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ADMINISTRATIVO. MEDICAMENTO. CÂNCER. IMPRESCINDIBILIDADE DO FÁRMACO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO. EVIDÊNCIA CIENTÍFICA PELA INEFETIVIDADE DO TRATAMENTO. TRF4....

Data da publicação: 07/07/2020, 17:44:19

EMENTA: ADMINISTRATIVO. MEDICAMENTO. CÂNCER. IMPRESCINDIBILIDADE DO FÁRMACO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO. EVIDÊNCIA CIENTÍFICA PELA INEFETIVIDADE DO TRATAMENTO. 1. Faz jus ao fornecimento do medicamento pelo Poder Público a parte que demonstra a respectiva imprescindibilidade, que consiste na conjugação da necessidade e adequação do fármaco e da ausência de alternativa terapêutica. 2. Havendo parecer de órgãos técnicos que atestam pela não indicação do mesmo, informando ausência de vantagem terapêutica em relação aos tratamentos disponibilizado pelo SUS, tem-se que não há evidência nos autos da presença dos requisitos que corroborem o direito alegado pela parte. (TRF4, AC 5008371-97.2016.4.04.7002, QUARTA TURMA, Relator para Acórdão LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 12/04/2018)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5008371-97.2016.4.04.7002/PR

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ORLANDO PELIZZARI MARCHESINI (AUTOR)

ADVOGADO: ANA HERCÍLIA RENOSTO PAULA LENTO

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

RELATÓRIO

Trata-se de apelações interpostas em face da sentença proferida nos seguintes termos:

Ante o exposto, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva e, quanto ao mérito, confirmo a antecipação dos efeitos da tutela, julgando procedente o pedido (CPC, art. 487, I) para o fim de determinar que os réus adotem as providências necessárias para o fornecimento do medicamento AVASTIN430 mg/ml, na quantidade indicada na receita médica anexada à inicial e na perícia judicial.

Considerando que a utilização do medicamento requerido pode perdurar por tempo considerável, podendo haver alteração da quantidade a ser ministrada, entendo razoável a apresentação, a cada 30 (trinta) dias , de receituário atualizado pelo médico do SUS que atende a parte autora à autoridade que efetua a entrega dos produtos.

A obrigação é atribuída a cada réu, solidariamente, da seguinte forma: a) o Estado do Paraná deverá fornecer o(s) medicamento(s) através da Secretaria Estadual de Saúde, promovendo a entrega diretamente à parte autora ou seu procurador(a); b) o reembolso dos custos deverá ser feito posteriormente pela União, nos termos da legislação pertinente, cabendo ao Estado do Paraná requerer diretamente àquela ré o atendimento dessa obrigação, porquanto trata-se de medida a ser solvida administrativamente, sem necessidade de intervenção judicial

Sem custas (art. 4º, I, da Lei 9.289/96).

Relativamente aos honorários advocatícios, a 3ª Turma do TRF da 4ª Região recentemente se pronunciou no seguinte sentido:

ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. LEGITIMIDADE. HONORÁRIOS. MAJORAÇÃO. 1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido da responsabilidade solidária da União, Estados e Municípios nas ações onde se postula fornecimento público de medicamentos ou tratamento médico. A solidariedade não induz litisconsórcio passivo necessário, mas facultativo, cabendo à parte autora a escolha daquele contra quem deseja litigar, sem obrigatoriedade de inclusão dos demais. Dessa forma, qualquer um dos entes tem legitimidade ad causam para figurar no polo passivo da demanda. 2. No caso, demonstrada a imprescindibilidade do tratamento especificado na proemial, consistente na conjugação da necessidade e adequação do fármaco e na ausência de alternativa terapêutica, no que mantida a determinação para o fornecimento do medicamento pleiteado. 3. Em demandas que tratam da prestação de serviços à saúde, como no caso de fornecimento de medicamentos, adequada a condenação dos réus ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em R$ 3.000,00 por ente que integre a lide, conforme entendimento firmado pela Turma. Hipótese em que majorada a verba honorária. 4. Isenta a União quanto ao pagamento dos honorários advocatícios, porquanto, não devidos à Defensoria Pública quando esta atuar conta a pessoa jurídica de direito público integrante da mesma Fazenda Pública a qual pertença. A contrario sensu, reconhece-se o direito ao recebimento dos honorários advocatícios se a atuação se dá em face de ente federativo diverso, no que mantido o comando sentencial condenando o Estado do Rio Grande do Sul e o Município de Santa Maria ao pagamento da verba honorária. (TRF4, AC 5000179-74.2013.404.7102, TERCEIRA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 03/12/2014).

Assim, com base nos fundamentos constantes do aludido precedente, e considerando, ainda, que o feito versa sobre o direito à saúde, fixo a verba honorária no montante de R$ 5.368,30 (cinco mil, trezentos e sessenta e oito reais e trinta centavos), pro rata, com respaldo no art. 85, § 8°, do CPC, adotando como parâmetro dez vezes o valor máximo da tabela de honorários advocatícios constante da Resolução n° 305/2014, do Conselho da Justiça Federal.

Ainda, condeno os réus, solidariamente, ao pagamento dos honorários periciais antecipados pela Justiça Federal.

Em suas razões recursais, a União teceu considerações a respeito da existência de políticas públicas para o tratamento da moléstia, da incorporação de novas tecnologias e da impossibilidade de condenação exclusiva da União. Nesses termos, requereu o conhecimento e provimento do presente recurso de apelação, com a reforma da sentença ora apelada, pugnando pela improcedência do pedido. Caso procedente, que seja reformado o capítulo da sentença de determinou a responsabilidade pelo ressarcimento seja integral da União.

