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PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 59 E 62 DA LEI N. º 8. 213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. GESTAÇÃO DE ALTO RISCO. INCAPACIDAD...

Data da publicação: 20/03/2021, 19:01:01

E M E N T A PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 59 E 62 DA LEI N.º 8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. GESTAÇÃO DE ALTO RISCO. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO. PRESCRIÇÃO AFASTADA. - Comprovada a incapacidade total e temporária para o trabalho, bem como presentes os demais requisitos previstos nos artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença. - O INSS não pode exigir carência para conceder auxílio-doença às seguradas gestantes cuja gravidez seja clinicamente comprovada como de alto risco e que, em razão disso, tenham que se afastar do trabalho por mais de 15 dias consecutivos, conforme decisão, válida em todo país, proferida nos autos da ACP n.5051528-83.2017.4.04.7100/RS. - Não se desconhece que a questão da devolução dos valores recebidos por força de tutela antecipada foi decidida pelo Eg. STJ, em 10/2015, em sede de recurso repetitivo, REsp 1.401.560/ MT. - Contudo, o C. Supremo Tribunal Federal, em decisões posteriores, assentou no sentido de ser desnecessária a restituição dos valores recebidos de boa fé, mediante decisão judicial, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos. Precedentes. - O artigo 115, II, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 13.846/19, autoriza o desconto nos casos de pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento. - Na hipótese dos autos, a tutela antecipada se deu antes da vigência da alteração legislativa (Lei 13.846/2019). - Nas relações previdenciárias se aplica o princípio do tempus regit actum, ou seja, aplica-se a lei vigente à época dos fatos, de forma que, inaplicável a legislação superveniente aos fatos ocorridos antes de sua vigência (18/06/2019), sob pena de ofensa a garantia de irretroatividade da lei, prevista no artigo 5º., inciso XXXVI, da CF. - Considerando que à época dos fatos, vigorava o entendimento consolidado pelo C. STF, no sentido de ser desnecessária a restituição dos valores recebidos de boa fé, mediante decisão judicial, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, bem como ao entendimento pacífico da E. 10ª. Turma desta Corte, é defeso a Autarquia exigir a devolução de valores já pagos. - Apelação do INSS não provida. (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0001402-22.2013.4.03.6118, Rel. Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA, julgado em 08/03/2021, Intimação via sistema DATA: 12/03/2021)


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001402-22.2013.4.03.6118

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: SIMONE CRISTINA GENEROSO CIPRIANO

Advogados do(a) APELADO: EDNA ANTONINA GONCALVES FIGUEIRA - SP145630-A, CARLOS ALBERTO HORTA NOGUEIRA - SP210169-N, FREDERICO JOSE DIAS QUERIDO - SP136887-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001402-22.2013.4.03.6118

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: SIMONE CRISTINA GENEROSO CIPRIANO

Advogados do(a) APELADO: EDNA ANTONINA GONCALVES FIGUEIRA - SP145630-A, CARLOS ALBERTO HORTA NOGUEIRA - SP210169-N, FREDERICO JOSE DIAS QUERIDO - SP136887-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora):

Proposta ação de conhecimento de natureza previdenciária, objetivando a concessão de auxílio-doença, com conversão em aposentadoria por invalidez, sobreveio sentença de parcial procedência do pedido, para condenar a autarquia previdenciária a conceder o benefício de auxílio-doença no período de 24/06/2013 a 29/12/2013, com correção monetária e juros de mora, compensando-se os valores recebidos por força de tutela antecipada. Considerando que a parte autora decaiu de maior parte do pedido, condenou-a ao pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, observada sua condição de beneficiária da justiça gratuita. Por fim, ressalvou que os valores recebidos em razão da decisão antecipatória de tutela não  serão  objeto  de  devolução,  tendo  em  vista  que  recebidos  de  boa-fé.

 

A r. sentença não foi submetida ao reexame necessário.

 

A autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido, sustentando a ausência dos requisitos legais para a concessão do benefício. Subsidiariamente, pede o reconhecimento da prescrição quinquenal e a devolução dos valores recebidos por força de tutela antecipada no curso da demanda.

 

Com contrarrazões, os presentes autos foram remetidos a esta Corte.

 

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001402-22.2013.4.03.6118

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: SIMONE CRISTINA GENEROSO CIPRIANO

Advogados do(a) APELADO: EDNA ANTONINA GONCALVES FIGUEIRA - SP145630-A, CARLOS ALBERTO HORTA NOGUEIRA - SP210169-N, FREDERICO JOSE DIAS QUERIDO - SP136887-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora):

Recebo o recurso de apelação do INSS, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do Código de Processo Civil.

