D.E. Publicado em 02/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento aos recursos de apelação interpostos pelo Instituto Nacional do Seguro Social e por Simétrica Engenharia Ltda., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007466-39.2012.4.03.6100/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelações cíveis interpostas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e por Simétrica Engenharia Ltda. em face da r. sentença das fls. 654/661, que julgou improcedente o pedido formulado pelo INSS contra a ré Campos Mármores Granitos e Empreiteira de Mão de Obra Ltda. - ME e procedente em parte o pedido formulado em face da apelante Simétrica Engenharia Ltda., para condená-la a pagar à autarquia R$ 6.821,00 (seis mil, oitocentos e vinte e um reais, com correção monetária e incidência de juros. Sucumbência recíproca.
Nas razões recursais das fls. 665/679, a ré Simétrica Engenharia Ltda. aduz, em síntese: a) inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91; b) culpa exclusiva da vítima do acidente de trabalho em questão. Requer o reconhecimento de inconstitucionalidade do referido dispositivo legal e que seja julgada improcedente a ação.
Por sua vez, no recurso apresentado às fls. 685/695 dos autos, o INSS sustenta, em suma, culpa exclusiva da empresa-ré no acidente sofrido por João Cláudio Caetano. Requer o provimento do recurso para a ação seja julgada totalmente procedente, condenando-se a ré ao ressarcimento à Previdência Social das despesas referentes ao auxílio-doença NB 544.331.017-4.
Contrarrazões recursais apresentadas às fls. 697/713 e 718/731.
É o breve relatório.
VOTO
Pleiteia o INSS, com a presente ação regressiva por acidente de trabalho, proposta com fulcro no art. 120 da Lei nº 8.213/91, o ressarcimento ao Erário de verbas despendidas com benefício previdenciário de auxílio-doença concedido a João Cláudio Caetano em função de acidente de trabalho ocorrido por descumprimento de normas de higiene e de segurança de trabalho.
Extrai-se da peça inicial que, em 12/12/2010, João Cláudio Caetano, segurado da Previdência Social, sofreu grave acidente de trabalho.
À época, o segurado era empregado da Campos Mármores Granitos e Empreiteira de Mão de Obra Ltda., que fora contratada pela Simétrica Engenharia Ltda. para a execução de obras de construção civil.
A empresa Simétrica Engenharia Ltda. era responsável por obras de reforma do antigo prédio do DETRAN e pela nova sede do Museu de Arte Contemporânea de São Paulo (MAC). Assim, subcontratava outras empresas para prestação de serviços de construção civil com fornecimento de mão de obra, dentre elas a Campos Mármores Granitos e Empreiteira de Mão de Obra Ltda.
Segundo o INSS, no momento do acidente, João Cláudio Caetano estava em um canteiro de obras quando foi atingido na cabeça, ombro direito e costas por uma carriola que despencou do quinto piso do prédio.
Em razão do acidente, o Ministério do Trabalho e do Emprego instaurou procedimento fiscalizatório e o Auditor do Trabalho constatou que:
De acordo com a Autarquia Federal, a fiscalização apurou, dentre os fatores que contribuíram para o acidente: a) falta de grade de proteção no quinto andar do elevador; b) ausência de marcação e isolamento do local de forma a impedir que estranhos ao serviço se expusessem a eventuais quedas de objetos; c) ausência de proteção provisória no local, até que fosse possível a instalação definitiva de grade.
Para a parte autora, as rés teriam agido com culpa (negligência), por não cumprir os procedimentos legais de segurança.
Inicialmente, afasta-se a alegação de inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 suscitada pela Simétrica Engenharia Ltda.
Com efeito, o fato de a empresa-ré contribuir para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas aquela destinada ao Seguro de Acidente do Trabalho (SAT), atualmente denominada Riscos Ambientais do Trabalho (RAT), não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho.
Nesse contexto, prescreve a Constituição Federal:
Cuida-se de prestações de naturezas diversas e a título próprio, inexistindo incompatibilidade entre os ditos preceitos.