O Estado do Paraná sustentou que: (a) é necessário respeito à repartição de competências nas ações que envolvem o pedido de fornecimento de medicamentos, especialmente os oncológicos; (b) a dispensação de medicamentos no Sistema Único de Saúde; (c) Peculiaridades em relação aos tratamentos oncológicos – Obrigação de competência da União - Ausência de responsabilidade do Estado do Paraná pelo custeio do tratamento postulado, e (d) Necessidade de determinação de ressarcimento pela União nos próprios autos - Dificuldades relacionadas ao ressarcimento administrativo.

O(A) autor(a) pugnou pela majoração dos honorários sucumbenciais, calculando-os SOBRE O VALOR DE R$ 200.700,59, correspondente à expressão econômica da CONDENAÇÃO, e fixando-os entre as balizas legais para o mínimo de 8% e máximo de 10% , aproximando-os do teto, consoante alterações já em vigor trazidas pelo Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105 de 16/03/2015) e ainda a incidência de juros e correção monetária, da data do ajuizamento da presente ação até a data do efetivo pagamento, em respeito às disposições legais respectivas, nos termos da fundamentação.

Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.

O Ministério Público Federal exarou parecer, opinando pelo desprovimento dos recursos.

É o relatório.

VOTO

I - A legitimidade passiva ad causam - seja para o fornecimento do medicamento, seja para seu custeio -, resulta da atribuição de competência comum a todos os entes federados, em matéria de direito à saúde, e da responsabilidade decorrente da gestão tripartite do Sistema Único de Saúde, previstas nos artigos 24, inciso II, e 198, inciso I, ambos da Constituição Federal, respectivamente.

Nesse sentido, transcrevo os seguintes precedentes:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA UNIÃO. REPERCUSSÃO GERAL DECLARADA PELO STF. SOBRESTAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1. O funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que qualquer dessas entidades tem legitimidade ad causam para figurar no pólo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros. Precedentes do STJ. (...) (STJ, 2ª Turma, AgRg no Ag 1107605/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 03/08/2010, DJe 14/09/2010)

ADMINISTRATIVO. MEDICAMENTOS. UNIÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA. LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO. CACON. BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS. PREVALÊNCIA DA ESSENCIALIDADE DO DIREITO À SAÚDE SOBRE OS INTERESSES FINANCEIROS DO ESTADO. 1. A União, Estados-Membros e Municípios têm legitimidade passiva e responsabilidade solidária nas causas que versam sobre fornecimento de medicamentos. 2. A solidariedade não induz litisconsórcio passivo necessário, mas facultativo, cabendo à parte autora a escolha daquele contra quem deseja litigar, sem obrigatoriedade de inclusão dos demais. Se a parte escolhe litigar somente contra um ou dois dos entes federados, não há a obrigatoriedade de inclusão dos demais.(...). (TRF4, 4ª Turma, AG 5008919-21.2012.404.0000, Relator p/acórdão Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 24/07/2012)

Com efeito, a União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios são legítimos, indistintamente, para as ações em que pleiteado o fornecimento de medicamentos (inclusive aqueles para tratamento de câncer, a despeito da responsabilidade de os Centros de Alta Complexidade em Oncologia prestarem tratamento integral aos doentes), consoante orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo Regimental interposto, pela União, em face de decisão que indeferiu o pedido de Suspensão de Tutela Antecipada n.º 175, relatado pelo Ministro Gilmar Mendes, de cujo voto extraio o seguinte trecho:

A competência comum dos entes da Federação para cuidar da saúde consta do art. 23, II, da Constituição. União, Estado, Distrito Federal e Municípios são responsáveis solidários pela saúde, tanto do indivíduo quanto da coletividade e, dessa forma, são legitimados passivos nas demandas cuja causa de pedir é a negativa, pelos SUS (seja pelo gestor municipal, estadual ou federal), de prestação na área de saúde. O fato de o Sistema Único de Saúde ter descentralizado os serviços e conjugado os recursos financeiros dos entes da Federação, com o objetivo de aumentar a qualidade e o acesso aos serviços de saúde, apenas reforça a obrigação solidária e subsidiária entre eles.

Idêntico entendimento foi adotado nos RE n.º 195.192-3, RE-AgR n.º 255.627-1 e RE n.º 280.642.

Sendo assim, os entes demandados têm legitimidade para figurar no pólo passivo da ação, em litisconsórcio passivo facultativo, reconhecido o direito do cidadão de escolher com quem pretende litigar. Eventual acerto de contas que se faça necessário, em virtude da repartição de competências no SUS, deve ser realizado administrativamente, sem prejuízo do cumprimento da decisão judicial, imposta solidariamente.

II - A Constituição Federal consagra a saúde como direito fundamental, ao prevê-la, em seu art. 6º, como direito social. O seu art. 196, por sua vez, estabelece ser a saúde direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

Dentre os serviços e benefícios prestados no âmbito da saúde, encontra-se a assistência farmacêutica. O art. 6º, inc. I, alínea "d", da Lei n.º 8.080/90 expressamente inclui, no campo de atuação do Sistema Único de Saúde, a execução de ações de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica. A Política Nacional de Medicamentos e Assistência Farmacêutica, portanto, é parte integrante da Política Nacional de Saúde e possui a finalidade de garantir a todos o acesso aos medicamentos necessários, seja interferindo em preços, seja fornecendo gratuitamente as drogas de acordo com as necessidades.

