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SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO. FILHA MAIOR DE VINTE E UM ANOS E SOLTEIRA. BENEFÍCIO CONCEDIDO COM FUNDAMENTO NA LEI Nº 3.373/1958. PROVA DA DEPENDÊNCIA ECONÔMIC...

Data da publicação: 23/03/2021, 19:01:02

E M E N T A SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO. FILHA MAIOR DE VINTE E UM ANOS E SOLTEIRA. BENEFÍCIO CONCEDIDO COM FUNDAMENTO NA LEI Nº 3.373/1958. PROVA DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. ACÓRDÃO nº 2.780/2016 DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. ILEGALIDADE. PRECENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RESSALVA DO ENTENDIMENTO PESSOAL DO RELATOR. I - Pensão concedida à filha maior de vinte um anos e solteira, com fundamento na Lei nº 3.373/1958, cuja comprovação de dependência econômica passou a ser exigida após o Acórdão nº 2.780/2016 do Tribunal de Contas da União, medida que, de acordo com o entendimento do Relator deste recurso, mostra-se razoável, tratando-se de requisito implícito a determinados benefícios previdenciários que devem observar modificações culturais, sociais, econômicas e históricas. II - Contudo, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, firmada em diversos precedentes recentes das suas duas Turmas, firmou-se no sentido da ilegalidade da exigência de comprovação de dependência econômica formulada pelo Tribunal de Contas da União, entendimento este que, embora despido de força vinculante, observa-se por razões de segurança jurídica, com a ressalva do entendimento pessoal do Relator deste recurso. III - Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5004429-91.2018.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 11/03/2021, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 15/03/2021)


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5004429-91.2018.4.03.6104

RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: MIRTES ROSEMARY GONCALVES FELIPE

Advogado do(a) APELADO: JOAO ATOGUIA JUNIOR - SP78958-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 


APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5004429-91.2018.4.03.6104

RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: MIRTES ROSEMARY GONCALVES FELIPE

Advogado do(a) APELADO: JOAO ATOGUIA JUNIOR - SP78958-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

R E L A T Ó R I O

O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator):

Trata-se de ação ordinária ajuizada por Mirtes Rosemary Gonçalves Felipe em face da União Federal, objetivando, em síntese, a manutenção do benefício de pensão por morte.

Sentença: julgou procedente o pedido, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, a fim de assegurar à parte autora a manutenção do benefício de pensão por morte. Condenou, ainda, a ré a pagar honorários advocatícios fixados no patamar mínimo, nos termos do artigo 85, parágrafo 3º, incisos I a V, do Código de Processo Civil.

Apelação da União Federal juntada no documento id 149011376.

Devidamente processado o recurso, vieram os autos a esta E. Corte.

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5004429-91.2018.4.03.6104

RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: MIRTES ROSEMARY GONCALVES FELIPE

Advogado do(a) APELADO: JOAO ATOGUIA JUNIOR - SP78958-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

 

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator):

Recebo o recurso de apelação apenas no efeito devolutivo, nos termos do artigo 1.012, parágrafo 1º, inciso V, do CPC.

Anoto, de início, que este relator e esta Segunda Turma seguem entendimento consolidado pela jurisprudência pátria no sentido de que, em se tratando de benefícios de natureza previdenciária, incide a lei vigente à época do óbito do instituidor.

Nesse sentido:

“ADMINISTRATIVO MILITAR. SERVIDOR CIVIL DA AERONÁUTICA PENSÃO POR MORTE. LEI Nº 3.765/60. IMPOSSIBILIDADE. INVALIDEZ NÃO DEMONSTRADA. ART. 373, I, NOVO CPC.

1 - Em se tratando de benefícios de natureza previdenciária, incide a legislação vigente na data do óbito do instituidor. Precedentes. O instituidor do benefício veio a óbito em 17/04/1992 (fl. 18). Dessa maneira, para fins de pensão militar, incide a redação original da Lei nº 3.765/60, antes das alterações promovidas pelo advento da Medida Provisória nº 2.215-10/2001. 2 - O instituidor nunca foi, stricto sensu, um militar, temporário ou de carreira, à luz do art. 3º da Lei nº 6.880/80, pois era servidor civil da Aeronáutica. Assim, a apelante não faz jus à pensão militar. Malgrado as alegações acerca da doença de Lesão de esforço repetitivo (LER), apelante não logrou demonstrar a existência de invalidez para as atividades laborativas civis, não se desincumbindo, pois, do ônus probatório do art. 373, I, do Novo CPC. 3 - Apelação a que se nega provimento. (AC 00121734320094036104, DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/09/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)”.

