargo inerente a(s) atividade(s), ora relacionadas. O documento foi anexado ao Evento 24.

Colhida a prova oral (Evento 69).

Apresentados memoriais de ambas as partes (Eventos 73 e 76).

Juntados aos autos o Manual de Procedimentos do Centro de Atendimento ao Contribuinte (Evento 84).

Veio concluso.

Decido

1. PRELIMINARMENTE

1.1. Prescrição

Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, firmada em sede de recurso repetitivo, o prazo de prescrição aplicável é o do Decreto nº 20.910/32:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (ARTIGO 543-C DO CPC). RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL (ART. 1º DO DECRETO 20.910/32) X PRAZO TRIENAL (ART. 206, § 3º, V, DO CC). PREVALÊNCIA DA LEI ESPECIAL. ORIENTAÇÃO PACIFICADA NO ÂMBITO DO STJ. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. 1. A controvérsia do presente recurso especial, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC e da Res. STJ n 8/2008, está limitada ao prazo prescricional em ação indenizatória ajuizada contra a Fazenda Pública, em face da aparente antinomia do prazo trienal (art. 206, § 3º, V, do Código Civil) e o prazo quinquenal (art. 1º do Decreto 20.910/32). 2. O tema analisado no presente caso não estava pacificado, visto que o prazo prescricional nas ações indenizatórias contra a Fazenda Pública era defendido de maneira antagônica nos âmbitos doutrinário e jurisprudencial. Efetivamente, as Turmas de Direito Público desta Corte Superior divergiam sobre o tema, pois existem julgados de ambos os órgãos julgadores no sentido da aplicação do prazo prescricional trienal previsto no Código Civil de 2002 nas ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública. Nesse sentido, o seguintes precedentes: REsp 1.238.260/PB, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 5.5.2011; REsp 1.217.933/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 25.4.2011; REsp 1.182.973/PR, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJe de 10.2.2011; REsp 1.066.063/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe de 17.11.2008; EREspsim 1.066.063/RS, 1ª Seção, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 22/10/2009). A tese do prazo prescricional trienal também é defendida no âmbito doutrinário, dentre outros renomados doutrinadores: José dos Santos Carvalho Filho ("Manual de Direito Administrativo", 24ª Ed., Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris, 2011, págs. 529/530) e Leonardo José Carneiro da Cunha ("A Fazenda Pública em Juízo", 8ª ed, São Paulo: Dialética, 2010, págs. 88/90). 3. Entretanto, não obstante os judiciosos entendimentos apontados, o atual e consolidado entendimento deste Tribunal Superior sobre o tema é no sentido da aplicação do prazo prescricional quinquenal - previsto do Decreto 20.910/32 - nas ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública, em detrimento do prazo trienal contido do Código Civil de 2002. 4. O principal fundamento que autoriza tal afirmação decorre da natureza especial do Decreto 20.910/32, que regula a prescrição, seja qual for a sua natureza, das pretensões formuladas contra a Fazenda Pública, ao contrário da disposição prevista no Código Civil, norma geral que regula o tema de maneira genérica, a qual não altera o caráter especial da legislação, muito menos é capaz de determinar a sua revogação. Sobre o tema: Rui Stoco ("Tratado de Responsabilidade Civil". Editora Revista dos Tribunais, 7ª Ed. - São Paulo, 2007; págs. 207/208) e Lucas Rocha Furtado ("Curso de Direito Administrativo". Editora Fórum, 2ª Ed. - Belo Horizonte, 2010; pág. 1042). 5. A previsão contida no art. 10 do Decreto 20.910/32, por si só, não autoriza a afirmação de que o prazo prescricional nas ações indenizatórias contra a Fazenda Pública foi reduzido pelo Código Civil de 2002, a qual deve ser interpretada pelos critérios histórico e hermenêutico. Nesse sentido: Marçal Justen Filho ("Curso de Direito Administrativo". Editora Saraiva, 5ª Ed. - São Paulo, 2010; págs. 1.296/1.299). 6. Sobre o tema, os recentes julgados desta Corte Superior: AgRg no AREsp 69.696/SE, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 21.8.2012; AgRg nos EREsp 1.200.764/AC, 1ª Seção, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe de 6.6.2012; AgRg no REsp 1.195.013/AP, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 23.5.2012; REsp 1.236.599/RR, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJe de 21.5.2012; AgRg no AREsp 131.894/GO, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJe de 26.4.2012; AgRg no AREsp 34.053/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 21.5.2012; AgRg no AREsp 36.517/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 23.2.2012; EREsp 1.081.885/RR, 1ª Seção, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe de 1º.2.2011. 7. No caso concreto, a Corte a quo, ao julgar recurso contra sentença que reconheceu prazo trienal em ação indenizatória ajuizada por particular em face do Município, corretamente reformou a sentença para aplicar a prescrição quinquenal prevista no Decreto 20.910/32, em manifesta sintonia com o entendimento desta Corte Superior sobre o tema. 8. Recurso especial não provido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008. (STJ, REsp 1251993/PR, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julg. 12/12/2012, DJe 19/12/2012)

Ajuizada a demanda em 28/09/2016, nos termos do Decreto nº 20.010/32 e da Súmula 85 do STJ, encontrar-se-íam prescritas, em caso de condenação, as parcelas anteriores a 28/09/2011.

2. MÉRITO

Versa a presente demanda sobre pleito de reconhecimento de desvio funcional, onde a parte autora, investida no cargo de Técnico do Seguro, alega que exerce funções próprias do cargo de Auditor Fiscal da Receita Federal. Subsidiariamente, pretende que seja reconhecido o desvio funcional relativo ao cargo de Analista Tributário, requerendo, destarte, o reconhecimento do direito às diferenças remuneratórias existentes entre os citados cargos.

No que tange à matéria em pauta, a jurisprudência de nossa Corte Especial é pacífica no sentido de, uma vez comprovado o exercício de atividade desviada, exsurge o direito às diferenças remuneratórias. A propósito, este é o entendimento estampado no verbete nº 378 da jurisprudência daquela corte, que colaciono, in verbis:

Nesse sentido, foi editado o verbete 378 da súmula do STJ: "Reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes".

De antemão, destaco que tal posição não se consubstancia em violação à regra do concurso público (CF, art 37, II). Isto porque não se cuida de alteração de cargo, promoção ou progressão funcional, que são veementemente vedadas pelo ordenamento jurídico pátrio, mas tão somente do reconhecimento da impossibilidade de chancelar o enriquecimento indevido por parte do Estado, em afronta às mais antigas regras do Direito.

