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ADMINISTRATIVO. SFH. SEGURO. PRAZO PRESCRICIONAL. INTERESSE DE AGIR. TRF4. 5004288-33.2015.4.04.7209...

Data da publicação: 07/07/2020, 15:54:00

EMENTA: ADMINISTRATIVO. SFH. SEGURO. PRAZO PRESCRICIONAL. INTERESSE DE AGIR Nas ações que versam sobre indenização securitária, o prazo prescricional passa a fluir a partir da data em que o segurado torna-se ciente da recusa à verba indenizatória pleiteada perante a seguradora. No caso em análise, contudo, inexiste comprovação da ciência por parte do segurado acerca da negativa da seguradora, muito menos é possível afirmar se efetivamente ocorreu o indeferimento em resposta a notificação do aviso de sinistro. Diante das várias providências tomadas pelos autores, não há que se falar em ausência de pretensão resistida e tampouco em falta de interesse de agir. (TRF4, AC 5004288-33.2015.4.04.7209, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 05/07/2018)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5004288-33.2015.4.04.7209/SC

RELATOR: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (RÉU)

APELADO: FELICIO DIAS DE SOUSA (AUTOR)

APELADO: HELIANE MARIA DA SILVA (AUTOR)

RELATÓRIO

Felício Dias de Souza e Heliane Maria da Silva ajuizou ação ordinária em face da Caixa Econômica Federal - CEF em que pugnam a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais e materias.

Relatam que em 15/09/1997 firmaram Contrato de Compra e Venda e Mútuo com Obrigações e Hipoteca com CEF para aquisição de imóvel residencial por meio do Sistema Financeiro da Habitação - SFH; que em virtude de fortes chuvas ocorridas entre os anos de 2008 e 2009 o imóvel adquirido sofreu danos que inviabilizaram a permanência dos autores no local e que a CEF foi notificada dos danos por meio de Requerimento de Sinistro - Danos Físicos - DFI, sem que tenha adotado nenhuma providência ou fornecido resposta em relação ao pedido.

A sentença dispôs:

3. DISPOSITIVO:

Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos, resolvendo o mérito nos termos do art. 487, I, do CPC para:

a) Condenar a ré ao pagamento em favor dos autores de indenização pelo valor correspondente ao imóvel, no montante de R$ 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil reais), corrigidos de acordo com os critérios especificados na fundamentação.

b) Condenar a ré ao pagamento em favor dos autores de indenização a título de aluguéis pagos até o ajuizamento da ação no valor de R$ 44.078,47 (quarenta e quatro mil setenta e oito reais e quarenta e sete centavos), corrigidos de acordo com os critérios especificados na fundamentação, bem como dos aluguéis pagos pelos autores após o ajuizamento da ação, até o efetivo recebimento do valor fixado no item a, com incidência de juros e correção monetária a partir do pagamento de cada parcela mensal.

c) Determinar que a ré exclua os encargos moratórios incidentes sobre as parcelas do financimento imobiliário dos autores, desde quando estas deixaram de ser pagas até o efetivo pagamento da indenização fixada no item a, com a reprogramação do vencimento de cada parcela mensal para os meses seguintes ao pagamento da indenização pelo valor do imóvel.

d) Condenar a ré ao pagamento em favor de cada um dos autores de indenização por danos morais no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), corrigidos de acordo com os critérios especificados na fundamentação.

e) Condeno a ré, ante a sucumbência mínima dos autores, ao pagamento das custas processuais e em honorários advocatícios no montante 10% sobre o valor total das condenações ora cominadas, nos termos do art. 85, §2º, do CPC.

A Caixa Econômica apresenta apelação. Sustenta a prescrição do direito, inexistência de pretenção resistida e falta de interesse de agir dos autores.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Quanto à Prescrição

A Caixa alega haver prescrição, uma vez que os danos no imóvel são decorrentes de enxurradas em 2008/2009 e a comunicação do sinistro somente ocorreu em 2010, sustenta também a prescrição em face de a ação somente ter sido ajuizada em 2015.

Sem razão, como bem referido pelo Juiz da causa:

Os dispositivos invocados dispõem que:

Art. 206. Prescreve:

§ 1o Em um ano:

(...)

