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ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. SERVIDOR PÚBLICO. FILHA SOLTEIRA. MAIOR DE 21 ANOS. LEI 3. 373/1958. CANCELAMENTO DO PENSIONAMENTO. EMPREGO PÚBLICO. OCUP...

Data da publicação: 04/11/2021, 07:00:59

EMENTA: ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. SERVIDOR PÚBLICO. FILHA SOLTEIRA. MAIOR DE 21 ANOS. LEI 3.373/1958. CANCELAMENTO DO PENSIONAMENTO. EMPREGO PÚBLICO. OCUPANTE. POSSIBILIDADE. NEGADO PROVIMENTO. 1. A lei a ser aplicável à pensão por morte é aquela em vigor à data do óbito do instituidor do benefício. 2. A verificação das condições ensejadoras da pensão temporária da Lei 3.373/58 pode, e deve, ser realizada, porquanto o benefício é devido enquanto a beneficiada mantiver as condições legais, forte na lógica da regra rebus sic stantibus. 3. A Lei 3.373/58 estabelece que a filha do segurado terá direito à pensão temporária em 3 (três) hipóteses: (i) se menor de 21 anos, de qualquer condição; (ii) se maior de 21 anos, inválida; (iii) se maior de 21 anos, de qualquer condição, mas solteira e sem ocupar cargo público permanente. 4. A ocupação de emprego público pela pensionista, por não ser enquadrar no conceito de cargo público permanente, não enseja a cessação da pensão prevista no artigo 5°, parágrafo único, da Lei 3.373/58. 5. No caso dos autos, além de ser solteira, não restou comprovada a ocupação de cargo público permanente, mas tão somente de emprego público, razão pela qual satisfaz os requisitos ensejadores do benefício da pensão temporária da Lei 3.373/58. 6. Impossibilidade de a anterior beneficiada com a quota-parte parte da pensão restituir os valores que recebeu de boa fé e por equívoco da Administração Pública. Precedentes deste Regional. 7. Em não tendo sido os honorários advocatícios fixados na origem, em razão da reclassificação da ação do procedimento do Juizado Especial para o comum, cabível o arbitramento daqueles nos autos recursais, com a possibilidade, ainda, de majoração, forte no artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil. 8. Apelação a que se nega provimento. (TRF4, AC 5006364-27.2019.4.04.7100, QUARTA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 27/10/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5006364-27.2019.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: RUBIA GUIMARAES RIBEIRO (AUTOR)

RELATÓRIO

Julgamento conjunto das Apelações nº 5006364-27.2019.4.04.7100 e 5005810-92.2019.4.04.7100.

Trata-se de recurso de apelação interposto pela União em face de sentença que, em suma, julgou procedente o pedido da apelada para anular o ato administrativo que cancelou o benefício de pensão percebido pela autora em razão do falecimento de seu pai, o instituidor Pythagoras Abelardo Ribeiro Filho.

A apelante, em síntese, argumenta: (a) que a autora não mais depende financeiramente do servidor falecido, porquanto é empregada pública, além de possuir outra fonte de renda; (b) que o Tribunal de Contas da União possui entendimento sumulado de que a pensão da Lei 3.373/1958 somente é devida à filha solteira maior de 21 anos enquanto existir dependência econômica em relação ao instituidor da pensão, falecido antes do advento da Lei 8.112/1990 - Súmula n. 285 do TCU; (c) que a interpretação correta a ser dada à norma legal é aquela que pondere a evolução social e a necessária leitura constitucional da legislação anterior a 1988; (d) que "não há que se falar em decadência administrativa, haja vista tratar-se de benefício temporário, que pode ser suprimido quando constatada a ausência dos requisitos legais/constitucionais para a sua manutenção"; (e) que a decisão de primeiro grau foi omissa em não consignar expressamente a necessidade de a litisconsorte Nadia Cristina Guimaraes Ribeiro, irmã da demandante e revel na ação, devolver os valores recebidos a maior.

Requer, assim, seja dado provimento à presente súplica recursal, ou, sucessivamente, mantida a sentença, "fique expressa a necessidade de a litisconsorte devolver os valores que recebeu a maior por força do cancelamento da pensão da autora".

Intimada a se manifestar, a apelada apresentou contrarrazões (Evento 56, CONTRAZ1, autos originários).

Registra-se que, em razão do que previsto no artigo 3º, § 1º, inciso III, da Lei 10.259/01 (Lei dos Juizados Especiais Federais), foi declarada a incompetência da Turma Recursal para conhecer do Recurso Inominado ora interposto (Evento 48, RecIno1, autos originários), tendo o feito, na sequência, sido encaminhado a esta Corte.

Em tempo, consigna-se que o feito restou julgado pela 10ª Vara Federal de Porto Alegre, no julgamento conjunto desta ação e a do processo de nº 5005810-92.2019.4.04.7100.

É o relatório.

VOTO

Em 03-8-2020, restou prolatada sentença de procedência parcial do pedido da autora, assim redacionada, in verbis (Evento 44, SENT1):

Julgamento conjunto das ações de Procedimento Comum nº 5006364-27.2019.4.04.7100 e 5005810-92.2019.4.04.7100, esta redistribuída a esta 10ª vara por conexão àquela.

Dispensado o relatório.

Decido.

Gratuidade da justiça

A assistência judiciária é devida a quem não possui rendimentos suficientes para suportar as despesas de um processo, presumindo-se verdadeira a declaração de necessidade do benefício (artigos 98, caput, e 99, §§ 2º e 3º, do CPC). No entanto, considerando o volume de casos que aportam no Judiciário com tal pedido, é autorizada a utilização de um critério objetivo, ao menos para uma análise primeira, sem impedir que venham as partes (com instrução adequada) a contestar a conclusão.

Este Juízo adota como parâmetro o teto de benefícios pagos pelo INSS, cujo valor para o ano de 2020 é de R$ 6.101,06 (Portaria nº 914 da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, de 13 de janeiro de 2020), a exemplo da jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (vg: TRF4, AG 5041707-78.2018.4.04.0000).

No caso em tela, a renda mensal auferida pela parte autora, após os descontos obrigatórios (contribuição social e IRPF), corresponde, em média, a R$ 6.815,09 mensais no ano calendário de 2017, superior ao teto, portanto.

Assim, a renda comprovada afasta a presunção de miserabilidade jurídica exigida pela lei a ensejar a concessão do benefício.

Portanto, INDEFIRO o pedido da gratuidade da justiça.

Mérito

A parte autora busca provimento jurisdicional que declare a ocorrência de decadência do direito da ré de revisar a sua pensão, e que determine a manutenção do pagamento do benefício, instituído sob a vigência da Lei 3.373/58, devido por falecimento de seu pai.

Narra que é filha de Pythagoras Abelardo Ribeiro Filho, ex-servidor público da Polícia Federal, falecido em 27/09/1988, e, nessa condição, há mais de vinte anos, percebe pensão por morte do ex-servidor com fundamento na Lei nº 3.373/58, visto que é solteira e não exerce cargo público.

Aduz que, em janeiro de 2017, recebeu Notificação nº 229/2017/-SEAP/DRH/CHR/DGP/PF, pela qual foi informada que o Tribunal de Contas da União apurou, por meio de "Trilhas de Auditoria", indícios de irregularidades em sua pensão. Instada a prestar informações e documentação, atendeu prontamente. Não obstante, em outubro/2017, foi proferido parecer determinando o cancelamento de seu benefício, cuja portaria foi publicada em 26/10/2017.