“ADMINISTRATIVO MILITAR. PENSÃO ESPECIAL EX-COMBATENTE. LEI Nº 4.242/63. FILHAS. REQUISITOS DO ART. 30 NÃO VERIFICADOS.

Em se tratando de benefícios de natureza previdenciária, incide a legislação vigente na data do óbito do instituidor. Precedentes. O instituidor do benefício veio a óbito em 27/09/1980. Aplicação do art. 30 da Lei nº 4.242/63, antes da revogação ocorrida com a vigência da Lei nº 8.059/90. Na reversão da pensão especial de ex-combatentes para os herdeiros legalmente habilitados, estes também devem comprovar os requisitos do art. 30. Precedentes: (AGRESP 201501765223, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:02/02/2016 ..DTPB:.). Não há qualquer elemento probatório a atestar a existência de incapacidade de proverem o próprio sustento. Duas das coapeladas indicaram receber aposentadoria pega pelo estado de São Paulo (fls. 19 e 24), o que implica na situação de recebimento de valores dos cofres públicos. Apelação a que se nega provimento. (AC 00102028120134036104, DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/09/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)”.

Trata-se de aplicação do princípio Tempus regit actum.

No entanto

, isso não significa que as particularidades históricas, sociais, culturais e econômicas da época do óbito do instituidor do benefício e, principalmente, da promulgação da lei instituidora, assim como aquelas do requerimento administrativo, do ajuizamento da ação e, sobretudo, do exercício da tutela jurisdicional não possam ser confrontadas. É fundamental que haja ponderação da realidade social em vigor, na medida em que o direito não existe no vácuo.

Portanto, embora continue a seguir o aludido entendimento jurisprudencial, não deixarei de ponderar as características dos contextos históricos, atual e pretérito, para tratar de assuntos relativos à pensão instituída pela Lei nº 3.373/58, de modo a chegar a uma solução mais condizente com os preceitos de razoabilidade.

A situação vislumbrada originalmente pela Lei nº 3.373/58 já não subsiste diante das rápidas transformações sociais ocorridas no Brasil e no mundo desde a metade do século passado. Malgrado a força normativa e axiológica do artigo 5º, I, da Constituição Federal de 1988, ainda não se pode afirmar que, no Brasil atual, homens e mulheres usufruam de situação de igualdade condizente com o aludido direito fundamental, de modo que ainda há muito a ser corrigido.

De qualquer modo, não se pode perder de vista que, comparativamente ao fim da década de 1950, houve inegáveis avanços na inserção das mulheres no mercado de trabalho – que é o que importa para o caso em comento. Entre 1950 e 2010, a participação da mulher na População Economicamente Ativa variou de 13,6% para 49,9% (http://www2.camara.leg.br/a-camara/documentos-e-pesquisa/estudos-e-notas-tecnicas/areas-da-conle/tema7/2016_12416_mulheres-no-mercado-de-trabalho_tania-andrade), conquanto ainda persistam discriminações, como, por exemplo, remuneração em média menor em relação aos homens.

Por conseguinte, não é razoável que a presunção de dependência econômica e financeira de mulheres solteiras acima de 21 anos e não ocupantes de cargos públicos permanentes continue a produzir efeitos diante de uma realidade socioeconômica e cultural distinta.

Embora o artigo 5º, parágrafo único, da Lei nº 3.373/58 não exija, expressamente, a comprovação da dependência econômica, não se pode ignorar que esse aspecto está contido na própria norma. A legislação partia do pressuposto de que mulheres naquelas condições eram incapazes de proverem autonomamente o próprio sustento. Porém, diante das transformações sociais acima referidas, o ordenamento jurídico pátrio deixou de as considerar como beneficiárias da pensão. Trata-se de inovação trazida pela Lei nº 8.112/90 e reforçada pela Lei nº 13.135/2015, pelas quais se presume dependência econômica dos filhos, independentemente do gênero, até os 21 anos de idade.

É equivocado afirmar que a dependência econômica não era um parâmetro, um requisito do artigo 5º, parágrafo único, da Lei nº 3.373/58. Ainda que implícito, tratava-se de elemento essencial da legislação, devendo ser assim considerado em relação a uma realidade social modificada. Dessa maneira, ao seguir o entendimento jurisprudencial de incidência da legislação vigente à época do óbito do instituidor do benefício, não pode o magistrado ficar preso a uma presunção absolutamente anacrônica nos dias atuais.