Concretizando a dispensação de medicamentos à população, o Ministério da Saúde classifica como básicos, de responsabilidade dos três gestores do SUS, os remédios utilizados nas ações de assistência farmacêutica relativas à atenção básica em saúde e ao atendimento a agravos e programas de saúde específicos inseridos na rede de cuidados da atenção básica. Os medicamentos estratégicos são aqueles utilizados para o tratamento de doenças endêmicas, com impacto socioeconômico, cabendo sua aquisição pelo Ministério da Saúde e seu armazenamento e distribuição pelos Municípios. Já o Programa de Medicamentos de Dispensação Excepcional tem por objeto o tratamento de doenças específicas, que atingem um número restrito de pacientes, os quais necessitam de medicamentos com custo elevado, cujo fornecimento depende de aprovação específica das Secretarias Estaduais de Saúde e de recursos oriundos do Ministério da Saúde, bem como daquelas Secretarias também responsáveis pela programação, aquisição e dispensação das drogas (vide a classificação e a responsabilidade pelo financiamento destas na Portaria n. 399/GM de 22 de fevereiro de 2006).

Finalmente, há programas e sistemáticas de assistência específicos para determinadas moléstias, como, por exemplo, o diabetes e o câncer.

No caso do diabetes, o regramento legal (Lei n.º 11.347/06 e a Portaria GM 2.583/07) garante o fornecimento do tratamento ao paciente, mas estipula que, para tanto, deve estar inscrito nos Programas de Educação para Diabéticos, promovidos pelas unidades de saúde do SUS.

Na hipótese de câncer, até 1998, havia dispensação de medicamentos para seu tratamento em farmácias do SUS, bastando a apresentação de receita ou relatório médico, fosse de consultório particular, fosse de hospital público ou privado. Hoje, contudo, tais drogas não mais se enquadram nos programas de dispensação de medicamentos básicos, estratégicos ou excepcionais, nem encontram padronização no âmbito do SUS; a assistência oncológica, inclusive no tocante ao fornecimento de fármacos, é direta e integralmente prestada por entidades credenciadas, junto ao Poder Público, como Centros de Alta Complexidade em Oncologia (CACONs) e assemelhados - Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia, Centros de Referência de Alta Complexidade em Oncologia e Serviços Isolados de Quimioterapia e Radioterapia -, os quais devem ser ressarcidos pelo Ministério da Saúde dos valores despendidos com medicação, consultas médicas, materiais hospitalares, materiais de escritório, materiais de uso de equipamentos especiais, materiais de limpeza e de manutenção da unidade. Inexistindo padronização de medicamentos, mas apenas de procedimentos terapêuticos (quimioterapia, radioterapia, etc.) para cada tipo e estágio de câncer, a indicação dos fármacos antineoplásicos necessários a cada paciente fica ao encargo dos médicos dos CACONs/UNACONs, de acordo com as evidências científicas a respeito e os fatores específicos de cada caso, sendo que tudo deve ser alcançado, como dito, pelo próprio estabelecimento de saúde credenciado, e somente para os pacientes que estiverem recebendo seu tratamento no local.

Nesse contexto, considerando a notória escassez dos recursos destinados ao SUS, não se pode deixar de pesar as consequências do deferimento judicial de drogas ou tratamentos estranhos aos administrativamente disponibilizados. Deferir, sem qualquer planejamento, benefícios para alguns, ainda que necessários, pode causar danos para muitos, consagrando-se, sem dúvida, injustiça. Sequer pode-se considerar o Judiciário como uma via que possibilite a um paciente burlar o fornecimento administrativo de medicamentos, garantindo seu tratamento sem sopesar a existência de outros cidadãos nas mesmas ou em piores circunstâncias.

Bem por isso, após a realização de audiência pública com participação de diversos segmentos da sociedade, o Supremo Tribunal Federal, interpretando o art. 196 da Constituição Federal e debruçando-se sobre a problemática da efetividade dos direitos sociais e da chamada "judicialização da saúde", no julgamento da Suspensão de Tutela Antecipada n.º 175 (decisão no Agravo Regimental proferida em 17 de março de 2010, Relator Ministro Gilmar Mendes), estabeleceu alguns pressupostos e critérios relevantes para a atuação do Poder Judiciário, mais precisamente na questão do fornecimento de medicamentos e tratamentos pleiteados em face dos entes políticos.

Nos termos da decisão referida, a Corte Suprema entendeu que "é possível identificar [...] tanto um direito individual quanto um direito coletivo à saúde". "Não obstante, esse direito subjetivo público é assegurado mediante políticas sociais e econômicas, ou seja, não há um direito absoluto a todo e qualquer procedimento necessário para a proteção, promoção e recuperação da saúde, independentemente da existência de uma política pública que o concretize. Há um direito público subjetivo a políticas públicas que promovam, protejam e recuperem a saúde". "A garantia mediante políticas sociais e econômicas ressalva, justamente, a necessidade de formulação de políticas públicas que concretizem o direito à saúde por meio de escolhas alocativas. É incontestável que, além da necessidade de se distribuírem recursos naturalmente escassos por meio de critérios distributivos, a própria evolução da medicina impõe um viés programático ao direito à saúde, pois sempre haverá uma nova descoberta, um novo exame, um novo prognóstico ou procedimento cirúrgico, uma nova doença ou a volta de uma doença supostamente erradicada".