Ao revés, o que de fato constitui violação à necessidade de concurso para a investidura de cargos é a própria situação de desvio funcional, conforme já lecionado por nosso Egrégio TRF4:

"ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA. DESVIO DE FUNÇÃO. DIFERENÇAS SALARIAIS. SITUAÇÃO ADMINISTRATIVA IRREGULAR. 1. O servidor público que realiza funções alheias ao cargo para o qual foi originalmente provido, decorrente de desvio de função, tem direito ao pagamento das diferenças salariais correspondentes ao período, sob pena de locupletamento indevido por parte do Estado. 2. Por se tratar de situação administrativa irregular o direito deve ser limitado à data da ciência pela ré dos termos da sentença, devendo a autora ser reconduzida às atribuições do cargo, porque a manutenção do desvio implica violação à exigência constitucional de concurso para o provimento de cargos públicos." (TRF4, APELREEX 5008237-43.2011.404.7100, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Jorge Antonio Maurique, D.E. 09/08/2012)

A demandante passou a integrar os quadros da Secretaria da Receita Federal do Brasil-RFB em 02/05/2007, data da fusão da Secretaria da Receita Federal-SRF com a extinta Secretaria da Receita Previdenciária-SRP, no cargo de Agente Administrativo, em exercício na Equipe de Atendimento ao Contribuinte 2, vinculada à estrutura do Centro de Atendimento ao Contribuinte-CAC da Delegacia da Receita Federal em Santa Maria, seção onde permaneceu até sua aposentadoria voluntária em 30/06/2014. Em 01/10/2007 a servidora ascendeu ao cargo de Técnico do Seguro Social, exercendo direito facultado pela legislação da reestruturação dos cargos integrantes da Carreira Previdenciária (Art. 5º da Lei 10.855/2004, com a redação da Lei 11.501/2007).

Analisando-se as provas colacionadas aos autos, verifico que as tarefas executadas pela autora apenas se aproximam às tarefas de mero auxílio àquelas atribuídas por lei ao Auditor no que se refere, basicamente, ao procedimento fiscal.

Frise-se que tal conclusão é amplamente corroborada pela prova testemunhal prestada por HERVÊ SAUL PANISSON TASCHETTO –, Auditor Fiscal que atuou no local de trabalho da postulante, no mesmo período (Evento 69 - AUDIO5). O referido servidor explicou que o Centro de Atendimento ao Contribuinte (CAC) foi criado para prestar melhor atendimento ao cidadão, local onde é centralizado o atendimento presencial. Na sequência, esclareceu que as demandas são formalizadas no Centro de Atendimento e encaminhadas para a Seção de Fiscalização, onde ocorre a análise mais apurada das questões apresentadas. Acrescentou que no CAC algumas atividades são conclusivas e outras não, sendo que a "orientação ao contribuinte faz parte do serviço de todos os servidores".

Também merece destaque no depoimento do aludido servidor a declaração de que “no Centro de Atendimento não existe nenhum serviço privativo do Auditor Fiscal”. Referiu que o Lançamento de Débito Confessado (LDC) não é lançamento de crédito tributário, como alega a demandante. A testemunha mencionou que no LDC há formulário padrão, não havendo juízo de mérito, sendo o valor informado pelo próprio contribuinte.

No mesmo sentido é o relato do servidor CLAUDIR LUIS RUEDELL (Evento 69 - AUDIO4), Auditor Fiscal, ao declarar que o LDC seria apenas um registro do contribuinte, não podendo ser considerado lançamento de crédito fiscal, ato privativo do Auditor Fiscal. Por fim, elucidou que narrou que o lançamento do crédito é concentrado na Seção de Fiscalização, muito eventualmente seria constituir algum crédito na área de Arrecadação". A testemunha ATHAIDE VARGAS ROSA (Evento 69 - AUDIO3), Auditor Fiscal, reforça a convicção desse magistrado para rejeitar o pedido da autora, uma vez que informou que o lançamento "é feito exclusivamente por auditores e tem dois servidores que auxiliam. Alguma coisa residual era feita no nosso setor, 2% 3%(...). Então basicamente de lançamentos fiscais, de apurar o crédito é feito na Seção de Fiscalização".

Assim, infere-se que a autora não realizava atividades típicas do cargo de Auditor Fiscal da Receita Federal, ou mesmo do cargo de Analista Tributário. Se praticou alguma tarefa alheia às atribuições do cargo em que ocupava, tal se deu eventualmente, o que não autoriza o reconhecimento do desvio de função, haja vista o precedente da Corte local colacionado:

ADMINISTRATIVO. DESVIO DE FUNÇÃO. OFICIAL DE JUSTIÇA AD HOC. EVENTUALIDADE. DESVIO NÃO RECONHECIDO. Para que fique caracterizado o desvio de função, é necessário que o servidor permanentemente exerça funções inerentes a outro cargo. O exercício eventual e esporádico de outras atividades, além daquelas expressamente previstas para o cargo do servidor, não gera direito à indenização. (TRF4, AC 5039975-10.2015.4.04.7100, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 08/09/2017)

Conjugando as declarações anteriormente transcritas, aos documentos juntados aos autos, tenho que a autora executava algumas das tarefas descritas na inicial em regime de apoio, em decorrência de recomendação da Administração.

Não havia, ao que se depreende do contexto do caso concreto, análise da escrituração contábil de empresas, nem lançamento de crédito tributário, atividade privativa do cargo de Auditor Fiscal e do cargo de Analista Tributário, consistindo a atividade desempenhada, a maioria das vezes, na inserção, nos sistemas informatizados da Secretaria da Receita Previdenciária, de valores declarados espontaneamente pelo contribuinte.

Tal situação se mostra, dentro do contexto, necessária, em razão da eficiência que norteia a Administração Pública, a fim de permitir a adequada prestação dos serviços estatais, tendo em vista a constante evolução da demanda pública e a notória escassez dos quadros funcionais, não podendo ser executadas por Auditores Fiscais todas as atividades-meio dos órgãos fazendários.

Diante disso, não há como se reconhecer a situação de desvio funcional em relação às atividades exercidas pela autora, que não se caracterizam como atividades privativas de Auditor Fiscal e de Analista Tributário, de sorte que a decretação de improcedência é a medida imperativa.

(...)

A tais fundamentos, não foram opostos argumentos idôneos a infirmar o convencimento do julgador.

É firme, na jurisprudência, o entendimento no sentido de que o servidor público tem direito à precepção de diferenças remuneratórias, a título de indenização, quando exercer, de forma habitual e permanente, atribuições alheias ao cargo legalmente ocupado e a retribuição dos cargos for distinta:

O empregado, durante o desvio funcional, tem direito a diferença salarial, ainda que o empregador possua quadro de pessoal organizado em carreira. (súmula 223 do TFR)

Reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes. (súmula 378 do STJ)

Se, de um lado, há o princípio da legalidade (art. 37, caput, da CRFB e Lei n.º 8.112/1990), a impedir o pagamento de remuneração distinta daquela prevista em lei; de outro, é devida a compensação pecuniária dos prejuízos decorrentes do ilícito praticado pela Administração (que exigiu do servidor prestação laboral distinta daquela prevista para o seu cargo), por força do princípio que veda o enriquecimento sem causa.

