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PROCESSO CIVIL. DECADÊNCIA DO DÉBITO PREVIDENCIÁRIO. USO TÉCNICO IMPRÓPRIO DO INSTITUTO JURÍDICO. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA P...

Data da publicação: 09/08/2024, 03:08:04

PROCESSO CIVIL. DECADÊNCIA DO DÉBITO PREVIDENCIÁRIO. USO TÉCNICO IMPRÓPRIO DO INSTITUTO JURÍDICO. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RETORNO VOLUNTÁRIO AO TRABALHO. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO AO INSS. DEVOLUÇÃO DOS VALORES. POSSIBILIDADE. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. PRESERVAÇÃO DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL DA PREVIDÊNCIA. APELAÇÃO DO AUTOR DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. 1 - Não está em discussão a regularidade do ato concessório do benefício por incapacidade, ocorrido em 30/09/2003, mas sim a impossibilidade de seu recebimento concomitantemente com o exercício de atividade remunerada pelo segurado. 2 - Desse modo, a invocação do instituto jurídico da decadência é absolutamente imprópria no caso dos autos, do ponto de vista estritamente técnico. Realmente, a decadência se refere não à perda da pretensão - a qual se entende modernamente que nunca ocorre, em razão da garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (artigo 5º. XXXV) -, mas à perda de um direito potestativo, entendido como aquele que pode ser exercido de forma unilateral, sem estar condicionado à vontade de terceiros. 3 - Se a parte quisesse alegar que o débito é inexigível pelo decurso do tempo, a boa técnica recomenda que se alegasse a ocorrência de prescrição. Realmente, esta sim configura a perda da exigibilidade de uma pretensão - e não da pretensão em si - pela inércia prolongada de seu titular. 4 - No entanto, nem mesmo a prescrição foi consumada no caso vertente, uma vez que o último vínculo empregatício do demandante cessou em 08/09/2008. A cobrança extrajudicial do débito ora impugnado, por sua vez, iniciou-se em 12/05/2009 (ID 116440289 - p. 17). Portanto, como não transcorreram mais de cinco anos entre a ciência da lesão ao erário e o início da cobrança administrativa, não há falar em prescrição. 5 - O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, fundado na eqüidade, constitui alicerce do sistema jurídico desde a época do direito romano e encontra-se atualmente disciplinado pelo artigo 884 do Código Civil de 2002. Desse modo, todo acréscimo patrimonial obtido por um sujeito de direito que acarrete necessariamente o empobrecimento de outro, deve possuir um motivo juridicamente legítimo, sob pena de ser considerado inválido e seus valores serem restituídos ao anterior proprietário. Em caso de resistência à satisfação de tal pretensão, o ordenamento jurídico disponibiliza à parte lesada os instrumentos processuais denominados ações in rem verso, a fim de assegurar o respectivo ressarcimento, das quais é exemplo a ação de repetição de indébito. 6 - A propositura de demanda judicial, contudo, não constitui a única via de que dispõe a Administração Pública para corrigir o enriquecimento sem causa. Os Entes Públicos, por ostentarem o poder-dever de autotutela, podem anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, ressalvando-se ao particular o direito de contestar tal medida no Poder Judiciário, conforme as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal. 7 - Ademais, na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II, da Lei 8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99. 8 - Assim, ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias. 9 - Deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e o enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção. 10 – In casu, a parte autora usufruiu do benefício de aposentadoria por invalidez de 30/09/2003 a 15/04/2009 (NB 514.013.478-7). Todavia, em auditoria interna realizada em 12/05/2009, o INSS constatou irregularidades na manutenção do benefício, uma vez que o demandante exerceu atividade laborativa voluntariamente, na FAZENDA BOA VISTA. durante os períodos de 01/04/2004 a 18/06/2004, de 19/06/2006 a 29/09/2006 e de 04/02/2008 a 08/09/2008. Assim, iniciou-se a cobrança administrativa do débito, apurado em R$ 6.375,46 (seis mil, trezentos e setenta e cinco reais e quarenta e seis centavos). 11 - É dever do segurado comunicar ao INSS o retorno voluntário ao trabalho, conforme preconiza o artigo 46 da Lei n. 8.213/91. Ademais, até o leigo tem plena consciência de que o benefício de aposentadoria por invalidez visa ampará-lo enquanto perdurar sua incapacidade laboral. Assim, não constitui erro escusável o recebimento de prestação sabidamente indevida, razão pela qual não pode ser acolhida a alegação de boa-fé. Precedentes. 12 - Apelação do autor desprovida. Sentença mantida. Ação julgada improcedente. (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0001451-31.2011.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 24/06/2021, DJEN DATA: 29/06/2021)



Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP

0001451-31.2011.4.03.9999

Relator(a)

Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO

Órgão Julgador
7ª Turma

Data do Julgamento
24/06/2021

Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 29/06/2021

Ementa


E M E N T A

PROCESSO CIVIL. DECADÊNCIA DO DÉBITO PREVIDENCIÁRIO. USO TÉCNICO
IMPRÓPRIO DO INSTITUTO JURÍDICO. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA.
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RETORNO VOLUNTÁRIO AO
TRABALHO. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO AO INSS. DEVOLUÇÃO DOS VALORES.
POSSIBILIDADE. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM
CAUSA. PRESERVAÇÃO DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL DA PREVIDÊNCIA.
APELAÇÃO DO AUTOR DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. AÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE.
1 - Não está em discussão a regularidade do ato concessório do benefício por incapacidade,
ocorrido em 30/09/2003, mas sim a impossibilidade de seu recebimento concomitantemente com
o exercício de atividade remunerada pelo segurado.
2 - Desse modo, a invocação do instituto jurídico da decadência é absolutamente imprópria no
caso dos autos, do ponto de vista estritamente técnico. Realmente, a decadência se refere não à
perda da pretensão - a qual se entende modernamente que nunca ocorre, em razão da garantia
constitucional da inafastabilidade da jurisdição (artigo 5º. XXXV) -, mas à perda de um direito
potestativo, entendido como aquele que pode ser exercido de forma unilateral, sem estar
condicionado à vontade de terceiros.
3 - Se a parte quisesse alegar que o débito é inexigível pelo decurso do tempo, a boa técnica
recomenda que se alegasse a ocorrência de prescrição. Realmente, esta sim configura a perda
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos

da exigibilidade de uma pretensão - e não da pretensão em si - pela inércia prolongada de seu
titular.
4 - No entanto, nem mesmo a prescrição foi consumada no caso vertente, uma vez que o último
vínculo empregatício do demandante cessou em 08/09/2008. A cobrança extrajudicial do débito
ora impugnado, por sua vez, iniciou-se em 12/05/2009 (ID 116440289 - p. 17). Portanto, como
não transcorreram mais de cinco anos entre a ciência da lesão ao erário e o início da cobrança
administrativa, não há falar em prescrição.
5 - O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, fundado na eqüidade, constitui alicerce
do sistema jurídico desde a época do direito romano e encontra-se atualmente disciplinado pelo
artigo 884 do Código Civil de 2002. Desse modo, todo acréscimo patrimonial obtido por um sujeito
de direito que acarrete necessariamente o empobrecimento de outro, deve possuir um motivo
juridicamente legítimo, sob pena de ser considerado inválido e seus valores serem restituídos ao
anterior proprietário. Em caso de resistência à satisfação de tal pretensão, o ordenamento jurídico
disponibiliza à parte lesada os instrumentos processuais denominados ações in rem verso, a fim
de assegurar o respectivo ressarcimento, das quais é exemplo a ação de repetição de indébito.
6 - A propositura de demanda judicial, contudo, não constitui a única via de que dispõe a
Administração Pública para corrigir o enriquecimento sem causa. Os Entes Públicos, por
ostentarem o poder-dever de autotutela, podem anular seus próprios atos, quando eivados de
vícios que os tornem ilegais, ressalvando-se ao particular o direito de contestar tal medida no
Poder Judiciário, conforme as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
7 - Ademais, na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores
pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II,
da Lei 8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99.
8 - Assim, ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador
reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas
alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.
9 - Deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e o
enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício
ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio financeiro
e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais segurados e
em risco à continuidade dessa rede de proteção.
10 – In casu, a parte autora usufruiu do benefício de aposentadoria por invalidez de 30/09/2003 a
15/04/2009 (NB 514.013.478-7). Todavia, em auditoria interna realizada em 12/05/2009, o INSS
constatou irregularidades na manutenção do benefício, uma vez que o demandante exerceu
atividade laborativa voluntariamente, na FAZENDA BOA VISTA. durante os períodos de
01/04/2004 a 18/06/2004, de 19/06/2006 a 29/09/2006 e de 04/02/2008 a 08/09/2008. Assim,
iniciou-se a cobrança administrativa do débito, apurado em R$ 6.375,46 (seis mil, trezentos e
setenta e cinco reais e quarenta e seis centavos).
11 - É dever do segurado comunicar ao INSS o retorno voluntário ao trabalho, conforme
preconiza o artigo 46 da Lei n. 8.213/91. Ademais, até o leigo tem plena consciência de que o
benefício de aposentadoria por invalidez visa ampará-lo enquanto perdurar sua incapacidade
laboral. Assim, não constitui erro escusável o recebimento de prestação sabidamente indevida,
razão pela qual não pode ser acolhida a alegação de boa-fé. Precedentes.
12 - Apelação do autor desprovida. Sentença mantida. Ação julgada improcedente.

