D.E. Publicado em 01/12/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e, no mérito, dar parcial provimento à apelação do autor e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0022773-68.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Exmo. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelações de sentença pela qual foi julgado parcialmente procedente o pedido formulado em ação previdenciária para reconhecer o exercício de atividades especiais nos períodos de 28.03.1985 a 10.03.1987, 09.06.1987 a 13.09.1989, 01.02.1992 a 01.09.1992, 06.07.1993 a 13.02.1995, 16.02.1995 a 13.05.1997, 01.11.1997 a 09.07.2008 e de 01.05.2009 a 18.06.2012, julgando improcedente a concessão do benefício de aposentadoria especial. Tendo em vista a sucumbência recíproca, cada parte arcará com o pagamento dos honorários advocatícios de seus respectivos patronos. Sem custas.
O autor em apelação requer, preliminarmente, a realização de prova pericial e testemunhal quanto às atividades especiais. No mérito, aduz que restou comprovado o exercício das atividades sob condições especiais desempenhadas nas lides rurais, fazendo jus à concessão do benefício de aposentadoria especial.
Em apelação o INSS aduz que o autor não comprovou o exercício de atividade especial, bem como que a utilização de equipamento de proteção individual neutraliza a insalubridade, fato este que elide o alegado labor sob condições prejudiciais. Subsidiariamente, requer a aplicação da prescrição quinquenal.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
Em cumprimento ao despacho de fl.302, houve a apresentação dos documentos de fls. 321/323, 327/329, manifestando-se o INSS às fls. 335 e 339.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0022773-68.2015.4.03.9999/SP
VOTO
Da preliminar
Não há se falar em cerceamento de defesa a ensejar a decretação de nulidade da sentença, uma vez que ao magistrado cabe a condução da instrução probatória, tendo o poder de dispensar a produção de provas que entender desnecessárias para o deslinde da causa, não havendo que se falar em produção de prova pericial e testemunhal.
No caso em tela, observo que o conjunto probatório acostado aos autos é suficiente para o deslinde da questão.
Do mérito
Busca o autor, nascido em 15.03.1954, o reconhecimento de atividades exercidas sob condições especiais nos períodos declinados na inicial, e a concessão do benefício de aposentadoria especial, a contar de 18.06.2012, data do requerimento administrativo.
De início, cumpre distinguir a aposentadoria especial prevista no art. 57, "caput", da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de serviço, prevista no art. 52 da Lei nº 8.213/91, porquanto a aposentadoria especial pressupõe o exercício de atividade considerada especial pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, e, cumprido esse requisito o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da E.C. nº 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, assim como não se submete ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de serviço há tanto o exercício de atividade especial como o exercício de atividade comum, sendo que o período de atividade especial sofre a conversão em atividade comum aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da E.C. nº 20/98.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos 83.080/79 e 53.831/64, até 05.03.1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95 como a seguir se verifica.
O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruído s superior 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB como agente nocivo à saúde.
Com o advento do Decreto n. 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruído s tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruído s de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, conforme ementa a seguir transcrita:
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
Assim, devem ser mantidos os termos da sentença que reconheceu o exercício de atividades sob condições especiais dos períodos de 28.03.1985 a 10.03.1987, 09.06.1987 a 13.09.1989, 01.02.1992 a 01.09.1992, 06.07.1993 a 13.02.1995, 16.02.1995 a 13.05.1997, como lavador de veículos e lubrificador, utilizando jatos d'água com pressão, lubrificando as máquinas agrícolas, tratores e implementos, exposto aos agentes químicos óleo diesel e queimado, graxa e gasolina (hidrocarbonetos), conforme formulários de fls. 35, 40/43, 52/53, agentes nocivos previstos nos códigos 1.1.3 e 1.2.11 do Decreto 53.831/64 e 1.2.10 do Decreto 83.080/79, bem como de 01.11.1997 a 09.07.2008 e de 01.05.2009 a 18.06.2012, no setor de lavagem de veículos, conforme PPP de fls. 321/323, 327/329, exposto a hidrocarbonetos aromatizados e ruído (92/102dB) acima do limite legal estabelecido, agentes nocivos previstos nos códigos 1.1.6 e 1.2.11 do Decreto 53.831/64 e 1.1.5 e 1.2.10 do Decreto 83.080/79, e código 2.0.1., anexo IV, e código 1.0.3 ambos do Decreto 3.048/99.