Em casos análogos a estes autos, para a caracterização do desvio de função, a jurisprudência deste Tribunal exige a comprovação do exercício de funções inerentes a outro cargo de forma permanente e habitual.

Nesse sentido:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DESVIO DE FUNÇÃO. TÉCNICO E ANALISTA JUDICIÁRIO. OFICIAL DE JUSTIÇA AD HOC DA JUSTIÇA ELEITORAL. AUSÊNCIA DE HABITUALIDADE. DESVIO NÃO RECONHECIDO. 1. Nos termos da súmula 378 do e. STJ, reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes. 2. Todavia, para que fique caracterizado o desvio de função, é necessário que o servidor permanentemente exerça funções inerentes a outro cargo. O exercício eventual e esporádico de outras atividades, além daquelas expressamente previstas para o cargo do servidor, não gera direito à indenização. Hipótese em que não se verifica habitualidade no exercício da atividade de oficial de justiça ad hoc. (TRF4, AC 5037961-53.2015.404.7100, Quarta Turma, Relatora Loraci Flores de Lima, juntado aos autos em 23/02/2017).

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. AGENTE ADMINISTRATIVO. DESVIO DE FUNÇÃO NÃO CONFIGURADO. Não estando demonstrado que as tarefas desempenhadas eram realizadas de modo permanente, sendo as mesmas exclusivas do cargo de Auditor-Fiscal da Receita Nacional, não há que se falar em desvio de função. (TRF-4, AC 50660396220124047100 RS 5066039-62.2012.404.7100, Quarta Turma, Relator LUís Alberto D'Azevedo Aurvalle, data de Julgamento: 04/08/2015, Data de Publicação: D.E. 05/08/2015).

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ANVISA. AGENTE ADMINISTRATIVO. ESPECIALISTA EM REGULAÇÃO E VIGILÂNCIA SANITÁRIA. DESVIO DE FUNÇÃO NÃO CONFIGURADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. 1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que, reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais dele decorrentes. 2. No caso, não se vislumbra que as tarefas desempenhadas pela parte autora eram, de modo permanente, exclusivas do cargo de Especialista em Regulação e Vigilância Sanitária. 3. Manutenção da sentença de improcedência. (TRF-4, AC 50289965720134047100 RS 5028996-57.2013.404.7100, Terceira Turma, Relator MARGA INGE BARTH TESSLER, Data de Julgamento: 26/03/2014, Data de Publicação: D.E. 27/03/2014).

Portanto, é ônus da autora provar o fato constitutivo de seu direito, in casu, pela demonstração de que exercia atribuições privativas de Analistas/Auditores Fiscais de forma habitual e permanente.

No caso dos autos, a autora prestou concurso público para agente administrativo, que foi transformado no cargo de técnico previdenciário, integrante da Carreira do Seguro Social, a partir da Lei 10.855/2004 (evento 7 dos autos originários, OFIC2).

As atribuições dos Técnicos Previdenciários e Analistas Previdenciários foram descritas no art. 6º, da Lei nº 10.667/2003, nos seguintes termos:

Art. 6º. (...)

I - Analista Previdenciário:

a) instruir e analisar processos e cálculos previdenciários, de manutenção e de revisão de direitos ao recebimento de benefícios previdenciários;

b) proceder à orientação previdenciária e atendimento aos usuários;

c) realizar estudos técnicos e estatísticos; e

d) executar, em caráter geral, as demais atividades inerentes às competências do INSS;

II - Técnico Previdenciário: suporte e apoio técnico especializado às atividades de competência do INSS.

Parágrafo único. O Poder Executivo poderá dispor de forma complementar sobre as atribuições decorrentes das atividades a que se referem os incisos I e II.

Posteriormente, a Lei n.º 11.501/07, que alterou a denominação do cargo, estabeleceu como atribuições do cargo de Técnico do Seguro Social (anexo I, tabela III): 'Realizar atividades técnicas e administrativas, internas ou externas, necessárias ao desempenho das competências constitucionais e legais a cargo do INSS, fazendo uso dos sistemas corporativos e dos demais recursos disponíveis para a consecução dessas atividades'.

O Decreto nº 6.641/2008, que regulamenta as atribuições da Carreira de Auditoria da Receita Federal do Brasil, composta pelos cargos de nível superior de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e de Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil, conforme previsão contida no § 3º do art. 6º da Lei nº 10.593, de 6 de dezembro de 2002, assim dispõe:

(...)

Art. 2o São atribuições dos ocupantes do cargo de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil:

I - no exercício da competência da Secretaria da Receita Federal do Brasil e em caráter privativo:

a) constituir, mediante lançamento, o crédito tributário e de contribuições;

b) elaborar e proferir decisões ou delas participar em processo administrativo-fiscal, bem como em processos de consulta, restituição ou compensação de tributos e contribuições e de reconhecimento de benefícios fiscais;

c) executar procedimentos de fiscalização, praticando os atos definidos na legislação específica, inclusive os relacionados com o controle aduaneiro, apreensão de mercadorias, livros, documentos, materiais, equipamentos e assemelhados;

d) examinar a contabilidade de sociedades empresariais, empresários, órgãos, entidades, fundos e demais contribuintes, não se lhes aplicando as restrições previstas nos arts. 1.190 a 1,192 do Código Civil e observado o disposto no art. 1.193 do mesmo diploma legal;

e) proceder à orientação do sujeito passivo no tocante à interpretação da legislação tributária; e

f) supervisionar as demais atividades de orientação ao contribuinte; e

II - em caráter geral, exercer as demais atividades inerentes à competência da Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Art. 3o Incumbe aos ocupantes dos cargos de Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil, resguardadas as atribuições privativas referidas no inciso I do art. 2o:

I - exercer atividades de natureza técnica, acessórias ou preparatórias ao exercício das atribuições privativas dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil;

II - atuar no exame de matérias e processos administrativos, ressalvado o disposto na alínea “b” do inciso I do art. 2o; e

III - exercer, em caráter geral e concorrente, as demais atividades inerentes às competências da Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Art. 4o São atribuições dos ocupantes dos cargos efetivos de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e de Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil, em caráter geral e concorrente:

I - lavrar termo de revelia e de perempção;

II - analisar o desempenho e efetuar a previsão da arrecadação; e

III - analisar pedido de retificação de documento de arrecadação.

