D.E. Publicado em 04/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em consonância com o art. 1.013, § 1°, do CPC/2015, NEGAR PROVIMENTO à Apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016545-09.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal Fausto De Sanctis:
Trata-se de Apelação interposta pela autora Ana Maria Fagundes (fls. 145-152) em face da r. Sentença (fls. 137-142) que julgou improcedente o pedido de concessão de auxílio doença e/ou aposentadoria por invalidez rural, desde a data do início da doença, nos termos do laudo do perito judicial. Condenou a parte autora ao pagamento das custas, despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor dado à causa, com observância da condição ostentada pela autora de beneficiária da gratuidade da justiça.
Em seu recurso, a parte autora pugna pela reforma da r. Sentença, sob fundamento de que houve a comprovação da qualidade de segurada especial da autora, ressaltando início de prova material corroborada pela prova testemunhal.
Subiram os autos a esta Eg. Corte, sem as contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal Fausto De Sanctis:
Sem preliminares, passo à análise do mérito.
Cumpre, primeiramente, apresentar o embasamento legal relativo aos benefícios previdenciários concedidos em decorrência de incapacidade para o trabalho.
Nos casos em que está configurada uma incapacidade laboral de índole total e permanente, o segurado faz jus à percepção da aposentadoria por invalidez. Trata-se de benefício previsto nos artigos 42 a 47, todos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Além da incapacidade plena e definitiva, os dispositivos em questão exigem o cumprimento de outros requisitos, quais sejam: a) cumprimento da carência mínima de doze meses para obtenção do benefício, à exceção das hipóteses previstas no artigo 151 da lei em epígrafe; b) qualidade de segurado da Previdência Social à época do início da incapacidade ou, então, a demonstração de que deixou de contribuir ao RGPS em decorrência dos problemas de saúde que o incapacitaram.
É possível, outrossim, que a incapacidade verificada seja de índole temporária e/ou parcial, hipóteses em que descabe a concessão da aposentadoria por invalidez, mas permite seja o autor beneficiado com o auxílio-doença (artigos 59 a 62, todos da Lei nº 8.213/1991). A fruição do benefício em questão perdurará enquanto se mantiver referido quadro incapacitante ou até que o segurado seja reabilitado para exercer outra atividade profissional.
Destacados os artigos que disciplinam os benefícios em epígrafe, passo a analisar a questão dos requisitos mencionados, no caso concreto.
Cabe analisar a carência e qualidade de segurada especial, ou não, na data fixada como início da incapacidade para o trabalho pelo perito judicial. No caso, à mingua de elementos sólidos, restou fixada em 2010 (quesito do INSS 10 - fls. 86 e 112).
Neste ponto, vale ressaltar que o trabalhador rural está dispensado do cumprimento da carência, mas deve comprovar o exercício de atividade rural:
O Colendo Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a comprovação da atividade rural requer a existência de início de prova material, a qual poderá ser corroborada com a prova testemunhal, conforme entendimento cristalizado na Súmula 149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário."
Por outro lado, o próprio Superior Tribunal de Justiça entende não ser imprescindível que a prova material abranja todo o período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, desde que a prova testemunhal amplie a sua eficácia, permitindo sua vinculação ao tempo de carência.
Nesse sentido:
Ademais, tendo em vista, o julgamento do Recurso Especial n.º 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, é possível a admissão de tempo de serviço rural anterior à prova documental, desde que corroborado por prova testemunhal idônea. Desse modo, houve a relativização da contemporaneidade dos documentos apresentados para comprovação de exercício de atividade rural.
Acrescente-se, conforme entendimento sedimentado no julgamento do REsp n° 1.321.493-PR, recebido pela C. Corte STJ, como recurso representativo de controvérsia, a possibilidade de se permitir maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material em relação ao trabalhador rural, na modalidade boia fria, ressaltando-se, contudo, que a despeito de ser permitida maior flexibilidade, há a exigência de que a prova material apresentada abranja pelo menos parte do período controverso, não afastando a aplicação da Súmula 149 do STJ ao trabalhadores rurais na qualidade de boia fria/diarista.