Acórdao

PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001451-31.2011.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: JOSE SANTANA DOS SANTOS

Advogado do(a) APELANTE: ALLAN KARDEC MORIS - SP49141-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELADO: PEDRO FURIAN ZORZETTO - SP230009-N

OUTROS PARTICIPANTES:




PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001451-31.2011.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: JOSE SANTANA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: ALLAN KARDEC MORIS - SP49141-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: PEDRO FURIAN ZORZETTO - SP230009-N
OUTROS PARTICIPANTES:

R E L A T Ó R I O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):

Trata-se de apelação interposta por JOSÉ SANTANA DOS SANTOS, em ação ajuizada em
face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o reconhecimento
da inexigibilidade de débito previdenciário.

A r. sentença, prolatada em 17/06/2010, julgou improcedente os pedidos deduzidos na inicial e
condenou o demandante no pagamento de custas, despesas processuais e honorários
advocatícios, condicionando, contudo, a exigibilidade destas verbas à perda dos benefícios da
gratuidade judiciária.

Em suas razões recursais, o demandante alega, preliminarmente, que houve a decadência do

débito previdenciário. No mérito, pugna pela reforma do r. decisum, sustentando, em síntese,
que o caráter alimentar das prestações previdenciárias ou o seu recebimento de boa-fé
implicam necessariamente sua irrepetibilidade. No mais, afirma que não tinha conhecimento de
que o recebimento de aposentadoria por invalidez o impossibilitava de trabalhar.

Devidamente processado o recurso, sem contrarrazões, foram os autos remetidos a este
Tribunal Regional Federal.

É o relatório.











PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001451-31.2011.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: JOSE SANTANA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: ALLAN KARDEC MORIS - SP49141-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: PEDRO FURIAN ZORZETTO - SP230009-N
OUTROS PARTICIPANTES:

V O T O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):

Preliminarmente, não merece prosperar a alegação de decadência suscitada pelo autor.

Não está em discussão a regularidade do ato concessório do benefício por incapacidade,
ocorrido em 30/09/2003, mas sim a impossibilidade de seu recebimento concomitantemente
com o exercício de atividade remunerada.

Desse modo, a invocação do instituto jurídico da decadência é absolutamente imprópria no
caso dos autos, do ponto de vista estritamente técnico. Realmente, a decadência se refere não

à perda da pretensão - a qual se entende modernamente que nunca ocorre, em razão da
garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (artigo 5º. XXXV) -, mas à perda de um
direito potestativo, entendido como aquele que pode ser exercido de forma unilateral, sem estar
condicionado à vontade de terceiros.

Se a parte quisesse alegar que o débito é inexigível pelo decurso do tempo, a boa técnica
recomenda que se alegasse a ocorrência de prescrição. Realmente, esta sim configura a perda
da exigibilidade de uma pretensão - e não da pretensão em si - pela inércia prolongada de seu
titular.