Art. 5o Os ocupantes dos cargos efetivos de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e de Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil, em caráter geral e concorrente, poderão ainda exercer atribuições inespecíficas da Carreira de Auditoria da Receita Federal do Brasil, desde que inerentes às competências da Secretaria da Receita Federal do Brasil, em especial:

I - executar atividades pertinentes às áreas de programação e de execução orçamentária e financeira, contabilidade, licitação e contratos, material, patrimônio, recursos humanos e serviços gerais;

II - executar atividades na área de informática, inclusive as relativas à prospecção, avaliação, internalização e disseminação de novas tecnologias e metodologias;

III - executar procedimentos que garantam a integridade, a segurança e o acesso aos dados e às informações da Secretaria da Receita Federal do Brasil;

IV - atuar nas auditorias internas das atividades dos sistemas operacionais da Secretaria da Receita Federal do Brasil; e

V - integrar comissão de processo administrativo disciplinar.

Art. 6o Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 7o Fica revogado o Decreto no 3.611, de 27 de setembro de 2000.

A respeito das atribuições da autora, colhe-se da prova testemunhal (evento 69 dos autos originários):

A testemunha Ana Margareth Leite Gress (AUDIO2), administradora, colega da autora, afirmou que: ela e a autora trabalham lado a lado com analistas, alguns auditores, e executam o mesmo trabalho; ela e a autora fazem lançamento de débitos confessados (LDC), "mas, é um lançamento, tanto é um lançamento que exige assinatura do contribuinte (...) e a gente assina junto também", esse tipo de lançamento pode ser feito também por auditor, nesses lançamentos são constituídos créditos de contribuinte individual, de empregador doméstico, de reclamatária trabalhista e de regularização de obra; em relação ao LDC, elas orientam como deve ser feito, a forma de pagamento, a legislação que disciplina; fazem as mesmas atividades dos analistas; quando foram redistribuídas, faziam a parte previdenciária, depois passaram a fazer a parte fazendária; a autora realizava retificação de GPS; não recorda que a autora realizasse retificação de DARF; realizaram constituição de crédito, emissão de guias, orientações; a autora é formada em Administração; as atividades desempenhadas eram supervisionadas por uma chefia, mas, por terem vindo da previdência, muitas vezes eram elas que orientam os colegas; a atividade primordial do técnico do seguro social era o atendimento ao público; a autora realizava "todas as atividades que tem que fazer atendendo ao público", recepcionando documentos, analisando processos, orientando contribuintes, fazendo os lançamentos.

A testemunha Athaíde Vargas Rosa (AUDIO3), Auditor-Fiscal da Receita Federal, afirmou que: foi chefe na sessão de cobrança e arrecadação, atuava no rescaldo do trabalho do atendimento (quem não pagasse o LDC, ia para a cobrança); os técnicos foram trazidos para dentro da Receita, ficaram numa condição provisória, recebendo pelo INSS, vinculados à Receita Federal; a autora efetuava LDC, que poderiam findar no atendimento - faz o levantamento, vê o valor, recolhe).

A testemunha Claudir Luis Ruedell (AUDIO4), Auditor-Fiscal da Receita Federal, colega, afirmou que: é chefe da seção de fiscalização; no Centro de Atendimento ao Contribuinte de Santa Maria, o contribuinte é recebido e direcionado a um dos atendentes (pode ser feito trabalho de retaguarda, mas "o grosso é nas demais seções"); recorda-se que a autora trabalhava no CAC, setor de atendimento ao contribuinte (atendente), mas não tem lembrança das atividades realizadas; o LDC é um formulário preenchido pelo contribuinte e registrado no sistema (realizado no atendimento); entende o LDC como um registro; nunca presenciou a autora fazendo análise contábil.

A testemunha Hervê Saul Panisson Taschetto (AUDIO5), Auditor-Fiscal, chefe da autora durante o todo tempo em que trabalhou na Receita, afirmou que: desde que houve a fusão da Receita Federal com a Previdenciária até a aposentadoria da autora, foi chefe no CAC (aproximadamente 20 anos), saiu em 2015; o Centro de Atendimento ao Contribuinte foi criado para concentrar em um único lugar todo o atendimento ao contribuinte, onde é centralizado o atendimento presencial; com a informatização dos procedimentos, a presença do contribuinte tem diminuído, em função do "serviço na página"; o atendimento compreende a execução de serviços solicitados pelo contribuinte; grande parte dos serviços se esgotam no atendimento (serviço conclusivo); existem outras demandas no setor, o servidor recebe a documentação e essa documentação é inserida num processo, num dossiê, atualmente a documentação é digitalizada; essa documentação é recebida, porque não são os servidores do CAC que tem o perfil para desenvolver determinada atividade (por exemplo, o contribuinte recebe uma notificação de Lançamento, relativa à malha fina do Imposto de Renda, se ele não concorda com os termos e no prazo legal, ele apresenta uma impugnação. O processo é formalizado no CAC, onde ele apresenta os documentos e esse processo é encaminhado para outra seção, no caso, a seção de arrecadação e, então, encaminha-se o processo para uma Delegacia de Julgamento); quando houve a fusão, houve o ingresso dos técnicos da carreira do seguro social, então, dependendo do serviço, existem perfis; no CAC não existe nenhum serviço privativo de auditor fiscal, porque serviço privativo de servidor auditor fiscal é feito somente na arrecadação ou na fiscalização, e existe somente um serviço privativo da carreira de auditoria da receita federal realizado no CAC, que é a retificação de DARF, e só o analista e o auditor que podem executar essa retificação, e a autora nunca pode fazer esse trabalho; há um Manual, em nível nacional, para que as informações sejam repassadas ao contribuinte sempre da mesma forma, então, todos os servidores têm perfis e são habilitados para fornecer orientações básicas sobre documentação, sobre procedimentos; no CAC não há atividade de lançamento de crédito tributário; existem analista tributários lotados no CAC, executam as mesmas atividades dos demais servidores, a única atividade diferente é a retificação de DARF; no atendimento, nunca se faz nada de ofício, é sempre a pedido do contribuinte; retificação de documento de arrecadação é feito só por auditor e analista; a alteração da guia da previdência social pode ser feita por técnico do seguro social, como pode ser feita pelo analista; quanto ao LDC - Lançamento do Débito Confessado, não é um lançamento de crédito tributário na acepção genuína; de forma alguma o LDC é um lançamento, porque o lançamento é de ofício, pressupõe uma ciência do contribuinte; nunca presenciou a servidora Patrícia realizando o levantamento de sigilo de documentação contábil, para fiscalização; no atendimento, há parâmetros a serem seguidos, ele é simplificado, se realizar procedimentos mais complexos, há uma deturpação da orientação a ser seguida; não há análise "demorada" de documentos; as atividades que os analistas desempenhavam no CAC não são privativas de analistas; a única atividade privativa é a retificação de DARF, sempre executada por analistas; quando houve a fusão, vieram algumas atividades da previdência, e existiam um leque muito grande de atividades fazendárias; nos dois últimos anos em que estava na chefia do atendimento, os técnicos do seguro social e administradores começaram a executar algumas atividades que outras catergorias que não os analistas também executavam no atendimento, como pesquisa de situação fiscal, cópia de declarações, pesquisa de processo; as atividades mais complexas, não privativas de analistas, que é sistemas de cobrança de conta corrente de pessoa física e pessoa jurídica não foram desempenhadas pelos previdenciários, também não pela autora; existem atividades que são exclusivas dos auditores (lançamento) e uma outra atividade do atendimento, que é a retificação de DARF (carreira da auditoria); quanto à demais atividades realizadas no CAC, não existe legislação discipline atividades que são privativas desta ou daquela categoria (analista/técnico); a complexidade está relacionada mais à demora da atividade do que à profundidade; há orientação para que não se fale sobre a interpretação da legislação ao contribuinte; quando existe uma dúvida maior, vai ao plantão fiscal; enquanto ele foi chefe, o servidor não poderia realizar esse tipo de atividade.