Saliente-se que a própria certidão de nascimento do filho constitui início de prova material, pois o C. STJ pacificou entendimento no sentido de reconhecer como início probatório as certidões da vida civil.
Quanto ao tempo de serviço rural, posterior à vigência da Lei n° 8.213/91, na qualidade de pequeno produtor rural, observa-se a regra do art. 39 do referido diploma:
Pelo que se infere dos autos, a autora alega que durante toda a sua vida exerce atividade rural, em regime de economia familiar, e para terceiros, na qualidade de diarista e/ou boia fria, devendo comprovar o exercício de atividade rural, no período de carência do benefício pleiteado.
Cabe ressaltar que a despeito do trabalhador rural, na modalidade boia fria, ser enquadrado como contribuinte individual, nos termos do art. 11, V, alínea "g", da Lei de Benefícios, em razão da informalidade da prestação laboral, e em consonância com o entendimento das Cortes Superiores, exige-se a comprovação do labor rural, de forma equiparada ao segurado especial, em regime de economia familiar.
Contudo, verifico não comprovada tal alegação.
Para a comprovação do efetivo trabalho agrícola, em regime de economia familiar, e como boia fria, no período da carência do benefício, a autora juntou documento correspondente ao ano de 1971 (Certidão de casamento, na qual consta a profissão do esposo da autora como lavrador - fl. 11).
Neste ponto, vale destacar que a certidão de casamento da parte autora (1971), na qual consta a profissão do esposo da requerente como lavrador (fl. 11), não serve para comprovar seu alegado labor rural, pois em marco temporal muito longínquo da data do início da incapacidade laborativa fixada pelo jurisperito (2010 - quesito do INSS 10 - fls. 86 e 112), cabendo destacar que há a necessidade de comprovação do labor rural, mesmo descontínuo, no período de carência do benefício.
Ademais, a pesquisa CNIS (fls. 47-49) demonstra o exercício laboral do esposo da autora como empresário/empregador a partir de 07.1995, o que afasta a alegada qualidade de segurado especial da Previdência. Frise-se que tal fato foi corroborado pela própria parte autora, em suas razões recursais, no sentido de que alega de que o fato do marido verter algumas contribuições previdenciárias como empresário, não significa que a requerente seja trabalhadora urbana ou tenha abandonado as lides campesinas (fl. 148). Além disso, afirma que o esposo da requerente contribuiu por algum tempo como comerciante, dedicando-se ao pequeno comércio na vilinha onde residem, ou seja, no bairro Bocaina, vendendo poucas coisas para as pessoas do vilarejo, jamais grande empresário (fl. 149), o que conforme já fundamentado, afasta a alegada qualidade de segurado especial da Previdência. Neste ponto, frise-se, estende-se à autora a não comprovação de tal qualidade de segurada especial, já que quer comprovar sua alegada atividade rural com a qualificação do esposo como lavrador na certidão de casamento, e a prova dos autos contrariam tais alegações.
Além disso, consta dos autos que em processo para concessão de aposentadoria por idade rural (Processo n° 346/2010 - fls. 32-66), o mesmo foi julgado improcedente (fls. 60-64), restando tal decisão transitada em julgado em 14.07.2011 (fl. 65).
Neste ponto, vale observar que não se está a vincular tal decisão ao presente feito, contudo cabe destacar que nos termos do art. 372 do CPC/2015, o juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.