Reputa ilegal o ato administrativo, pois sustenta que a Lei nº 3.373/58, em nenhum momento, vedou a percepção de outra renda pela pensionista. Sustenta que as pensões concedidas às filhas maiores, sob a égide da Lei nº 3.373/58, que preenchiam os requisitos pertinentes ao estado civil e a não ocupação de cargo público de caráter permanente encontram-se consolidadas e somente podem ser alteradas/cessadas, se um dos dois requisitos for superado, ou seja, se deixarem de ser solteiras ou se passarem a ocupar cargo público permanente.

Postos os fatos, observo que a questão posta neste feito foi analisada com profundidade pelo Ministro Edson Fachin, em decisão proferida nos autos da Medida Cautelar em Mandado de Segurança nº 34.677/DF, em trâmite no Supremo Tribunal Federal, cujos fundamentos acolho como razão de decidir:

"(...) A matéria em comento está adstrita à legalidade do ato do Tribunal de Contas da União que reputa necessária a comprovação de dependência econômica da pensionista filha solteira maior de 21 anos, para o reconhecimento do direito à manutenção de benefício de pensão por morte concedida sob a égide do art. 5º, II, parágrafo único, da Lei 3.373/58. Partindo dessa premissa, o TCU determinou a reanálise de pensões concedidas a mulheres que possuem outras fontes de renda, além do benefício decorrente do óbito de servidor público, do qual eram dependentes na época da concessão. Dentre as fontes de renda, incluem-se: renda advinda de relação de emprego, na iniciativa privada, de atividade empresarial, na condição de sócias ou representantes de pessoas jurídicas ou de benefícios do INSS; recebimento de pensão com fundamento na Lei 8.112/90, art. 217, I, alíneas a, b e c (pensão na qualidade de cônjuge de servidor); recebimento de pensão com fundamento na Lei 8.112/90, art. 217, inciso I, alíneas d e e (pais ou pessoa designada) e inciso II, alíneas a, c e d (filhos até 21 anos, irmão até 21 anos ou inválido ou pessoa designada até 21 anos ou inválida); a proveniente da ocupação de cargo público efetivo federal, estadual, distrital ou municipal ou aposentadoria pelo RPPS; ocupação de cargo em comissão ou de cargo em empresa pública ou sociedade de economia mista.

Discute-se, portanto, se a dependência econômica em relação ao instituidor do benefício e do valor pago a título de pensão por morte encontra-se no rol de requisitos para a concessão e manutenção do benefício em questão.

Inicialmente, assento a jurisprudência consolidada neste Supremo Tribunal Federal quanto à incidência, aos benefícios previdenciários, da lei em vigência ao tempo em que preenchidos os requisitos necessários à sua concessão. Trata-se da regra “tempus regit actum”, a qual aplicada ao ato de concessão de pensão por morte significa dizer: a lei que rege a concessão do benefício de pensão por morte é a vigente na data do óbito do segurado.

Neste sentido:

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. FISCAIS DE RENDA. PENSÃO POR MORTE. 1) A pensão por morte rege-se pela legislação em vigor na data do falecimento do segurado. Princípio da lei do tempo rege o ato (tempus regit actum). Precedentes. 2) Impossibilidade de análise de legislação local (Lei Complementar estadual n. 69/1990 e Lei estadual n. 3.189/1999). Súmula n. 280 do Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental ao qual se nega provimento” (ARE 763.761- AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe 10.12.2013).

“Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Pensão por morte. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que o valor da pensão por morte deve observar o padrão previsto ao tempo do evento que enseja o benefício. Tempus regit actum. 3. Evento instituidor do benefício anterior à vigência da Emenda Constitucional 20/1998. Descabe emprestar eficácia retroativa à diretriz constitucional. 4. Agravo regimental a que se nega provimento” (ARE 717.077- AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe 12.12.2012).

A tese foi assentada, inclusive, no julgamento do RE 597.389-RG-QO, sob a sistemática da repercussão geral.

As pensões cujas revisões foram determinadas no Acórdão 2.780/2016 – Plenário – TCU, tiveram suas concessões amparadas na Lei 3.373/58, que dispunha sobre o Plano de Assistência ao Funcionário e sua Família (regulamentando os artigos 161 e 256 da Lei 1.711/1952, a qual, por sua vez, dispunha sobre o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União), cujos artigos 3º e 5º tinham a seguinte redação:

Art. 3º O Seguro Social obrigatório garante os seguintes benefícios:

I - Pensão vitalícia;

II - Pensão temporária;

III - Pecúlio especial.

(...)

Art. 5º Para os efeitos do artigo anterior, considera-se família do segurado:

I - Para percepção de pensão vitalícia:

a) a espôsa, exceto a desquitada que não receba pensão de alimentos;

b) o marido inválido;

c) a mãe viúva ou sob dependência econômica preponderante do funcionário, ou pai inválido no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo;

II - Para a percepção de pensões temporárias:

a) o filho de qualquer condição, ou enteado, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido, enquanto durar a invalidez;

b) o irmão, órfão de pai e sem padrasto, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido enquanto durar a invalidez, no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo, sem filhos nem enteados.

Parágrafo único. A filha solteira, maior de 21 (vinte e um) anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente.

Os requisitos para a concessão da pensão por morte aos filhos dos servidores públicos civis federais eram, portanto, serem menores de 21 (vinte e um anos) ou inválidos. Excepcionalmente, a filha que se mantivesse solteira após os 21 anos não deixaria de receber a pensão por morte, exceto se passasse a ocupar cargo público permanente. Não se exigiam outros requisitos como, por exemplo, a prova da dependência econômica da filha em relação ao instituidor ou ser a pensão sua única fonte de renda.

De igual modo, não havia na lei hipótese de cessação da pensão calcada no exercício, pela pensionista, de outra atividade laborativa que lhe gerasse algum tipo de renda, à exceção de cargo público permanente.

A superação da qualidade de beneficiário da pensão temporária ocorria, apenas, em relação aos filhos do sexo masculino após os 21 anos, quando da recuperação da capacidade laborativa pelo filho inválido, e, no que tange à filha maior de 21 anos, na hipótese de alteração do estado civil ou de posse em cargo público.

A Lei 1.711/1952 e todas as que a regulamentavam, incluída a Lei 3.373/58, foram revogadas pela Lei 8.112/90, que dispôs sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, à luz na nova ordem constitucional inaugurada em 1988.

Nesse novo estatuto a filha solteira maior de 21 anos não mais figura no rol de dependentes habilitados à pensão temporária. Atualmente, considerando as recentes reformas promovidas pela Lei 13.135/2015, somente podem ser beneficiários das pensões, cujos instituidores sejam servidores públicos civis, o cônjuge ou companheiro, os filhos menores de 21 anos, inválidos ou com deficiência mental ou intelectual, e os pais ou irmão que comprovem dependência econômica.

Nesse contexto, as pensões cuja revisão suscita o Tribunal de Contas da União no Acórdão 2.780/2016 foram concedidas entre o início e o término de vigência da Lei 3.373/58, ou seja, de março de 1958 a dezembro de 1990.

A respeito do prazo para a revisão do ato de concessão de benefícios previdenciários a servidor público ou a seus dependentes, a Lei 9.784/99 dispõe, no artigo 54, ser de cinco anos o prazo para a Administração anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários.

Com efeito, pende de julgamento neste Supremo Tribunal Federal o tema em que se discute o termo inicial do prazo decadencial para revisar atos de pensão ou aposentadoria pelo Tribunal de Contas da União, se da concessão da aposentadoria/pensão ou se do julgamento pela Corte de Contas, em sede de repercussão geral no bojo de RE 636.553, pendente ainda o julgamento do mérito.