Diante disso, seguindo nessa linha, a análise judicial de pedidos de dispensação gratuita de medicamentos e tratamentos pressupõe que se observe, primeiramente, se existe ou não uma política estatal que abranja a prestação pleiteada pela parte. Se referida política existir, havendo previsão de dispensação do tratamento buscado, não há dúvida de que o postulante tem direito subjetivo público a tal, cabendo ao Judiciário determinar seu cumprimento pelo Poder Público. Não estando a prestação pleiteada entre as políticas do SUS, as circunstâncias do caso concreto devem ser observadas, a fim de que se identifique se a não inclusão do tratamento nos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas do Sistema, elaborados com fundamento na corrente da "Medicina com base em evidências", configura omissão legislativa/administrativa ou está justificada em decisão administrativa fundamentada/vedação legal. Afinal, o medicamento ou tratamento pode não ser oferecido, pelo Poder Público, por não contar, p.ex., com registro na ANVISA, o qual constitui garantia à saúde pública e individual, só podendo ser relevado em situações muito excepcionais, segundo disposto nas Leis n.º 6.360/76 e 9.782/99 (hipótese de vedação legal). Outrossim, a prestação pode não estar inserida nos Protocolos, por inexistirem evidências científicas suficientes a autorizarem sua inclusão (hipótese de decisão administrativa fundamentada).

Se o medicamento ou procedimento requerido judicialmente não estiver incluído nas políticas públicas de saúde, mas houver outra opção de tratamento para a moléstia do paciente, deve-se, em regra, privilegiar a escolha feita pelo administrador. Afinal, nas palavras do Ministro Gilmar Mendes, "um medicamento ou tratamento em desconformidade com o Protocolo deve ser visto com cautela, pois tende a contrariar um consenso científico vigente. Ademais, não se pode esquecer de que a gestão do Sistema Único de Saúde, obrigado a observar o princípio constitucional do acesso universal e igualitário às ações e prestações de saúde, só torna-se viável mediante a elaboração de políticas públicas que repartam os recursos (naturalmente escassos) da forma mais eficiente possível. Obrigar a rede pública a financiar toda e qualquer ação e prestação de saúde existente geraria grave lesão à ordem administrativa e levaria ao comprometimento do SUS, de modo a prejudicar ainda mais ao atendimento médico da parcela da população mais necessitada".

Não se pode ignorar, contudo, que, em algumas situações, por razões específicas do organismo de determinadas pessoas - resistência ao fármaco, efeitos colaterais deste, conjugação de problemas de saúde etc. -, as políticas públicas oferecidas podem não lhes ser adequadas ou eficazes. Nesses casos pontuais, restando suficientemente comprovada a ineficácia ou impropriedade da política de saúde existente, é possível ao Judiciário ou à própria Administração determinar prestação diversa da usualmente custeada pelo SUS.

Finalmente, se o medicamento ou procedimento postulado não constar das políticas do SUS, e tampouco houver tratamento alternativo ofertado para a patologia, há que se verificar se consiste em tratamento meramente experimental, ou novo, ainda não testado pelo Sistema ou a ele incorporado.

Os tratamentos experimentais são pesquisas clínicas, e a participação neles é regulada por normas específicas. As drogas aí envolvidas sequer podem ser adquiridas, uma vez que não foram aprovadas ou avaliadas, devendo seu acesso ser disponibilizado apenas no âmbito de estudos clínicos ou programas de acesso expandido. Não se pode, assim, compelir o Estado a fornecê-los.

Já os tratamentos novos, não contemplados em qualquer política pública, merecem atenção e cuidado redobrados, tendo em vista que, "se, por um lado, a elaboração dos Protocolos Clínicos e das Diretrizes Terapêuticas privilegia a melhor distribuição de recursos públicos e a segurança dos pacientes, por outro a aprovação de novas indicações terapêuticas pode ser muito lenta e, assim, acabar por excluir o acesso de pacientes do SUS a tratamento há muito prestado pela iniciativa privada".

Sendo certo que a inexistência de políticas públicas não pode implicar violação ao princípio da integralidade do Sistema, é possível a impugnação judicial da omissão administrativa no tratamento de determinado mal, impondo-se, todavia, que se proceda a ampla instrução probatória sobre a matéria, "o que poderá configurar-se um obstáculo à concessão de medida cautelar".

Em contrapartida, o Poder Público não pode simplesmente invocar a cláusula da "reserva do possível", para exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, sem demonstrar, concretamente, a impossibilidade de fazê-lo. Nesse sentido, o STF já se pronunciou:

Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da "reserva do possível" - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.

(...) entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde - que se qualifica como direito subjetivo inalienável a todos assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, "caput", e art. 196) - ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo, uma vez configurado esse dilema, que razões de ordem ético-jurídica impõem, ao julgador, uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humanas.

(...) a missão institucional desta Suprema Corte, como guardiã da superioridade da Constituição da República, impõe, aos seus Juízes, o compromisso de fazer prevalecer os direitos fundamentais da pessoa, dentre os quais avultam, por sua inegável precedência, o direito à vida e o direito à saúde. (STA 175, Rel. Min. Celso de Mello, DJE 30/04/2010)

Em conclusão, independentemente da hipótese trazida à apreciação do Poder Judiciário, é "clara a necessidade de instrução das demandas de saúde", a fim de que, à luz das premissas e critérios antes declinados, "o julgador concilie a dimensão subjetiva (individual e coletiva) com a dimensão objetiva do direito à saúde".

Assentadas essas premissas, passo à análise do caso concreto.

O(A) autor(a) ajuizou ação, objetivando o fornecimento do mediamento Avastin 430 mg/ml, a cada 15 dias, por ser portador(a) de Adenocarcinoma de cólon metastático para o fígado.