In casu, possível constatar incongruências em relação às alegações da parte autora no referido processo, que restaram por formar o convencimento do julgador no sentido do não preenchimento dos requisitos necessários para a concessão do benefício pleiteado. Saliente-se que nos referidos autos, restou inconsistente a informação de exercício de labor rural pela autora, valendo ressaltar que o único documento apresentado como início de prova material foi a mesma certidão de casamento juntada nos presentes autos (fls. 11 e 35). Acrescente-se que a prova testemunhal produzida naqueles autos (fls. 54-55 e 63) não se prestou a comprovar a existência do exercício de atividade rural pela requerente, em regime de economia familiar, nem como diarista/boia fria. Neste ponto, cabe destacar que o depoimento das testemunhas arroladas pela requerente, Antonio Vitorino Ribeiro e Jose Pinto (fls. 55 e 63) foi unânime no sentido de que conhecem a autora há mais de 30 anos, que o imóvel em que a autora reside não se trata de imóvel rural, e sim uma casa na vila, sem plantação ou produção, o que corrobora a informação da própria parte autora, em suas razões recursais, no sentido de que indica que o esposo da requerente contribuiu por algum tempo como comerciante, dedicando-se ao pequeno comércio na vilinha onde residem, ou seja, no bairro Bocaina (fl. 149). Ademais, vale salientar o depoimento da testemunha Jose Pinto (fl. 55) que afirma que a autora nunca trabalhou fora de casa, nem tampouco na roça, que sempre sobreviveu do trabalho do marido que trabalhava para terceiros no roçado, que a autora não criou animais para venda e nem efetuou plantações no seu imóvel com o objetivo de lucro, que nunca viu a autora trabalhando com o marido na roça. Acrescente-se que ambas as testemunhas não informam com precisão o período em que o esposo da autora trabalhou no roçado, nem o nome dos proprietários rurais para quem foi prestado o alegado trabalho rural.
Frise-se que não há um único documento comprobatório do alegado labor rural, em regime de economia familiar, nem na qualidade de diarista e/ou boia fria, no período controverso.
Portanto, não havendo início de prova material, não é admitida prova exclusivamente testemunhal, a teor da Súmula 149 do STJ.
Todavia vale destacar que a prova testemunhal produzida no presente feito (fls. 129-135) não se prestou a comprovar o exercício de atividade rural pela requerente no período controverso.
Observa-se do depoimento das testemunhas Roque Alves de Macedo, Maria Aparecida Ventura do Nascimento e Nilton Cesar Pinto, transcritos às fls. 130-135, que apesar de afirmarem o exercício de labor rural pela requerente, não há precisão de datas, dos nomes dos proprietários rurais aonde foram exercidas as alegadas atividades rurais, cabendo ressaltar que afirmam que sabem que a requerente e seu esposo sempre trabalharam na lavoura, mas nunca trabalharam juntos, bem como que a autora nunca trabalhou em terras próprias, o que afasta o alegado exercício de labor rural em regime de economia familiar.
Ademais, nos termos do art. 373, I, do CPC/2015 (art. 333, I, do CPC/1973), cabe ao autor o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito. Neste caso, não restou comprovado o alegado labor rural no período controverso, não podendo o embasamento do direito alegado pelas partes se apoiar em meras suposições.
Desse modo, pelo que consta dos autos, não houve elementos probatórios conclusivos para a formação do convencimento desse julgador, no sentido de que a parte-requerente possui a qualidade de segurada especial, exercendo atividade rural, em regime de economia familiar, nem na qualidade de diarista/boia fria, restando não preenchidos os requisitos legais, no caso a carência e a qualidade de segurada.
Não havendo o preenchimento do requisito legal qualidade de segurada especial, prescindível a análise dos demais requisitos. Desse modo, não merece reforma a r. sentença.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, devendo-se observar o disposto no artigo 98, § 3°, do CPC/2015.
Nesse sentido, é o julgado da Suprema Corte abaixo transcrito:
Posto isto, em consonância com o art. 1.013, § 1°, do CPC/2015, voto por NEGAR PROVIMENTO à Apelação da parte autora, nos termos expendidos na fundamentação.
É o voto.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 23/08/2017 12:46:43 |