No entanto, o Acórdão impugnado diz respeito a atos de concessão cuja origem são óbitos anteriores a dezembro de 1990, sendo muito provável que o prazo de cinco anos, contados da concessão ou do julgamento, já tenha expirado. De todo modo, não houve, no Acórdão do TCU, menção ao respeito ao prazo decadencial de revisão previsto no artigo 9.784/99, porquanto o entendimento lá sustentado diz respeito à possibilidade de revisão a qualquer tempo em que se modificarem as condições fáticas da dependência econômica.

Haure-se, portanto, da leitura rasa da jurisprudência e da legislação acima citadas a seguinte conclusão: as pensões concedidas às filhas maiores sob a égide da Lei 3.373/58 que preenchiam os requisitos pertinentes ao estado civil e à não ocupação de cargo público de caráter permanente encontram-se consolidadas e somente podem ser alteradas, é dizer, cessadas, se um dos dois requisitos for superado, ou seja, se deixarem de ser solteiras ou se passarem a ocupar cargo público permanente.

O Tribunal de Contas da União, contudo, não interpreta do mesmo modo a legislação e a jurisprudência transcritas acima e esclarece, no ato coator, ter havido uma “evolução na jurisprudência recente do TCU a respeito do tema”.

O TCU adotava a tese firmada no Poder Judiciário no sentido de que à pensão por morte aplica-se a lei vigente à época da concessão.

Permitia, ainda, nos termos da Súmula 168, que a filha maior solteira que viesse a ocupar cargo público permanente na Administração Direta e Indireta optasse entre a pensão e a remuneração do cargo público, considerando a situação mais vantajosa.

No entanto, em 2012, após consulta formulada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, o que resultou na confecção do Acórdão 892/2012, o TCU alterou a interpretação sobre o tema “a partir da evolução social” e considerou revogar a Súmula 168, bem como reputar necessária a comprovação da dependência econômica das filhas em relação ao valor da pensão da qual são titulares.

Para a Corte de Contas, “a dependência econômica constitui requisito cujo atendimento é indispensável tanto para a concessão da pensão quanto para a sua manutenção, ou seja, a eventual perda de tal dependência por parte da pensionista significará a extinção do direito à percepção do benefício em referência.”

Partindo dessa premissa, ou seja, de que para a obtenção e manutenção da pensão por morte é exigida a prova da dependência econômica, o TCU definiu ser incompatível com a manutenção desse benefício a percepção, pela pensionista, de outras fontes de renda, ainda que não decorrentes da ocupação de cargo público permanente.

Editou, então, a Súmula 285, de seguinte teor: “A pensão da Lei 3.373/1958 somente é devida à filha solteira maior de 21 anos enquanto existir dependência econômica em relação ao instituidor da pensão, falecido antes do advento da Lei 8.112/1990.”

Ademais, foram fixadas diretrizes para a análise do novo requisito: “Se comprovado que o salário, pró-labore e/ou benefícios não são suficientes para a subsistência condigna da beneficiária, ela poderá acumular a economia própria com o benefício pensional. De outra forma, se a renda for bastante para a subsistência condigna, não há que se falar em habilitação ou na sua permanência como beneficiária da pensão.” (eDOC 30, p. 8)

Estabeleceu-se como parâmetro da análise de renda “condigna da beneficiária” o valor do teto dos benefícios do INSS.

Entendo, no entanto, ao menos em análise própria do pedido cautelar, que os princípios da legalidade e da segurança jurídica não permitem a subsistência in totum da decisão do Tribunal de Contas da União contida no Acórdão 2.780/2016.

A violação ao princípio da legalidade se dá pelo estabelecimento de requisitos para a concessão e manutenção de benefício cuja previsão em lei não se verifica.

Ainda que a interpretação evolutiva do princípio da isonomia entre homens e mulheres após o advento da Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, I) inviabilize, em tese, a concessão de pensão às filhas mulheres dos servidores públicos, maiores e aptas ao trabalho, pois a presunção de incapacidade para a vida independente em favor das filhas dos servidores não mais se sustenta com o advento da nova ordem constitucional, as situações jurídicas já consolidadas sob a égide das constituições anteriores e do arcabouço legislativo que as regulamentavam não comportam interpretação retroativa à luz do atual sistema constitucional.

Nesse sentido, embora o princípio da igualdade não tenha sido uma novidade na Constituição Federal de 1988, por já constar dos ideais revolucionários em 1879 e formalmente nas constituições brasileiras desde a do Império, de 1824, a sua previsão não se revelou suficiente para impedir a escravidão ou para impor o sufrágio universal, por exemplo, tampouco para extirpar do Código Civil de 1916 a condição de relativamente incapazes das mulheres casadas, o que somente ocorreu em 1962, com a Lei 4.121/62.

Do escólio doutrinário de Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, em comentários ao art. 5º, I, da CF/88, extrai-se o seguinte:

“é preciso todavia reconhecer que o avanço jurídico conquistado pelas mulheres não corresponde muitas vezes a um real tratamento isonômico no que diz respeito à efetiva fruição de uma igualdade material. Isso a nosso ver é devido a duas razões fundamentais: as relações entre homens e mulheres obviamente se dão em todos os campos da atividade social, indo desde as relações de trabalho, na política, nas religiões e organizações em geral, até chegar ao recanto próprio do lar, onde homem e mulher se relacionam fundamentalmente sob a instituição do casamento. É bem de ver que, se é importante a estatuição de iguais direitos entre homem e mulher, é forçoso reconhecer que esta disposição só se aperfeiçoa e se torna eficaz na medida em que a própria cultura se altere.” (Comentários à Constituição do Brasil. v. 2. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 18, grifos meus)

Nesse contexto, revelava-se isonômico, quando da disciplina do estatuto jurídico do servidor público no ano de 1958, salvaguardar às filhas solteiras uma condição mínima de sobrevivência à falta dos pais.

Essa situação não mais subsiste e soaria não só imoral, mas inconstitucional, uma nova lei de tal modo protetiva na sociedade concebida sob os preceitos de isonomia entre homens e mulheres insculpidos na atual ordem constitucional.

No entanto, a interpretação evolutiva dada pelo Tribunal de Contas da União não pode ter o condão de modificar os atos constituídos sob a égide da legislação protetiva, cujos efeitos jurídicos não estão dissociados da análise do preenchimento dos requisitos legais à época da concessão, pois “não é lícito ao intérprete distinguir onde o legislador não distinguiu” (RE 71.284, Rel. Min. Aliomar Baleeiro).

Além disso, o teor da lei 3.373/58 e o histórico retro mencionado acerca da situação da mulher na sociedade pré Constituição de 1988, revela claramente a presunção de dependência econômica das filhas solteiras maiores de vinte e um anos, não se revelando razoável, exceto se houver dúvida no tocante à lisura da situação das requerentes no momento da solicitação da pensão (o que não se pode extrair das razões do ato impugnado), exigir que faça prova positiva da dependência financeira em relação ao servidor instituidor do benefício à época da concessão.

Veja-se que a legislação de regência, quando previu, em relação a benefícios de caráter temporário, a possibilidade de “superação da qualidade de beneficiário”, o fez expressamente.

A Lei 3.373/58, por exemplo, estabelecia a manutenção da invalidez como “condição essencial” à percepção da pensão do filho ou do irmão inválido.

De igual modo, a Lei 8.112/90, atual estatuto jurídico dos servidores públicos civis federais, no artigo 222, enumera de modo expresso as hipóteses para a “perda da qualidade de beneficiário”: falecimento, anulação de casamento, cessação de invalidez ou afastamento de deficiência, acumulação de pensões, renúncia expressa ou, em relação ao cônjuge, o decurso dos prazos de que tratou a Lei 13.135/2015.