Sobre a pretensão, assim manifestou-se o juízo a quo:

3) Mérito

Quando da apreciação do pedido de antecipação dos efeitos da tutela, a matéria já restou analisada de forma completa. Tendo em vista a ausência de qualquer elemento novo no curso processual, hábil a alterar o quadro fático-probatório presente até então, transcrevo a referida decisão como razões de decidir desta sentença:

(...)

O dever do Estado fornecer medicamentos, face ao preceito constitucional exposto no artigo 196, é inconteste, uma vez que concretiza não só o direito à saúde, mas, sobretudo, o direito à vida.

O artigo 6º, inciso I, alínea "d", da Lei nº 8.080/90, expressamente inclui no campo de atuação do Sistema Único de Saúde a execução de ações de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica. Por consequência, a Política Nacional de Medicamentos e Assistência Farmacêutica é parte integrante da Política Nacional de Saúde.

Trata-se de entendimento pacífico nos tribunais. Por todos, colaciono o precedente que segue:

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE DO ESTADO-MEMBRO PELO FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS A NECESSITADO. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PARTE VENCEDORA REPRESENTADA PELA DEFENSORIA PÚBLICA ESTADUAL. CONDENAÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL AO PAGAMENTO DA VERBA ADVOCATÍCIA. IMPOSSIBILIDADE. CONFUSÃO ENTRE CREDOR E DEVEDOR. PRECEDENTE DA COLENDA PRIMEIRA SEÇÃO. Ausência de prequestionamento dos artigos 10 e 12 da Lei n. 6.360/76 e divergência jurisprudencial não-demonstrada. Ainda que assim não fosse, predomina neste Superior Tribunal de Justiça o entendimento segundo o qual há responsabilidade solidária da União, Estados e Municípios pelo fornecimento gratuito de medicamentos às pessoas desprovidas de recursos financeiros. Precedentes. "O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional" (STF - AGRE 271.286/RS, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 24.11.2000). No que concerne aos honorários advocatícios, a colenda Primeira Seção, na assentada de 10.12.2003, quando do julgamento do EREsp 493.342/RS, da relatoria do eminente Ministro José Delgado, firmou entendimento no sentido de que, se a parte vencedora foi representada em juízo pela Defensoria Pública Estadual, é indevida a condenação do Estado ao pagamento da verba advocatícia. A Defensoria é órgão do Estado, sem personalidade jurídica própria, razão pela qual se confundem na mesma pessoa o credor e o devedor. Precedentes. Recurso especial provido em parte, para afastar a condenação em honorários advocatícios. (REsp 689.587/RS, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, SEGUNDA TURMA, julgado em 21.06.2005, DJ 12.09.2005 p. 293) - Sem destaque no original.

Importa registrar que embora o STJ e o STF entendam que deve haver comprovação de que o beneficiário é hipossuficiente e de que a prescrição médica seja feita por médico vinculado ao SUS, com a devida vênia, entendo de modo diverso. Isto porque sendo o direito à saúde um direito de todos, bem como um direito irrestrito, não se pode restringi-lo a requisitos não constantes na Constituição Federal. Nossa Carta Magna, no art. 196, dispõe que a saúde é direito de todos e dever do Estado. Ou seja, não restringe o acesso à saúde às pessoas que não têm condições de pagar o atendimento privado.

Além disso, se qualquer pessoa (com ou sem condições financeiras) pode ir até um hospital/pronto atendimento público, bem como adquirir medicamentos de forma gratuita pelo SUS, não há razões para restringir o fornecimento de medicamentos excepcionais ou alimentos especiais (não fornecidos de forma regular pelo SUS) apenas às pessoas hipossuficientes.

Pelos mesmos motivos, entendo não haver necessidade de a prescrição médica ter sido feita por médico em atendimento pelo SUS.

No presente caso, verifica-se que a perícia judicial atestou a imprescindibilidade do fornecimento do medicamento requerido.

Por oportuno, colaciono o laudo pericial (evento 17):

Portanto, restou demonstrada a plausibilidade das alegações contidas na inicial, uma vez que o pedido vem instruído com documentação suficiente para comprovar a enfermidade, seu atual estágio e o tratamento prescrito, bem como a concreta possibilidade do medicamento requerido ser o tratamento eficaz, ainda que paliativo, para o caso concreto.

Relativamente ao perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, verifico que este requisito decorre da própria gravidade do caso, como acima explanado.

Destarte, estando presentes os requisitos necessários, há de ser deferida a tutela de urgência.

(...)

De acordo com a manifestação anexada ao evento47, o medicamento foi disponibilizado à parte autora.

Logo, a procedência do pedido é medida que se impõe. Até porque, alinhada com os precedentes do TRF da 4ª Região.

Da análise das provas produzidas nos autos, especialmente o laudo pericial (evento 17), infere-se que: (1) o(a) autor(a) realiza tratamento médico no SUS; (2) o medicamento foi prescrito por profissional vinculado a um CACON/UNACON, sendo competente para indicar o tratamento mais adequado para o paciente; (3) não existem outros fármacos eficazes para o controle adequado da doença, porquanto inexitosas as alternativas terapêuticas disponibilizadas pelo SUS, e (4) o avastin possui registro na ANVISA.

Comprovadas a eficácia e a necessidade de uso do medicamento para o controle da doença e a ineficácia das drogas fornecidas pelo SUS, é inafastável o reconhecimento do direito à tutela jurisdicional.

III - Ante a existência de solidariedade na prestação de serviços de saúde, não há como excluir qualquer um deles da responsabilidade pela aquisição do medicamento. Caberá aos réus proceder, administrativamente, a repartição/ressarcimento dos valores despendidos, independentemente de intervenção judicial.