II - a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo:

(...)

b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão;

Não há como reconhecer a prescrição. De acordo com a narrativa contida na inicial, a possível causa dos problemas apresentados pelo imóvel foram as chuvas ocorridas entre os anos de 2008 e 2009. Todavia, pelo que se pode observar a partir da documentação anexada aos autos, os danos, ou seja, os fatos geradores da pretensão, ocorreram sobretudo no início de 2010, quando chegou a acontecer um desmoronamento em 14/01/2010, atendido pelos bombeiros voluntários de Guaramirim (evento 1 - OUT6). A própria desocupação do imóvel foi feita apenas em outubro de 2010 (evento 1 - OUT16), de modo que não é possível reconhecer que a comunicação do sinistro em 12/01/2010 foi realizada depois do transcurso de um ano após a ocorrência dos danos ao imóvel. Não se pode confudir a causa (possivelmente as chuvas intensas entre 2008 e 2009) com o efeito (danos ao imóvel), este sim gerador da pretensão à cobertura securitária.

Por outro lado, conforme prêve o enunciado da Súmula 229 do Superior Tribunal de Justiça, "o pedido do pagamento de indenização à seguradora suspende o prazo de prescrição até que o segurado tenha ciência da decisão". Como não houve manifestação formal da ré em relação ao pedido de cobertura securitária, não há como reconhecer a prescrição após a solicitação da indenização.

Assim, quer por os danos terem ocorridos no ano de 2010, no mesmo ano em que os autores comunicaram o sinistro (ou seja, menos de um ano da data do dano), quer por não ter havido resposta do banco quanto ao seu pedido de indenização até a data do ajuizamento da ação e, portanto, de acordo com a súmula 229, o prazo estava suspenso, não há que se falar em prescrição.

Ausência de Pretensão Resistida e Falta de Interesse de Agir

A própria Caixa refere que os autores comunicaram o sinistro em em 12/01/2010, sem que haja resposta da Seguradora.

Ora, os autores protocolaram o Requerimento de Sinistro-Danos Físicos-DFI (OUT13 - Evento 1) em janeiro de 2010.

Em 06/05/2010, diante da necessidade de desocupação do imóvel de forma urgente, os apelados protocolaram pedido solicitando urgência na finalização do processo de pagamento do seguro habitacional contratado.

Diante do contato dos demandantes com a Ouvidoria da Caixa, solicitando providências, em face da demora na resposta ao seu pedido, foi emitida, por aquele setor, declaração em 20/01/2011 (OUT17 – Evento 1) solicitando providências urgentes.

Os autores e ajuizaram a ação em 26/08/2015, sem ter obtido respsota da seguradora.

Desse modo, não há que se falar em ausência de pretensão resistida e tampouco em falta de interesse de agir.

Assim, tenho que a sentença deva ser mantida, até por ausência de recurso quanto aos demais pontos do decisum:

Mérito

No mérito, o contrato firmado entre as partes em 15 de setembro de 1997 (evento 1 - OUT8) para aquisição do imóvel pelos autores prevê o seguinte, no que interessa para a resolução da presente demanda:

CLÁUSULA DÉCIMA NONA - SEGUROS - Durante a vigência deste contrato de financiamento são obrigatórios os seguros previstos pela Apólice Compreensiva Habitacional ou que venham a ser adotados pelo Sistema Financeiro da Habitação - SFH, os quais serão processados por intermédio da CEF, obrigando-se os DEVEDORES a pagar os respectivos prêmios.

(...)

CLÁUSULA VIGÉSIMA - SINISTRO - Em caso de sinistro, fica a CEF autorizada a receber diretamente da companhia seguradora o valor da indenização, aplicando-o na solução ou na amortização da dívida e colocando o saldo, se houver, à disposição dos DEVEDORES.

(...)

CLÁUSULA VIGÉSIMA PRIMEIRA - COMUNICAÇÃO DO SINISTRO - Os DEVEDORES declaram estar cientes e, desde já, se comprometem a informar a seus beneficiários que, em caso de ocorrência de sinistro de morte, os mesmos beneficiários deverão comunicar o evento à CEF, por escrito e imediatamente. Os DEVEDORES declaram estar cientes, ainda, de que deverão comunicar à CEF a ocorrência de sua invalidez permanente ou danos físicos no imóvel objeto deste contrato.