Mesmo para os benefícios devidos aos pais e aos irmãos, que necessitam comprovar a dependência econômica para a concessão do benefício, a superação dessa condição não consta dentre as hipóteses de perda da qualidade de beneficiário.

A respeito especificamente desse tema, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 234.543, de relatoria do Ministro Ilmar Galvão, expressamente considerou que a Lei 8.112/90 (art. 217, II, a, e 222, IV), ao revogar o benefício de pensão por morte à filha solteira maior de 21 anos, não poderia retroagir para atingir benefícios concedidos antes de sua vigência.

Eis a ementa do julgado:

ADMINISTRATIVO. FILHA DE EX-SERVIDOR DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. PENSÃO TEMPORÁRIA. LEI 3.373/58. ALTERAÇÕES PELA LEI 8.112/90. DIREITO ADQUIRIDO. A garantia insculpida no art. 5º, inc. XXXVI, da Constituição Federal impede que lei nova, ao instituir causa de extinção de benefício, não prevista na legislação anterior, retroaja para alcançar situação consolidada sob a égide da norma então em vigor. Conquanto tenha a Lei 8.112/90 alterado as hipóteses de concessão de pensão temporária, previstas na Lei 3.373/58, tais modificações não poderiam atingir benefícios concedidos antes de sua vigência. Recurso extraordinário não conhecido. (RE 234.543, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Primeira Turma, julgado em 20/04/1999, DJ 06-08-1999 PP-00051 EMENT VOL-01957-14 PP-02953)

Ademais, dizer que a pensão é temporária não significa suscitar a sua revisão a cada dia ou a cada mês para verificar se persistem os requisitos que ensejaram a sua concessão. Significa que esse tipo de benefício tem condições resolutivas pré-estabelecidas: para os filhos, o atingimento da idade de 21 anos; para os inválidos, a superação dessa condição; para as filhas maiores de 21 anos, a alteração do estado civil ou a ocupação de cargo público de caráter permanente.

Assim, enquanto a titular da pensão permanece solteira e não ocupa cargo permanente, independentemente da análise da dependência econômica, porque não é condição essencial prevista em lei, tem ela incorporado ao seu patrimônio jurídico o direito à manutenção dos pagamentos da pensão concedida sob a égide de legislação então vigente, não podendo ser esse direito extirpado por legislação superveniente, que estipulou causa de extinção outrora não prevista.

No mesmo sentido, o Plenário do STF, no julgamento do MS 22.604, de relatoria do Ministro Maurício Corrêa, expressamente assenta a impossibilidade de reversão de pensão considerando o direito adquirido já consolidado:

PENSÃO. DISPUTA ENTRE HERDEIRAS. APLICAÇÃO DA LEI Nº 6.782/80. ATO ADMINISTRATIVO DO TCU. FILHA SEPARADA APÓS O ÓBITO DO PAI. REVERSÃO DO BENEFÍCIO. DIREITO ADQUIRIDO. EXISTÊNCIA. 1. Filha viúva, divorciada ou desquitada equipara-se à filha solteira, se provada dependência econômica ao instituidor, à data da sucessão pensional. 2. Verificado o óbito desse quando da vigência da Lei nº 6.782/80, a filha solteira, enquanto menor, faz jus à pensão, perdendo-a ao se casar. 3. Quota-parte da pensão cabível àquela que se casou transferida para a outra. Impossibilidade da reversão tempos depois em face da consolidação do direito adquirido. Mandado de Segurança conhecido e deferido. (MS 22604, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 28/04/1998, DJ 08-10-1999 PP-00039 EMENT VOL-01966-01 PP-00032)

Nesse contexto, viola, a piori, o princípio da legalidade o entendimento lançado no Acórdão 2.780/2016 no sentido de que qualquer fonte de renda que represente subsistência condigna seja apta a ensejar o cancelamento da pensão ou de outra fonte de rendimento das titulares de pensão concedida na forma da Lei 3.373/58 e mantida nos termos do parágrafo único do artigo 5º dessa lei.

Em segundo lugar, o acórdão do TCU não subsiste a uma apreciação à luz do princípio da segurança jurídica. Como dito, a Lei 9.784/99 impõe prazo decadencial para a revisão, pela Administração, de atos administrativos dos quais decorram efeitos favoráveis aos destinatários, salvo comprovada má-fé.

Assim, ressalvados os casos em que as pensionistas deliberadamente violaram a lei, é dizer, usaram de má-fé para a obtenção ou manutenção do benefício previdenciário em questão, a revisão do ato de concessão há de observar o prazo decadencial previsto na Lei 9.784/99, pois o STF, no julgamento do RE 626.489, sob a sistemática da repercussão geral, assentou entendimento segundo o qual, com base na segurança jurídica e no equilíbrio financeiro e atuarial, não podem ser eternizados os litígios.

A exceção à prova de má-fé não consta do Acórdão 2.780/2016, porque a interpretação que deu o TCU à manutenção das pensões temporárias é a de que elas podem ser revogadas a qualquer tempo, constatada a insubsistência dos requisitos que ensejaram a sua concessão, especialmente a dependência econômica, a qual, para o TCU, não é presumida.

Por derradeiro, observo que um dos principais fundamentos do Acórdão 2.780/2016 é a “evolução interpretativa” realizada pelo TCU à luz da nova ordem constitucional, a permitir que se exija a comprovação da dependência econômica da pensionista em relação ao valor percebido.

Veja-se que a nova interpretação resultou inclusive na revogação de Súmula do TCU que tratava da acumulação da pensão com cargo público.

Ainda que fosse admissível a exigibilidade da dependência econômica como condição para a manutenção da pensão em debate nestes autos, a aplicação da inovação interpretativa aos atos já consolidados encontra óbice no inciso XIII do parágrafo único do artigo 2º da Lei 9.784/99, o qual veda a aplicação retroativa de nova interpretação na análise de processos administrativos.

O Supremo Tribunal Federal reconheceu a necessidade de se conferir efeitos ex nunc às decisões administrativas que modificam posicionamentos anteriores, a fim de dar segurança jurídica a atos já consolidados e até mesmo para evitar que justificativas como “orçamento público” sejam utilizadas para rever atos dos quais decorram efeitos financeiros favoráveis ao beneficiário. Precedente: AO 1.656, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe de 10.10.2014.

Ante todo o exposto, considero, a priori, plausíveis de serem revistos apenas os atos de concessão de pensões por morte cujas titulares deixaram de se enquadrar na previsão legal vigente na época do preenchimento dos requisitos legais, ou seja, é possível a revisão das pensões cujas titulares ocupem cargo público de caráter permanente ou recebam outros benefícios decorrentes da alteração do estado civil, como a pensão prevista no art. 217, inciso I, alíneas a, b e c, Lei 8.112/90, ou a pensão prevista no art. 74 c/c art. 16, I, ambos da Lei 8.213/91, ou seja, pensões por morte de cônjuges.