No tocante à análise das provas, constou na sentença:

Analisando-se as provas colacionadas aos autos, verifico que as tarefas executadas pela autora apenas se aproximam às tarefas de mero auxílio àquelas atribuídas por lei ao Auditor no que se refere, basicamente, ao procedimento fiscal.

Frise-se que tal conclusão é amplamente corroborada pela prova testemunhal prestada por HERVÊ SAUL PANISSON TASCHETTO –, Auditor Fiscal que atuou no local de trabalho da postulante, no mesmo período (Evento 69 - AUDIO5). O referido servidor explicou que o Centro de Atendimento ao Contribuinte (CAC) foi criado para prestar melhor atendimento ao cidadão, local onde é centralizado o atendimento presencial. Na sequência, esclareceu que as demandas são formalizadas no Centro de Atendimento e encaminhadas para a Seção de Fiscalização, onde ocorre a análise mais apurada das questões apresentadas. Acrescentou que no CAC algumas atividades são conclusivas e outras não, sendo que a "orientação ao contribuinte faz parte do serviço de todos os servidores".

Também merece destaque no depoimento do aludido servidor a declaração de que “no Centro de Atendimento não existe nenhum serviço privativo do Auditor Fiscal”. Referiu que o Lançamento de Débito Confessado (LDC) não é lançamento de crédito tributário, como alega a demandante. A testemunha mencionou que no LDC há formulário padrão, não havendo juízo de mérito, sendo o valor informado pelo próprio contribuinte.

No mesmo sentido é o relato do servidor CLAUDIR LUIS RUEDELL (Evento 69 - AUDIO4), Auditor Fiscal, ao declarar que o LDC seria apenas um registro do contribuinte, não podendo ser considerado lançamento de crédito fiscal, ato privativo do Auditor Fiscal. Por fim, elucidou que narrou que o lançamento do crédito é concentrado na Seção de Fiscalização, muito eventualmente seria constituir algum crédito na área de Arrecadação". A testemunha ATHAIDE VARGAS ROSA (Evento 69 - AUDIO3), Auditor Fiscal, reforça a convicção desse magistrado para rejeitar o pedido da autora, uma vez que informou que o lançamento "é feito exclusivamente por auditores e tem dois servidores que auxiliam. Alguma coisa residual era feita no nosso setor, 2% 3%(...). Então basicamente de lançamentos fiscais, de apurar o crédito é feito na Seção de Fiscalização".

Assim, infere-se que a autora não realizava atividades típicas do cargo de Auditor Fiscal da Receita Federal, ou mesmo do cargo de Analista Tributário. Se praticou alguma tarefa alheia às atribuições do cargo em que ocupava, tal se deu eventualmente, o que não autoriza o reconhecimento do desvio de função, haja vista o precedente da Corte local colacionado:

ADMINISTRATIVO. DESVIO DE FUNÇÃO. OFICIAL DE JUSTIÇA AD HOC. EVENTUALIDADE. DESVIO NÃO RECONHECIDO. Para que fique caracterizado o desvio de função, é necessário que o servidor permanentemente exerça funções inerentes a outro cargo. O exercício eventual e esporádico de outras atividades, além daquelas expressamente previstas para o cargo do servidor, não gera direito à indenização. (TRF4, AC 5039975-10.2015.4.04.7100, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 08/09/2017)

Conjugando as declarações anteriormente transcritas, aos documentos juntados aos autos, tenho que a autora executava algumas das tarefas descritas na inicial em regime de apoio, em decorrência de recomendação da Administração.

Não havia, ao que se depreende do contexto do caso concreto, análise da escrituração contábil de empresas, nem lançamento de crédito tributário, atividade privativa do cargo de Auditor Fiscal e do cargo de Analista Tributário, consistindo a atividade desempenhada, a maioria das vezes, na inserção, nos sistemas informatizados da Secretaria da Receita Previdenciária, de valores declarados espontaneamente pelo contribuinte.

Tal situação se mostra, dentro do contexto, necessária, em razão da eficiência que norteia a Administração Pública, a fim de permitir a adequada prestação dos serviços estatais, tendo em vista a constante evolução da demanda pública e a notória escassez dos quadros funcionais, não podendo ser executadas por Auditores Fiscais todas as atividades-meio dos órgãos fazendários.

Diante disso, não há como se reconhecer a situação de desvio funcional em relação às atividades exercidas pela autora, que não se caracterizam como atividades privativas de Auditor Fiscal e de Analista Tributário, de sorte que a decretação de improcedência é a medida imperativa.

(...)

A tais fundamentos, a autora não opôs argumentos idôneos a infirmar o convencimento do julgador, motivo pelo qual a sentença merece ser mantida.

Com efeito,

(i) infere-se que a autora não realizava atividades típicas do cargo de Auditor Fiscal da Receita Federal, ou mesmo do cargo de Analista Tributário. Se praticou alguma tarefa alheia às atribuições do cargo em que ocupava, tal se deu eventualmente, o que não autoriza o reconhecimento do desvio de função;

(ii) conjugando as declarações anteriormente transcritas, aos documentos juntados aos autos, tenho que a autora executava algumas das tarefas descritas na inicial em regime de apoio, em decorrência de recomendação da Administração;

(iii) não havia, ao que se depreende do contexto do caso concreto, análise da escrituração contábil de empresas, nem lançamento de crédito tributário, atividade privativa do cargo de Auditor Fiscal e do cargo de Analista Tributário, consistindo a atividade desempenhada, a maioria das vezes, na inserção, nos sistemas informatizados da Secretaria da Receita Previdenciária, de valores declarados espontaneamente pelo contribuinte;

(iv) o Lançamento de Débito Confessado (LDC) não é lançamento de crédito tributário, como alega a demandante. A testemunha mencionou que no LDC há formulário padrão, não havendo juízo de mérito, sendo o valor informado pelo próprio contribuinte; e

(v) não há como se reconhecer a situação de desvio funcional em relação às atividades exercidas pela autora, que não se caracterizam como atividades privativas de Auditor Fiscal e de Analista Tributário, de sorte que a decretação de improcedência é a medida imperativa.