No entanto, nem mesmo a prescrição foi consumada no caso vertente, uma vez que o último
vínculo empregatício do demandante cessou em 08/09/2008. A cobrança extrajudicial do débito
ora impugnado, por sua vez, iniciou-se em 12/05/2009 (ID 116440289 - p. 17). Portanto, como
não transcorreram mais de cinco anos entre a ciência da lesão ao erário e o início da cobrança
administrativa, não há falar em prescrição.

Superada a questão prejudicial, avanço ao mérito.

Discute-se a exigibilidade dos valores pagos indevidamente à parte autora, a título de benefício
previdenciário, na seara administrativa.

O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, fundado na eqüidade, constitui alicerce
do sistema jurídico desde a época do direito romano e encontra-se atualmente disciplinado pelo
artigo 884 do Código Civil de 2002, in verbis:

"Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a
restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários."

Desse modo, todo acréscimo patrimonial obtido por um sujeito de direito que acarrete
necessariamente o empobrecimento de outro, deve possuir um motivo juridicamente legítimo,
sob pena de ser considerado inválido e seus valores serem restituídos ao anterior proprietário.
Em caso de resistência à satisfação de tal pretensão, o ordenamento jurídico disponibiliza à
parte lesada os instrumentos processuais denominados ações in rem verso, a fim de assegurar
o respectivo ressarcimento, das quais é exemplo a ação de repetição de indébito.

A propositura de demanda judicial, contudo, não constitui a única via de que dispõe a
Administração Pública para corrigir o enriquecimento sem causa. Os Entes Públicos, por
ostentarem o poder-dever de autotutela, podem anular seus próprios atos, quando eivados de
vícios que os tornem ilegais, ressalvando-se ao particular o direito de contestar tal medida no
Poder Judiciário, conforme as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.

Ademais, na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores

pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II,
da Lei 8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99, in verbis:

"Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
(...)
II - pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou
além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão
judicial, nos termos do disposto no Regulamento. (Redação dada pela Medida Provisória nº
871, de 2019)"

Assim, ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador
reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas
alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.

Neste sentido, deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e
o enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de
benefício ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o
equilíbrio financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os
demais segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção.

In casu, a parte autora usufruiu do benefício de aposentadoria por invalidez de 30/09/2003 a
15/04/2009 (NB 514.013.478-7). Todavia, em auditoria interna realizada em 12/05/2009, o INSS
constatou irregularidades na manutenção do benefício, uma vez que o demandante exerceu
atividade laborativa voluntariamente, na FAZENDA BOA VISTA. durante os períodos de
01/04/2004 a 18/06/2004, de 19/06/2006 a 29/09/2006 e de 04/02/2008 a 08/09/2008. Assim,
iniciou-se a cobrança administrativa do débito, apurado em R$ 6.375,46 (seis mil, trezentos e
setenta e cinco reais e quarenta e seis centavos).

Historiados os fatos, deve ser acolhido o pleito autárquico de restituição dos valores recebidos
pelo demandante.

Inicialmente, cumpre ressaltar que é dever do segurado comunicar ao INSS o retorno voluntário
ao trabalho, conforme preconiza o artigo 46 da Lei n. 8.213/91.

Ademais, até o leigo tem plena consciência de que o benefício de aposentadoria por invalidez
visa ampará-lo enquanto perdurar sua incapacidade laboral. Assim, não constitui erro escusável
o recebimento de prestação sabidamente indevida, razão pela qual não pode ser acolhida a
alegação de boa-fé.