Assentadas essas premissas, há plausibilidade jurídica no pedido formulado, no sentido de que, reconhecida a qualidade de dependente na filha solteira maior de vinte e um anos em relação ao instituidor da pensão e não se verificando a superação das condições essenciais previstas em lei, a pensão é, prima facie, devida e deve ser mantida. Ademais, tratando-se de verba de natureza alimentar, tenho como presente a possibilidade de que a demora na concessão do provimento possa resultar na sua ineficácia, já que a revisão do ato de concessão da pensão, nos moldes como determinada pelo TCU no ato impugnado, poderá resultar na cessação de uma das fontes de renda recebidas pela Impetrante.(grifei)

Com essas considerações, havendo fundamento relevante e risco de ineficácia da medida, defiro parcialmente o pedido de liminar, nos termos do art. 7º, III, da Lei 12.016/2009, para suspender, em parte, os efeitos do Acórdão 2.780/2016 em relação às pensionistas associadas à Impetrante até o julgamento definitivo deste mandado de segurança, mantendo-se a possibilidade de revisão em relação às pensões cujas titulares ocupem cargo público de caráter permanente ou recebam outros benefícios decorrentes da alteração do estado civil, como a pensão prevista no art. 217, inciso I, alíneas a, b e c, da Lei 8.112/90, ou a pensão prevista no art. 74 c/c art. 16, I, ambos da Lei 8.213/91, ou seja, pensões por morte de cônjuges.

Comunique-se ao Tribunal de Contas da União.

Intime-se a autoridade coatora para, no prazo de 10 (dez) dias, prestar as informações (art. 7º, I, da Lei 12.016/09).

Dê-se ciência à Advocacia-Geral da União para que, querendo, ingresse no feito (art. 7º, II, da Lei n. 12.016/09).

Após o recebimento das informações ou findo o prazo estipulado, ouça-se o Ministério Público, para os fins do art. 12 da Lei n. 12.016/09 e do art. 178, II, do CPC.

Publique-se. Intime-se.

Brasília, 31 de março de 2017.'

Cumpre ressaltar que referida decisão foi confirmada por decisão publicada no DJE nº 98 em 21/05/2018, cujo dispositivo transcrevo a seguir:

" (...) Com essas considerações, diante da violação aos princípios da legalidade e da segurança jurídica, concedo parcialmente a segurança, com fulcro no art. 1º, da Lei 12.016/2009, para anular, em parte, o Acórdão 2.780/2016 do TCU em relação às pensionistas associadas à Impetrante, mantendo-se a possibilidade de revisão em relação às pensões cujas titulares ocupem cargo público de caráter permanente ou recebam outros benefícios decorrentes da alteração do estado civil, como a pensão prevista no art. 217, inciso I, alíneas a, b e c, da Lei 8.112/90, ou a pensão prevista no art. 74 c/c art. 16, I, ambos da Lei 8.213/91, ou seja, pensões por morte de cônjuges. (...) Publique-se. Intimem-se."

No mesmo sentido é a jurisprudência do TRF 4ª Região:

ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. LEI N.º 3.373/1958. MANUTENÇÃO/RESTABELECIMENTO. FILHA SOLTEIRA. NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO PERMANENTE. REQUISITOS LEGAIS. A exigência de prova de dependência econômica em relação ao instituidor da pensão por morte, para fins de concessão/manutenção do benefício, com fundamento na Lei n.º 3.373/1958 (vigente à época do óbito do instituidor, ocorrido em 01/06/1993), decorre de interpretação específica conferida à legislação pelo Tribunal de Contas da União, em Orientação Normativa n.º 13, de 30/10/2013, e no Acórdão n.º 2.780/2016, a qual não tem lastro na norma legal. Na esteira do princípio tempus regit actum, não há como impor à autora o implemento de outros requisitos além daqueles previstos na Lei n.º 3.373/1958 - quais sejam, a condição de solteira e o não exercício de cargo público permanente. (TRF4, AC 5019457-19.2017.4.04.7200, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 07/06/2019)

ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. PENSÃO POR MORTE DE SERVIDOR PÚBLICO. FILHA SOLTEIRA. MAIOR DE 21 ANOS. NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO EFETIVO. LEI Nº 3.373/58. POSSIBILIDADE. 1. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos suficientes acerca da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, nos termos do artigo 300 do CPC. 2. A pensão por morte de servidor público percebida por filha maior de 21 (vinte e um) anos, segundo disposto no artigo 5º, parágrafo único, da Lei nº 3.373/58, somente cessa quando esta ocupar cargo público permanente ou contrair núpcias. (TRF4, AG 5005583-62.2019.4.04.0000, TERCEIRA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 13/05/2019)

ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. LEI N.º 3.373/1958. MANUTENÇÃO/RESTABELECIMENTO. FILHA SOLTEIRA. NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO PERMANENTE. REQUISITOS LEGAIS. A exigência de prova de dependência econômica em relação ao instituidor da pensão por morte, para fins de concessão/manutenção do benefício, com fundamento na Lei n.º 3.373/1958 (vigente à época do óbito do instituidor, ocorrido em 01/06/1993), decorre de interpretação específica conferida à legislação pelo Tribunal de Contas da União, em Orientação Normativa n.º 13, de 30/10/2013, e no Acórdão n.º 2.780/2016, a qual não tem lastro na norma legal. Na esteira do princípio tempus regit actum, não há como impor à autora o implemento de outros requisitos além daqueles previstos na Lei n.º 3.373/1958 - quais sejam, a condição de solteira e o não exercício de cargo público permanente. (TRF4, AC 5011943-18.2017.4.04.7102, QUARTA TURMA, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 25/04/2019)

No caso, a autora manteve relação de emprego com a empresa Imune Clínica de Vacinação Ltda e com o Hospital de Clínicas de Porto Alegre (emprego público), situações que não se confundem com a ocupação de cargo público permanente, que decorre de acesso por concurso público e se sujeita ao regime estatutário.

Quanto ao pedido de declaração da decadência do direito da ré de revisar a pensão, tenho que não procede. A pensão da autora é temporária e a lei prevê condições resolutivas, que, uma vez implementadas, ensejam sua extinção. Portanto, considerando que o quadro fático pode alterar-se a qualquer momento, a todo tempo é possível à Administração verificar se as condições resolutivas (casamento e exercício de cargo público) estão, ou não, presentes.

Assim, a União deverá restabelecer o pagamento da cota-parte da pensão devida à autora, bem como restituir os pagamentos suspensos. Os valores em atraso, a serem calculados até a data da efetiva reimplantação do benefício, deverão ser pagos acrescidos de correção monetária, desde cada vencimento até o efetivo pagamento, e acrescidos de juros moratórios. A correção monetária será computada pelo IPCA-E. Os juros de mora incidem a contar da citação, pela taxa de 6% ao ano, até a edição da Lei nº 11.960/09, quando passam a ser computados pelos índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança, capitalizados de forma simples.

A ré Nádia, beneficiada com a reversão da cota-parte da pensão da autora, não se opôs ao restabelecimento do benefício em favor da irmã, pois não apresentou contestação. Inobstante, não compete a ela efetuar a restituição do quanto recebido a maior, seja porque tais pagamentos se operaram por equívoco da União, seja porque os recebeu de boa-fé. Eventuais ajustes, se a União assim os entender devidos, deverão ser por ela gestionados juntos à pensionista.

Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, para determinar a manutenção do benefício de pensão temporária em favor da autora, enquanto não cessarem as condições expressamente previstas no art. 5º, II, "a", § único, da Lei 3.373/58.

Condeno a União a restabelecer o pagamento da cota-parte da pensão devida à autora, e a pagar os valores indevidamente suspensos, acrescidos de juros e correção monetária, conforme fundamentação desta sentença.

Diante da procedência do pedido principal formulado pela autora, concedo a tutela de evidência para determinar à União que restabeleça o benefício de pensão temporária em favor da autora, no prazo de 10 (dez) dias, comprovando a medida nos autos.

Sem honorários advocatícios, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95.

Intimem-se.