A Quarta Turma desta Corte decidiu nessa direção ao analisar situação similar a que ora se examina:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. TÉCNICO DO SEGURO SOCIAL. DESEMPENHO DE ATIVIDADES PRÓPRIAS DE AUDITOR/ANALISTA DA RECEITA FEDERAL. DESVIO DE FUNÇÃO NÃO CONFIGURADO. O desvio de função caracteriza-se nas hipóteses em que o servidor, ocupante de determinado cargo, exerce funções atinentes a outro cargo público, seja dentro da própria repartição ou em outro órgão. O cargo público é conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na organização legal de uma entidade e do servidor. O exercício de um cargo pressupõe não apenas funções executivas, mas as responsabilidades pelos atos por ele praticados. Para configurar-se o desvio, mister prova de que a parte autora tivesse desempenhado as funções e responsabilidades da carreiras paradigma, o que de todo inocorreu no caso dos autos. Hipótese em que a parte autora não se desincumbiu de seu ônus probatório para as alegações de exercício de atividade privativa de Auditor/Analista da Receita Federal, sendo as atividades desempenhadas pela autora compatíveis com com o cargo que detém de Técnico do Seguro Social. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5029843-45.2016.4.04.7200, 4ª Turma, Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 29/08/2019)

Trago à colação excerto do referido julgado, cujos fundamentos agrego como razão de decidir, in verbis:

A controvérsia envolve pedido de indenização por dano decorrente de alegado desvio funcional, formulado por servidor público federal ocupante do cargo de Técnico do Seguro Social, e que, desde 01/02/2009, quando de sua lotação definitiva na Delegacia da Receita Federal do Brasil em Florianópolis, exerce funções que correspondem à competência funcional de servidores de nível superior (Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil e Analista Técnico da Receita Federal do Brasil).

(...)

A respeito das atribuições da autora, transcreve-se, por elucidativo, os seguintes excertos do depoimento pessoal e da prova testemunhal:

Testemunha 1: Recieri Duarte, brasileiro, casado, Analista Técnico da Receita Federal do Brasil (...) - Testemunha Compromissada - O depoente é colega do autor, sendo que trabalham juntos no centro de atendimento ao público. No que diz respeito às normas da previdência, o autor presta atendimento resolvendo dúvidas da população que se dirigem pessoalmente ao órgão. O autor tem suas atividades voltadas ao públicos, sendo que não atua na fiscalização de tributos e não lavra autos de infração. Dos que atuam no atendimento ao público são analistas da receita, técnicos administrativos da receita e técnicos previdenciários. Existem três que são do SERPRO. Existe um chefe do setor que é auditor, sendo mais dois chefes de turno que são analistas. Existe também um fiscal de obras que também atende ao público relativamente à previdência. Acha que o autor trabalha no setor há 10 (dez) anos. O autor também atua com retificação de GPS, auxiliando a pessoa que chega ao setor. Nessa atividade o autor examina o documento quanto as condições para a retificação. Sabe que o autor atende contribuintes com o objetivo de fazer regularização de obras, no entanto não sabe dizer se o serviço é conferido ou assinado por outra autoridade. Também faz analise de regularidade fiscal para liberação de CND pessoa física e jurídica, assim como o depoente também exerce essa atividade. O autor é Técnico previdenciário e não exerce atividade externa. O autor trabalha com os sistemas DATAPREV e os sistemas do SERPRO. Tais sistemas são de uso geral do Âmbito da receita, não se limitando ao atendimento ao público. Todos os utilizam, cada um na sua área e com a sua senha. O DATAPREV atua na área previdenciária e os sistemas do SERPRO são vinculados à área tributária. Não sabe dizer os sistemas onde atuam os auditores fiscais.

Testemunha 2: Marcia Raquel Tschumi, brasileira, solteira, Auditora Fiscal da Receita Federal do Brasil (...) - Testemunha Compromissada - O autor desde quando teve sua lotação na Receita Federal, em fevereiro de 2009, sempre trabalho no centro de atendimento ao contribuinte, prestando esclarecimentos de forma presencial. A depoente, aposentada há 1 (um) ano, também atuava no mesmo setor, como orientadora de todos os atendentes, na área de regularização de obra, e também atendia ao público. Excepcionalmente haviam alguns auditores que atuaram no setor para regularização de obras, no entanto trata-se de um setor cujos componentes não são auditores via de regra, existindo técnicos previdenciários e analistas. Confirma que os técnicos e analistas não têm atribuição de fiscalização externa, tão pouco proceder autuação. O autor procedia a retificação de GPS junto aos contribuintes. O autor, juntamente com outros técnicos que vieram da previdência têm conhecimento para realizar tal atividade, no entanto não é atividade privativa do auditor fiscal. A depoente não sabe exatamente do rol de atribuições de cada carreira ou cargo, mas considera que os funcionários atuantes na CAC procedem o LDC (lançamento de débito confessado pelo contribuinte). acrescenta que o autor é muito preparado e tem condições de realizar qualquer atividade vinculada ao seu setor. Haviam servidores do SERPRO no setor, mas com algum tipo de restrição quanto atribuição e acesso. O autor não tem qualquer restrição para o uso do sistema, atuando de forma ampla no setor. O autor executava tarefas com complexidade e que exigem conhecimento da área tributária a exemplo de regularização de obras, parcelamento de débitos, etc., sem necessidade de assinatura de outra autoridade. Alguns pedidos formulados no CAC são apenas encaminhados ao setor competente após uma análise prévia, mas sem conteúdo decisório imediato. No setor não existem distinções entre os analistas e os técnicos previdenciários, dentre estes o autor. O autor atua no CAC, que é regulado pelo SISCAC, que tem um sistema de acesso cuja a senha e o poder de acesso quem determina é o chefe. Todos os que atuam no CAC trabalham no mesmo sistema, sendo que o que varia é a senha e o acesso de cada um dependendo da área de atuação de cada um. O chefe do setor há muitos anos é um auditor fiscal.