IV - Os réus deverão arcar com os honorários advocatícios devidos ao procurador do autor, observados os critérios legalmente estabelecidos no art. 85 do CPC.

No que diz respeito à legitimidade, é cediço na jurisprudência que, apesar de os honorários advocatícios constituírem direito autônomo do advogado, não exclui a legitimidade concorrente da parte para discuti-los.

No tocante ao quantum a ser arbitrado a esse título, há que se ponderar que, nas ações em que pleiteado o fornecimento gratuito de medicamentos, (1) não raras vezes, há discrepância entre o valor atribuído à causa e o real proveito econômico obtido, tendo em vista a possibilidade de interrupção superveniente do tratamento original pela alta toxicidade do fármaco, o que inviabiliza a estimativa baseada em custo do medicamento e tempo de sua utilização, e (2) o direito à saúde é de valor inestimável. Por essa razão, aplica-se a regra prevista no § 8º do art. 85 do CPC, que remete o arbitramento da verba honorária sucumbencial à apreciação equitativa do juiz (que considerará o grau de zelo profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho efetivamente realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço).

No caso concreto, considerando os critérios acima explicitados e o fato de que o feito tramitou por menos de um ano até a prolação da sentença, sem incidentes processuais que exigissem diligências por parte dos procuradores, não merece reforma a que fixou a verba honorária R$ 5.368,30 (cinco mil, trezentos e sessenta e oito reais e trinta centavos), pro rata, com respaldo no art. 85, § 8°, do CPC, devendo ser devidamente corrigidos (já considerado o disposto no art. 85, § 11, do CPC), porquanto em consonância com a jurisprudência em ações dessa natureza.

Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.

Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações.



Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000369209v8 e do código CRC 57623aa2.Informações adicionais da assinatura:
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5008371-97.2016.4.04.7002
40000369209.V8


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5008371-97.2016.4.04.7002/PR

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ORLANDO PELIZZARI MARCHESINI (AUTOR)

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

VOTO DIVERGENTE

Com a devida vênia divirjo em parte da e. Relatora quanto ao mérito. No caso dos autos, tenho que se deve dar provimento aos apelos da União e do Estado, sendo inviável a dispensação do Bevacizumabe no presente caso.

O direito fundamental à saúde encontra-se garantido na Constituição, descabendo as alegações de mera norma programática, de forma a não lhe dar eficácia. A interpretação da norma constitucional há de ter em conta a unidade da Constituição, máxima efetividade dos direitos fundamentais e a concordância prática, que impede, como solução, o sacrifício cabal de um dos direitos em relação aos outros. Em se tratando de fornecimento de medicamentos ou realização de procedimentos, deve-se observar determinados parâmetros:

a) eventual concessão da liminar não pode causar danos e prejuízos relevantes ao funcionamento do serviço público de saúde;

b) o direito de um paciente individualmente não pode, a priori, prevalecer sobre o direito de outros cidadãos igualmente tutelados pelo direito à saúde;

c) o direito à saúde não pode ser reconhecido apenas pela via estreita do fornecimento de medicamentos;

d) havendo disponibilidade no mercado, deve ser dada preferência aos medicamentos genéricos, porque comprovada sua bioequivalência, resultados práticos idênticos e custo reduzido;

e) o fornecimento de medicamentos ou procedimento médico deve, em regra, observar os protocolos clínicos e a "medicina das evidências", devendo eventual prova pericial, afastado "conflito de interesses" em relação ao médico, demonstrar que tais não se aplicam ao caso concreto;

f) medicamentos e tratamentos ainda em fase de experimentação, não enquadrados nas listagem ou protocolos clínicos devem ser objeto de especial atenção e verificação, por meio de perícia específica, para comprovação de eficácia em seres humanos e aplicação ao caso concreto como alternativa viável.

Observo que os relatórios médicos assim como o laudo médico judicial que deram suporte à decisão que antecipou os efeitos da tutela, relataram a imprescindibilidade do tratamento em questão para um melhor controle da doença e consequente aumento da sobrevida livre de progressão e sobrevida global, diminuindo o risco de morte, sendo que a associação do fármaco requerido teria eficácia superior ao tratamento de quimioterapia isolada, não havendo substitutos no âmbito do SUS.

Todavia, há de considerar que, em consulta ao NATS - Núcleo de Avaliação de Tecnologias em Saúde, de Minas Gerais, foi realizado estudo acerca da medicação postulada para tratamento de câncer de colorretal, concluindo-se pela não indicação (http://bd.tjmg.jus.br/jspui/handle/tjmg/8215):

"(...) SOBRE A DOENÇA E SEU TRATAMENTO

No Brasil, os tumores de cólon e reto estão entre as cinco localizações anatômicas mais importantes em termos de mortalidade para ambos os sexos. As maiores taxas de mortalidade padronizadas por câncer de cólon/reto são observadas nas regiões Sul e Sudeste. Nos últimos anos, tem-se observado aumento na ocorrência de casos dos 40 aos 60 anos. A cirurgia é o único procedimento que possibilita a cura na doença locorregional. Os pacientes com a doença metastática geralmente não podem ser curados e o tratamento é realizado com quimioterapia. A doença metastática tem prognóstico ruim, com sobrevida de apenas alguns meses sem tratamento. Nos ensaios clínicos,os melhores tempos de sobrevida tem sido obtidos com regimes quimioterápicos que adicionam irinotecano (ou oxaliplatina, ou vice versa) ao regime conhecido como Protocolo de Gramont ( fluoruracil mais ácido folínico). Esses tratamentos sucessivos, denominados FOLFOX (com oxaliplatina) ou FOLFIRI (com irinotecano) resultam em uma mediana de sobrevida de cerca de 21 meses. (...)