Aliás, esse é o entendimento consolidado no C. Superior Tribunal de Justiça, conforme se infere
dos seguintes precedentes que trago à colação firmados em casos análogos:

"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SEGURADO QUE VOLTA A
TRABALHAR. CUMULAÇÃO INDEVIDA. DEVOLUÇÃO. SUSTENTABILIDADE DO REGIME
DE PREVIDÊNCIA. DEVER DE TODOS. CLÁUSULA GERAL DE BOA-FÉ. REPETIBILIDADE.
1. Trata-se de Recurso Especial em que a autarquia previdenciária pretende a devolução dos
valores pagos a título de aposentadoria por invalidez a segurado que voltou a trabalhar.
2. A aposentadoria por invalidez consiste em benefício pago aos segurados do Regime Geral
de Previdência social para a cobertura de incapacidade total e temporalmente definitiva para o
trabalho, tendo, portanto, caráter substitutivo da renda. O objetivo da proteção previdenciária é,
pois, garantir o sustento do segurado que não pode trabalhar.
3. O art. 42 da Lei 8.213/1991 estabelece que a aposentadoria por invalidez será paga ao
segurado total e definitivamente incapacitado "enquanto permanecer nesta condição". Já o art.
46 da Lei 8.213/1991 preceitua que "o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à
atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
4. A sustentabilidade do Regime Geral de Previdência Social brasileiro é frequentemente
colocada em debate, devendo, desse contexto sensível, não somente exsurgir as soluções
costumeiras de redução de direitos e aumento da base contributiva. Também deve aflorar a
maior conscientização social tanto do gestor, no comprometimento de não desvio dos recursos
previdenciários, e do responsável tributário, pelo recolhimento correto das contribuições, quanto
dos segurados do regime no respeito à cláusula geral de boa-fé nas relações jurídicas,
consubstanciada na responsabilidade social de respeito aos comandos mais básicos oriundos
da legislação, como o aqui debatido: quem é incapaz para o trabalho, como o aposentado por
invalidez, não pode acumular o benefício por incapacidade com a remuneração do trabalho.
5. Admitir exceções a uma obrigacão decorrente de comando legal expresso que define o limite
de uma cobertura previdenciária, passível de compreensão pelo mais leigo dos cidadãos,
significa transmitir a mensagem de que se pode sugar tudo do Erário, por mais ilegal que seja,
já que para o Estado não é preciso devolver aquilo que foi recebido ilegalmente. Em uma era de
debates sobre apropriação ilegal de recursos públicos e seus níveis, essa reflexão é
imensamente simbólica para que se passe a correta mensagem a toda a sociedade.
6. Sobre a alegação da irrepetibilidade da verba alimentar, está sedimentado no STJ o
entendimento de que a aplicação dessa compreensão pressupõe a boa-fé objetiva, concernente
na constatação de que o receptor da verba alimentar compreendeu como legal e definitivo o
pagamento. A propósito: MS 19.260/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, DJe
11/12/2014.
7. Conforme fixado no precedente precitado, "descabe ao receptor da verba alegar que
presumiu o caráter legal do pagamento em hipótese de patente cunho indevido, como, por
exemplo, no recebimento de auxílio-natalidade (art. 196 da Lei 8.112/1990) por servidor público
que não tenha filhos".
8. Tal entendimento aplica-se perfeitamente ao presente caso, pois não há como presumir, nem
pelo mais leigo dos segurados, a legalidade do recebimento de aposentadoria por invalidez com
a volta ao trabalho, não só pela expressa disposição legal, mas também pelo raciocínio básico
de que o benefício por incapacidade é indevido se o segurado se torna novamente capaz para o
trabalho.

9. No mesmo sentido do que aqui decidido: "1. Em exame, os efeitos para o segurado, do não
cumprimento do dever de comunicação ao Instituto Nacional do Seguro Social de seu retorno
ao trabalho, quando em gozo de aposentadoria por invalidez. 2. Em procedimento de revisão do
benefício, a Autarquia previdenciária apurou que o segurado trabalhou junto à Assembleia
Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, no período de 04/04/2001 a 30/09/2007 (fls. 379 e fls.
463), concomitante ao recebimento da aposentadoria por invalidez no período de 26/5/2000 a
27/3/2007, o que denota clara irregularidade 3. A Lei 8.213/1991 autoriza expressamente em
seu artigo 115, II, que valores recebidos indevidamente pelo segurado do INSS sejam
descontados da folha de pagamento do benefício em manutenção. 4.
Pretensão de ressarcimento da Autarquia plenamente amparada em lei." REsp 1454163/RJ,
Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18.12.2015.
10. Recurso Especial provido."
(REsp 1554318/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
02/06/2016, DJe 02/09/2016)