 

Os requisitos para a concessão do benefício de auxílio-doença, de acordo com o artigo 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91 são os que se seguem: 1) qualidade de segurado;2) cumprimento da carência, quando for o caso; 3) incapacidade temporária para o exercício das atividades profissionais habituais, bem como incapacidade que, embora permanente, não seja total, isto é, haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que garanta o seu sustento e 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da filiação à Previdência, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento daquelas.

 

No presente caso, há prova da qualidade de segurada da parte autora, mediante a apresentação de cópia da sua CTPS (Id 149195811 -página 23), com registro de vínculo empregatício desde 16/08/2012, sem data de saída à época de propositura da ação, em 05/09/2013.

 

Para a solução da lide, ainda, é de substancial importância a prova técnica produzida. Neste passo, a incapacidade para o exercício de trabalho que garanta a subsistência foi atestada pelo laudo pericial (Id. 149195811 - páginas 68/71 e 85). De acordo com a referida perícia, a parte autora, em virtude de gravidez de alto risco (hipertensão arterial, com quadro de preeclampsia e ameaça de abortamento, com necessidade de repouso), encontrava-se total e temporariamente incapacitada para as atividades laborativas desde junho de 2013, quadro que perduraria por 30 a 60 dias após a realização do parto por cesariana (ocorrido em 29/10/2013).

 

A alegação do INSS de que a parte autora não faz jus à concessão do benefício por não ter cumprido o período de carência exigido, não merece prosperar, pois o INSS não pode exigir carência para conceder auxílio-doença às seguradas gestantes cuja gravidez seja clinicamente comprovada como de alto risco e que, em razão disso, tenham que se afastar do trabalho por mais de 15 dias consecutivos, conforme decisão, válida em todo país, proferida nos autos da ACP n. 5051528-83.2017.4.04.7100/RS, pelo R. Juízo da 17ª Vara Federal de Porto Alegre.

 

Acresce relevar, que a Eg. 6ª. Turma do TRF da 4ª. Região, ao julgar o AI n. 5002577-81.2018.4.04.0000, interposto pelo INSS, em face da r. decisão acima referida, negaram provimento ao mesmo, nos seguintes termos:

 

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. GESTANTE COM GRAVIDEZ DE ALTO RISCO. DISPENSA DE CARÊNCIA. TUTELA DE URGÊNCIA. EFEITOS . MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA.

1.  A Lei nº 8.213/91, em seu artigo 26, trata dos benefícios que independem do cumprimento da carência, dentre os quais destacou o legislador o benefício de auxílio-doença (no inciso II), que prevê, em sua parte final, que tal requisito poderá ser dispensado na existência de fator que confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado.

2. Na hipótese de gravidez de alto risco, essa gravidade e especificidade restam configuradas em virtude da saúde e da própria vida da gestante, assim como do feto ou recém-nascido terem maiores chances de serem atingidas, o que requer tratamento particularizado.

3. Nesse contexto, o quadro de gestação de alto risco, comprovada clinicamente, exime a segurada da Previdência Social da necessidade do cumprimento do período de carência para a concessão do benefício de auxílio-doença, quando houver recomendação médica para afastamento do trabalho por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, em razão dessa condição clínica.

4. Hipótese de manutenção da decisão agravada que já havia deferido a tutela de urgência, com abrangência nacional, determinando ao INSS que se abstenha de "exigir carência para concessão de auxílio-doença às seguradas gestantes cuja gravidez seja comprovada clinicamente como de alto risco e haja recomendação médica para afastamento do trabalho por mais de 15 (quinze) dias consecutivos em razão dessa condição clínica".

5. Não há falar em mácula ao disposto no art. 195, §5, da Constituição Federal/88, porquanto o conteúdo normativo da decisão não tem por objetivo criar, majorar ou estender benefícios ou serviço da seguridade social. Não se cria benefício, a concessão de auxílio doença está expressamente previsto na Lei 8.213/91. Não se majora o valor do benefício de auxílio-doença, pois o potencial valor a ser pago àqueles que preencherem os requisitos legais para sua concessão é aquele ditado pelas normas da Lei nº 8.213/91, nem mais, nem menos. Não se estende benefício ou serviço, uma vez que a decisão apenas determina o pagamento à mulher grávida que se encontra em estado de patologia que pode ensejar a sua morte ou a do seu feto. O que se realiza na presente decisão, como essência da atividade jurisdicional, é a interpretação extensiva em dispositivo normativo, tendo em vista que o dispositivo disse menos do que deveria dizer quando da análise das situações patológicas que justificam a concessão de auxílio-doença independentemente de carência. A interpretação extensiva tem por objetivo, não trazer para o conteúdo normativo fato não vislumbrado pelo legislador, mas, sim, reconhecer circunstância vislumbrada pelo legislador, mas que, por qualquer motivo, não ficou expressamente consignada no texto legal.