O contrato prevê a obrigatoriedade de seguro contra danos ao imóvel, processado pela ré, cabendo aos autores o pagamento do prêmio e a comunicação do sinistro. Conforme já constatado, os autores cumpriram o ônus de comunicar a ré acerca da ocorrência dos danos e não há alegação desta no sentido de que teriam descumprido a obrigação de pagar os respectivos prêmios, normalmente embutidos nos encargos mensais suportados pelos mutuários.

Embora não tenha sido juntada aos autos pela ré a apólice do seguro, o comunicado de seguro/habitação anexado à inicial (evento 1 - OUT10) indica a seguinte cobertura:

O imóvel está garantido contra os danos provenientes de:

a) incêndio;

b) explosão;

c) desmoronamento total;

d) desmoronamento parcial, entendida a destruição ou desabamento de paredes, vigas ou outro elemento estrutural;

e) ameaça de desmoronamento, devidamente comprovada;

f) destelhamento (causado por ventos ou granizo);

g) inundação ou alagamento.

A situação apresentada pelos autores enquadra-se perfeitamente nos itens d e e. A declaração emitida pelos bombeiros voluntários de Guaramirim em 19/01/2010 (evento 1 - LAUDO14) indica que no dia 14/01/2010 a corporação foi acionada para prestar assistência em razão da ocorrência de desmoronamento parcial do imóvel dos autores, sendo relatado que "no local foi observado a inclinação de algumas árvores, parede da residência rachada. Foi orientado a proprietária da mesma a procurar a Prefeitura Municipal para obter um parecer técnico da estrutura da residência e solo".

Mesmo assim a ré não tomou providências para viabilizar a reparação dos danos por meio do acionamento do seguro, apesar da solicitação protocolada em 12/01/2010 (Evento 1 - OUT13) e do pedido de urgência junto à Ouvidoria da CEF protocolado em 20/01/2011 (Evento 1 - OUT17).

No que se refere às normas incidentes sobre o presente caso, o STF reconheceu a plena aplicação do CDC às relações estabelecidas entre os bancos e seus clientes, nessa condição, conforme se infere da ADIn 2591/DF, relatada pelo Min. Carlos Velloso.

Dada a aplicação do CDC, isso implica o reconhecimento de um conjunto de garantias asseguradas ao consumidor do crédito bancário, conforme se infere dos arts. 4º, 39 e 51 da Lei 8078/1990.

Destaco, nesse âmbito, o dever de atuar com boa-fé (e o correspondente respeito à boa-fé objetiva), preconizado no art. 4º, III, CDC. Como diz Rizzatto Nunes, "a boa-fé objetiva, que é a que está presente no Código de Defesa do Consumidor, pode ser definida, grosso modo, como sendo uma regra de conduta, isto é, o dever das partes de agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, a fim de se estabelecer o equilíbrio nas relações de consumo (...) Assim, quando se fala em boa-fé objetiva, pensa-se em comportamento fiel, leal, na atuação de cada uma das partes contratantes a fim de garantir respeito à outra." (RIZZATTO NUNES apud EFING, Antônio Carlos. Contratos e procedimentos bancários à luz do Código de Defesa do Consumidor. 2. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: RT, 2012, p. 87).

A incidência do CDC implica ainda o dever, por parte do fornecedor, de disponibilizar ao consumidor informação adequada e clara sobre os diferentes serviços e produtos, com especificação correta da quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço (art. 6º, III, CDC c/ redação veiculada pela lei 12.741/2012).

Com relação ao seguro, o art. 757 do Código Civil dispõe que "Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados."

O art. 14 da Lei 4.380/1964 preconizava que "Os adquirentes de habitações financiadas pelo Sistema Financeiro da Habitação contratarão seguro de vida de renda temporária, que integrará, obrigatoriamente, o contrato de financiamento, nas condições fixadas pelo Banco Nacional da Habitação."

