D.E. Publicado em 06/03/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0036703-85.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
A parte autora ajuizou a presente ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando, em síntese, o reconhecimento de labor rural, exercido sem o correspondente registro em CTPS, bem como o enquadramento de atividade especial, a ser convertida em tempo de serviço comum, com fins de viabilizar a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, em sua forma integral.
Concedidos os benefícios da Justiça Gratuita (fl. 35).
Prova oral colacionada à fl. 134 (gravação em mídia digital).
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer o período de abril/1976 a dezembro/1983, como labor rural exercido pelo demandante, a ser averbado perante o INSS, a fim de viabilizar a expedição de certidão de tempo de serviço, para fins previdenciários. Sucumbência recíproca. Sem custas, nos termos do art. 4º, da Lei n.º 9.289/96 (fls. 98/101).
Inconformado, recorre o INSS (fls. 105/123), sustentando, em princípio, a necessária sujeição da r. sentença ao reexame necessário. No mérito, assere a impossibilidade de reconhecimento de tempo de serviço exercido antes do implemento dos 14 (quatorze) anos de idade, bem como a ausência de início razoável de provas materiais acerca do alegado labor rurícola reclamado pelo demandante. Subsidiariamente, requer a alteração dos critérios de incidência dos consectários legais.
Com contrarrazões (fls. 127/129), subiram os autos a esta Corte.
É o Relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0036703-85.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Ab initio, insta salientar que em virtude da alteração legislativa decorrente da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (Lei n.º 13.105/15), não há de se falar na sujeição da r. sentença ao reexame necessário, como suscitado pela autarquia federal.
DA REMESSA OFICIAL
O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo trânsito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:
Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.
Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC -, vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrario, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.
Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.
NATUREZA JURÍDICA DA REMESSA OFICIAL
Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.
Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.
Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.
Ao reexame necessário aplica-se o principio inquisitório (e não o principio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.
Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.
Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.
DIREITO INTERTEMPORAL
Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, na produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Publico, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.
A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:
Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferior a 1000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
Diante disso, não há de se falar em sujeição da r. sentença à remessa oficial.
Realizadas tais considerações, observo que a controvérsia havida no presente feito cinge-se a possibilidade de reconhecimento de labor rural exercido pelo autor, sem o correspondente registro em CTPS, a fim de viabilizar a expedição de certidão de tempo de serviço.
Anote-se que a despeito do d. Juízo de Primeiro Grau não ter procedido ao reconhecimento do período de atividade especial reclamado pelo autor e tampouco analisado a questão atinente ao efetivo implemento dos requisitos legais necessários à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a ausência de recurso voluntário da parte autora inviabiliza qualquer alteração nesse sentido, haja vista a incidência do princípio da non reformatio in pejus.
Por consequência, em observância à necessária correlação do presente julgamento aos limites da insurgência recursal veiculada pela autarquia federal, ressalto que apenas a questão atinente ao período de labor rural declarado na r. sentença e destinado à expedição de certidão de tempo de serviço, para fins previdenciários, será objeto de apreciação por esta E. Corte.
DO LABOR RURAL
Conforme se depreende dos autos, pretende a parte autora o reconhecimento de labor rural exercido no período de abril/1976 (implemento dos 10 anos de idade - fl. 13) até dezembro/1983 (termo final do ano anterior ao primeiro registro firmado em CTPS - fl. 22), sem o correspondente registro oficial.
Inicialmente, faz-se necessário salientar a impossibilidade legal de reconhecimento de labor rural exercido pelo demandante antes de 31.03.1978 (implemento dos 12 anos de idade - fl. 13), haja vista a vedação constitucional imposta ao trabalho infantil.
Nesse sentido, confira-se:
No mais, insta salientar que a jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na forma da Súmula 149 - STJ, in verbis:
Nesse diapasão, a seguinte ementa do E. STJ:
Todavia, com intuito de comprovar o exercício de atividade rurícola no período controvertido, a parte autora se limitou a colacionar aos autos, os seguintes documentos:
a) histórico escolar do autor, relativo aos anos de 1973, 1974, 1975, 1977, 1978, 1981, 1982 e 1983, cursados em estabelecimento de ensino situado na cidade de Guaraçaí/SP, porém, sem qualquer informação alusiva à ocupação profissional eventualmente desenvolvida pelo demandante e seus familiares;
b) certidão de casamento, celebrado aos 27.06.1987, indicando o ofício de "operário" desenvolvido pelo requerente;
c) certidão de casamento do genitor do autor, celebrado aos 09.04.1966, indicando o ofício de "lavrador" exercido à época pelo cônjuge; e
d) CTPS do autor contendo registros de contratos de trabalho firmados a partir de maio/1984, exclusivamente, para o exercício de atividade urbana.
Vê-se, pois, que diversamente da argumentação expendida pelo d. Juízo de Primeiro Grau, a parte autora não se desincumbiu do ônus de comprovar sua efetiva dedicação ao labor rurícola no período reclamado em sua exordial, haja vista a inexistência de qualquer elemento de convicção nesse sentido.
Nenhum dos documentos apresentados pelo autor indica sua dedicação à faina campesina, o que seria de rigor.
E nem se alegue que a certidão de casamento de seu genitor se prestaria a tal finalidade, eis que emitida no ano de nascimento do próprio segurado (1966 - fl. 19), ou seja, muitos anos antes do termo inicial do período de labor rural por ele reclamado, isso sem qualquer outro registro contemporâneo que nos permitisse concluir pela continuidade da dedicação de seu genitor à faina campesina.
Acrescento, por oportuno, que as provas orais colacionadas aos autos (fl. 134 - gravação em mídia digital), corroboraram a alegação da parte autora no sentido de que este teria exercido atividade rurícola desde a tenra idade, juntamente de seus familiares, contudo, conforme acima explicitado, a legislação previdenciária vigente não admite a utilização exclusiva de provas orais para a comprovação de tempo de serviço, sendo indispensável um início razoável de provas materiais nesse sentido, o que não ocorreu no presente caso.
Não desconheço o teor do julgado proferido no REsp n.º 1.348.633/SP, entretanto, compulsando os autos, verifico que o teor dos depoimentos não se reputa fonte segura e robusta o suficiente para fundamentar, de forma exclusiva, o acolhimento de todo o período reclamado na exordial e para o qual inexiste nos autos qualquer elemento de convicção ou prova material atestando o exercício de labor rural pelo requerente.
Destarte, entendo que a r. sentença merece reforma para excluir o período de abril/1976 a dezembro/1983, do cômputo de labor rural desenvolvido pelo demandante.
Considerando que a parte autora decaiu integralmente do pedido veiculado na exordial, condeno-a ao pagamento de custas e honorários advocatícios que ora arbitro em R$ 1.000,00 (hum mil reais), na esteira da orientação erigida pela E. Terceira Seção desta Corte (Precedentes: AR 2015.03.00.028161-0/SP, Relator Des. Fed. Gilberto Jordan; AR 2011.03.00.024377-9/MS, Relator Des. Fed. Luiz Stefanini). Sem se olvidar tratar-se de parte beneficiária da justiça gratuita, observar-se-á, in casu, a letra do art. 98, parágrafo 3º, do CPC/2015.
Isto posto, DOU PROVIMENTO AO APELO DO INSS, para determinar a exclusão do período de abril/1976 a dezembro/1983, do cômputo de labor rural desenvolvido pelo demandante.
É o voto.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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