6. No caso, entende-se que a gravidez de risco (patologia que pode ensejar a morte da mãe e do feto) encontra-se inserida nas hipóteses previstas no art. 151 da Lei nº 8.213/91 (interpretação extensiva), o que enseja a concessão de auxílio-doença com base no art. 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91.” (Agravo de Instrumento Nº 5002577-81.2018.4.04.0000/RS RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA  AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS AGRAVADO: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL).

 

Neste sentido, o entendimento desta Corte Regional:

 

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. GRAVIDEZ DE RISCO. COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DO REQUISITO DA CARÊNCIA. DESCABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

I- O rol de situações que dispensam a carência para a concessão do benefício por incapacidade, previsto no art. 151, da Lei nº 8.213/91, e na Portaria Interministerial MPAS/MS 2.998, de 23.08.2001,  não engloba numerus clausus, permitindo interpretação extensiva, restando comprovada “in casu” a configuração de gravidez de risco, e, portanto, considerando-se risco de morte à mãe e à criança, devendo ser analisada a questão sob o enfoque da proteção especial conferida à gestante e à criança (arts. 201, inc. II e art. 227, da Constituição da República), justificando-se a concessão do benefício de auxílio-doença à autora.

II-Mantidos os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, eis que de acordo com o entendimento da 10ª Turma desta E. Corte.

III- Apelação do réu improvida.

(TRF 3ª Região, 10ª Turma,  ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5483434-18.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO, julgado em 28/11/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 05/12/2019)”

 

“PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. EFEITO DEVOLUTIVO DA APELAÇÃO. AUXÍLIO DOENÇA. GRAVIDEZ DE ALTO RISCO. CARÊNCIA DISPENSADA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA n° 5051528-83.2017.4.04.7100/RS. ABRANGÊNCIA NACIONAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA DURANTE O PERÍODO DE INCAPACIDADE. TERMO FINAL DO BENEFÍCIO. DIA ANTERIOR AO PARTO.  JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. LEI Nº 11.960/2009. HONORÁRIOS DE ADVOGADO MANTIDOS. DEDUÇÃO DOS VALORES ADMINISTRATIVOS PAGOS NA FASE DE LIQUIDAÇÃO.

1.É plenamente possível a antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública nas causas de natureza previdenciária e assistencial. Apelação dotada apenas de efeito devolutivo.

2.Requisito legal carência dispensado. Ação Civil Pública n° 5051528-83.2017.4.04.7100/RS. Abrangência nacional.

3.O exercício de atividade laborativa durante o período em que constatada a incapacidade não afasta o direito ao benefício, desde que preenchidos os requisitos legais. Necessidade de subsistência.

4.Termo final do benefício fixado no dia anterior à data do parto.

5.Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e a partir da vigência da Lei nº 11.960/09, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Correção de ofício.

6.Honorários advocatícios mantidos. Fixados em 10% do valor da condenação. Artigo 20, §§ 3º e 4º, Código de Processo Civil/73 e Súmula nº 111 do STJ. Sucumbência recursal. Enunciado Administrativo nº 7/STJ.

7.Obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora na via administrativa (art. 124 da Lei nº 8.213/1991).

8.Sentença corrigida de ofício. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS provida em parte.

(TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA,  Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2013679 - 0033589-46.2014.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 30/07/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/08/2018 )”

 

Assim, preenchidos os requisitos legais, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença à parte autora, no período de 24/06/2013 a 29/12/2013, nos termos da r. sentença.

 

No tocante à alegação de prescrição quinquenal, esta somente alcança as prestações não pagas nem reclamadas na época própria, não atingindo o fundo de direito, devendo ser observada no presente caso. Neste sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica a seguir:

 

"Em se tratando de ação proposta com o fito de obter revisão de benefício previdenciário, relação de trato sucessivo e natureza alimentar, a prescrição que incide é aquela prevista na Súmula 85/STJ: "Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação.". Inocorrência da chamada prescrição do fundo de direito." (REsp 544324/SP, Relator Ministro FELIX FISCHER, j. 25/05/2004, DJ 21/06/2004, p. 242).

 

No caso dos autos, considerando-se que o benefício foi concedido no período de 24/06/2013 a 29/12/2013, e tendo a ação sido ajuizada em 05/09/2013, não há falar em parcelas prescritas.