O SFH prevê a incidência de duas espécies de seguro:

(a) - MIP (morte e invalidez permanente): taxa incide sobre o valor do financiamento. Destina-se a liquidar o saldo devedor, caso o mutuário principal faleça ou seja aposentado por invalidez;

(b) - DFI (danos físicos no imóvel): taxa incide sobre o valor do imóvel adquirido. Destina-se a pagar o valor do imóvel caso haja incêndio ou destruição não provocada por vício interno (ou melhor, caso o dano seja provocado por causas externas).

Em regra, os prêmios de seguro são arrecadados pelo próprio banco mutuante, que os repassa para a empresa seguradora. Caso o sinistro ocorra e a apólice seja ativada, o valor da indenização é pago também para o banco, destinando-se a liquidar o valor de eventual saldo devedor (no caso M.I.P.); sendo o caso de dano no imóvel, eventual diferença (i.e., valor do imóvel superior ao valor da dívida) é paga ao mutuário.

Portanto, conforme já pontuado no início, a responsabilidade pela operacionalização do seguro e intermediação junto à seguradora é do agente financeiro. A ausência de resposta por parte da ré em relação ao pedido de cobertura caracteriza vício do serviço nos termos do art. 20 do CDC, na medida em que a ré sequer apresentou aos autores uma resposta conclusiva acerca da solicitação em um prazo razoável. Da doutrina relativa ao vício do serviço extrai-se que "A preocupação básica é que os serviços oferecidos no mercado de consumo atendam a um grau de qualidade e funcionalidade que não deve ser aferido unicamente pelas cláusulas contratuais, mas de modo objetivo, considerando, entre outros fatores, as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, a inadequação para os fins que razoavelmente se esperam dos serviços, normas regulamentares de prestabilidade. Nessa linha, assim dispõe o caput do art. 20 do CDC: O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária (...). A noção de impropriedade do serviço é indicada pelo §2º do art. 20: São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade". (BENJAMIN, Antonio Herman V. MANUAL DE DIREITO DO CONSUMIDOR. Antonio Herman V. Benjamin, Cláudia Lima Marques, Leonardo Roscoe Bessa. 5ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 205).

A caracterização do vício do serviço ultrapassa, pois, as disposições estritas do contrato e deve ser aferida a luz das circunstâncias de cada caso específico, sob a égide da boa-fé objetiva. No caso concreto, verifica-se que desde a solicitação da cobertura securitária até o ajuizamento desta ação transcorreu mais de 5 anos, sem que os autores tenham recebido uma resposta conclusiva. Isso apesar de a ré ter conhecimento de que estes foram obrigados a abandonar o imóvel adquirido, que lhes servia de moradia, e de os autores terem solicitado urgência na resolução do problema por meio dos canais institucionais disponíveis.

O reconhecimento do vício do serviço implica na responsabilização objetiva da ré, tornando ainda impertinente eventuais discussões sobre a limitação de cobertura da apólice de seguro em razão do princípio da reparação integral dos danos danos ao consumidor, nos termos do art. 6, inciso VI, do CDC. Nesse sentido:

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. FUNDOS DE INVESTIMENTOS NO EXTERIOR. CASO "MADOFF". INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. ASSESSORAMENTO FINANCEIRO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OBRIGAÇÃO DE MEIO. VÍCIO NO SERVIÇO. INEXISTÊNCIA.1. Hipótese em que a parte autora busca a reparação dos prejuízos sofridos em decorrência da aplicação em fundo de investimento no exterior atingido por uma das maiores fraudes já praticadas no mercado financeiro norte-americano (caso "Madoff").2. As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por vício na prestação de serviços, ressalvada a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, incumbindo-lhes, na prestação de serviço de assessoramento financeiro, apresentar informações precisas e transparentes acerca dos riscos aos quais seus clientes serão submetidos.3. A aferição do dever de apresentar informações precisas e transparentes acerca dos riscos do negócio pode variar conforme a natureza da operação e a condição do operador, exigindo-se menor rigor se se fizerem presentes a notoriedade do risco e a reduzida vulnerabilidade do investidor.4. Os deveres jurídicos impostos aos administradores dos fundos de investimento não se confundem com a responsabilidade da instituição financeira que os recomenda a seus clientes como possíveis fontes de lucro.5. Eventuais prejuízos decorrentes de aplicações mal sucedidas somente comprometem as instituições financeiras que os recomendam como forma de investimento se não forem adotadas cautelas mínimas necessárias à elucidação da álea natural do negócio jurídico, sobretudo daqueles em que o elevado grau de risco é perfeitamente identificável segundo a compreensão do homem-médio, justamente por se tratar de obrigação de meio, e não de resultado.6. Causa do insucesso do empreendimento diretamente atrelada a um dos maiores golpes já aplicados no mercado financeiro norte-americano, que surpreendeu milhares de outros investidores do mercado financeiro no mundo todo.7. Recurso especial não provido.(REsp 1606775/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/12/2016, DJe 15/12/2016)