SOBRE A MEDICAÇÃO BEVACIZUMABE

(...) O bevacizumabe tem indicação de bula para o tratamento do câncer colorretal metastático (CCRm): “o bevacizumabe, em combinação com quimioterapia à base de fluoropirimidina, é indicado para o tratamento de pacientes com carcinoma metastático do cólon ou do reto”. (...)

SOBRE A MEDICAÇÃO BEVACIZUMABE+ FOLFIRI NO TRATAMENTO DO CÂNCER DE CÓLON METASTATICO/AVANÇADO

(...) Recentemente, foi publicado artigo avaliando a efetividade do bevacizumabe associado à terapia padrão (FOLFOX ou FOLFIRI) para tratamento de primeira linha do câncer de cólon metastático. Os pacientes foram distribuídos aleatoriamente para receber FOLFIRI ou FOLFOX mais bevacizumabe ( braço A) ou somente FOLFIRI ou FOLFOX4 ( braço B). Foram incluídos 376 pacientes; depois de mediana de seguimento de 36 meses foi observado que não houve diferença entre os grupos em relação à sobrevida global, mas o grupo que recebeu o bevacizumabe apresentou mais eventos adversos (hipertensão, sangramento, proteinúria e astenia). (...)

CONCLUSÃO

Não foi demonstrado em estudo clínico que a associação do bevacizumabe ao FOLFORI aumenta a sobrevida global dos pacientes com câncer de cólon metastático/avançado. O bevacizumabe é uma droga com alta toxicidade, inclusive, potencialmente fatal. Assim, diante da ausência de benefício e do risco aumentado de eventos adversos graves, que podem prejudicar ainda mais o paciente com doença grave e terminal, o NATS não recomenda esta medicação.

Como visto, o presente caso enquadra-se nas situações em que a alternativa pleiteada não consta dos protocolos clínicos para o tratamento custeado pelo Poder Público por força de entendimento no sentido de que inexistem evidências científicas suficientes que autorizem sua inclusão nos protocolos clínicos de tratamento da doença (hipótese de decisão administrativa fundamentada). E se o medicamento ou procedimento requerido judicialmente não estiver incluído nas políticas públicas de saúde, mas houver outra opção de tratamento para a moléstia do paciente, deve-se, em regra, privilegiar a escolha feita pelo administrador, nos termos do Enunciado 14 da I Jornada de Direito da Saúde do Conselho Nacional de Justiça:

14 - Não comprovada a inefetividade ou impropriedade dos medicamentos e tratamentos fornecidos pela rede pública de saúde, deve ser indeferido o pedido não constante das políticas públicas do Sistema Único de Saúde.

O art. 196 da Constituição Federal não pode ser compreendido como mera norma programática, mas como norma de eficácia plena. Irradia seus efeitos e determina a todos os entes componentes do SUS a praticar as medidas necessárias à prestação de serviços de saúde efetivos e adequados ao cidadão. No entanto, o simples fato da parte postular a concessão de medicamento com amparo em preceito constitucional, não tem o efeito de levar a presunção de eficácia na concessão do tratamento pleiteado, para fins de autorização da concessão da tutela antecipada.

Portanto, ainda que o medicamento pretendido tenha o devido registro na ANVISA e que haja prova da recusa dos réus no seu fornecimento, não se pode presumir que haja eficácia no tratamento prescrito, devendo-se cassar a tutela concedida.

Conforme dito inicialmente, assiste razão ao apelo da União, merecendo reforma, a sentença, quanto ao mérito, revogando a tutela inicialmente concedida.

Da devolução dos valores da antecipação da tutela

Por fim, com a reforma da sentença de procedência, convém esclarecer acerca da devolução dos valores gastos com o medicamento por força da tutela e cuja dispensação, ao final, foi considerada indevida.

Entende-se incabível a devolução, pela parte autora, dos respectivos valores despendidos na aquisição do medicamento diante da revogação da antecipação de tutela, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. RESTABELECIMENTO DE APOSENTADORIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS. IMPOSSIBILIDADE. CARÁTER ALIMENTAR DO BENEFÍCIO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO.

1. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da impossibilidade da devolução dos proventos percebidos a título de benefício previdenciário, em razão do seu caráter alimentar, incidindo, na hipótese, o princípio da irrepetibilidade dos alimentos.

2. Recurso especial conhecido e improvido.

(STJ. Recurso Especial 446892/RS. Quinta Turma. Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima. DJ 18.12.2006, p. 461)

Esta Corte também já se manifestou sobre o não-cabimento da devolução dos valores eventualmente disponibilizados por força da antecipação dos efeitos da tutela:

PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. VALORES PAGOS POR FORÇA DE LIMINAR. SENTENÇA REFORMADA EM GRAU RECURSAL. BOA-FÉ DO SEGURADO. IMPOSSIBILIDADE DE REPETIÇÃO. REGRA DO ART. 154, §3º DO DECRETO 3.048/99. AFASTAMENTO. IRREPETIBILIDADE DAS VERBAS DE CARÁTER ALIMENTAR. PROTEÇÃO DA CONFIANÇA. UNICIDADE DO PODER ESTATAL. HARMONIZAÇÃO DOS POSTULADOS DA SEGURANÇA JURÍDICA E INSTITUTO DA COISA JULGA PELO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE.

1. Havendo percepção de valores de boa-fé pelo segurado, padece de sedimento a pretensão da autarquia que visa à repetição das quantias pagas por força de liminar, cuja sentença que a confirmou foi reformada em grau recursal.

