D.E. Publicado em 14/09/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação autárquica, dar parcial provimento à apelação do autor e negar provimento à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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Data e Hora: | 30/08/2016 19:06:01 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004886-71.2010.4.03.6111/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de trabalho rural, o enquadramento de tempo de serviço especial e a conversão de tempo comum para especial, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
O pedido foi julgado parcialmente procedente apenas para reconhecer o trabalho sob condições especiais de 1/10/1977 a 12/4/1978, 1/7/1984 a 30/11/1984, 2/9/1985 a 1/6/1992 e 2/6/1993 a 30/9/1995. O benefício foi negado.
Decisão não submetida ao reexame necessário.
O INSS interpôs apelação, requerendo a apreciação do reexame necessário.
Por seu turno, o autor também apelou, requerendo o reconhecimento de tempo de labor rural (1/1/1968 a 31/12/1970, 1/1/1972 a 13/2/1976 e maio de 1978 a 30/10/1982) e de atividade sob condições especiais (1/11/1982 a 15/3/1983, 2/2/1993 a 11/3/1993, 16/3/1993 a 2/4/1993, 1/10/1998 a 10/2/2000, 1/5/2001 a julho de 2002 e 1/11/2003 a 1/6/2008).
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte, tendo sido distribuídos a este relator.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço das apelações, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Considerando que a r. sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não se aplicam as novas regras previstas no artigo 496 e §§ do Novo CPC.
Assim, não obstante ter sido proferida a sentença após a vigência da alteração do artigo 475, § 2º, do Código de Processo Civil pela Lei n. 10.352/2001, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos, dou a remessa oficial por interposta, por não haver valor certo a ser considerado, na forma da súmula nº 490 do STJ.
Ressalte-se que o intervalo 14/2/1976 a 12/4/1978 foi reconhecido pelo INSS e, por isso, é incontroverso.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/91:
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua vinculação ao tempo de carência". (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
No caso, o autor pleiteia o reconhecimento de trabalho rural de 1/1/1968 a 31/12/1970, 1971, 1/1/1972 a 13/2/1976, maio de 1978 a 30/10/1982.
Para tanto, juntou sua certidão de casamento (1978), as certidões de nascimento de seus filhos (1979, 1981), seu título eleitoral (1982) em que está qualificado como lavrador.
Ademais, juntou notas fiscais de produtor rural (1981, 1982), cédula rural pignoratícia (1981), CTPS de seu genitor (com vínculo com a Fazenda Santa Terezinha de 1/9/1959 a 30/4/1978 - cargo: administrador) e certidão fornecida pela diretoria da ETEC Paulo Guerreiro Franco - Centro Estadual Paula Souza que o autor completou em um ano o curso de técnico em agropecuária (1971).
Os demais documentos apresentados dizem respeito a terceiros e, portanto, não estabelecem liame entre o requerente e o labor asseverado.
Os intervalos 1/1/1968 a 31/12/1970 e 1/1/1972 a 13/2/1976 não devem ser reconhecidos.
Isso porque o pai do autor não trabalhava como rurícola, mas como administrador de fazenda, labor de natureza urbana.
Nesse diapasão, à vista do teor da súmula nº 73 do E. TRF da 4ª Região, o tempo em que o pai do autor foi empregado rural ou empregado urbano não pode lhe ser estendido para fins do artigo 55, § 3º, da LBPS, porque trabalhava ele com registro em CTPS, não em regime de economia familiar.
Nesse ponto, os depoimentos colhidos foram vagos, contraditórios e mal circunstanciados.
Os lapsos maio de 1978 a abril de 1979, junho de 1979 a agosto de 1979, agosto de 1981 a 30/10/1982 também não devem ser reconhecidos.
Isso porque, embora haja início de prova material, o autor deixou de apresentar testemunha que relatasse o labor rural supostamente ocorrido nesses interregnos.
Vale destacar que o autor efetuou recolhimentos para as competências 05/1979, 9/1979 a 7/1981, os quais deverão ser computados na apuração do tempo total de serviço/contribuição.
Discute-se, ainda, a possibilidade de computar como tempo de serviço o período de aprendizado profissional em escola técnica como aluno aprendiz.
A esse respeito, vale ressaltar que a Instrução Normativa INSS/PRES N. 27, de 30 de abril de 2008, publicada no Diário Oficial da União de 2/5/2008, alterou a redação do artigo 113 da Instrução Normativa n. 20/INSS/PRES, de modo a readmitir-se o cômputo como tempo de serviço/contribuição dos períodos de aprendizado profissional realizados na condição de aluno aprendiz até a publicação da Emenda Constitucional n. 20/98, de 16 de dezembro de 1998. Confira-se:
Desse modo, tem-se admitido a averbação do período de estudo em escolas industriais ou técnicas da rede pública de ensino, desde que comprovada a frequência ao curso profissionalizante e a retribuição pecuniária, ainda que indireta, conforme o inciso III do artigo 113, da aludida Instrução Normativa 20 do INSS, na redação dada pela IN 27.
Nesse sentido, o julgado desta Nona Turma:
Vale citar, ainda, o enunciado da Súmula n. 96, do E. Tribunal de Contas da União:
Na hipótese, embora a certidão de folha 68 comprove que o requerente matriculou-se no Centro Estadual de Educação Paula Souza - Escola Técnica Estadual Paulo Guerreiro Franco - em 1971, perfazendo tempo de 11 meses e 14 dias, tal documento não pode ser admitido, pois não consta qualquer evidência de que a parte autora recebesse retribuição pecuniária por seu trabalho, ainda que indireta.