 

Quanto ao pedido de devolução dos valores recebidos por força de tutela antecipada, cumpre observar que, em 18/06/2019, foi sancionada a Lei 13.846 (conversão da MP 871/2019), que, dentre outras disposições, alterou a Lei 8.213/91. Das alterações, destaca-se a nova redação do artigo 115, verbis:

 

"Art. 115. Podem ser descontados os benefícios:

(...)

II - pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento;

(...)".

 

Ocorre que, no caso dos autos, a tutela antecipada foi concedida e posteriormente revogada antes da vigência da alteração legislativa supra referida.

 

Neste passo, é cediço que nas relações previdenciárias se aplica o princípio do tempus regit actum, ou seja, aplica-se a lei vigente à época dos fatos, de forma que, inaplicável a legislação superveniente aos fatos ocorridos antes de sua vigência (18/06/2019), sob pena de ofensa a garantia de irretroatividade da lei, prevista no artigo 5º, inciso XXXVI, da CF.

 

Acresce relevar, ainda, o que dispõe o artigo 24 da LINDB, acrescentado pela Lei 13.655/18:

 

"Art. 24. A revisão, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, quanto à validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa cuja produção já se houver completado levará em conta as orientações gerais da época, sendo vedado que, com base em mudança posterior de orientação geral, se declarem inválidas situações plenamente constituídas.

Parágrafo único. Consideram-se orientações gerais as interpretações e especificações contidas em atos públicos de caráter geral ou em jurisprudência judicial ou administrativa majoritária, e ainda as adotadas por prática administrativa reiterada e de amplo conhecimento público".

 

Tal disposição reforça a regra constitucional que veda a retroatividade da lei. Interpretar uma norma é determinar o seu sentido e alcance, em respeito ao princípio da segurança jurídica, projetando seus efeitos para o futuro.

 

Em decorrência, considerando que à época dos fatos vigorava o entendimento consolidado pelo C. STF, no sentido de ser desnecessária a restituição dos valores recebidos de boa fé, mediante decisão judicial, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, bem como ao entendimento pacífico da E. 10ª. Turma desta Corte, é defeso a Autarquia exigir a devolução de valores já pagos.

 

Ademais, não se mostra razoável impor ao segurado a obrigação de devolver a verba que recebeu de boa-fé, em virtude de ordem judicial com força provisória.

 

Assim, ante a natureza alimentar do benefício concedido, pressupõe-se que os valores correspondentes foram por ele utilizados para a manutenção da própria subsistência e de sua família, além do que, não consta dos autos elementos capazes de afastar a presunção de que os valores não foram recebidos de boa-fé pela parte autora.

 

Diante do exposto,

NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS

, nos termos da fundamentação.

 

E o voto.

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 59 E 62 DA LEI N.º 8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. GESTAÇÃO DE ALTO RISCO. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO. PRESCRIÇÃO AFASTADA.

- Comprovada a incapacidade total e temporária para o trabalho, bem como presentes os demais requisitos previstos nos artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença.

- O INSS não pode exigir carência para conceder auxílio-doença às seguradas gestantes cuja gravidez seja clinicamente comprovada como de alto risco e que, em razão disso, tenham que se afastar do trabalho por mais de 15 dias consecutivos, conforme decisão, válida em todo país, proferida nos autos da ACP n.5051528-83.2017.4.04.7100/RS.

- Não se desconhece que a questão da devolução dos valores recebidos por força de tutela antecipada foi decidida pelo Eg. STJ, em 10/2015, em sede de recurso repetitivo, REsp 1.401.560/ MT.

- Contudo, o C. Supremo Tribunal Federal, em decisões posteriores, assentou no sentido de ser desnecessária a restituição dos valores recebidos de boa fé, mediante decisão judicial, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos. Precedentes.

- O artigo 115, II, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 13.846/19, autoriza o desconto nos casos de pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento.

- Na hipótese dos autos, a tutela antecipada se deu antes da vigência da alteração legislativa (Lei 13.846/2019).

- Nas relações previdenciárias se aplica o princípio do tempus regit actum, ou seja, aplica-se a lei vigente à época dos fatos, de forma que, inaplicável a legislação superveniente aos fatos ocorridos antes de sua vigência (18/06/2019), sob pena de ofensa a garantia de irretroatividade da lei, prevista no artigo 5º., inciso XXXVI, da CF.

- Considerando que à época dos fatos, vigorava o entendimento consolidado pelo C. STF, no sentido de ser desnecessária a restituição dos valores recebidos de boa fé, mediante decisão judicial, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, bem como ao entendimento pacífico da E. 10ª. Turma desta Corte, é defeso a Autarquia exigir a devolução de valores já pagos.

- Apelação do INSS não provida.

 


 

ACÓRDÃO


Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, nos termos da fundamentação., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

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