2. A Regra do art. 154, §3º do decreto 3.048/99, deve ceder diante do caráter alimentar dos benefícios, a cujas verbas, conforme é sabido, é ínsita a irrepetibilidade.

3. Mostra-se necessário prestigiar-se a diretiva da proteção da confiança, aspecto subjetivo da segurança jurídica, dada a imprescindibilidade de estabilização das relações jurídicas criadas tanto por atos da Administração Pública, quanto por decisões judiciais - em homenagem ao postulado da unicidade do poder estatal.

4. A colisão entre a efetividade da coisa julgada e a segurança jurídica deve, pelo princípio da proporcionalidade, ser resolvida de forma harmoniosa, evitando-se a continuidade da percepção indevida, sem contudo se responsabilizar a parte pela determinação judicial que lhe proporcionou aquele auferimento, conferindo a correta função harmonizadora dos direitos fundamentais ao instituto da tutela provisória.

(TRF4, AG 2006.04.00.032594-8, Sexta Turma, Relator Victor Luiz dos Santos Laus, publicado em 03/04/2007).

Sucumbência

Do exposto, tenho que a sentença merece reforma quanto ao mérito e dessa forma, inverto a sucumbência para condenar a parte autora a arcar com os honorários de sucumbência em favor dos procuradores dos réus, no valor de R$ 3.000,00 pro rata, em observância ao preceituado na nova regra processual, cuja exigibilidade fica suspensa pela concessão da AJG.

Conclusão

De todo o exposto, concluo que os apelos dos réus merecem parcial provimento para julgar improcedente a ação no mérito, invertendo o ônus sucumbencial, restando prejudicado o apelo da parte autora, nos termos da fundamentação.

Dispositivo

Ante ao exposto, voto por dar parcial provimento aos apelos da União e do Estado, e julgar prejudicado o apelo do autor.



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5008371-97.2016.4.04.7002
40000402979.V8


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300 - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010395 - Fone: 51 32133592

Apelação Cível Nº 5008371-97.2016.4.04.7002/PR

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ORLANDO PELIZZARI MARCHESINI (AUTOR)

ADVOGADO: ANA HERCÍLIA RENOSTO PAULA LENTO

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. MEDICAMENTO. câncer. imprescindibilidade do fármaco. ausência de demonstração. evidência científica pela inefetividade do tratamento.

1. Faz jus ao fornecimento do medicamento pelo Poder Público a parte que demonstra a respectiva imprescindibilidade, que consiste na conjugação da necessidade e adequação do fármaco e da ausência de alternativa terapêutica.

2. Havendo parecer de órgãos técnicos que atestam pela não indicação do mesmo, informando ausência de vantagem terapêutica em relação aos tratamentos disponibilizado pelo SUS, tem-se que não há evidência nos autos da presença dos requisitos que corroborem o direito alegado pela parte.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, vencida a relatora, decidiu dar parcial provimento aos apelos da UNIÃO e do ESTADO, e julgar prejudicado o apelo do autor, vencidos a Des. Federal Vivian Caminha e o Des. Federal Cândido Alfredo Silva Leal Junior. Lavrará o acórdão o Des. Federal Luís Alberto D Azevedo Aurvalle, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 11 de abril de 2018.



Documento eletrônico assinado por LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, Relator do Acórdão, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000438242v3 e do código CRC afe512ef.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 12/4/2018, às 17:19:51


5008371-97.2016.4.04.7002
40000438242 .V3


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/03/2018

Apelação Cível Nº 5008371-97.2016.4.04.7002/PR

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

PRESIDENTE: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ORLANDO PELIZZARI MARCHESINI (AUTOR)

ADVOGADO: ANA HERCÍLIA RENOSTO PAULA LENTO

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/03/2018, na seqüência 387, disponibilizada no DE de 23/02/2018.

Certifico que a 4ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

APÓS O VOTO DA DES. FEDERAL VIVIAN CAMINHA NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES, O VOTO DO DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE NO SENTIDO DE DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS APELOS DA UNIÃO E DO ESTADO, E JULGAR PREJUDICADO O APELO DO AUTOR E O VOTO DO DES. FEDERAL CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR NO SENTIDO DE ACOMPANHAR A RELATORA. O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO DE ACORDO COM O ARTIGO 942 DO CPC.

Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Acompanha o Relator em 12/03/2018 23:05:53 - GAB. 41 (Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR ) - Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR.



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 14:44:16.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 11/04/2018

Apelação Cível Nº 5008371-97.2016.4.04.7002/PR

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

PRESIDENTE: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ORLANDO PELIZZARI MARCHESINI (AUTOR)

ADVOGADO: ANA HERCÍLIA RENOSTO PAULA LENTO

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 11/04/2018, na seqüência 20, disponibilizada no DE de 27/03/2018.

Certifico que a 4ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Prosseguindo no julgamento, após as ratificações de voto proferidos originalmente, o voto da Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA e da Des. Federal MARGA BARTH TESSLER no sentido de acompanhar a divergência. A Turma Ampliada, por maioria, vencida a relatora, decidiu dar parcial provimento aos apelos da UNIÃO e do ESTADO, e julgar prejudicado o apelo do autor, vencidos a Des. Federal Vivian Caminha e o Des. Federal Cândido Alfredo Silva Leal Junior. Lavrará o acórdão o Des. Federal Luís Alberto D Azevedo Aurvalle.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER

Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

LUIZ FELIPE OLIVEIRA DOS SANTOS

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 14:44:16.

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