Veja-se que a Emenda Constitucional nº 20/98 acrescentou o § 10 ao art. 201 à Constituição Federal, que dispõe: "Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo setor privado".
Tal dispositivo deixa claro que o setor privado também deve arcar com os riscos atinentes aos acidentes de trabalho, especialmente quando o sinistro decorrer de culpa do empregador.
Não deve ser acolhida, portanto, a pretensão da parte ré em afastar o cabimento da ação regressiva em razão do pagamento da SAT/RAT.
A presente ação encontra previsão nos artigos 120 e 121 da Lei nº 8.213/91:
Com a Emenda Constitucional nº 20/98, restou expressamente estabelecido que tanto a Previdência Social quanto o setor privado são responsáveis pela cobertura do risco de acidente do trabalho, o que afasta a alegação de inconstitucionalidade do art. 120 da Lei 8.213/91. Inexiste, pois, qualquer incompatibilidade entre as disposições do art. 120 da Lei nº 8.213/91 e o art. 7º, inciso XXVIII, da Constituição Federal.
Essa responsabilidade funda-se na premissa de que os danos gerados culposamente pelo empregador ao INSS, decorrente de acidente do trabalho, não podem e não devem ser suportados por toda a sociedade em razão de atitude ilícita da empresa que não cumpre normas do ambiente de trabalho.
A responsabilidade objetiva da Previdência Social, sem possibilidade de intentar ação regressiva contra os responsáveis pelo acidente em caso de dolo ou culpa, inevitavelmente levaria o empregador a negligenciar quanto às normas de segurança do trabalho, mesmo porque a efetivação de tais regras traz custos para a empresa.
Ressalte-se que a constitucionalidade do referido dispositivo já foi reiteradamente reconhecida pela jurisprudência (STJ, EDcl no AgRg nos EDcl no REsp n. 973379, Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira, j. 06.06.13; REsp n. 614847/RS. Rel. Min. Félix Fischer, j. 18.09.07; TRF da 3ª Região, AC n. 0006165-13.2010.4.03.6105, Rel. Des. Fed. José Lunardelli, j. 10.06.14; TRF da 4ª Região, Argüição de Inconstitucionalidade na AC nº. 1998.04.01.023654-8, Corte Especial, Rel. Des. Fed. Maria de Fátima Freitas Labarrere, DJ 13.11.2002; TRF da 1ª Região, 4ª Turma Suplementar, AC 199938000225520, Rel. Juiz Fed. Conv. Rodrigo Navarro de Oliveira, e-DJF1 10/04/2013).
Dito isso, considerando-se que o direito de regresso invocado pelo INSS é justificado pela negligência do empregador, que, ao não cumprir os ditames da lei em sede de prevenção de acidentes acaba criando um ambiente propício ao seu acontecimento, faz-se necessário verificar se estão presentes os pressupostos da responsabilidade civil subjetiva, isto é: a) da ação ou omissão do agente; b) do dano experimentado pela vítima; c) do nexo causal entre a ação e omissão e o dano; d) da culpa do agente, nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil:
No presente caso, como bem apreciado pelo Juízo de primeiro grau, o conjunto probatório coligido demonstra a negligência da empresa requerida, assim como imprudência da vítima do acidente de trabalho, João Cláudio Caetano.
Consta dos autos Análise de Acidente de Trabalho realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (fls. 33/40), segundo a qual os fatores infracionais que contribuíram para a ocorrência do acidente foram: a) a empresa-ré ter deixado de demarcar e isolar o local de foram a impedir que estranhos ao serviço se expusessem a quedas eventuais de objetos; b) ausência de grade de proteção no quinto andar do elevador; c) a ré ter deixado de exigir os cuidados especiais no local em razão da situação irregular provisória; d) ter deixado de providenciar proteção provisória no local, até que fosse possível instalar a grade definitivamente (fl. 38).