Reconhecida a responsabilidade da ré pelo vicío na prestação dos serviços, impõe-se a análise individualizada dos pedidos de reparação deduzidos pelos autores.

a) Satisfação da obrigação securitária mediante pagamento em dinheiro

Os autores requereram o pagamento da quantia de R$ 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil reais), correspondente ao valor de mercado do imóvel, tendo em vista a impossibilidade de sua reconstrução. O valor está embasado em parecer técnico elaborado por profissional habilitada (evento 1 - PARECER15) e não foi impugnado pela ré na contestação, razão pela qual o pedido é procedente neste ponto.

Sobre esse valor incidirá correção monetária pelo IPCA-e e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês (art. 406 do CC c.c. art. 161, §1º, do CTN), ambos contados da citação, em razão de a quantia postulada já levar em consideração a atualização do preço do imóvel.

b) Ressarcimento de aluguéis

A título de danos materiais, os autores requereram a condenação dos réus ao ressarcimento dos aluguéis pagos desde a desocupação do imóvel até o efetivo recebimento da indenização prevista no item a.

O pedido deve ser julgado procedente ante o reconhecimento da responsabilidade da ré por não ter respondido ao pedido de cobertura securitária apresentado pelos autores.

Quanto ao termo a quo dos meses a serem ressarcidos, fixo o mês de novembro de 2010, considerando que os autores desocuparam o imóvel no mês de outubro do mesmo ano. Os autores apresentaram com a inicial cálculo atualizado dos alugueis pagos até o ajuizamento da ação totalizando R$ 44.078,47 (quarenta e quatro mil setenta e oito reais e quarenta e sete centavos). Como o valor indicado não foi controvertido pela ré, fixo desde logo essa quantia como valor a ser ressarcido a título de aluguéis, sem prejuízo do ressarcimento dos valores pagos e devidamente comprovados após o ajuizamento da ação, que serão apurados na fase de execução.

Sobre o valor de R$ 44.078,47 (quarenta e quatro mil setenta e oito reais e quarenta e sete centavos) incidirá correção monetária pelo IPCA-e e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês (art. 406 do CC c.c. art. 161, §1º, do CTN), ambos contados da citação, em razão de a quantia postulada ter sido atualizada monetariamente até o ajuizamento da ação.

c) Pagamento das prestações do contrato do SFH

Os autores requereram a condenação da ré ao pagamento, em seus nomes, das prestações do contrato do SFH a partir da data do sinistro.

Esse pedido não pode julgado procedente, sob pena de acarretar o enriquecimento sem causa dos autores. Ambos adquiriram um imóvel por meio do SFH e vinham pagando as prestações correspondentes. Ao serem privados do bem em razão de sinistro coberto pela apólice do seguro, deveriam ter recebido a indenização devida. Como isso não aconteceu pela via administrativa, a ré está sendo condenada judicialmente a pagar-lhes o valor correspondente ao imóvel. Isso não lhes desobriga, contudo, de pagarem as prestações do financiamento imobiliário.