Havendo recurso, dê-se vista à parte contrária para contrarrazões e, na sequência, remeta-se o processo à Turma Recursal.

Em vista da inalteração das circunstâncias fáticas, tampouco de entendimento jurisprudencial majoritário e atual sobre o tema, não verifico motivos para alterar o posicionamento adotado pela magistrada primeva.

Prefacialmente, deve-se consignar que a lei a ser aplicável à pensão por morte é aquela em vigor à data do óbito do instituidor, nos termos da jurisprudência pacificada do Supremo Tribunal Federal (STF, ARE 774760 AgR, Primeira Turma, Relator Ministro Dias Toffoli, julgado em 04/02/2014), bem assim do verbete sumular n. 340 do Superior Tribunal de Justiça.

Além disso, é de se ressaltar que a verificação das condições ensejadoras da pensão temporária da Lei nº 3.373/58 pode, e deve, ser realizada, porquanto o benefício é devido enquanto a beneficiada mantiver as condições legais, forte na lógica da regra rebus sic stantibus. Nesse sentido, confira-se entendimento da 4ª Turma deste Tribunal:

ADMINISTRATIVO. PENSÃO. LEI 3.373 /58 (ART. 5º, PARÁGRAFO ÚNICO). FILHA MAIOR DE 21 ANOS. ACUMULAÇÃO COM VENCIMENTOS DE CARGO PÚBLICO PERMANENTE. IMPOSSIBILIDADE. PRELIMINAR. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. Deve ser rejeitada a preliminar de nulidade da sentença, por ausência de fundamentação, já que adotado os argumentos lançados em outra sentença que analisou situação análoga a ora examinada. O direito à pensão temporária em favor da filha maior de vinte e um anos, albergado na Lei nº 3373 /58, é concedido sob a condição de ser solteira e enquanto não ocupante de cargo público (parágrafo único, art. 5º), não cabendo a invocação de direito adquirido ou ato jurídico perfeito, caso ocorra, ulteriormente, qualquer uma das causas impeditivas da continuidade do beneficio. O fato de a autora ter recebido por um determinado lapso temporal, de forma incorreta, os proventos da pensão acumulados com os vencimentos do cargo público não legitima tal situação, vez que constitui poder-dever da Administração rever os seus atos, quando eivados de vícios, porque deles não se originam direitos (Súmulas 346 e 473 do STF). Apelação improvida. (TRF4, AC 5052039-91.2011.4.04.7100, Quarta Turma, Relatora Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 02/07/2014)

Salienta-se, ainda, que, para a Lei 3.373/58, a filha do segurado terá direito à pensão temporária em 3 (três) hipóteses: (i) se menor de 21 anos, de qualquer condição; (ii) se maior de 21 anos, inválida; (iii) se maior de 21 anos, de qualquer condição, mas solteira e sem ocupar cargo público permanente. Veja-se:

Art 5º Para os efeitos do artigo anterior, considera-se família do segurado:

I - Para percepção de pensão vitalícia:

a) a espôsa, exceto a desquitada que não receba pensão de alimentos;

b) o marido inválido;

c) a mãe viúva ou sob dependência econômica preponderante do funcionário, ou pai inválido no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo;

II - Para a percepção de pensões temporárias:

a) o filho de qualquer condição, ou enteado, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido, enquanto durar a invalidez;

b) o irmão, órfão de pai e sem padrasto, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido enquanto durar a invalidez, no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo, sem filhos nem enteados.

Parágrafo único. A filha solteira, maior de 21 (vinte e um) anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente.

Pois bem.

O óbito do instituidor Pythagoras Abelardo Ribeiro Filho ocorrera em 27-9-1988, conforme prova dos autos originários, do que se depreende a correta aplicação da Lei 3.373/1958 à espécie.

Assim sendo, tendo em vista que a Lei 3.373/58 exige, para a percepção da pensão temporária, a condição de ser a filha, se maior de 21 anos e de qualquer condição, solteira e não ocupante de cargo público permanente, tenho que, acaso demonstrada a ocupação do cargo da natureza precitada, falece um dos requisitos negativos a serem comprovados pela beneficiada.

Nessa perspectiva:

ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. LEI 3.373/58. FILHA SOLTEIRA NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO PERMANENTE. 1. A cessação do direito à pensão temporária somente se justificará se a parte autora deixa de implementar os requisitos expressamente previstos na Lei nº 3.373/1958, isto é, o estado civil de solteira e/ou o exercício de cargo público permanente/efetivo. 2. Permanecendo a parte autora na condição de filha maior solteira e não ocupante de cargo público, faz jus à manutenção da pensão temporária por morte de ex-servidor, concedida nos termos da Lei referida, não havendo razões para a reforma da sentença. (TRF4, AC 5010598-28.2014.4.04.7100, Terceira Turma, Relatora Marga Inge Barth Tessler, juntado aos autos em 16/06/2021)

A este ponto, faz-se mister explicitar as diferenças entre cargo e emprego público. O primeiro decorre de relação legal, estatutária, com possibilidade de aquisição de estabilidade e regido por normas de direito público, razão pela qual se impõe a necessidade de realização de concurso público para seu preenchimento/ocupação. Já o segundo trata-se de relação contratual, celetista, sem estabilidade, sendo regido predonominantemente por normas de direito privado, parcialmente derrogadas, em certas ocasiões, pelas de cunho público.

Portanto, a vedação de ocupação a cargo público permanente a que a Lei 3.737/58 se refere é aquela relacionada ao cargo público estatutário, que é o único, frisa-se, que pode ser encaixado na ideia de "permanente", em decorrência da estabilidade assegurada a seus ocupantes quando preenchidos os requisitos para tanto.

É o que está exposado no seguinte julgado do Tribunal da Cidadania:

ADMINISTRATIVO. PENSÃO TEMPORÁRIA. FILHA SOLTEIRA. NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO. DIREITO. FATO SUPERVENIENTE. TRANSFORMAÇÃO DO VÍNCULO. CANCELAMENTO DO BENEFÍCIO. DECADÊNCIA. INEXISTÊNCIA. OPÇÃO. DIREITO. 1. Nos termos dos arts. 53 e 54 da Lei n. 9.784/1999, a Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, sendo certo que o direito de anular os atos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. 2. A Lei n. 3.373/1958 previa expressamente que a filha solteira, maior de 21 anos, poderia receber pensão temporária enquanto não fosse ocupante de cargo público permanente. 3. Hipótese em que o ato de concessão da pensão à impetrante, quando da sua edição, atendia a todos os requisitos legais estabelecidos no art. 5º, II, da Lei n. 3.373/1958, já que ela era ocupante de emprego público, e não de cargo público. 4. In casu, o pagamento do benefício passou a ser ilegal em razão de fato superveniente, qual seja, a transposição do emprego público em cargo público. 5. Somente com a exigência de comprovantes de rendimentos no recadastramento do ano 2015, a pensionista apresentou demonstrativos de pagamento do Governo do Distrito Federal, oportunidade em que a Administração teve ciência da natureza do vínculo com base no qual se dava o percebimento dos proventos. 6. Sendo instaurado processo administrativo para apuração da irregularidade em 2015, não ficou configurada a decadência da Administração de rever o rebimento do benefício temporário. 7. Ainda que afastada a decadência, deve ser possibilitado à impetrante o direito de opção. 8. Recurso parcialmente provido. (STJ, RMS 54.974/PB, Primeira Turma, Relator Ministro Gurgel de Faria, julgado em 25/06/2019).