Há nos autos ainda cópia do Laudo Pericial nº 64.478/2010, juntado aos autos do Inquérito Policial nº 532/2010 (fls. 150/159), do qual se extrai a seguinte conclusão (fl. 158):
As constatações dos peritos policiais, de concorrência de culpas da empresa-ré e do segurado vitimado, são corroboradas por depoimentos testemunhais.
Rubens de Paula Paiva declarou à Polícia Civil do Estado de São Paulo (fls. 139/140) ocupa o cargo de Diretor Técnico na Simétrica Engenharia Ltda. e que, no dia dos fatos:
Em juízo, a testemunha complementou as declarações dantes prestadas (fl. 622). Afirmou que todos os materiais adquiridos pelas empresas terceirizadas eram armazenados no prédio principal. A vítima João Cláudio Caetano era empregado da empresa terceirizada Campos Mármores, sendo o responsável pelo recebimento de material e de aplicação dos granitos na obra do MAC. Explicou que sempre ao final da tarde o material era levado para perto da plataforma do elevador e dali era guindado até os pavimentos do prédio. A área em volta do elevador é isolada, para evitar acidentes. Afirmou que todos os funcionários que entram no canteiro de obras da empresa recebem treinamento de técnicos de segurança, específico para os respectivos serviços que prestam. Relatou que João Cláudio Caetano invadiu a área isolada do elevador, no momento que este estava em operação. Asseverou que nenhum funcionário está autorizado a adentrar a plataforma do elevador quando este está em funcionamento. Afirmou que o contrato firmado com a Campos Mármores compreendia tanto o fornecimento de material para a construção (granito) quanto a mão de obra necessária para instalá-lo. Havia na obra fiscalização diária de todas as empresas terceirizadas, realizada por um engenheiro de segurança do trabalho e três técnicos. Trabalhavam na obra cerca de setecentos funcionários e todos passavam por treinamento. Afirmou que o funcionário acidentado assumiu um risco ao invadir uma área que não deveria acessar, no horário de almoço dos outros funcionários, direcionando um caminhão para descarregamento de granito em local impróprio, ao lado da plataforma. Asseverou que havia uma fita em volta do local, indicativa da vedação de acesso.
De sua parte, Naiane de Almeida Barbosa afirmou em juízo (fl. 602) que:
Por fim, Fernando José da Silva declarou em juízo (fls. 626/627) que:
Nota-se, portanto, que a ré foi negligente ao permitir que João Cláudio Caetano se aproximasse da área isolada, reservada para as operações com elevador, e se omitiu em adotar medidas paliativas adequadas para impedir que acidentes ocorressem naquela área, ao mesmo passo que a própria vítima comportou-se imprudentemente ao invadir a área isolada, infringindo normas de segurança de que tinha conhecimento.
Deveras, foi a soma desses fatores que levou ao acidente de trabalho sob análise, sendo permitido cogitar que este não teria ocorrido caso a ré ou o segurado tivessem tomado as precauções que individualmente lhes cabiam.
Assim, a ré não se desincumbiu do ônus que lhe impõe o art. 333, II, do CPC, pois não restou comprovado que houve culpa exclusiva do empregado terceirizado, da mesma forma que o INSS não demonstrou a culpa exclusiva da empresa demandada.
Convém ressaltar que é dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança do trabalho, conforme art. 157, da Consolidação das Leis do Trabalho: "Cabe às empresas: I - cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho.". Assim, é a empresa a responsável pela adoção e uso de medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador.
A própria lei nº 8.213/91 determina que:
Nesse prisma, diante da conclusão do conjunto probatório contido nos autos e ante a ausência de adoção das precauções recomendáveis que evidenciam tanto a negligência da empresa-ré quanto do segurado acidentado, deve ser ressarcida à Previdência apenas metade dos valores que desembolsou a título de benefício previdenciário de auxílio-doença.
Ante o exposto, nego provimento aos recursos de apelação interpostos pelo Instituto Nacional do Seguro Social e por Simétrica Engenharia Ltda.
É o voto.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 21/03/2018 17:38:12 |