"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
PROCEDIMENTO REVISIONAL DA AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA. CONSTATAÇÃO DE
RETORNO DO SEGURADO À ATIVIDADE LABORATIVA. DEVOLUÇÃO DE VALORES AO
ERÁRIO. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Em exame, os efeitos para o segurado, do não cumprimento do dever de comunicação ao
Instituto Nacional do Seguro Social de seu retorno ao trabalho, quando em gozo de
aposentadoria por invalidez.
2. Em procedimento de revisão do benefício, a Autarquia previdenciária apurou que o segurado
trabalhou junto à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, no período de
04/04/2001 a 30/09/2007 (fls. 379 e fls. 463), concomitante ao recebimento da aposentadoria
por invalidez no período de 26/5/2000 a 27/3/2007, o que denota clara irregularidade
3. A Lei 8.213/1991 autoriza expressamente em seu artigo 115, II, que valores recebidos
indevidamente pelo segurado do INSS sejam descontados da folha de pagamento do benefício
em manutenção.
4. Pretensão de ressarcimento da Autarquia plenamente amparada em lei.
5. Recurso conhecido e não provido."
(REsp 1454163/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado
em 15/12/2015, DJe 18/12/2015)

No mesmo sentido, cito julgado deste Egrégio Tribunal:

"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO.
RETORNO VOLUNTÁRIO AO TRABALHO. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE.
POSSIBILIDADE DE DESCONTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Compulsando os autos, verifico que foi concedida aposentadoria por invalidez ao autor, em
19/12/2003, por ser portador de "outros transtornos mentais devidos a lesão e disfunção
cerebral e a doença física", CID 10 F06.

- Após revisão administrativa, no ano de 2007, o INSS constatou a cessação da incapacidade
em 06/08/2004. Ademais, conforme documentos juntados aos autos, verifica-se o retorno
voluntário do autor ao trabalho, atuando como advogado em inúmeros processos, no período de
2004 a 2007.
- No caso dos autos, o ora recorrente, enquanto recebia benefício por incapacidade, passou a
exercer atividade remunerada na qualidade de advogado, atuando em diversos processos,
conforme comprovam as consultas realizadas nos sítios eletrônicos do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo e do Diário Oficial do Estado de São Paulo.
- Assim, não se justifica a manutenção do benefício, cuja finalidade é a proteção social do
segurado acometido de incapacidade total e permanente para o trabalho.
- Diante disso, devem ser devolvidos os valores indevidamente recebidos, sob pena de ofensa
ao princípio da moralidade e a fim de evitar o enriquecimento sem causa e o locupletamento
indevido do autor em prejuízo dos cofres públicos.
- Assim, tendo em vista que o autor atualmente é beneficiário de aposentadoria por tempo de
contribuição, nada obsta o desconto dos pagamentos efetuados indevidamente pela Autarquia,
nos termos do art. 115 da LBPS. Contudo, esse desconto deve ser efetuado em percentual que
não reduza o benefício a valor inferior ao mínimo legal e tampouco supere a 30% do valor do
benefício em manutenção, nos termos do artigo 154 do Decreto nº 3.048/99.
- A verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da causa.
- Apelação provida. Tutela antecipada cassada."
(TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1679868 - 0008542-
22.2008.4.03.6106, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, julgado em
03/04/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/04/2017)

Ante o exposto, nego provimento à apelação do autor, mantendo íntegra a sentença de 1º grau
de jurisdição.

É como voto.