À semelhança, veja-se:

ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. LEI 3.373/58. RESTABELECIMENTO. FILHA SOLTEIRA NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO PERMANENTE. 1. Não há como impor à autora o preenchimento de outros requisitos que não daqueles previstos na Lei n.º 3.373/1958 - quais sejam, a condição de solteira e o não exercício de cargo público permanente. Por outro lado, não se exigiam outros requisitos como, por exemplo, a prova da dependência econômica da filha em relação ao instituidor ou ser a pensão sua única fonte de renda. 2. Permanecendo a parte autora na condição de filha maior solteira e não ocupante de cargo público permanente, faz jus à manutenção da pensão temporária por morte de ex-servidor, concedida nos termos da Lei n. 3.373/58. A circunstância da autora perceber redinmentos decorrente de exercício de emprego público, não legitima a cessação do benefício de pensão por morte, não sendo possível equiparar a percepção de qualquer renda com a ocupação de cargo público, por se tratar de situações distintas. (TRF4 5018316-62.2017.4.04.7200, Terceira Turma, Relator Rogerio Favreto, juntado aos autos em 23/08/2019)

Ademais, no que se refere à ausência de comprovação da dependência econômica da autora e aos entendimentos do Tribunal de Contas da União, adoto como razões de decidir, à similitude da sentença, a decisão proferida nos autos da Medida Cautelar em Mandado de Segurança nº 34.677/DF de Relatoria do Ministro Edson Fachin, no Supremo Tribunal Federal, em que a questão posta neste feito foi analisada com profundidade e se concluiu pela anulação parcial do Acórdão 2.780/2016 do Órgão de controle, posteriormente confirmada com o seguinte dispositivo:

" (...) Com essas considerações, diante da violação aos princípios da legalidade e da segurança jurídica, concedo parcialmente a segurança, com fulcro no art. 1º, da Lei 12.016/2009, para anular, em parte, o Acórdão 2.780/2016 do TCU em relação às pensionistas associadas à Impetrante, mantendo-se a possibilidade de revisão em relação às pensões cujas titulares ocupem cargo público de caráter permanente ou recebam outros benefícios decorrentes da alteração do estado civil, como a pensão prevista no art. 217, inciso I, alíneas a, b e c, da Lei 8.112/90, ou a pensão prevista no art. 74 c/c art. 16, I, ambos da Lei 8.213/91, ou seja, pensões por morte de cônjuges. (...) Publique-se. Intimem-se."

Outrossim, a jurisprudência deste Regional é firme nesse sentido:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. PENSÃO POR MORTE TEMPORÁRIA. FILHA MAIOR E SOLTEIRA NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO PERMANENTE, DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. 1. Permanecendo a parte autora na condição de filha maior solteira e não ocupante de cargo público permanente, faz jus à manutenção da pensão temporária por morte de ex-servidor, concedida nos termos da Lei n. 3.373/58, não cabendo à Administração impor o critério restritivo de comprovação da persistência da situação da dependência econômica existente à época do óbito. 2. Apelação e remessa oficial improvidas. (TRF4, AC 5031779-21.2019.4.04.7000, Quarta Turma, Relator Marcos Josegrei da Silva, juntado aos autos em 06/02/2020)

ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. LEI 3.373/58. RESTABELECIMENTO. FILHA SOLTEIRA NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO PERMANENTE. 1. Não há como impor à autora o preenchimento de outros requisitos que não daqueles previstos na Lei n.º 3.373/1958 - quais sejam, a condição de solteira e o não exercício de cargo público permanente. Por outro lado, não se exigiam outros requisitos como, por exemplo, a prova da dependência econômica da filha em relação ao instituidor ou ser a pensão sua única fonte de renda. 2. Permanecendo a parte autora na condição de filha maior solteira e não ocupante de cargo público permanente, faz jus à manutenção da pensão temporária por morte de ex-servidor, concedida nos termos da Lei n. 3.373/58. A circunstância da autora perceber remuneração decorrente de vínculo privado pou aposentadoria pelo RGPS, não legitima a cessação do benefício de pensão por morte, não sendo possível equiparar a percepção de qualquer renda com a ocupação de cargo público, por se tratar de situações distintas. (TRF4, AC 5038587-67.2018.4.04.7100, Terceira Turma, Relatora Carla Evelise Justino Hendges, juntado aos autos em 12/11/2020)

Ademais, no sentido específico dos autos, confira-se:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. LEI Nº 3.373/1958. PENSÃO TEMPORÁRIA POR MORTE. FILHA MAIOR SOLTEIRA NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO PERMANENTE. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. CANCELAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Para a concessão/manutenção do benefício da justiça gratuita, é necessária a declaração da parte requerente no sentido de que não possui condições de arcar com os ônus processuais, restando à contraparte a comprovação de circunstâncias que possam infirmar a presunção legal de pobreza, a qual pode ser ilidida pelo exame do conjunto probatório. 2. No caso, restou demonstrado que a parte conta com renda suficiente para arcar com os custos do processo, não preenchendo os requisitos legais para o deferimento do benefício da justiça gratuita. 3. A concessão de pensão por morte é regida pela legislação vigente à data do falecimento do instituidor, em atenção ao princípio tempus regit actum. 4. O STF, ao analisar medida cautelar em mandado de segurança coletivo (MS 34.677 MC/DF) objetivando a suspensão do Acórdão nº 2.780/2016 do Plenário do TCU que determinou a revisão de benefícios previdenciários de pensão por morte titularizados por filhas de servidores públicos civis, instituídas com base no art. 5º, II, parágrafo único, da Lei n. 3.373/1958, deferiu parcialmente a liminar, entendendo que, em respeito aos princípios da legalidade e da segurança jurídica, as pensões concedidas às filhas maiores sob a égide da Lei 3.373/58 que preenchiam os requisitos pertinentes ao estado civil e à não ocupação de cargo público de caráter permanente encontram-se consolidadas e somente podem ser cessadas se um destes dois requisitos legais for superado, independentemente da análise da dependência econômica, porque não é condição essencial prevista naquela Lei. 5. Permanecendo a parte autora na condição de filha maior solteira e não ocupante de cargo público permanente, faz jus à manutenção da pensão temporária por morte de ex-servidor, concedida nos termos da Lei n. 3.373/58, não cabendo à Administração impor o critério restritivo de comprovação da persistência da situação da dependência econômica. (TRF4, AC 5007249-32.2019.4.04.7200, Terceira Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, juntado aos autos em 30/09/2020)

Ainda, no que concerne à percepção de outra renda, que não pública, tampouco decorre de cargo permanente:

ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. LEI 3.373/58. RESTABELECIMENTO. FILHA SOLTEIRA NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO PERMANENTE. 1. Não há como impor à autora o preenchimento de outros requisitos que não daqueles previstos na Lei n.º 3.373/1958 - quais sejam, a condição de solteira e o não exercício de cargo público permanente. Por outro lado, não se exigiam outros requisitos como, por exemplo, a prova da dependência econômica da filha em relação ao instituidor ou ser a pensão sua única fonte de renda. 2. Permanecendo a parte autora na condição de filha maior solteira e não ocupante de cargo público permanente, faz jus à manutenção da pensão temporária por morte de ex-servidor, concedida nos termos da Lei n. 3.373/58. A circunstância da autora perceber remuneração decorrente de relação de emprego, na iniciativa privada, não legitima a cessação do benefício de pensão por morte, não sendo possível equiparar a percepção de qualquer renda com a ocupação de cargo público, por se tratar de situações distintas. (TRF4 5006921-48.2018.4.04.7100, Terceira Turma, Relator Rogerio Favreto, juntado aos autos em 01/07/2020)

Assim sendo, aos fundamentos da sentença não foram opostos argumentos idôneos a infirmar a conclusão da julgadora de origem, pelo o que deve ser mantido o provimento jurisdicional de primeiro grau em sua integralidade.