Testemunha 3: Marinês Francisca Mercedes de Lourdes Sant'ana, brasileira, solteira, Assessora de Gabinete (...) - Testemunha Compromissada - A depoente atua no Governo do Estado e uma vez a cada 4 (quatro) meses se dirige até o CAC e sempre é atendida pelo autor. Nesse atendimento a depoente busca a emissão da certidão negativa para o Estado e em cada ocasião é feito um relatório com todas as pendências, sendo que o autor orienta a depoente a respeito da solução de cada uma das pendências. Existem 126 CNPJs vinculados à administração direta do Estado. O relatório das pendências podem incluir qualquer tipo de tributo vinculado à receita federal. É sempre o próprio autor que presta tal atendimento de maneira integral, não repassando tal atividade a qualquer outro colega da receita. Considera que a análise em questão é bastante complexa, envolvendo inúmeros processos. O processo de liberação de CND para o Estado leva em torno de 30 (trinta) dias. Esclarece que eventuais pendências relativas à procuradoria são resolvidas naquele setor. de resto as pendências da própria receita são resolvidas no CAC pelo autor. A CND não faz constar qualquer assinatura. O autor é quem faz a baixa das pendências no sistema para viabilizar a expedição da CND. As pendências devem ser resolvidas pelo próprio Estado. Na ausência do autor quem atende o depoente é a Marinês Goes que trabalha no mesmo setor. A depoente atua nessa atividade desde 2007, sendo que vem sendo atendida pelo autor desde 2009.

TERMOS DE DEPOIMENTO da parte ré.

Testemunha 1: Hercule Imbrosio Neto, brasileiro, estado civil, Auditor Fiscal - Testemunha Compromissada - O depoente é chefe do CAC, onde trabalha o autor. No setor trabalham auditores, analistas, técnicos da seguridades social, agentes administrativos e assistentes técnicos administrativos. A atividade do autor se enquadra nos atendimentos gerais e não é privativa de nenhuma carreira. o autor não tem competência para lavrar auto de infração. Considera que o LDC (lançamento de débito confessado) não se enquadra no conceito de autuação, sendo apenas a inscrição no sistema de valor confessado e declarado pelo contribuinte, de maneira a se poder fazer um acompanhamento de dívida que foi apresentada pessoalmente pelo contribuinte. O autor não exerce atividade externa, permanecendo no âmbito do atendimento ao público do setor. O horário do autor é das 13:00 às 19:00 horas (turno da tarde). Existe também o turno da manhã com outra equipe. O autor presta atendimento presencial e para tanto tem acesso aos sistemas da receita. O autor atua principalmente nos sistemas oriundos da previdência, no entanto hoje em dia executa serviços próprios da receita federal. Com o passar do tempo houve uma inovação nos sistemas. O grau de atuação nos sistemas é determinado por portaria que determina a competência de cada servidor, existindo o Decreto nº 6.641/2008 que regula as atribuições da carreira de auditoria. O autor está habilitado para atuar no sistema próprio da GPS, mas não está habilitado para retificar a DARF. Não é atribuição exclusiva do autor atender o Estado no que diz respeito à expedição de CND, embora tenha sido ele e sua colega Marinês normalmente procurados para essa finalidade por estarem habituados a prestarem esse atendimento, já conhecendo o histórico dos atendimentos anteriores. Nesse tipo de atividade cumpre ao CAC apresentar ao contribuinte eventuais pendências a serem resolvidas, a fim de viabilizar a expedição da CND. A Receita costuma dar um atendimento preferencial aos demais órgãos públicos inclusive existe outra pessoa que costuma atender as Prefeituras, neste caso um auditor. O depoente atua é chefe do setor desde 2000 e o autor ingressou após 2007. Os atendentes vinculados ao SERPRO têm uma competência muito mais reduzida, restando hoje apenas 2 (dois). Existe uma assistente técnico administrativo que tem competência reduzida, focando em outras atividades não previdenciárias. A alocação de DARF é uma atividade não privativa de qualquer cargo, e acredita que o autor tem competência para tal. A atividade de regularização de obra é desempenhada pelo autor e também passou a ser desempenhada pelo analista Luiz Cláudio Maciel Tinoco, sendo que este por ser analista da receita desempenha algumas atividades próprias especificadas no Decreto 6.641/2008. Existem restrições do Decreto 6.641/2008 especificas das atividades da receita relativamente aos técnicos, e por isso o autor não poderia fazer retificação de documento de arrecadação, no entanto os técnicos oriundos da previdência continuaram a desempenhar as atividades que faziam na receita previdenciária, a exemplo da retificação da GPS. O autor examina o cumprimento pelo Estado de todas as pendências e, uma vez afastadas tais pendências, o próprio autor procede a baixa de cada uma no sistema, de forma a se liberar a CND ficando guardada cópia digital de cada documento, formando um dossiê digital comprobatório da satisfação das condições.

Segundo consta, a parte autora: 1) desempenhava a atividade de atendimento ao público, resolvendo dúvidas da população, mas não atuava na fiscalização de tributos e não lavrava autos de infração; 2) o autor também atuava com retificação de GPS, examinando o documento quanto às condições para a retificação; 3) também fazia análise de regularidade fiscal para liberação de CND pessoa física e jurídica, mas não exercia qualquer atividade externa; 4) trabalhava com os sistemas DATAPREV e os sistemas do SERPRO, sendo que tais sistemas são de uso geral do âmbito da Receita, não se limitando ao atendimento ao público.

Repise-se que a descrição legal das atividades de Auditor-Fiscal também comportam execução orçamentária, licitação, autuação interna em sistema operacional, funções referentes a recursos humanos e acesso de dados às informações da Receita Federal. Nenhuma dessas funções foi provada ou sequer ventilada nos autos.

Assim, forçoso reconhecer que, nos termos da prova oral colhida, a parte autora exercia na verdade a função de "atendimentos gerais" que não é privativa de nenhuma carreira.

Portanto, não restou evidenciado que as atividades executadas pelo demandante possuíam grau de complexidade que demandasse qualificação superior. Com efeito, restou evidenciado que a parte autora exercia atividades técnicas com a supervisão de Auditores-Fiscais os quais orientavam, acompanhavam e fiscalizavam o seu trabalho.

Por fim, ainda que fosse adotado entendimento diverso e considerasse que algumas das tarefas realizadas pela parte autora seriam privativas de Auditores-Fiscais/Analistas, como não abrangem a maior parte das atribuições dos Auditores-Fiscais, além de estarem sujeitos à supervisão e orientação destes, não seria o caso de procedência. O pagamento de indenização em razão de desvio de função é medida judicial excepcional, visto que esta prática viola o princípio da legalidade, em razão disso deve restar evidenciado nos autos que a parte autora, de fato, desempenhava de maneira permanente atribuições privativas.

Nesse sentido:

EMENTA: EMBARGOS DECLARATÓRIOS. OMISSÃO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PRETENSÃO AO RECONHECIMENTO DO DESVIO DE FUNÇÃO. AUDITOR-FISCAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. IMPOSSIBILIDADE. 1. O desvio de função caracteriza-se nas hipóteses em que o servidor, ocupante de determinado cargo, exerce funções atinentes a outro cargo público, seja dentro da própria repartição ou em outro órgão. 2. As tarefas executadas pelo autor apenas assemelham-se às tarefas atribuídas por lei ao Auditor-Fiscal. O autor executou algumas das tarefas típicas de Auditor, e não na sua plenitude, não dando ensejo à pretendida equiparação de vencimentos. 3. No caso, não se vislumbra que as tarefas desempenhadas pela requerente eram, de modo permanente, exclusivas do cargo de Auditor-Fiscal. Logo, considerando que a caracterização do desvio de função é situação excepcional em face do princípio da legalidade, não se pode reconhecer o direito postulado. (TRF4, EDAC 5003217-13.2012.4.04.7108, QUARTA TURMA, Relator EDUARDO VANDRÉ O L GARCIA, juntado aos autos em 20/12/2016) Grifei.