E M E N T A

PROCESSO CIVIL. DECADÊNCIA DO DÉBITO PREVIDENCIÁRIO. USO TÉCNICO
IMPRÓPRIO DO INSTITUTO JURÍDICO. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA.
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RETORNO VOLUNTÁRIO AO
TRABALHO. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO AO INSS. DEVOLUÇÃO DOS VALORES.
POSSIBILIDADE. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM
CAUSA. PRESERVAÇÃO DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL DA PREVIDÊNCIA.
APELAÇÃO DO AUTOR DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. AÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE.
1 - Não está em discussão a regularidade do ato concessório do benefício por incapacidade,
ocorrido em 30/09/2003, mas sim a impossibilidade de seu recebimento concomitantemente
com o exercício de atividade remunerada pelo segurado.
2 - Desse modo, a invocação do instituto jurídico da decadência é absolutamente imprópria no
caso dos autos, do ponto de vista estritamente técnico. Realmente, a decadência se refere não
à perda da pretensão - a qual se entende modernamente que nunca ocorre, em razão da
garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição (artigo 5º. XXXV) -, mas à perda de um
direito potestativo, entendido como aquele que pode ser exercido de forma unilateral, sem estar
condicionado à vontade de terceiros.
3 - Se a parte quisesse alegar que o débito é inexigível pelo decurso do tempo, a boa técnica
recomenda que se alegasse a ocorrência de prescrição. Realmente, esta sim configura a perda
da exigibilidade de uma pretensão - e não da pretensão em si - pela inércia prolongada de seu
titular.
4 - No entanto, nem mesmo a prescrição foi consumada no caso vertente, uma vez que o último
vínculo empregatício do demandante cessou em 08/09/2008. A cobrança extrajudicial do débito
ora impugnado, por sua vez, iniciou-se em 12/05/2009 (ID 116440289 - p. 17). Portanto, como
não transcorreram mais de cinco anos entre a ciência da lesão ao erário e o início da cobrança
administrativa, não há falar em prescrição.
5 - O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, fundado na eqüidade, constitui
alicerce do sistema jurídico desde a época do direito romano e encontra-se atualmente
disciplinado pelo artigo 884 do Código Civil de 2002. Desse modo, todo acréscimo patrimonial
obtido por um sujeito de direito que acarrete necessariamente o empobrecimento de outro, deve
possuir um motivo juridicamente legítimo, sob pena de ser considerado inválido e seus valores
serem restituídos ao anterior proprietário. Em caso de resistência à satisfação de tal pretensão,
o ordenamento jurídico disponibiliza à parte lesada os instrumentos processuais denominados
ações in rem verso, a fim de assegurar o respectivo ressarcimento, das quais é exemplo a ação
de repetição de indébito.
6 - A propositura de demanda judicial, contudo, não constitui a única via de que dispõe a
Administração Pública para corrigir o enriquecimento sem causa. Os Entes Públicos, por
ostentarem o poder-dever de autotutela, podem anular seus próprios atos, quando eivados de
vícios que os tornem ilegais, ressalvando-se ao particular o direito de contestar tal medida no
Poder Judiciário, conforme as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
7 - Ademais, na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos
valores pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo

115, II, da Lei 8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99.
8 - Assim, ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador
reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas
alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.
9 - Deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e o
enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício
ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio
financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais
segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção.
10 – In casu, a parte autora usufruiu do benefício de aposentadoria por invalidez de 30/09/2003
a 15/04/2009 (NB 514.013.478-7). Todavia, em auditoria interna realizada em 12/05/2009, o
INSS constatou irregularidades na manutenção do benefício, uma vez que o demandante
exerceu atividade laborativa voluntariamente, na FAZENDA BOA VISTA. durante os períodos
de 01/04/2004 a 18/06/2004, de 19/06/2006 a 29/09/2006 e de 04/02/2008 a 08/09/2008.
Assim, iniciou-se a cobrança administrativa do débito, apurado em R$ 6.375,46 (seis mil,
trezentos e setenta e cinco reais e quarenta e seis centavos).
11 - É dever do segurado comunicar ao INSS o retorno voluntário ao trabalho, conforme
preconiza o artigo 46 da Lei n. 8.213/91. Ademais, até o leigo tem plena consciência de que o
benefício de aposentadoria por invalidez visa ampará-lo enquanto perdurar sua incapacidade
laboral. Assim, não constitui erro escusável o recebimento de prestação sabidamente indevida,
razão pela qual não pode ser acolhida a alegação de boa-fé. Precedentes.
12 - Apelação do autor desprovida. Sentença mantida. Ação julgada improcedente. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


Resumo Estruturado

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