Segunda consta da inicial, os autores pararam de pagar as parcelas do financiamento em julho de 2010. Naquele momento a ré já havia recebido o pedido de cobertura securitária, estando, por assim dizer, em mora para com os autores. Por essa razão, diante do descumprimento das obrigações contratuais pela ré, é possível acolher parcialmente o pedido dos autores apenas para afastar os encargos moratórios incidentes sobre as prestações desde o momento em que as parcelas deixaram de ser pagas, até o momento em que os autores receberem a indenização fixada no item a, sendo vedada qualquer forma de compensação entre os valores vencidos e os montantes ora fixados a título de indenização. Nesse sentido, do ponto de vista contratual, deverá a ré conceder uma moratória aos autores, reprogramando o vencimento das parcelas do financiamento para depois do pagamento da indenização pelo valor do imóvel, de modo que os autores somente voltem a ter que pagarem as prestações depois de terem condições de adquirirem outra residência.

d) Danos morais

O dano moral resulta naturalmente dos fatos e não depende de comprovação. Sobre esse assunto, são lapidares as lições doutrinárias de Sérgio Cavalieri Filho, as quais, embora extensas, merecem a transcrição:

Essa é outra questão que enseja alguma polêmica nas ações indenizatórias. Como, em regra, não se presume o dano, há decisões no sentido de desacolher a pretensão de indenizatória por falta de prova do dano moral.

Entendemos, todavia, que por se tratar de algo imaterial ou ideal, a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Seria uma demasia, algo até impossível, exigir que a vítima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos, ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou o desprestígio através dos meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase de irreparabilidade do dano moral em razão de fatores instrumentais.

Nesse ponto a razão se coloca ao lado daqueles que entendem que o dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si. Se a ofensa é grave e de representação, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum. Assim, por exemplo, provada a perda de um filho, do cônjuge, ou de outro ente querido, não há que se exigir a prova do sofrimento, porque isso decorre do próprio fato de acordo com as regras da experiência comum; provado que a vítima teve seu nome aviltado, ou a sua imagem vilipendiada, nada mais ser-lhe-á exigido provar, por isso que o dano moral está in re ipsa; decorre inexoravelmente da gravidade do próprio fato ofensivo, de sorte que, provado o fato, provado está o dano moral.

(CAVALIERI FILHO. Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. Atlas, 2012, pág. 97).

No caso sob apreciação verifica-se que os autores estão há mais de 5 anos privados da possibilidade de residirem em sua "casa própria", adquirida com a assunção de um financiamento de longo prazo. Nesse período, além de não contarem com o abrigo do imóvel adquirido, foram privados da possibilidade de adquirirem outro em razão do compromisso assumido. E não se trata aqui de vedação legal, mas de impossibilidade fática, visto que os autores são pessoas de condição financeira bastante limitadas, como pode ser constatado na audiência de instrução.

É perceptível que essa situação ultrapassa a noção de mero aborrecimento e possui gravidade suficiente para justificar a imposição da reparação por danos morais, sobretudo se considerados os sentimentos de segurança e tranquilidade proporcionados pela aquisição de imóvel próprio, em especial nas pessoas mais humildes, que nem sempre possuem condições para pagar o aluguel de uma moradia digna, por esteram sujeitas à situação de desemprego e outras adversidades.

Do quantum indenizatório:

O Código Civil, nos seus artigos 944 e 945, traça os parâmetros a serem seguidos pelo juiz para a quantificação da indenização:

Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.

Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização.

Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.

A indenização, em regra, deve guardar correspondência com o dano causado, de modo a repor o patrimônio da vítima na exata medida em que foi desfalcado. Nessa esteira, o quantum indenizatório devido a título de danos morais deve assegurar a justa reparação do prejuízo sem proporcionar enriquecimento sem causa do autor, sem olvidar a capacidade econômica do réu e devendo ser arbitrado pelo juiz de modo que a composição do dano seja proporcional à ofensa, calcada nos critérios da exemplaridade e da solidariedade. Essa regra geral, entretanto, sofre temperamentos. Tanto a menor gravidade da culpa do autor do dano, quanto à concorrência de conduta da própria vítima para que ele tenha ocorrido, podem implicar na redução da indenização, equitativamente, pelo juiz.

No caso dos autos, para fixar o montante da indenização, entendo necessário considerar: (a) a repercussão da omissão da ré em responder ao pedido de cobertura securitária, que resultou na impossibilidade de os autores residirem em imóvel próprio; (b) que entre o pedido de cobertura securitária e o ajuizamento da presente demanda transcorreram 5 anos, sem uma resposta formal por parte da ré; (c) que a CEF é instituição financeira sólida e financeiramente saudável e possui patrimônio elevado, devendo a indenização possuir também efeito pedagógico, de modo a estimular a adoção de medidas de segurança efetivas e que evitem a repetição das condutas que levaram à produção dos danos suportados pelos autores; e, por fim, (d) que os autores não concorreram de nenhuma forma para o evento danoso.