Nos termos do §2º do art.68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação do Decreto 3.048/99, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
Ademais, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho
Assim, devem ser tidos por especiais os períodos de 16.03.1983 a 16.05.1983, 22.02.1984 a 26.03.1984, 02.04.1984 a 08.02.1985, 28.09.1989 a 08.02.1990 e de 13.02.1990 a 26.11.1990, em que trabalhou no meio rural, em agroindustria, conforme CTPS, PPP e formulário, fls. 85/86, 30/31, 38/29, 48/49, em que executava atividade manual de corte, cultivo, capina e plantio de cana de açúcar dentro das propriedades das empresas, suficiente a comprovar a atividade especial enquadrada pela categoria profissional, conforme código 2.2.1 do Decreto 53.831/64 "trabalhadores na agropecuária", permitido até 10.12.1997 da Lei n.º 9.528/97.
Todavia, devem ser mantidos como comuns os períodos de 01.11.1976 a 30.11.1976, 14.12.1976 a 15.02.1977 e de 16.02.1977 a 30.07.1977 (CTPS, fl.84), em que trabalhou na construção civil, tendo em vista a impossibilidade de enquadramento de tal período pela categoria profissional, por não estar a função servente de pedreiro elencada nos Decretos n.º53.831/64 e n.º 83.080/79.
De outro turno, apenas aos trabalhadores ocupados em grandes obras de construção civil, tais como edifícios, pontes e barragens, é possível a contagem especial, tendo em vista o risco de queda, atividade tida por perigosa, conforme código 2.3.3 do Decreto 53.831/64.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
A discussão quanto à utilização do EPI, no caso em apreço, é despicienda, porquanto o autor esteve exposto ao agente nocivo ruído, cujos efeitos agressivos não são neutralizados pelos tipos de equipamentos de proteção individual atualmente disponíveis.
Já em relação à exposição a outros agentes (químicos, biológicos, etc) podemos dizer que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pelo autor demonstra a impossibilidade de atestar a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
Somados apenas os períodos de atividades especiais aqui reconhecidos, o autor totaliza 24 anos e 9 meses de atividade exclusivamente especial até 18.06.2012, data do requerimento administrativo, insuficiente à concessão de aposentadoria especial nos termos do art.57 da Lei 8.213/91, conforme planilha anexa, parte integrante da presente decisão.
Verifica-se, contudo, que houve o reconhecimento do tempo especial até a data da elaboração do novo PPP em 21.12.2015 (fls.321/323 e 327/329), uma vez que o autor continua trabalhando na mesma empresa, Francisco Urenha Cia Ltda, conforme CNIS-anexo, devendo ser considerado até a data do ajuizamento da ação (19.11.2012, fls.02), para fins de verificação do direito à aposentação, de aposentadoria especial, requerida na exordial.
Assim, somando-se os períodos de atividades especiais aqui reconhecidos, o autor totaliza 25 anos, 2 meses e 1 dia de atividade exclusivamente especial até 19.11.2012, data da propositura da ação, conforme planilha anexa, parte integrante da presente decisão.
Destarte, o autor faz jus à aposentadoria especial com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação (20.05.2014 - fl. 92), quando já haviam sido preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício, vez que à época do requerimento administrativo não havia cumprido os requisitos legais, conforme planilha anexa à decisão, não havendo que se falar em prescrição quinquenal.
Os juros de mora e a correção monetária deverão observar o disposto na lei de regência.
Fixo os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, a teor do disposto no Enunciado 7 das diretrizes para aplicação do Novo CPC aos processos em trâmite, elaboradas pelo STJ na sessão plenária de 09.03.2016.
As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), devendo reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Diante do exposto, rejeito a preliminar arguida pelo autor e, no mérito, dou parcial provimento à sua apelação para julgar parcialmente procedente o pedido para reconhecer o exercício de atividades especiais os períodos de 16.03.1983 a 16.05.1983, 22.02.1984 a 26.03.1984, 02.04.1984 a 08.02.1985, 28.09.1989 a 08.02.1990 e de 13.02.1990 a 26.11.1990, mantendo-se os períodos reconhecidos judicialmente, totalizando 25 anos, 2 meses e 1 dia de atividade exclusivamente especial até 19.11.2012. Em consequência, condeno o réu a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria especial, a contar de 20.05.2014, data da citação, com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99. Honorários advocatícios fixados em 15% das prestações vencidas até a data da sentença. Nego provimento à apelação do INSS. As verbas acessórias deverão ser aplicadas na forma acima explicitada. O INSS é isento de custas. As prestações em atraso serão resolvidas em liquidação de sentença.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, instruído com os devidos documentos da parte autora SEBASTIÃO COSTA, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja implantado o benefício de APOSENTADORIA ESPECIAL, DIB em 20.05.2014, e renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, tendo em vista o "caput" do artigo 497 do Novo CPC. As prestações em atraso serão resolvidas em liquidação de sentença.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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