Da devolução de valores pela litisconsorte

No que cinge ao pleito da União para que, em tendo sido mantida a sentença, ficasse "expressa a necessidade de a litisconsorte devolver os valores que recebeu a maior por força do cancelamento da pensão da autora", passo à análise do requerimento.

A apelante afirma que a decisão de primeiro grau foi omissa em não consignar expressamente a necessidade de a litisconsorte Nadia Cristina Guimaraes Ribeiro, irmã da demandante e revel na ação, devolver os valores recebidos a maior.

Primeiramente, assevera-se que a apelante não se irresignou quanto a temática por meio da via recursal cabível, isso é, através dos embargos declaratórios, vide artigos 1.022 e seguintes do Código de Processo Civil, o que, no entanto, não obsta a análise do pedido, dado o efeito devolutivo do presente recurso.

Sem embargo, a sentença assim consignou:

A ré Nádia, beneficiada com a reversão da cota-parte da pensão da autora, não se opôs ao restabelecimento do benefício em favor da irmã, pois não apresentou contestação. Inobstante, não compete a ela efetuar a restituição do quanto recebido a maior, seja porque tais pagamentos se operaram por equívoco da União, seja porque os recebeu de boa-fé. Eventuais ajustes, se a União assim os entender devidos, deverão ser por ela gestionados juntos à pensionista.

(...)

Condeno a União a restabelecer o pagamento da cota-parte da pensão devida à autora, e a pagar os valores indevidamente suspensos, acrescidos de juros e correção monetária, conforme fundamentação desta sentença.

Portanto, não houve omissão da magistrada a quo no ponto.

Ademais, na esteira da jurisprudência remansosa desta Corte, são três as situações que envolvem a possibilidade de repetição ou não de valores pagos indevidamente pela Administração Pública: (i) os valores pagos indevidamente em decorrência de má-fé do segurado serão sempre restituídos ao erário; (ii) os valores pagos indevidamente por força de decisão judicial precária, ainda que recebidos de boa-fé, deverão ser restituídos ao erário; e, (iii) os valores pagos indevidamente, em caráter definitivo, em decorrência de erro da administração, desde que recebidos de boa-fé pelo segurado, são irrepetíveis (TRF4, AC 5000602-41.2017.4.04.7216, Quarta Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 26/05/2021).

In casu, está-se diante da terceira hipótese, devendo, alfim, ser mantida a decisão também nesse aspecto.

Honorários Advocatícios

No que concerne às verbas honorárias, a sentença do Evento 44, ainda proferida sob a égide do procedimento sumaríssimo da Lei 9.099/95, não as arbitrou, forte no artigo 55 desse diploma.

Ocorre que, conforme relatado alhures, houve a reclassificação do feito como sendo ação de procedimento comum (Evento 72, DESPADEC1, autos originários).

Na sequência, foram ratificados os atos e decisões proferidos no feito, inclusive a tutela de evidência concedida em sentença (Evento 80, DESPADEC1).

Não obstante, levando-se em conta a reclassificação e a incidência da Legislação Adjetiva Civil, deveria ter havido a condenação do vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor, nos termos do artigo 82 do Código de Processo Civil.

Sem embargo, forte no artigo 1.013, inciso III, do Código de Processo Civil, bem assim na Teoria da Causa Madura, passo à análise dos honorários sucumbenciais.

O artigo 87 do CPC assim dispõe:

Art. 87. Concorrendo diversos autores ou diversos réus, os vencidos respondem proporcionalmente pelas despesas e pelos honorários.

§ 1º A sentença deverá distribuir entre os litisconsortes, de forma expressa, a responsabilidade proporcional pelo pagamento das verbas previstas no caput .

§ 2 o Se a distribuição de que trata o § 1º não for feita, os vencidos responderão solidariamente pelas despesas e pelos honorários.

Em vista disso, devem ser as litisconsortes passivas da ação originárias condenadas ao pagamento dos honorários advocatícios da parte autora, os quais fixo solidariamente em 10%.

É necessário salientar que a fixação do quantum aludido não cuida de arbitramento decorrente da inversão do ônus sucumbencial, mas sim em razão de saneamento de vício, qual seja, ausência de fixação da verba na origem.

Ainda, levando em conta o trabalho adicional do procurador na fase recursal, a verba honorária fica majorada em 1%, com esteio no § 11 do artigo 85 do Codex Processual, acréscimo esse que deve ser suportado tão somente pela apelante União.

Isenta a apelante de custas, nos termos do artigo 4º, inciso I, da Lei 9.289/1990.

Prequestionamento

Por derradeiro, em face do disposto nas Súmulas n.os 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal e 98 da Corte Cidadã, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002681356v34 e do código CRC 030f06b2.Informações adicionais da assinatura:
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5006364-27.2019.4.04.7100
40002681356.V34


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5006364-27.2019.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: RUBIA GUIMARAES RIBEIRO (AUTOR)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. SERVIDOR PÚBLICO. FILHA SOLTEIRA. MAIOR DE 21 ANOS. LEI 3.373/1958. CANCELAMENTO DO PENSIONAMENTO. emprego público. ocupante. possibilidade. negado provimento.

1. A lei a ser aplicável à pensão por morte é aquela em vigor à data do óbito do instituidor do benefício.

2. A verificação das condições ensejadoras da pensão temporária da Lei 3.373/58 pode, e deve, ser realizada, porquanto o benefício é devido enquanto a beneficiada mantiver as condições legais, forte na lógica da regra rebus sic stantibus.

3. A Lei 3.373/58 estabelece que a filha do segurado terá direito à pensão temporária em 3 (três) hipóteses: (i) se menor de 21 anos, de qualquer condição; (ii) se maior de 21 anos, inválida; (iii) se maior de 21 anos, de qualquer condição, mas solteira e sem ocupar cargo público permanente.

4. A ocupação de emprego público pela pensionista, por não ser enquadrar no conceito de cargo público permanente, não enseja a cessação da pensão prevista no artigo 5°, parágrafo único, da Lei 3.373/58.

5. No caso dos autos, além de ser solteira, não restou comprovada a ocupação de cargo público permanente, mas tão somente de emprego público, razão pela qual satisfaz os requisitos ensejadores do benefício da pensão temporária da Lei 3.373/58.

6. Impossibilidade de a anterior beneficiada com a quota-parte parte da pensão restituir os valores que recebeu de boa fé e por equívoco da Administração Pública. Precedentes deste Regional.

7. Em não tendo sido os honorários advocatícios fixados na origem, em razão da reclassificação da ação do procedimento do Juizado Especial para o comum, cabível o arbitramento daqueles nos autos recursais, com a possibilidade, ainda, de majoração, forte no artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil.

8. Apelação a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 08 de outubro de 2021.



Documento eletrônico assinado por VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002681357v8 e do código CRC a61447c8.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 01/10/2021 A 08/10/2021

Apelação Cível Nº 5006364-27.2019.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

PRESIDENTE: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

PROCURADOR(A): EDUARDO KURTZ LORENZONI

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: RUBIA GUIMARAES RIBEIRO (AUTOR)

ADVOGADO: ENIO MEREGALLI JUNIOR (OAB RS067456)

ADVOGADO: PRISCILA MEREGALLI (OAB RS075262)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 01/10/2021, às 00:00, a 08/10/2021, às 16:00, na sequência 162, disponibilizada no DE de 22/09/2021.

Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

Votante: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO

Secretário



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