Com base nos parâmetros legais e fáticos acima mencionados, entendo razoável fixar para cada um dos autores indenização em valor correspondente a R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), valor esse que está longe de qualquer parâmetro qualificável como riqueza.

Sobre o valor dos danos morais incidirá correção monetária pelo IPCA-e (Manual de Cálculos da Justiça Federal), a contar da data desta decisão e juros de mora de 1% ao mês, nos termos do art. 406 do CC/2002, contados desde o evento danoso, considerado como tal o mês de outubro de 2010, que foi quando os autores tiveram que abandonar o imóvel adquirido.

Quanto ao pedido de condenação por litigância de má fé, feita pelos autores em contrarrazões, não prospera

Dispõe o art. 80 do Código de Processo Civil:

Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que:

I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;

II - alterar a verdade dos fatos;

III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal;

IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo;

V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;

VI - provocar incidente manifestamente infundado;

VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.

Embora julgada improcedente, a apelação da Caixa, não caracteriza qualquer das hipóteses previstas em lei, tendo constituído exercício legítimo do direito constitucional de defesa. Não obstante não tenha logrado êxito nas suas alegações, a apelante apressentou as razões por que entendia que a sentença deveria ser alterada, não se tratando de resistência injustificada.

No sentido de que a mera improcedência não pode, mutatis mutantis, por si só, ser equiparada à litigância de má-fé, cito o seguinte precedente:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL, COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. AUSÊNCIA DA CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - INOCORRÊNCIA. 1. É devido o benefício de aposentadoria rural por idade, nos termos dos artigos 11, VII, 48, § 1º e 142, da Lei nº 8.213/1991, independentemente do recolhimento de contribuições quando comprovado o implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e cinquenta e cinco anos para a mulher) e o exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, mediante início de prova material complementada por prova testemunhal idônea. 2. Hipótese em que a parte autora não preencheu os requisitos necessários à concessão do benefício, por não se tratar de segurado especial. 3. A improcedência do pedido inicial não implica em má-fé da parte autora, a qual deve ser comprovada concretamente. (TRF4, AC 5024048-03.2016.404.9999, QUINTA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 19/10/2016)

Nos termos do art. 85, § 11, do CPC, majoro os honorários sucumbenciais, a cargo da CEF, para 12% sobre o valor da condenação.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000509987v5 e do código CRC 33ddce4c.Informações adicionais da assinatura:
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5004288-33.2015.4.04.7209
40000509987.V5


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5004288-33.2015.4.04.7209/SC

RELATOR: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (RÉU)

APELADO: HELIANE MARIA DA SILVA (AUTOR)

APELADO: FELICIO DIAS DE SOUSA (AUTOR)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. SFH. SEGURO. PRAZO PRESCRICIONAL. INTERESSE DE AGIR

Nas ações que versam sobre indenização securitária, o prazo prescricional passa a fluir a partir da data em que o segurado torna-se ciente da recusa à verba indenizatória pleiteada perante a seguradora.

No caso em análise, contudo, inexiste comprovação da ciência por parte do segurado acerca da negativa da seguradora, muito menos é possível afirmar se efetivamente ocorreu o indeferimento em resposta a notificação do aviso de sinistro.

Diante das várias providências tomadas pelos autores, não há que se falar em ausência de pretensão resistida e tampouco em falta de interesse de agir.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 04 de julho de 2018.



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5004288-33.2015.4.04.7209
40000509988 .V4


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 04/07/2018

Apelação Cível Nº 5004288-33.2015.4.04.7209/SC

RELATOR: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

PRESIDENTE: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS

APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (RÉU)

APELADO: HELIANE MARIA DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: DIANA CORREA

APELADO: FELICIO DIAS DE SOUSA (AUTOR)

ADVOGADO: DIANA CORREA

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 04/07/2018, na seqüência 22, disponibilizada no DE de 18/06/2018.

Certifico que a 4ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A 4ª Turma , por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

LUIZ FELIPE OLIVEIRA DOS SANTOS

Secretário



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