EMENTA: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. AGENTE ADMINISTRATIVO. DESVIO DE FUNÇÃO. ATIVIDADES PRIVATIVAS DO CARGO DE AUDITOR-FISCAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. INOCORRÊNCIA. É firme, na jurisprudência, o entendimento no sentido de que o desempenho de atribuições de cargo distinto daquele formalmente ocupado pelo servidor púbico é prática irregular que, comprovada, gera o direito à percepção de diferenças remuneratórias, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração Pública. Nesse sentido, o teor do enunciado da Súmula n.º 378 do STJ: "Reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais dele decorrentes". Todavia, para que reste configurado desvio de função, é necessário que o servidor exerça funções inerentes a outro cargo de forma permanente e habitual. O exercício eventual e esporádico de atribuições que não estão previstas para o seu cargo não enseja o pagamento de indenização. De acordo com as provas produzidas nos autos, as tarefas que, em tese, poderiam ser enquadradas como atribuições privativas do cargo de Auditor-Fiscal eram desenvolvidas pelo servidor com autonomia limitada e em caráter não permanente, sob supervisão. Logo, não há desvio funcional a ser reconhecido, porque, se, um lado, há previsão legal de o Auditor-Fiscal efetuar lançamentos e constituir créditos tributários que forem apurados em auditoria e fiscalização, de outro, não se pode excluir a formalização de lançamentos tributários e atendimento ao público das atribuições do Agente Administrativo, hoje Técnico do Seguro Social, que envolvem a execução de atribuições técnicas e administrativas necessárias ao exercício das competências do INSS (descrição genérica). Ou seja, a sua atuação é abrangente, o que lhe permite executar tarefas compatíveis o grau de instrução exigido e a complexidade do trabalho. (TRF4, AC 5070625-74.2014.4.04.7100, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 24/11/2016) Grifei.

Quanto ao pedido sucessivo de equiparação a Analista, melhor sorte não socorre à apelante. Primeiramente, aplica-se o mesmo raciocínio de que o cargo de analista comporta uma série de atividades descritas no art.6º, §2º, da lei nº. 10.593/2002, tais como atividades de natureza técnica, preparatória das atividades privativas de auditor, exame de processos administrativo. Novamente, a parte não provou exercer essas atribuições.

(...)

Nesse sentido, ainda, a Terceira Turma desta Corte, em sua composição ampliada:

ADMINISTRATIVO. DESVIO DE FUNÇÃO. TÉCNICO DO SEGURO SOCIAL. ANALISTA TRIBUTÁRIO DA RECEITA FEDERAL. NÃO CONFIGURADO. 1. De acordo com a prova produzida, não é possível concluir que o autor, investido no cargo de Técnico do Seguro Social, tenha exercido, de forma efetiva e habitual, atividades alegadamente específicas do cargo de Analista Tributário da Receita Federal, tampouco incompatíveis com o cargo de origem. 2. Examinando-se as legislações regentes (Lei 10.855/04 e Lei 10.593/02), observa-se que as atribuições dos cargos de Técnico do Seguro Social e de Analista Tributário da Receita Federal foram elencadas genericamente, o que viabiliza o desempenho de um plexo de tarefas abrangentes pelos servidores. Por outro lado, em razão da ausência de um rol taxativo, é comum que haja uma sobreposição de atividades entre ambos os cargos. No entanto, tal circunstância, por si só, não configura o prefalado desvio funcional, mormente em face da inexistência de previsão normativa de atribuições exclusivas do cargo de Analista Tributário. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007451-77.2017.4.04.7200, 3ª Turma, Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR, JUNTADO AOS AUTOS EM 17/12/2019)

Destarte, irretocável a sentença.

Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.



Documento eletrônico assinado por SERGIO RENATO TEJADA GARCIA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003199137v56 e do código CRC 83e2d1d7.Informações adicionais da assinatura:
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5007698-95.2016.4.04.7102
40003199137.V56


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5007698-95.2016.4.04.7102/RS

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

APELANTE: PATRÍCIA AVENA DE BORBA (AUTOR)

ADVOGADO: LUCIANA INES RAMBO (OAB RS052887)

ADVOGADO: Heverton Renato Monteiro Padilha (OAB RS074807)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. TÉCNICO DO SEGURO SOCIAL. DESEMPENHO DE ATIVIDADES PRÓPRIAS DE AUDITOR/ANALISTA DA RECEITA FEDERAL. DESVIO DE FUNÇÃO NÃO CONFIGURADO.

1. A produção de provas visa à formação do convencimento do juiz, que, por decisão fundamentada, pode indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias (artigos 355 e 370 do CPC). Existindo elementos probatórios suficientes para apreciação do litígio, não se afigura ilegal ou abusivo o julgamento antecipado da lide.

2. O desvio de função caracteriza-se nas hipóteses em que o servidor, ocupante de determinado cargo, exerce funções atinentes a outro cargo público, seja dentro da própria repartição ou em outro órgão.

3. O cargo público é conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na organização legal de uma entidade e do servidor. O exercício de um cargo pressupõe não apenas funções executivas, mas as responsabilidades pelos atos por ele praticados. Para configurar-se o desvio, mister prova de que o servidor desempenhada(ou) as funções e responsabilidades da carreiras paradigma.

4. A jurisprudência deste Tribunal exige a comprovação do exercício de funções inerentes a outro cargo de forma permanente e habitual.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 04 de maio de 2022.



Documento eletrônico assinado por SERGIO RENATO TEJADA GARCIA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003199138v5 e do código CRC fe3afce2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SERGIO RENATO TEJADA GARCIA
Data e Hora: 5/5/2022, às 12:3:38


5007698-95.2016.4.04.7102
40003199138 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 13/05/2022 04:33:55.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 04/05/2022

Apelação Cível Nº 5007698-95.2016.4.04.7102/RS

RELATOR: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

PRESIDENTE: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER

APELANTE: PATRÍCIA AVENA DE BORBA (AUTOR)

ADVOGADO: LUCIANA INES RAMBO (OAB RS052887)

ADVOGADO: Heverton Renato Monteiro Padilha (OAB RS074807)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 04/05/2022, na sequência 554, disponibilizada no DE de 22/04/2022.

Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

Votante: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

Votante: Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN

GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 13/05/2022 04:33:55.

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