O ônus respectivo, respeitante à produção de prova suficiente e segura cabia, induvidosamente, à parte autora, pois se tratava de fato constitutivo de seu direito. E, dele, não se desincumbiu.
Por tais razões, o período pleiteado como aluno-aprendiz não deve ser reconhecido.
Assim, rejeito o pedido de reconhecimento de labor rural.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições prejudiciais.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
No caso em tela, o autor pleiteia o reconhecimento da especialidade dos ofícios exercidos de 1/10/1977 a 12/4/1978, 1/11/1982 a 15/3/1983, 2/2/1993 a 11/3/1993, 16/3/1993 a 2/4/1993, 1/10/1998 a 10/2/2000, 1/5/2001 a julho de 2002, 1/11/2003 a 1/6/2008.
Quanto ao lapso 1/10/1977 a 12/4/1978, as anotações em CTPS revelam a atividade de "tratorista" a qual permite o reconhecimento de sua natureza especial apenas pelo enquadramento profissional (até a data de 5/3/1997), nos termos dos códigos 2.4.4 do anexo do Decreto n. 53.831/64 e 2.4.2 do anexo do Decreto n. 83.080/79 (TRF 3ª R, AC n. 2001.03.99.041797-0/SP, 9ª Turma, Rel. Des. Federal Marisa Santos, julgado em 24/11/2008, DJU 11/02/2009, p. 1.304 e TRF3, 10ª Turma, AC n. 00005929820004039999, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, DJU 16/11/2005).
Em relação aos interregnos 1/7/1984 a 30/11/1984, 2/9/1985 a 1/6/1992, 2/2/1993 a 11/3/1993, 16/3/1993 a 2/4/1993, 2/6/1993 a 15/9/1995, há anotações em carteira de trabalho e formulários que informam o ofício de motorista de caminhão no transporte de cargas, situação que permite o enquadramento nos termos dos códigos 2.4.4 do anexo ao Decreto n. 53.831/64 e 2.4.2 do anexo ao Decreto n. 83.080/79 (TRF 3ª R; AC n. 2001.03.99.041797-0/SP; 9ª Turma; Rel. Des. Federal Marisa Santos; julgado em 24/11/2008; DJU 11/02/2009, p. 1304 e TRF3, 10ª Turma, AC n. 00005929820004039999, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, DJU 16.11.2005).
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, concluo que, nessas hipóteses, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade do agente.
Por seu turno, quanto aos intervalos 1/11/1982 a 15/3/1983, 1/10/1998 a 10/2/2000, 1/5/2001 a julho de 2002, a parte autora não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca quando instruiu a peça inicial, qual seja: carrear prova documental como formulários padrão, laudo técnico individualizado e PPP - documentos aptos a individualizar a situação fática da autora e comprovar a especificidade ensejadora do reconhecimento de possível agressividade, inviabilizando, portanto, o enquadramento pretendido.
O período de 1/11/2003 a 1/6/2008 também não deve ser enquadrado como especial, pois no PPP apresentado não constam quais agentes agressivos o autor esteve sujeito.
Destarte, os interstícios de 1/10/1977 a 12/4/1978, 1/7/1984 a 30/11/1984, 2/9/1985 a 1/6/1992, 2/2/1993 a 11/3/1993, 16/3/1993 a 2/4/1993, 2/6/1993 a 15/9/1995 devem ser considerados como de atividade especial e convertido para comum.
Da aposentadoria pleiteada
Diante desse cenário, o autor não faz jus à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
Passo à análise da questão referente aos honorários de advogado à luz do direito processual intertemporal.
"Em caso de sucumbência recíproca, deverá ser considerada proveito econômico do réu, para fins do art. 85, § 2º, do CPC/2015, a diferença entre o que foi pleiteado pelo autor e o que foi concedido, inclusive no que se refere às condenações por danos morais." (Enunciado n° 14 aprovado pela ENFAM), sendo vedada a compensação na forma do § 14 do mesmo artigo.
No caso, tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, sendo vedada a compensação pela novel legislação, deveria ser observada a proporcionalidade à vista do vencimento e da perda de cada parte, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC.
Logo, caso tivesse sido a sentença proferida já na vigência do Novo CPC, seria caso de condenar o maior sucumbente a pagar honorários ao advogado arbitrados em 7% (sete por cento) sobre o valor da condenação ou da causa, e também condenar a outra parte a pagar honorários de advogado, neste caso fixados em 3% (três por cento) sobre a mesma base de cálculo.
Todavia, abstenho-me de aplicar a novel regra do artigo 85, § 14º, do NCPC, isso para evitar surpresa à parte prejudicada, devendo prevalecer o mesmo entendimento da jurisprudência concernente a não aplicação da sucumbência recursal. Consequentemente, deixo de condenar ambas as partes a pagar honorários ao advogado, mesmo porque se trata de hipótese diversa da prevista no artigo 21, § único, do CPC/1973, que trata da sucumbência mínima.
De fato, considerando que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, §§ 1º a 11º, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
Nesse diapasão, o Enunciado Administrativo nº 7 do STJ, in verbis: "Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC."
De todo modo, como a questão dos honorários de advogado envolve direito substancial, deve ser observada a legislação vigente na data da publicação da sentença, porquanto pertinente ao caso a regra do artigo 6º, caput, da LINDB.
Em relação à parte autora, é suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Isso posto, dou provimento à apelação autárquica, dou parcial provimento à apelação do autor e nego provimento à remessa oficial, para, nos termos da fundamentação, (i) reconhecer o enquadramento e a conversão de atividade especial; (ii) julgar improcedente o pedido de benefício; (iii) fixar a verba honorária.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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