Posteriormente, assim como ocorre nas pensões alimentícias no âmbito do direito de família, os benefícios de natureza previdenciária, por serem de trato continuado, renovando-se no tempo, submetem-se à cláusula Rebus sic stantibus. Nesse sentido, apresento precedente deste Tribunal Regional Federal:

“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. PENSÃO POR MORTE. COISA JULGADA. EMBARGOS À EXECUÇÃO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. GENITORES. CONCESSÃO ADMINISTRATIVA. COMPANHEIRA. DEPENDENTE DE PRIMEIRA CLASSE. EXCLUSÃO DAS CLASSES SEGUINTES. CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS.

1. A sentença que concede benefício de pensão por morte aos genitores do segurado falecido não prejudica terceiro pensionista que teve seu direito ao benefício reconhecido na via administrativa. 2. A existência de companheira, dependente de primeira classe, exclui o direito dos genitores ao recebimento de pensão por morte. 3. A cláusula rebus sic stantibus é inerente às relações de trato continuado, como é o caso dos benefícios previdenciários. 4. Nada é devido aos exequentes embargados em razão da exclusão de classes nos termos do Art. 16, § 1º da Lei 8.213/91. 5. Apelação desprovida. (AC 00066474220154036183, DESEMBARGADOR FEDERAL BAPTISTA PEREIRA, TRF3 - DÉCIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/07/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)”. (Grifo nosso)

Dessa maneira, as posteriores modificações no estado de fato devem ser levadas em consideração também nas hipóteses a envolver concessão de benefícios previdenciários. No que importa para o caso destes autos, as transformações socioeconômicas e culturais desde a década de 1950 a que se fez referência acima acabaram por revogar a dependência econômica presumida.

Assim, não se pode, a pretexto de observar os princípios da legalidade e da segurança jurídica, chegar a uma solução não condizente com a realidade social vigente.

Contudo, em que pese o meu entendimento em sentido contrário

, cumpre observar que a matéria foi recentemente enfrentada pelas duas

Turmas do Supremo Tribunal Federal

, conforme se verifica do seguinte precedente, verbis:

“CONSTITUCIONAL. AGRAVO INTERNO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO 2.780/2016 DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). EXCLUSÃO DE PENSÃO DE FILHA MAIOR E SOLTEIRA COM BASE EM REQUISITO NÃO PREVISTO NA LEI 3.373/1958. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. PRECEDENTES. RECURSO DE AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. O prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias, previsto no art. 23 da Lei 12.016/2009, conta-se da ciência inequívoca do ato impugnado. 2. Segundo o art. 5º, parágrafo único, da Lei 3.373/1958, as hipóteses de exclusão são restritas ao casamento ou posse em cargo público permanente. Dessa forma, a criação de hipótese de exclusão não prevista pela Lei 3.373/1958 (demonstração de dependência econômica) fere o princípio da legalidade. 3. Essa conclusão reflete a posição, recentemente, fixada pela

2ª Turma

(Sessão Virtual de 8.3.2019 a 14.3.2019), ao apreciar 265 Mandados de Segurança, todos de relatoria do Ministro EDSON FACHIN, que concluiu pela ilegalidade do mesmo Acórdão 2.780/2016 TCU. 4. Agravo interno a que se nega provimento.” (STF,

1ª Turma

, Agravo Regimental no Mandado de Segurança nº 35414, Rel. Min. Alexandre de Moraes - grifei) 

Diante deste quadro, ressalvado o meu entendimento pessoal a respeito da matéria, adoto a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal para

negar provimento

à apelação, nos termos da fundamentação supra.

É como voto.

 

 

 



E M E N T A

 

SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO. FILHA MAIOR DE VINTE E UM ANOS E SOLTEIRA. BENEFÍCIO CONCEDIDO COM FUNDAMENTO NA LEI Nº 3.373/1958. PROVA DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. ACÓRDÃO nº 2.780/2016 DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. ILEGALIDADE. PRECENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RESSALVA DO ENTENDIMENTO PESSOAL DO RELATOR.

I - Pensão concedida à filha maior de vinte um anos e solteira, com fundamento na Lei nº 3.373/1958, cuja comprovação de dependência econômica passou a ser exigida após o Acórdão nº 2.780/2016 do Tribunal de Contas da União, medida que, de acordo com o entendimento do Relator deste recurso, mostra-se razoável, tratando-se de requisito implícito a determinados benefícios previdenciários que devem observar modificações culturais, sociais, econômicas e históricas.

II - Contudo, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, firmada em diversos precedentes recentes das suas duas Turmas, firmou-se no sentido da ilegalidade da exigência de comprovação de dependência econômica formulada pelo Tribunal de Contas da União, entendimento este que, embora despido de força vinculante, observa-se por razões de segurança jurídica, com a ressalva do entendimento pessoal do Relator deste recurso.

III - Apelação desprovida.


 

ACÓRDÃO


Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

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